(com base no roteiro abaixo, falei no Diretório Nacional reunido dia 7 de agosto, acerca do documento “Plano de reconstrução e transformação do Brasil: Outro mundo é preciso; outro Brasil é necessário”.)
Sobre o mérito, eu começo ressaltando que o documento tenta articular propostas para diferentes níveis e situações: o plano emergencial, ou seja, medidas que devem ser propostas agora, quando ainda somos oposição; o plano da reconstrução, ou seja, medidas que devem ser propostas para imediato day after da saída de Bolsonaro e dos golpistas; e o plano do médio-longo prazo, ou seja, medidas que viabilizem a transição em direção à sociedade que queremos.
Na minha
opinião, o documento não articula adequadamente estes três níveis.
E perde em
radicalidade, exatamente onde deveria ser mais radical, ou seja, no médio e
longo prazo.
Chamo a atenção
para algo que está no texto e que o Aloizio repetiu aqui, que nosso objetivo é
uma nova utopia civilizatória.
O texto
chega a citar Thomas Morus, autor de um clássico de 1516 intitulado
UTOPIA. Portanto, diferente do que disse
aqui o Guimarães, o texto do plano coloca a discussão no terreno de que ser
realista também é ser utópico, no bom sentido da palavra.
Entretanto,
o texto anuncia uma utopia mas, na minha opinião, não articula de maneira
adequada a relação entre as medidas propostas e nosso objetivo SOCIALISTA.
Registro que
o texto melhorou: na versão inicial a palavra socialismo aparecia, se não me engano,
1 vez.
Agora
aparece algumas vezes e inclusive num parágrafo que deixa claro nosso objetivo de
longo prazo.
Mas a
articulação continua no essencial retórica, não programática.
Pois para
ser programática, precisa tratar do tema proibido: A PROPRIEDADE.
Para usar as
palavras do Aloizio, o centro do documento é “a reforma do Estado”.
Este é um
conceito equivocado.
O Estado é
MEIO, não é fim.
O nosso centro
é realizar uma profunda transformação, democrática, popular, socialista, nas
relações sociais e econômicas.
O que
implica em alterar a estrutura de propriedade.
Ao dizer que
o Estado é o centro, o documento deposita todas as fichas em medidas fiscais,
tributárias, de financiamento do Estado.
E não
enfrenta adequadamente, na minha opinião, o tema da mudança nas estruturas de
propriedade e poder, o que impacta negativamente, na minha opinião, o que o
texto fala sobre dois temas CHAVE, a saber: a reindustrialização e a geração de
dezenas de milhões de empregos bem pagos e com direitos garantidos em lei.
Não haverá
reindustrialização de novo tipo, se isso depender dos atuais capitalistas e das
atuais empresas capitalistas, nacionais e estrangeiras, existentes no Brasil.
A divergência
a respeito desse tema da propriedade faz o texto assumir como verdadeira o que
é uma fábula, uma pós-verdade: a de que o New Deal teria sido o responsável
pela superação da crise nos Estados Unidos.
Isto simplesmente
não é verdade.
Foi a
Segunda Guerra que permitiu aos EUA reconstruir sua economia e superar a crise.
Por isso é preciso
discutir de outra forma o problema: não o adotado pelo texto, que defende fazer
uma reforma capitalista do capitalismo; mas sim outro caminho, o de realizarmos
uma transformação democrático-popular e socialista do capitalismo existente em
nosso país.
O que, repito,
implica em tratar de outra forma o tema da propriedade.
E colocar o
socialismo como meta.
Meta que além
de desejável, é possível, necessária e realista neste momento de crise sistêmica
em que estamos, no Brasil e no mundo.
*
Em segundo
lugar, eu quero registrar que há três emendas que eu apresentei, que não foram
incorporadas e que não foram citadas pelo Aloizio como temas que mereciam
debate especialmente aprofundado.
Os temas
citados pelo Aloizio foram socialismo e Assembleia Constituinte.
Chamo a
atenção que a Constituinte já é uma deliberação partidária. E o fato da resolução
do último congresso ainda não ter sido finalizada e oficialmente publicada, não
anula estas e outras resoluções.
Portanto, na
minha opinião, ao não incluir este tema, a comissão responsável pelo tema
exorbitou.
E acho que o
texto base que aqui será aprovado, incorpore o tema, mesmo que numa formulação mediada.
A exclusão da
Constituinte já tinha ocorrido na campanha eleitoral, quando o tema foi
suprimido do programa no meio da campanha.
Ali,
considerei isto um erro político, mas estava dentro da digamos soberania do
candidato e da coordenação da campanha fazer isto, já que não se tratava de uma
candidatura apenas do PT.
Mas aqui
trata-se de um programa do PT e não entendo com qual autoridade uma comissão
retira, do programa, algo que está numa resolução congressual do Partido.
O argumento
utilizado aqui pelo Penildo e pela Maria do Rosário, o da correlação de forças,
se for adotado nos deveria levar a abandonar quase todas as propostas feitas no
documento, inclusive o socialismo.
Por outro
lado, várias das propostas do documento exigem e supõem uma Constituinte. Militares,
judiciário, por exemplo.
Por fim,
vamos nos entender: resta muito pouco da Constituição de 1988, no que ela tinha
de bom; e, por outro lado, seguem lá, firmes e fortes, todos os elementos que
possibilitaram o golpe.
Portanto, defender
a necessidade de uma nova Assembleia Nacional Constituinte NÃO é contraditória
com defender o que há de positivo na Constituição.
Pelo contrário,
defender a necessidade de uma nova ANC é ser coerente com a defesa do que há de
positivo na Constituinte.
Mas o mais importante
que quero ressaltar é que Aloizio não citou outras questões que eu considero
essenciais: a estatização do setor financeiro e o enfrentamento da questão
militar.
A questão
militar inclui as Forças Armadas, a começar pelo artigo 142 da Constituição.
Sem Constituinte, isso não será adequadamente resolvido
A questão
militar inclui, também, o tema da desmilitarização das policias militares. O
texto fala em “REVISAR” o modelo militar de segurança pública.
Isso está
profundamente errado.
Não há como
REVISAR.
Em se
tratando de segurança pública, não há modelo militar aceitável.
O caso da desmilitarização
é o mesmo da Constituinte: o documento EXCLUI esta proposta e rejeita as
emendas, desconsiderando o que o partido já acumulou.
Diferente é
a questão do setor financeiro.
A proposta de
estatização do setor financeiro foi rejeitada pelo DN, na discussão do programa
que apresentamos na campanha de 2018.
Da minha
parte, não considero possível enfrentar a crise, recuperar o papel do Estado e
mudar o rumo da sociedade brasileira, sem acabar com oligopólio financeiro
privado.
Não se
trata, portanto, apenas de uma “reforma” do sistema bancário.
Se trata de
fazer uma revolução no setor financeiro.
Revolução no
sentido de colocar sob controle publico o que hoje é controle de uma minúscula
oligarquia, que usa de uma concessão pública (pois os bancos são uma concessão)
e da captura dos órgãos controladores (pois o BC e Copom são braços do setor
financeiro privado) para EXTORQUIR há décadas a população brasileira.
Também foi rejeitada
pela comissão uma proposta que fiz sobre como tratar o agronegócio, o extrativismo
e as transnacionais.
Mas eu
precisaria reler o texto inteiro, para poder fazer um comentário adequado a
respeito. Temo, entretanto, que estejamos nestes casos incorrendo no mesmo erro
já citado: o de não enfrentar adequadamente o problema da propriedade.
Este
problema não será solucionado no plano emergencial, nem no day after; mas é um
tema que PRECISA ser solucionado, no plano de médio prazo.
Sob pena de,
ao final, não termos transformação efetiva.
O que seria
um desperdício imenso, pois vivemos uma CRISE SISTEMICA PROFUNDA, no mundo e no
Brasil.
E se estamos
falando sério, se realmente acreditamos aquilo que o documento fala, que esta é
a maior crise desde 1929, então esta é a hora de apresentarmos uma alternativa sistêmica
para esta crise sistêmica.
Trata-se de
uma crise sistêmica do CAPITALISMO, não apenas do modelo neoliberal.
E portanto a
alternativa sistêmica a esta crise tem que ser SOCIALISTA.
O documento aceitou
uma emenda que eu fiz, emenda que dizia o seguinte: “Embora distinta, esta é uma
crise tão devastadora quanto aquela que assolou mundo após 1929. Se, naquela
época, o “dia seguinte” foi um mundo com mais BemEstar, com ampla
descolonização e relativa democratização, isso só ocorreu porque ao final de
muita luta prevaleceram os setores progressistas, socialistas e democráticos”.
Agora, se os
socialistas HOJE ficarem tímidos em defender sua visão socialista, o resultado será um dia seguinte à crise pior
do que antes.
Neste
sentido, seria bom que o documento incorporasse o ELAN, o espirito do discurso
feito por Lula no primeiro de maio,
falando explicitamente do capitalismo moribundo como um objetivo nosso e uma
alternativa pelo que lutamos, aqui e agora.
É isto.
Obrigado
pela atenção.
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