quinta-feira, 29 de fevereiro de 2024

Quem não quiser polarizar, prepare-se para anistiar

Recomenda-se a leitura do artigo “Os riscos do fosso entre a avenida e o palanque”.

O artigo é de Maria Cristina Fernandes.

Foi publicado no jornal Valor de ontem, 29 de fevereiro.

O artigo afirma ter existido um fosso entre o público e os oradores do ato da extrema-direita, realizado dia 25 de fevereiro.

No público do ato, 88% acreditariam que a eleição de 2022 foi fraudada.

Esta posição, segundo MCF, “não encontrou eco no palanque”.

É um jeito de interpretar as coisas, há outros, mas sigamos.

Outro dado que MCF informa é o de que apenas 11% da população consultada em todo o país acreditaria que a manifestação da extrema-direita “frearia as investigações em curso”.

88% e 11%.

A base radicalizada, mas sem maioria, vai se acomodar?

Segundo MCF, quem o fará será o "cerco do supremo aos militares".

Neste ambiente, uma manifestação de esquerda seria como “um fósforo num ambiente propício à combustão”.

Como já disse alguém, não vamos cair em provocação!

E deixemos o "dispositivo do Xandão" cuidar dos militares!

A esse respeito, ler aqui: Valter Pomar: "Não vamos cair em provocação!"

Existe outro jeito de ver as coisas.

O ato do dia 25/2 foi um movimento tático.

Um aspecto central deste movimento é lançar a palavra de ordem da anistia.

O sentido geral é propor um acordo para a direita gourmet: virar a página do golpe!

Se a extrema-direita colher uma vitória importante nas urnas de 2024, o day after será a pressão para permitir que Bolsonaro concorra nas presidenciais.

A disputa se dará, simultaneamente, nas instituições, nas urnas e nas ruas.

Inclusive por isso, mas não somente, é um erro depositar todas as fichas no “cerco do supremo aos militares”.  

Primeiro, porque o supremo já demonstrou ser suscetível à pressão das ruas. Especialmente de certas ruas.

Segundo, porque a decisão em última análise será do congresso.

Terceiro, porque povo na rua muda a chamada opinião pública.

Por tudo isso e algo mais, a crítica que MCF faz contra a manifestação convocada - para o dia 23 de março de 2024 - pela esquerda, na prática colabora para o sucesso do movimento pela anistia dos golpistas. 

Pois, se prevalecer a opinião de MCF, só a extrema-direita estará fazendo pressão nas ruas.

Para sustentar seu ponto de vista, MCF busca apoio em Lula. 

Lula falou sobre o ato do dia 23 de março? Não que eu saiba. 

Mas talvez algum palaciano tenha feito chegar, na MCF, alguma versão a respeito.

Seja como for, MCF interpreta que a opinião de Lula, sobre não “remoer”, seria um recado acerca dos “riscos que o cultivo desta efeméride em praça pública traz à conjuntura”.

Sobre remoer, ler aqui: Valter Pomar: Lula não quer “remoer”! Nem nós!!

É simplesmente chocante o raciocínio segundo o qual a extrema-direita golpista pode ir às ruas, mas a esquerda não deveria.

Mais chocante ainda é que certas pessoas não percebam ser este um dos motivos pelos quais a extrema-direita teria avançado tanto, nos últimos temos. 

Como lembrou um octogenário combatente, faltaria “vontade de ter coragem”.

Mas quais seriam, segundo MCF, os “riscos” de fazer uma manifestação de esquerda?

O primeiro seria o de colocar menos gente na rua. 

MCF afirma que uma pesquisa indicaria que a maior parte da população concorda com a posição de mérito da esquerda, acerca do cavernícola. Logo, o raciocínio parece ser o seguinte: somos a maioria, mas se colocarmos menos gente na rua estaremos nos apequenando. Não se considera a hipótese de que a passividade de um dos lados faça o outro avançar.

O segundo risco seria o de colocar uma polarização que “hoje não está presente”. 

O raciocínio aqui parece ser o seguinte: o que a direita faz não seria polarizar, seria só marcar posição e, ademais, na defensiva. A polarização só apareceria se a esquerda reagir. Tipo "quando um não quer, dois não brigam". Ou ainda: se não falarmos do monstro, o monstro some. Em termos militares é mais ou menos o seguinte: se o cara estiver fugindo, não vá atrás. E se ele voltar depois, reclame com a MCF.

O terceiro risco seria o da deturpação, nas redes sociais, dos propósitos da manifestação. O exemplo citado por MCF é o do “ele não”, realizado em 2018.

Sobre isto, dois comentários: 

a) a máquina de fake news da direita opera, faça chuva, faça sol, com manifestação ou sem manifestação. Se o medo do que eles vão dizer passará a ser a nossa régua, melhor mudarmos de país; 

b) a crença que foi o “ele não” que fez Bolsonaro passar à frente em 2018 tem a mesma consistência da crença que imputa ao desempenho de Lula, no último debate, a responsabilidade pela vitória de Collor em 1989.

Aliás, chega a ser divertido que alguém fale das “72 horas que mudaram a campanha” de 2018, como se a vitória do cavernícola tivesse dependido de um golpe de sorte, de um erro do adversário, como se não fosse resultado de um processo político e social com imensas raízes.

Este tipo de raciocínio tem a mesma lógica dos que acreditam que uma boa DR com Cunha teria evitado o golpe de 2016. 

Seja como for, MCF está muito preocupada com o papel da IA na campanha. Sobre isso, ela diz que o governo não pode “delegar este combate inteiramente ao judiciário” e, “menos ainda, incitar a polarização”. 

O que seria o governo “incitar a polarização”? 

A esse respeito, aos que gostam de usar a palavra de Lula como argumento, lembro que ele disse, na entrevista citada por MCF, que Tarcísio e outros tinham mesmo que comparecer na manifestação de 25/2, afinal devem sua eleição ao cavernícola.

Lula lembrou, ainda, que os governadores ajudaram na campanha das Diretas Já. 

Sendo assim, por qual motivo Lula não poderia estar numa manifestação em defesa da democracia??

MCF conclui seu artigo dizendo que “é bem verdade que o governo e o PT precisam de militância nas redes sociais, mas a polarização hoje desfavorece Lula. Não há alternativa senão a da conquista do centro e o desarme das trincheiras do bolsonarismo. E aponta medidas do governo que, no entender dela, seriam positivas porque constituiriam “a única saída para evitar a combustão”.

Embora tenha aparecido apenas no final e sem os devidos argumentos, esta é a ideia essencial de MCF: "a polarização hoje desfavorece Lula", tudo dependeria da "conquista do centro" e do "desarme das trincheiras do bolsonarismo". 

Aceito este argumento, tudo dependeria da fidelidade democrática do Congresso e do STF. 

Se estes faltarem, a conclusão lógica acabará sendo, mais cedo ou mais tarde, apoiar a anistia pretendida pelos moderados que falaram no palanque armado na Paulista. 





 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Lula não quer “remoer”! Nem nós!!

Lula deu uma longa entrevista para Kennedy Alencar.

A íntegra da entrevista está aqui: É Notícia: Entrevista com o presidente Lula (27/02/24) | Completo (youtube.com)

A entrevista de Lula gerou ampla repercussão.

Na direita, o que mais causou polêmica foi Lula reafirmar a condenação do genocídio que Israel está praticando na Palestina.

Mais detalhes, aqui: Valter Pomar: Sabino e a "comparação"

Na esquerda, o que parece ter causado mais polêmica foi uma declaração de Lula sobre os 60 anos do golpe militar de 1964.

A declaração em síntese-muito-sintética foi a seguinte: “o que eu não posso é não tocar a história pra frente, ficar remoendo sempre, remoendo sempre”.

Vamos combinar: ninguém gosta de ficar “remoendo sempre”.

Remoer & sempre é coisa de quem não tem alternativa melhor.

Não é o nosso caso, não é o caso de Lula.

Temos os meios, podemos e devemos fazer muita coisa acerca da chamada questão militar.

Por exemplo:

*demonstrando na prática que, através do mais amplo exercício das liberdades democráticas, o povo pode conquistar uma vida melhor.

Sobre isso, Lula fala na entrevista, concordemos ou não com as medidas citadas.

*combatendo os golpistas aqui e agora, por exemplo tirando eles dos postos de comando, submetendo a julgamento, condenando e prendendo.

Sobre isso, Lula também fala na entrevista, na linha de que em “nenhum momento da história desse país os militares foram punidos como estão sendo agora” e “todos que foram provados e todos que provarem que participaram serão julgados, serão punidos”.

*pondo as forças armadas no seu devido lugar, ou seja, a defesa da soberania nacional contra inimigos externos.

Sobre isso, Lula fala na entrevista, na linha de que “estamos tentando reconstruir a civilidade nas forças armadas” e de que “Múcio tem feito um trabalho, sabe… adequado”.

*desligando o programa de lavagem cerebral, instalado desde o golpe de1964 em todas as escolas de formação de oficiais. 

Sobre isso acima, Lula não fala absolutamente nada na entrevista. 

De pouco adianta não comemorar o primeiro de abril nas cerimônias, mas continuar ensinando aos soldados que o golpe e a ditadura teriam salvo o país do comunismo.

E o fato é que, nos quartéis, seguem ensinando antigas lições e formando legiões de futuros bolsonaros, helenos, pazzuelos, mourões, cids e bragas netos.

Daí ser me engana que eu não gosto dizer que “os generais que estão hoje no poder eram criança naquele tempo, (...) alguns acho que não tinham nem nascido ainda naquele tempo”.

O golpismo nas forças armadas não é individual, é institucionalizado. 

As forças armadas contribuíram decisivamente, ao longo de boa parte da nossa história, para bloquear processos que pudessem transformar o Brasil em benefício da grande maioria de nosso povo. 

Por isso existe um fio que liga 1945, 1954, 1964, 2016, 2018 e 2023.

Se queremos que esta história não se repita, não podemos mesmo ficar “remoendo” o assunto. Muito menos deixar que mister Múcio seja régua do que seria “adequado” no trato com as forças armadas.

Precisamos tomar mais e melhores medidas, desde alterações no artigo 142 até mudanças no currículo das escolas militares, passando por nomear um ministro da Defesa que não seja nem cúmplice dos golpistas, tampouco representante dos militares junto ao governo. Sem esquecer das indispensáveis medidas de memória, verdade e justiça!

Ou é isso, ou ali na frente vamos ver de novo as forças armadas agindo como braço forte e mão amiga dos que bloqueiam as mudanças estruturais indispensáveis para fazer do Brasil um país desenvolvido, com soberania, bem-estar e liberdades.

Por isso, nada de "remoer". Tem que agir. 

 

Abaixo a íntegra dos trechos da entrevista citada

Kennedy Alencar perguntou:

Presidente, eu quero falar de economia com o senhor, política industrial, as perspectivas por ano, mas nessa questão da democracia o senhor mesmo disse que o senhor é um filho da democracia. “A Hora da Verdade”, a operação da polícia federal, ela mostrou um envolvimento muito grande de militares na tentativa de golpe e a gente viu voltar a circular na praça a tese de que o golpe não aconteceu porque havia legalistas no alto comando. Esses legalistas no dia 30 de outubro de 2022 viram no resultado da eleição a vitória do senhor. Toleraram e protegeram o acampamento golpista até 8 de janeiro, estavam esperando o que, né? O Múcio, ministro da Defesa José Múcio, aplica uma estratégia de acomodação com os militares. Pergunto pro senhor: essa estratégia não tá errada? Esses militares não têm que ser punidos? Que legalistas são esses que toleravam o acampamento golpista até 8 de janeiro, presidente?

Lula respondeu:

Primeiro, vamos ser franco: nenhum momento da história desse país os militares foram punidos como estão sendo agora. Nenhum! Lembre algum momento em que general foi chamado pela polícia federal pra prestar depoimento? Coronel, todos que foram provados e todos que provarem que participaram serão julgados, serão punidos. Não fique preocupado com isso. O que você não pode é o seguinte: é que nós fomos procurar nas Forças Armadas as pessoas para exercer o comando, as pessoas que não estavam comprometido com isso, tá? Eu tinha assistido o discurso do general Tomás uns dias antes, que eu achei extraordinário o discurso dele sobre a questão da política, por isso que ele veio a assumir o comando do exército, sabe? E assim vale pro Múcio, assim vale pro Damasceno. São pessoas que não estavam envolvidas com o bolsonarismo, que estavam com independência, sabe? Subordinado aos comandantes da época. Todos foram afastados e nós agora estamos tentando reconstruir a civilidade nas forças armadas. Eu fico imaginando… Eu fiquei sabendo de uma notícia ontem que um cidadão coronel, que mora em Campinas num apartamento tinha uma quantidade de munição, uma quantidade de arma que explodiu dentro da casa dele, ou seja, colocando em risco o prédio todo. A minha pergunta é a seguinte: que grau de responsabilidade tem uma pessoa que tem a patente de coronel do exército brasileiro para colecionar a quantidade de arma dentro de casa. O que ele queria com armas e munição? A serviço de quem que ele tava? A quem que ele queria fazer bem? Não pode. Então, deixa eu lhe falar: eu estou convencido que nós estamos no caminho certo. Estou convencido que o Múcio tem feito um trabalho, sabe… Adequado. Ou seja, nós precisamos aproximar… A sociedade brasileira e as forças armadas não pode se tratar a vida inteira como se fossem inimigas. As forças armadas têm um papel, o papel deles é constitucional, eu valorizo isso quando eu fui presidente da outra vez e valorizo isso agora. Eles têm que cumprir a constituição deles, eles têm que garantir a soberania nacional, eles têm que garantir a soberania do espaço aéreo, a nossa soberania da nossa riqueza mineral, a soberania da nossa floresta, nosso rio e cuidar do nosso povo. É isso que é o papel das forças armadas e é isso que eles vão fazer, e é isso que o Zé Múcio está cuidando de fazer com que aconteça no Brasil.

Kennedy Alencar perguntou:

Quero uma palavra do senhor sobre os 60 anos do golpe de 64. O general Tomás Paiva falou para não ter celebração nos quartéis. Muita gente fala “que beleza, um avanço”. Ora, deveria haver um mea culpa, porque eles acabaram com a democracia durante 21 anos. Pergunto: o seu governo, o senhor fez um ato em 8 de janeiro de memória sobre o ato de 2023 para que nunca mais se repita. 60 anos de golpe militar, como que o senhor vai tratar essa questão?

Lula respondeu:

Eu sinceramente vou tratar da forma mais tranquila possível. Eu to mais preocupado com o golpe de janeiro de 2023 do que com 64. Eu tinha 17 anos de idade, tava dentro da metalúrgica Independência quando aconteceu o golpe de 64. Isso já faz parte da história, já causou sofrimento que causou, o povo já conquistou o direito de democratizar esse país, sabe? Os generais que estão hoje no poder eram criança naquele tempo, sabe? Alguns acho que não tinham nem nascido ainda naquele tempo. Então o que eu não posso é não tocar a história pra frente, ficar remoendo sempre, remoendo sempre. Ou seja, é uma parte da história do Brasil que a gente ainda não tem todas as informações porque tem gente desaparecida ainda, porque tem gente que isso pode se apurar, mas eu sinceramente eu não vou ficar me remoendo e eu vou tentar tocar esse país pra frente. Eu tenho um compromisso de voltar a fazer esse país crescer

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Sabino e a "comparação"

Por razões, digamos, "de ofício", acompanho algumas rádios, sites e jornalista de extrema-direita.

Pelo menos um deles trabalhou, noutra encarnação, na revista Teoria e Debate, editada pelo PT.

Hoje, escreve artigos meio hidrófobos contra o Partido e contra Lula.

Um dos mais recentes está aqui: https://www.metropoles.com/colunas/mario-sabino/agora-lula-diz-que-nao-disse-o-que-disse-sobre-israel-e-o-holocausto

O artigo chegaria a ser engraçado, se o tema não fosse trágico. 

Afinal, Sabino admite que Lula não usou a palavra “holocausto”. 

Inclusive, reproduz a fala de Lula a respeito: “Primeiro que não disse a palavra Holocausto. Holocausto foi interpretação do primeiro-ministro de Israel. Não foi minha. A segunda coisa é a seguinte, morte é morte.”

Mas, mesmo assim, Sabino insiste que “não ter dito a palavra não apaga a comparação”.

Ou seja: Lula não disse a palavra, logo não fez a comparação, mas ainda assim a comparação existiria, porque embora Lula não tenha dito a palavra, é como se o tivesse feito!

Não haveria problema nesta insistência, se Sabino admitisse estar fazendo uma interpretação. Mas, como já mostramos, Sabino imputa a Lula ter feito uma comparação.

Acontece que Lula foi bem didático.

Em Adis Abeba Lula afirmou: "O que está acontecendo na Faixa de Gaza, com o povo palestino, não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando o Hitler resolveu matar os judeus".

A comparação, portanto, é com Hitler “quando resolveu matar os judeus”, não com o Holocausto.

Sabino entende que “o nome que se dá ao assassinato de milhões de judeus por Hitler é Holocausto”. 

Acontece que quando Hitler “resolveu matar os judeus” ainda não havia acontecido o Holocausto. 

O holocausto é a resultante final do processo, o ponto de partida é a ideologia racista e o intervalo entre os dois pontos é uma escalada de violência.

Portanto, Lula está certo, histórica e politicamente, ao fazer a comparação com Hitler e ao não utilizar a palavra holocausto.

Evidente que uma coisa desembocou na outra.

Evidente, também, que se Israel prosseguir na matança, a mediação feita por Lula perderá sentido.

O incrível é que a insistência do sionismo, em “acusar” Lula de ter usado uma palavra que ele não usou, está produzindo o efeito contrário ao pretendido.

Cresce o número de pessoas que – críticos de Israel e contrários ao sionismo – acham que o que está em curso em Gaza é mesmo um “holocausto”.

E argumentam, ademais, que a palavra “holocausto” pode e deve ser aplicada a várias outras situações históricas.

Por razões históricas e políticas, por enquanto não considero adequado usar a palavra "holocausto" para denominar o que está em curso na Faixa de Gaza.

O que está em curso é um genocídio, um morticínio, uma limpeza étnica, um assassinato em massa, um crime contra a humanidade, um ato similar a muitos cometidos por Hitler e pelo nazismo.

De toda forma, ficam cada vez mais evidentes as afinidades entre sionismo e nazismo.

Vejamos, por exemplo, o texto do próprio Sabino. 

Ele diz que a “comparação” seria “inaceitável”, entre outros motivos porque seria “despida de sentido, visto que Israel não está praticando genocídio em Gaza”.

Como designar a ideologia de alguém como Sabino, que afirma que matar 30 mil pessoas, na sua esmagadora maioria crianças, mulheres e civis, não seria praticar genocídio?

Sabino afirma, ainda, que a tal comparação “é uma desonestidade antissemita que iguala as vítimas, os judeus, a seus carrascos, os nazistas”.

A frase acima é genial, porque revela a lógica mental de alguns defensores de Israel.

Eles sabem o que estão fazendo. Por isso alegam que Israel estaria exercendo o “direito de se defender”. 

Acontece que desde 1948 Israel ocupa território palestino e violenta os direitos da população palestina.

Logo, perante o direito internacional e o bom senso, o “direito de se defender” é antes de mais nada dos palestinos. 

Além disso, ao exercer seu suposto “direito”, Israel pratica sempre a mais absoluta desproporcionalidade, ou seja, mata sempre muito mais palestinos e muito mais civis. 

Feitas as contas, noves fora, só resta, para tentar justificar a violência desproporcional do ocupante sionista, afirmar que sua violência estaria sendo praticada pelas vítimas do Holocausto, contra seus carrascos nazistas.

Noutras palavras: o governo de Israel usa “o pior crime já cometido contra a humanidade” como pretexto para cometer novos crimes contra a humanidade.

Felizmente, muita gente - entre os quais muitos judeus e muitos cidadãos de Israel - vem desmascarando esta empulhação. 

Felizmente, também, mais cedo ou mais tarde a ocupação será derrotada, a Palestina será livre e os criminosos de guerra - inclusive colaboracionistas - serão julgados e condenados.  













O papel das ruas (e da personalidade) na política

Durante o carnaval de 2024, o grande fato político foi a operação policial e judicial contra a cúpula do golpe. Os golpistas reagiram e, no dia 25 de fevereiro de 2024, realizaram uma demonstração de força, voltada a pedir anistia.

A anistia favoreceria, antes de mais nada, o cavernícola e os fardados que estiveram no centro da operação golpista. Na prática, possibilitaria ao cavernícola disputar pessoalmente as eleições de 2026.

Importante dizer que, neste caso, seria uma anistia-sem-julgamento-nem-condenação-prévia. Ou seja: seria como na auto-anistia que os militares se concederam no final da (mais recente) ditadura, quando torturadores, assassinos e ocultadores de cadáveres, bem como seus mandantes, não foram julgados, não foram condenados, mas já foram anistiados preventivamente.

A anistia pode resultar de uma ação no Congresso, onde as forças de direita e extrema-direita têm maioria. Nesse sentido, trata-se de uma oferta de "pacificação", oferta dirigida pela extrema-direita em direção ao centrão e à direita gourmet.

É por isso, aliás, que o cavernícola, em seu discurso, insistiu em duas teses: a) golpe exigiria tropas na rua; b) golpe avalizado pelo parlamento, não seria golpe. Estas duas teses são, exatamente, as que a direita gourmet utiliza para argumentar que, em 2016, não teria havido golpe, apenas impeachment.

No fundo, o cavernícola está dizendo que seria prudente, para os que "viraram a página do golpe" de 2016 (impeachment) e de 2018 (prisão e interdição de Lula), também virar a página da intentona golpista de 2023.

Se depender da história deste país, a proposta de anistia tem tudo para ganhar adeptos na direita gourmet. Afinal, a história deste país é a história dos acordos pelo alto, do pacto das elites, da conciliação por cima.

Assim, se a esquerda quiser impedir que a extrema-direita “passe uma borracha” no passado (e, fazendo assim, poder continuar descendo a borracha no lombo do povo), é fundamental não depender das instituições. O STF e o Congresso já demonstram diversas vezes, inclusive nos últimos anos, seu compromisso com o “estado democrático de direita”.

Portanto, se a esquerda quiser impedir que a extrema-direita seja anistiada, que o cavernícola recupere a elegibilidade, é preciso contrabalançar a pressão golpista. E isso se faz de várias maneiras, mas principalmente ocupando as ruas e demonstrando que a extrema-direita não é a única capaz de mobilizar centenas de milhares de pessoas em defesa de suas teses.

Há quem considere mobilização algo desnecessário, pois o julgamento e condenação caberiam ao STF. Os que pensam assim, saibam que estão – pela inação – ajudando a extrema-direita a conquistar a anistia, seja via amolecimento do Supremo, seja via decisão do Congresso.

Há quem considere mobilização algo perigoso, entre outros motivos porque faz tempo que a esquerda não demonstra capacidade de encher as ruas; e um ato fraco seria pior do que ato nenhum. Os que pensam assim deveriam então admitir que estão aceitando, como uma fatalidade, que a extrema-direita chegou para ficar e voltará ao governo, em prazo mais ou menos curto de tempo. Ademais, deveriam lembrar que na comemoração da vitória de Lula, as ruas ficaram infinitamente mais cheias do que no dia 25 de fevereiro.

E aí chegamos no papel da personalidade na história. Lula, em 2022, construiu uma frente ampla com base no argumento de que é necessário defender a democracia. Em 2023, teve início um governo auto-denominado de “união e reconstrução”. Pois bem: não haverá democracia, não haverá união, não haverá reconstrução, ao menos com algum sentido popular, se a extrema-direita continuar colocando uma faca na garganta do país. E a manifestação do dia 25 de fevereiro de 2024 foi exatamente isso: uma faca na garganta.

Assim, para dar consequência à “defesa da democracia”, cabe a Lula apoiar, ajudar a convocar e estar presente no ato nacional que as frentes convocaram para o dia 23 de março de 2024. 

Isto basta? Não basta. É preciso, também, uma inflexão à esquerda na política do governo. Mas até para que isso seja possível, é preciso barrar a ofensiva da extrema-direita. Por isso, toda força para as mobilizações de março.


terça-feira, 27 de fevereiro de 2024

"Não vamos cair em provocação!"

Aviso aos leitores: o que segue é tudo ficção e qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

Direitas e extremas-direitas saem para as ruas em 2013. 

Quase ganham as eleições em 2014.

Tomam novamente as ruas em 2015 e 2016.

Promovem um golpe disfarçado de impeachment.

Fazem um governo de merda.

Condenam, prendem e interditam o líder das pesquisas.

Ganham deste jeito as eleições em 2018.

Again um governo de merda.

Contribuem na morte de mais de 600 mil pessoas.

Perdem por pouco as eleições em 2022.

Promovem uma intentona golpista em 2023.

Convocam uma manifestação para o domingo 25 de fevereiro de 2024.

Na véspera da citada manifestação, pessoas avaliam que a manifestação vai "flopar".

Circula uma análise de redes sociais estimando que haveria de 20 a 40 mil presentes.

Manifestação reúne mais de 180 mil pessoas.

Na manhã seguinte, hora do balanço.

Muita gente admitindo que subestimou o que aconteceria.

Pouca gente respondendo qual a explicação para esta subestimação continuada, que há mais de dez anos minimiza a força do lado de lá.

Por qual motivo há tanta resistência em reconhecer os tempos que vivemos, tal como eles são e não como gostaríamos que fossem? 

Resistência que aparece nas palavras de um jornalista famoso, acompanhado cotidianamente por muita gente de esquerda, que no dia 26 pela manhã afirmava que na manifestação havia "pouca gente", "muito gado", "mobilizado por fake news", "vindo para um culto", "trazido graças à grana dos organizadores". 

(Em seguida à lacração, veio a propaganda de um curso de "empreendedorismo".)

Há muitos motivos para tal mistura de cegueira e arrogância.

Um destes motivos é preguiça. Afinal, para enfrentar a realidade como ela é, será preciso sair da "zona de conforto".

Preguiça que apareceu, por exemplo, em algumas das falas feitas, na tarde do dia 26, num balanço informal da manifestação: frente a uma proposta de convocar massiva manifestação em defesa das liberdades democráticas, alguém disse discordar, pois não devemos ser "reativos". Até porque, completou, para quem está no governo, "não interessa nada que não seja governar". 

Junto veio a proposta de "deixar rolar" a proposta de anistia e, talvez, encaminhar para o Supremo Tribunal Militar o julgamento dos fardados golpistas.

Outro alguém disse que convocar uma manifestação pode "causar mais problemas", pois a "polifonia" típica da esquerda pode "criar constrangimentos para o presidente".

Um terceiro lembrou, certamente fazendo ironia, que a palavra de ordem de anistia "dialoga" bem com a proposta de "união e reconstrução".

Felizmente, como foi alertado no início, é tudo ficção, sonhos de uma noite mal dormida.

O que não é ficção é a história contada, na manhã de domingo 25 de fevereiro, por um gauche assumidamente octogenário, recordando que aos 20 anos morava numa casa do estudante, militava no partido do proletariado e buscava orientação sobre como enfrentar o golpe militar recém ocorrido. 

A resposta que recebeu da direção foi: "não vamos cair em provocação, em 1965 haverá eleição".


ps.se a esquerda deixar o tema da "anistia" na mão das instituições, são grandes as chances de mais um acordo por cima passar a borracha nos crimes da extrema-direita. Entre outras medidas é preciso, como foi indicado na reunião da executiva nacional do PT, fortalecer as manifestações previstas para o mês de março. É necessário, ademais, que o companheiro Lula esteja presente na principal destas manifestações. Do contrário, a "pressão das ruas" será monopólio cavernícola. 




  

domingo, 25 de fevereiro de 2024

SEM ANISTIA! NÃO ACEITAMOS “PASSAR BORRACHA” NOS CRIMES

A direção estadual da tendência petista Articulação de Esquerda, reunida no domingo 25 de fevereiro de 2024, fez uma análise preliminar das implicações políticas da manifestação realizada, no dia de hoje, pela extrema-direita, na Avenida Paulista, em São Paulo capital.

A manifestação foi convocada pelo cavernícola e contou com a presença de quatro governadores estaduais (Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, do Republicanos; Romeu Zema, governador de Minas Gerais, do Partido Novo; Ronaldo Caiado, governador de Goiás, do União Brasil; e Jorginho Mello, governador de Santa Catarina, do Partido Liberal). Também estiveram presentes diversos senadores, deputados federais, deputados estaduais e prefeitos de todo o Brasil, inclusive o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes. Os que estiveram presentes explicitam sua cumplicidade política com o golpismo.

Não existe uma estimativa precisa em relação ao número de pessoas que assistiram ao ato, em alguns casos vindas de caravanas de outras cidades e, inclusive, de outros estados. Mas não deve haver dúvida de que o número de pessoas foi muito significativo, demonstrando que a extrema-direita em geral e o cavernícola em particular mantém grande capacidade de mobilização. Qualquer subestimação deste fato constituiria um erro fatal.

É necessário analisar com toda a atenção o conjunto da manifestação e suas implicações políticas, tomando como ponto de partida os discursos ali proferidos. Dentre estes, destaca-se o do cavernícola. Numa fala que começou e terminou com referências religiosas, o cavernícola fez um retrospecto de sua trajetória pessoal e política; disse que as eleições de 2022 devem ser consideradas “uma página virada na nossa história”, ao mesmo tempo que reafirmou implicitamente sua crítica ao processo eleitoral; explicitou que o objetivo da manifestação de 25 de fevereiro era oferecer uma “fotografia para o mundo”, sugerindo que só ele teria o povo ao seu lado; apresentou seu credo ideológico (“não queremos o socialismo para o nosso Brasil”, “não podemos admitir o comunismo em nosso meio”, “não queremos ideologia de gênero para nossos filhos”, “respeito à propriedade privada”, “direito à defesa da própria vida”, “respeito à vida desde a sua concepção”, “não queremos a liberação das drogas em nosso país”); se afirmou alguém perseguido desde antes de 2018; tentou ridicularizar as denúncias que ele responde na justiça; formulou uma “narrativa” acerca do golpe; e defendeu uma anistia para os golpistas, incluindo aí o direito dele próprio disputar eleições.

Acerca do golpe, o cavernícola disse que “golpe é tanque na rua, é arma, é conspiração”. E, acerca da minuta golpista, agregou a seguinte “explicação”: segundo ele, o estado de sítio e o estado de defesa exigiriam a convocação de conselhos, que não foram convocados; e exigiriam, também, que o parlamento tomasse a decisão final. Portanto, nas palavras do cavernícola, não faria sentido falar que estaria em gestação um “golpe usando dispositivo da constituição, cuja palavra final quem dá é o parlamento”.

Acerca da anistia, o cavernícola deixou uma ameaça implícita (“tem gente que sabe o que eu falaria”), mas enfatizou que busca “a pacificação, é passar uma borracha no passado, é buscar maneira de nós vivermos em paz, é não continuarmos sobressaltados, é uma anistia para aqueles pobres coitados que estão presos em Brasília”.

Em defesa do que ele denomina “conciliação”, disse que “nós já anistiamos no passado quem fez barbaridade no Brasil”, afirmação que aliás é verdadeira, uma vez que a anistia decretada pela ditadura militar realmente beneficiou torturadores, assassinos, estupradores e ocultadores de cadáveres, sem que nenhum desses criminosos tivesse sido previamente julgado ou condenado.

O pedido de um “projeto de anistia” foi direcionado, pelo cavernícola, aos 513 deputados e aos 81 senadores. Ressalvando que, “quem porventura depredou o patrimônio, que pague”.

O discurso do cavernícola incluiu um pedido para “caprichar no voto” nas eleições municipais, “em especial para vereadores”. Fazendo várias referências ao governador Tarcísio, à Polícia Militar, Civil e à “guarda metropolitana do Ricardo Nunes”, o cavernícola disse que “não podemos ganhar eleições afastando os opositores do cenário político”, omitindo que foi exatamente isto que fizeram, em 2018, em benefício da extrema-direita e dele próprio.

O discurso do cavernícola terminou com referências à importância de uma “família estruturada” e à boa lembrança que ele tem do seu próprio pai, apesar de “toda a sua truculência”. Tirante estas e outras passagens, que revelam as taras e a dissonância cognitiva típicas da extrema-direita, bem como o lugar central que a luta ideológica tem para a direita - e que também deveria ter, para a esquerda - o politicamente relevante é que o cavernícola está propondo um acordo.

É fundamental que todos os que defendem a democracia, a começar pela esquerda, respondam imediatamente. E a resposta deve ser: não! Nem borracha no passado, nem anistia, nem elegibilidade!

Os fatos são: o ex-presidente da República articulou diretamente um conjunto de iniciativas que pretendiam fraudar o resultado das eleições 2022. Estas iniciativas, desde as ocorridas antes da eleição, até a intentona golpista de 8 de janeiro, não tiveram êxito. Mas, mesmo frustradas, o conjunto destas iniciativas constitui, em si mesmo, um crime.  E os criminosos, desde os participantes diretos de 8 de janeiro, os financiadores, os que acobertaram, os que instigaram, os que planejaram e os que seriam beneficiários da intentona golpista, a começar pelo cavernícola, devem ser julgados, condenados e presos. Sem borracha no passado: não há justiça, sem memória! Sem anistia! Bolsonaro deve ser julgado, condenado, preso e seguir inelegível!

É fundamental que o presidente Lula, associado ao conjunto das forças políticas democráticas e de esquerda, convoquem um ato público em defesa do povo e da democracia. As liberdades democráticas correm risco, quando é a direita quem ocupa as ruas! Ao lado de manifestações populares, precisamos dar cada vez mais conteúdo popular ao governo, pois uma das maneiras mais consistentes de enfrentar a extrema direita é melhorando substancialmente a vida do povo.

Se não houver pressão popular de esquerda, cresce a possibilidade de um “acordo pelo alto” entre a extrema-direita e os representantes da direita tradicional, que leve o judiciário a recuar. O acordo entre a extrema-direita e setores da direita já existe em vários terrenos, por exemplo na defesa do neoliberalismo e, também, na defesa de Israel.

Embora não tenha comparecido no discurso do cavernícola, a defesa do estado genocida de Israel foi um traço marcante da manifestação da extrema-direita. Isto é revelador do verdadeiro estado de ânimo da extrema-direita, em particular das afinidades entre nazismo e sionismo, apontadas na entrevista dada por Lula em Adis Abeba. Reafirmamos nossa defesa do povo palestino: o genocídio precisa parar, a ocupação deve terminar, a Palestina deve ser livre, os criminosos de guerra precisam ser punidos.

A manifestação da extrema-direita tem, também, implicações diretamente eleitorais. Por exemplo, a presença de Ricardo Nunes na manifestação confirma que as eleições na capital paulistana – como nas demais cidades do estado e do país – será nacionalizada pela extrema-direita. A esquerda não deve temer esta nacionalização, pelo contrário. Cabe defender o governo Lula, inclusive defender a posição do presidente sobre a Palestina.

A presença de Tarcísio de Freitas na manifestação, por sua vez, confirma o lugar central que este governador tem no esquema político da extrema-direita. O PT precisa ampliar a oposição aos projetos privatizantes, ao projeto de educação e à política de (in)segurança pública deste governador. A recente mudança no comando da PM mostra a importância que o controle desta corporação tem no projeto da extrema direita paulista e nacional. E serve como alerta sobre o tipo de “pacificação” que a extrema-direita defende, no Brasil e no mundo.

Por todos estes motivos, levando em consideração também o cenário de recrudescimento da crise internacional, a começar pela vizinha Argentina, é preciso reafirmar: a extrema-direita só será derrotada se houver polarização, radicalização programática e mobilização popular.

Sem anistia!!!

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2024

A polêmica sobre Gaza, em 2009

Em janeiro de 2009 Israel atacou Gaza. 

O PT divulgou a seguinte nota, no dia 5 de janeiro de 2009:


PT condena ataques criminosos


Os ataques do exército de Israel contra o território palestino, que já causaram milhares de vítimas e centenas de mortes, além de danos materiais, só podem ser caracterizados como terrorismo de Estado.

Não aceitamos a "justificativa" apresentada pelo governo israelense, de que estaria agindo em defesa própria e reagindo a ataques.

Atentados não podem ser respondidos através de ações contra civis. A retaliação contra civis é uma prática típica do exército nazista: Lídice e Guernica são dois exemplos disso.

O governo de Israel ocupa territórios palestinos, ao arrepio de seguidas resoluções da ONU. Até agora, conta com apoio do governo dos Estados Unidos, que se realmente quiser tem os meios para deter os ataques.

Feitos sob pretexto de "combater o terrorismo", os ataques de Israel terão como resultado alimentar o ódio popular e as fileiras de todas as organizações que lutam contra os EUA e seus aliados no Oriente Médio, aumentando a tensão mundial.

O Partido dos Trabalhadores soma sua voz à condenação dos ataques que estão sendo perpetrados pelas forças armadas de Israel contra o território palestino e convoca seus militantes a engrossarem as manifestações contra a guerra e pela paz que estão sendo organizadas em todo o Brasil e no mundo.

O PT reafirma, finalmente, seu integral apoio à causa palestina.

Ricardo Berzoini
Presidente nacional do PT
Valter Pomar
Secretário de Relações Internacionais do Partido dos Trabalhadores


Um grupo de 36 militantes petistas divulgou uma carta manifestando seu desacordo com a nota do PT. 

A carta dos 36 repercutiu fortemente na imprensa, como se pode ver abaixo.


Petistas rebatem nota de Berzoini sobre Gaza e o acusam de ''distorcer'' nazismo - Estadão (estadao.com.br)

Petistas acusam Berzoini de "distorcer" nazismo (gazetadopovo.com.br)

Líderes criticam nota petista sobre ataques à Faixa de Gaza - 20/01/2009 | Diário do Grande ABC (dgabc.com.br)

Petistas criticam posição do partido sobre conflitos na faixa de Gaza | VEJA (abril.com.br)

Petistas criticam texto do PT sobre conflitos em Gaza (jb.com.br)


Além da carta dos petistas, o Centro Wiesenthal também protestou, como se pode ler a seguir:


G1 > Mundo - NOTÍCIAS - ONG judaica diz que PT é solidário ao antissemitismo e ao terrorismo (globo.com)


Infelizmente não localizei a versão integral da carta acima citada.

Agradeço a quem puder me enviar.


Em resposta à carta dos 36, divulguei o seguinte texto:

Opera Mundi: Direção do PT reafirma denúncia contra Israel e rechaça carta de dissidentes (uol.com.br)

Valter Pomar: A nota certa - Vermelho


A nota certa

Um grupo de 36 militantes petistas divulgou, no dia 16 de janeiro, uma carta manifestando seu “desacordo” com a nota divulgada no dia 4 de janeiro, intitulada “PT condena ataques criminosos”. Os signatários declaram-se “profundamente consternados com “

Acusando a nota de posicionar “equivocadamente o PT em relação a um conflito de notável complexidade”, os 36 militantes sintetizam sua opinião nos seguintes pontos:

a) a nota do PT “ignora a posição histórica do Partido, que sempre se pautou pela defesa da coexistência pacífica dos povos”;

b) a nota do PT “banaliza e distorce o fenômeno histórico do nazismo”;

c) a nota do PT “não registra a necessária condenação ao terrorismo”;

d) a nota do PT “não afirma o reconhecimento do direito de existência de Israel negado pelo Hamas”;

e) a nota do PT “não se coaduna com a posição equilibrada assumida pelo governo brasileiro sobre a questão”;

f) a nota do PT “queima, ao invés de construir, pontes para o entendimento”.

Pode-se concluir, portanto, que a carta dos 36 acusa a nota do PT de desequilíbrio pró-palestinos.

Considerando as circunstâncias, isto deve ser tomado como um elogio, não como uma crítica. Afinal, frente ao massacre perpetrado em Gaza, em aberta violação do direito internacional, é imperativo que um Partido como o nosso tome posição aberta e clara, sem subterfúgios nem meias-palavras, em favor dos mais fracos: o povo palestino. 

A primeira crítica dos 36 acusa a nota do PT de ignorar “a posição histórica do Partido, que sempre se pautou pela defesa da coexistência pacífica dos povos”.

Li e reli a nota divulgada pelo Partido e não consegui entender em que parágrafo, em que frase, em que vírgula nós ameaçamos a “coexistência pacífica”.

A única interpretação que me ocorre está contida em cartas que recebemos de sionistas: ao convocar a militância para uma mobilização contra a guerra e pela paz, o PT estaria supostamente ameaçando a coexistência pacífica entre “palestinos e judeus” aqui no Brasil, importando um conflito que “não é nosso”. Mas não consigo crer que os signatários da carta pensem isto.

A segunda crítica dos 36 diz que a nota do PT “banaliza e distorce o fenômeno histórico do nazismo”.

O que diz a nota do PT: “atentados não podem ser respondidos através de ações contra civis. A retaliação contra civis é uma prática típica do exército nazista: Lídice e Guernica são dois exemplos disso”.

Ou seja: a nota do PT não afirma uma tese sobre o “fenômeno histórico do nazismo”, nem comete nenhum anacronismo ou simplificação histórica. Logo, não podemos ser acusados de “distorcer” algo sobre o qual não pontificamos. A nota do PT limita-se a apontar um fato: o exército nazista ficou conhecido por retaliar civis. E matar civis, mesmo numa guerra, não pode ser considerado algo “banal”. Quem “banaliza” a violência é quem aprova, silencia, ou tergiversa sobre o que se passa em Gaza.

O governo de Israel considerou inaceitável a comparação feita pela nota do PT, mas não considera inaceitável matar e ferir milhares de civis. Infelizmente, os 36 não denunciam nem criticam explicitamente o terrorismo de Estado praticado pelo governo de Israel contra os palestinos, preferindo criticar a nota do PT.

Vale dizer que há muitos textos e manifestos, inclusive patrocinados por militantes judeus, que fazem analogia direta entre o Gueto de Varsóvia e a Faixa de Gaza.

A terceira e a quarta crítica dos 36 reclamam que a nota do PT “não registra a necessária condenação ao terrorismo” e “não afirma o reconhecimento do direito de existência de Israel negado pelo Hamas”.

Estas duas críticas partem de um pressuposto equivocado. Uma nota sobre um caso concreto não precisa, obrigatoriamente, fazer um inventário das posições históricas do PT. E a eventual ausência desta ou daquela posição, não significa que o Partido tenha alterado seu ponto de vista. Aliás, a nota do PT também não cita nossa posição sobre o Estado Palestino.

O fato concreto que provocou a nota foi a agressão do governo de Israel contra o povo palestino, e não uma inexistente ameaça ao direito dos israelenses em ter seu próprio Estado. Sugerir que o Partido desconhece esse direito, por não reafirmá-lo na nota citada, não passa de sofisma.

Ocorre que a carta dos 36 parece aceitar que o ataque contra a Faixa de Gaza é um ato de “legítima defesa” por parte do governo de Israel. A nota do PT rechaça explicitamente esta alegação. Aliás, o cronograma do ataque contra Gaza está diretamente vinculado à transição nos EUA e às eleições israelenses.

A carta dos 36 assume, mesmo que parcial e implicitamente, alguma das premissas e justificativas adotadas pelo governo de Israel para seu ataque contra Gaza. Só isto tornaria imprescindível incluir na nota do PT o “reconhecimento do direito de existência de Israel negado pelo Hamas”, quando o que está realmente em jogo é o direito à sobrevivência do povo palestino, bem como as resoluções internacionais violadas pelo Estado de Israel.

Evidentemente, o PT não defende o Hamas, defende o povo palestino. Também é sabido que condenamos o terrorismo, em todas as suas formas. Mas estamos convencidos de que as posições do Hamas e seus foguetes foram utilizados, pelo governo de Israel, como um pretexto para a barbárie perpetrada em Gaza.

A quinta crítica feita pelos 36 diz que a nota do PT “não se coaduna com a posição equilibrada assumida pelo governo brasileiro sobre a questão”.

Ao dizer que a posição do governo é “equilibrada”, os 36 sugerem ser desequilibrada a posição do PT.

O PT concorda com a posição do governo brasileiro. Achamos que ela se coaduna (ou seja, se combina, sem que sejam posições iguais) com a posição expressa pelo PT, na nota de 4 de janeiro.

Vale lembrar que declarações do presidente, do ministro das relações exteriores e do assessor especial utilizaram termos como carnificina, chacina, agressão injustificável e terrorismo de Estado.

Seja como for, o PT não precisa copiar a posição do governo. Partido é partido, governo é governo. O que um pode dizer e fazer, o outro nem sempre pode ou deve. E vice-versa.

A última crítica feita pelos 36 beira o grotesco: acusam a nota do PT de queimar, “ao invés de construir, pontes para o entendimento”.

O PT é a favor da paz. E paz implica dialogar, inclusive com inimigos. Paz não é esquecimento. Nem se constrói sobre mentiras, meias palavras, mal-entendidos. Nem tampouco se faz omitindo a história.

O governo de Israel atacou a Faixa de Gaza. Morreram mais de 1.200 palestinos. Milhares foram feridos. A infra-estrutura na região foi ainda mais destruída. São ações deste tipo que queimam pontes para o entendimento, ameaçam a coexistência pacífica entre os povos, impedem uma paz duradoura, baseada na coexistência pacífica de um Estado Palestino “viável e próspero” e de um Estado de Israel “definitivamente seguro”.

Não haverá segurança nem paz, enquanto houver ocupação, desrespeito às resoluções da ONU e enquanto os palestinos foram tratados, pelo governo de Israel, como uma sub-raça submetida ao terrorismo de Estado.

A nota do PT tem o mérito de dizer as coisas com simplicidade e clareza, inclusive sobre o papel jogado pelos Estados Unidos e sobre o agravamento da tensão mundial. Vale dizer que sem uma forte pressão internacional, o governo de Israel não mudará de atitude e não negociará. Neste sentido, a nota do PT ajuda mais na luta pela paz, do que as posições no mínimo tíbias adotadas pela carta dos 36, divulgada quase duas semanas depois da nota do Partido e na véspera do encerramento da ofensiva de Israel.

Haveria mais o que dizer, especialmente sobre os antecedentes históricos do conflito e sobre o direito de um povo resistir à ocupação estrangeira. Mas, tendo em vista o que está em jogo, é preferível que nos limitemos a defender os termos adotados pela nota do PT.


Como se pode ver e ler, certas polêmicas não são novas.



terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

Jaques Wagner "passou do ponto"

Jaques Wagner considera que Lula "vamos dizer, passou do ponto".

Onde?


Palavras de Wagner, segundo a fonte acima: "Para mim, a única coisa que, vamos dizer, passou do ponto foi a comparação. Porque eu acho que aquele episódio [Holocausto], que foi a maior barbárie do século 20, é um episódio único. Agora, a indignação do presidente, se eu puder apostar, é a indignação da ampla maioria dos seres humanos no mundo”.

De fato, o século 20 foi cheio de barbáries.

E o holocausto foi especialmente terrível.

Vale lembrar que o holocausto foi resultado final de uma decisão política: a de realizar uma "limpeza étnica".

Por isso, quem realmente se indigna com o holocausto, odeia quem defende e quem pratica "limpeza étnica".

E, também, despreza quem acoberta, passa o pano, olha para o outro lado, justifica, minimiza ou muda de assunto.

Tudo isto ajuda a explicar a indignação da "ampla maioria dos seres humanos no mundo", contra a "limpeza étnica" praticada por Israel, tendo como vítima o povo palestino.

Hitler operou uma "limpeza étnica", o governo de Israel quer fazer uma "limpeza étnica".

Israel está, neste momento, oferecendo duas opções ao povo palestino em Gaza: morrer ou desaparecer.

Tudo isso apoiado numa operação ideológica que visa desumanizar os palestinos.

Nisto reside, entre outras coisas, a "comparação" entre o que Israel está fazendo hoje e aquilo que os nazistas fizeram anteontem.

Isto posto, sugiro a Jaques Wagner que releia as frases agora célebres, onde Lula disse o seguinte: "O que está acontecendo na Faixa de Gaza, com o povo palestino, não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando o Hitler resolveu matar os judeus".

Como se pode ver, Lula não falou a palavra holocausto.

Sendo assim, por qual motivo Jaques Wagner fala que Lula "passou do ponto" ao fazer a "comparação"?

Na minha opinião, porque assim manda o "manual": se criticam Israel, fale do holocausto.

E aí a discussão passa a ser sobre o holocausto, "a maior barbárie do século 20", ao mesmo tempo que Israel está praticando aquela que já é uma das maiores barbáries do século 21.

O nome técnico disso é diversionismo


Felizmente, são muitas as vítimas do holocausto que estão do lado certo da história e não aceitam que se use o holocausto como "justificativa" para o genocídio contra o povo palestino.

Por isso, acho que Wagner, vamos dizer assim, "passou do ponto". 

Afinal, o diversionismo - mesmo quando vem fantasiado com palavras gentis e sorriso largo - não consegue ocultar a realidade.

E a realidade é que o genocídio precisa parar, a ocupação deve terminar, a Palestina deve ser livre, os criminosos de guerra precisa ser punidos.


























O governo de Israel deveria "aprender História e pedir desculpas"

"Uma mentira dita mil vezes torna-se verdade".

Dizem que a frase é de Joseph Goebbels.

Se não é, poderia ser.

A frase é apropriada para qualificar a postura de governantes de Israel, que atacam a declaração de Lula, feita em Adis Abeba.

A declaração foi a seguinte: "O que está acontecendo na Faixa de Gaza, com o povo palestino, não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando o Hitler resolveu matar os judeus".

A resposta do Benjamin Netanyahou foi, em resumo: “As palavras do presidente do Brasil são vergonhosas e graves. Trata-se de banalizar o Holocausto e de tentar prejudicar o povo judeu e o direito de Israel se defender. Comparar Israel ao Holocausto nazista e a Hitler é cruzar uma linha vermelha. Israel luta pela sua defesa e pela garantia do seu futuro até à vitória completa e faz isso ao mesmo tempo que defende o direito internacional”.

Em resumo: "holocausto".

A frase de Lula cita o holocausto? Não. 

Repitamos o que Lula falou: "quando o Hitler resolveu matar os judeus".

Falou do ponto de partida, não do ponto de chegada.

E, também por isso, a comparação está correta, politica e historicamente.

Aliás, os pontos de contato entre o nazismo e o sionismo vem sendo apontados, há tempos, por celebridades como Einstein e Hanna Arendt, por judeus que estiveram presos nos campos de concentração, por intelectuais mundo afora, ontem e hoje.

Por exemplo, ver aqui o que disse Masha Gessen:

https://www.youtube.com/watch?v=0ZupWRLF5rI

Mesmo assim, alguns isentões sinceros e vários espertalhões laureados seguem repetindo que teria havido "imprecisão histórica" na crítica de Lula.

Alguns chegam a falar em "revisionismo".

Houve não.

Primeiro, porque nazismo e sionismo são variantes do racismo. E, na base do racismo, do sionismo e do nazismo está a desumanização do oponente. 

Para o sionismo raiz, os palestinos não seriam seres humanos. 

Para os nazistas, homossexuais, ciganos, judeus, comunistas e outros "indesejados" não seriam seres humanos. 

Disseminar esta "compreensão" desumanizada, como é óbvio, contribui para o extermínio. 

Portanto, está certo Lula ao identificar a afinidade de base entre o que os nazistas pensavam "quando o Hitler resolveu matar os judeus" e o que Israel faz contra os palestinos hoje.

Não são seres humanos, então poderiam - na opinião de nazistas e de sionistas - ser maltratados, espezinhados e mortos. 

De outubro para cá foram assassinados, na Faixa de Gaza, cerca de 30 mil pessoas, na sua maioria crianças, mulheres, civis.

Aliás, se algo poderia ser acrescentado ao que Lula disse, é que esta atitude de Israel e do sionismo não começou agora. 

A frase de Lula também está certa, entre outros, por um segundo motivo.

A saber: o extermínio do nazismo contra os judeus não começou nos campos de concentração. 

Os campos de concentração, aquilo que os nazistas chamaram de "solução final" veio, como o próprio nome diz, ao final.

Entre o ponto de partida e o ponto de chegada, houve uma escalada. 

Durante esta escalada, muita "gente de bem" olhou para o lado e não condenou o nazismo.

“Quando o Hitler resolveu matar os judeus", ainda não havia ainda campos de concentração, mas já havia a política de desumanização e violência crescente. 

Passar o pano, deu no que deu.

Quem "passava o pano" nos anos 1920 e 1930 podia alegar, mesmo que hipocritamente, ignorância; quem passa o pano hoje não tem nenhuma desculpa, inclusive porque o genocídio contra os palestinos está sendo feito ao vivo e já sabemos como esta história termina, se não for interrompida.

Tem 2 milhões de pessoas em Rafah.

Milhões foram afetados, desde a Nakba, em 1948.

E o governo de Israel sabe muito bem o que fez e o que segue fazendo.

Apesar disso tudo, parte da imprensa brasileira segue trombeteando as reclamações do governo de Israel.

A mais recente veio do ministro de relações exteriores de Israel, que disse o seguinte no X: 

"Presidente do Brasil @LulaOficialMilhões de judeus em todo o mundo estão à espera do seu pedido de desculpas. Como ousa comparar Israel a Hitler?

É necessário lembrar ao senhor o que Hitler fez? Levou milhões de pessoas para guetos, roubou suas propriedades, as usou como trabalhadores forçados e depois, com brutalidade sem fim, começou a assassiná-las sistematicamente. Primeiro com tiros, depois com gás. Uma indústria de extermínio de judeus, de forma ordeira e cruel.

Israel embarcou numa guerra defensiva contra os novos nazistas que assassinaram qualquer judeu que viam pela frente. Não importava para eles se eram idosos, bebês, deficientes. Eles assassinaram uma garota em uma cadeira de rodas. Eles sequestraram bebês. Se não tivéssemos um exército, eles teriam assassinado mais dezenas de milhares.

Que vergonha. Sua comparação é promíscua, delirante. Vergonha para o Brasil e um cuspe no rosto dos judeus brasileiros.

Ainda não é tarde para aprender História e pedir desculpas. Até então - continuará sendo persona non grata em Israel!"

Como se vê, a técnica é a mesma: frente a uma crítica, dizem "holocausto" e acusam os críticos de antisemitismo.

Há quem diga que não se deve usar a palavra de Deus em vão. E, com certeza, não se deveria usar a palavra holocausto para tentar justificar um genocídio.

Seja como for, uma mentira dita mil vezes não vira verdade.

O nazismo foi derrotado. E Goebbels, sucessor de Hitler, fez como o antecessor e se suicidou.

A Palestina será livre, os sionistas serão derrotados. E, usando parte das palavras do post acima reproduzido, ainda não é tarde para parar a guerra, por fim na ocupação, aprender História e pedir desculpas. Pedir desculpas à humanidade, com bem disse Celso Amorim.