sexta-feira, 30 de maio de 2014

Palestra sobre conjuntura para direção nacional do MST

28 de maio de 2014

1.Centro da tática: eleição presidencial

2.Desde 1989, eleição presidencial cristaliza o estado da arte da luta de classes no Brasil

3.Três candidaturas principais na disputa

4.Não é a primeira vez que três candidaturas disputam

5.Foto de ontem ainda é vitória no primeiro turno; mas o filme de amanhã é disputa acirradíssima no segundo turno

6.Não é o mais provável, mas sempre devemos levar em conta a possibilidade de uma vitória da oposição de direita, com qualquer de suas candidaturas

7.Sem reforma política, não deve haver alteração qualitativa na composição do congresso nacional

8.Esquerda pode conquistar governos estaduais importantes, como MG, RJ e SP. Mas isto ainda está longe de ser a tendência principal. Em SP, por exemplo, PSDB pode perder e esquerda não levar.

9.Quais as três "novidades" desta eleição?

10.Mudou a atitude do grande capital
(greve de investimentos, atitude nas campanhas eleitorais, deixa crescer o mal humor da "classe média tradicional")
(razões do mal humor: perda de status, elevação de custos, redução da desigualdade dentro da CT, comportamento do oligopólio da mídia -sendo que isto é causa e efeita ao mesmo tempo)

11.Cresceu o setor não petista e não lulista da classe trabalhadora
(mudanças geracionais e de gênero, contradição sociológica entre ascensão pelo consumo e comportamento político, acúmulo de despolitização --via oligopólo, igrejas, educação, cultura, consumo, atitude sindicalismo e atitude partidos de esquerda)

12.Chegamos numa situação limite, do ponto de vista programático/estratégico: :não dá para continuar mudando sem impor perdas ao grande capital

13.PSDB quer mudanças com perdas para os trabalhadores, mas evidentemente não pode falar isto claro. Logo, acentua a crítica a "tudo isto que está aí". Esta crítica reforça o sentimento por mudanças na massa e pode empurrar um setor para votar na candidatura do PSB -que é expressão de um setor da burguesia e setor médio que rompeu pela direita com o PT. Isso os empurra, contraditoriamente, para choques eleitorais entre eles agora, embora precisem um do outro num segundo turno.

14.Massa do povo quer mudanças sem perdas. Precisa ser convencida de que é preciso impor perdas ao grande capital. Mas para isto PT tem que se convencer. Setores do PT não querem impor perdas, outros não percebem a necessidade e outros ainda setores temem as dificuldades para falar disto numa campanha eleitoral. Solução: tendem a acentuar as perdas do passado (causadas pelo PSDB), falando menos das mudanças no futuro. Risco: também empurrar um setor para votar na candidatura supostamente terceira via (nem as perdas do passado, nem tudo que está aí).

15.Existe uma dificuldade em falar, nas eleições, da necessidade de reformas estruturais? O debate sobre a reforma política como linha de menor resistência.

16.A importância de acoplar o debate sobre a democratização da comunicação.

17.Planos da oposição
-PSDB: casa das garças hard, acompanhado de oposição forte e por isto tendência à atitude repressiva dura
-PSB: casa das garças também, mas acompanhado de tentativa de cooptação setores do PT

18.Nosso desafio: segundo mandato superior ao atual
-polarização programática
-criar condições institucionais (congresso e governos)
-pressão social

19.Dois temas imediatos
-Copa: direita torce pela derrota
-Plebiscito popular: devemos apoiar fortemente


Palestra sobre reforma política em Mossoró

1 de maio de 2014

1.Vivemos momentos de mudança (crise, EUA, deslocamento geopolítico)

2.Mudanças lá fora, janela para mudanças aqui (1814, 1930, 1970)

3.Intensifica-se o conflito entre as duas vias de desenvolvimento (conservadora e democrática)

4.Semelhança entre situações: segundo governo Vargas, governo João Goulart, momento atual

5.Ambiente de tensão explica reações dos setores conservadores (no judiciário, no parlamento, nas forças armadas, nos meios de comunicação, nas igrejas)

6.Qual o impasse?

-país precisa de reformas, Executivo não consegue fazer e Congresso não quer fazer e Judiciário não deixa fazer
-o crescente impasse institucional mais a corrupção (seja a real, seja aquela que a mídia divulga existir) amplia a perda de legitimidade
-do jeito que está, não fica por muito tempo mais, pois sem solução institucional conflito vai se aprofundar

7.Qual a "solução democrática" para este conflito?

-ou bem a oposição conservadora vence no voto e tenta fazer o país voltar ao "normal" (o que vai aprofundar um determinado tipo de conflito)
-ou bem se realiza um reforma política e assim criamos as condições para aprofundar mudanças (o que vai aprofundar outro tipo de conflito, pois derrotada nas urnas e diante de uma Constituinte, uma parte da direita vai apostar numa solução não democrática)

9.Reforma política, para quê?
-para ampliar a participação
-para ampliar o controle social
-para ampliar a representação
-para eliminar a fonte da corrupção institucionalizada
-para estimular o voto programático

10.Como fazer a reforma?
-ou via emenda constitucional (mas não há maioria qualificada para aprovar reformas. Ou, se vier, será um retrocesso, vide PEC 352/2013)
-ou via constituinte exclusiva (que precisa de emenda constitucional para convocar, mas apenas maioria simples para reformar. O argumento de que constituinte seria inconstitucional converte a clausula 60 em pétrea. Politicamente, é o congelamento.
-ou via judicialização (que é um desastre sob qualquer aspecto)

11.É preciso construir uma maioria popular a favor da reforma via Constituinte. Por isto o Plebiscito Popular.


Aécio e Eduardo

Na minha opinião, o companheiro João Pedro Stédile comete um grave erro quando afirma que Dilma e Eduardo/Marina são "candidaturas alternativas de um mesmo projeto". 

Eduardo/Marina representam exatamente a posição de setores da burguesia e de setores médios que romperam com o PT, porque desejam reduzir as políticas que beneficiam a classe trabalhadora, além de desejar alterações no campo das liberdades democráticas e das relações internacionais.

A afirmação correta: Aécio Neves e Eduardo/Marina é que são candidaturas alternativas de um mesmo projeto. Com qualquer deles vitorioso, o projeto neoconservador do grande capital vai voltar com tudo.

Por fim: esta impressão equivocada acerca do real caráter da candidatura Eduardo Campos é um dos motivos pelos quais sua candidatura pode se converter na candidatura preferencial dos que desejam --como disse Marina-- "acabar com o chavismo do PT".


http://www.pagina13.org.br/eleicoes-2/stedile-esta-em-curso-no-brasil-uma-concentracao-da-propriedade-da-terra/

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Editorial da revista Esquerda Petista

Editorial

Como sabem os que acompanham a Editora Página 13, temos feito um esforço no sentido de “especializar” nossas publicações.

O jornal Página 13, editado desde 1998, já está em sua edição de número 130 e concentra-se nos temas conjunturais. O boletim Orientação Militante, dedicado a temas “internos”, circula digitalmente desde 3 de fevereiro de 2014; no momento em que este editorial estava sendo escrito, encontrava-se em fase de produção OM número 28. A Editora Página 13, além disso, dispõe de quase 20 títulos em seu catálogo, incluindo aí uma história em quadrinhos.

Já à revista Esquerda Petista --cuja primeira edição está em suas mãos neste momento-- cabe o debate de maior fôlego ideológico, teórico, programático e estratégico.

Embora seja uma revista editada sob responsabilidade da Articulação de Esquerda, não é “porta-voz” da tendência. Como em outras de nossas publicações, cada autor é responsável pelo que escreve, e suas posições não precisam coincidir necessariamente com as posições da tendência. Até porque nossa revista é aberta a militantes que, sendo de esquerda, não são integrantes da AE.

Esquerda Petista buscará circular na intelectualidade de esquerda em geral, especialmente --mas não somente-- aquela vinculada ao PT.

Editorialmente, nos esforçaremos para cobrir o seguinte temário: o capitalismo do século 21, a crise internacional, a integração regional e nossa política externa; a análise do capitalismo e a luta pelo socialismo no Brasil, a luz das tentativas feitas ao longo do século 20; a discussão sobre programa e estratégia, incluindo rumos do desenvolvimento e meio-ambiente, políticas públicas universais e reformas estruturais; educação, cultura e comunicação na luta por hegemonia; os debates de fundo acerca da conjuntura e tática; o balanço dos governos encabeçados pelo PT, em âmbito nacional, estadual e municipal; as diferentes manifestações da luta de classes, incluindo eleições, movimentos e lutas sociais; as questões de gênero, raça e orientação sexual; a análise crítica do conteúdo da mídia (TV, rádio, internet, revistas teóricas e políticas, livros); resenhas de livros e outras publicações; e um acompanhamento do debate acerca do PT e do conjunto da esquerda brasileira.
Agradecemos antecipadamente aos leitores que nos enviem críticas e sugestões, de preferência a tempo do número 2, que pretendemos fazer circular durante a Plenária estatutária da Central Única dos Trabalhadores.

Boa leitura e principalmente uma boa luta, é o que desejamos.

Os editores


Texto de 1986 comentando uma entrevista de Jacó Bittar

E Jacó falou...                                                                                                                     '
Em entrevista "polemica" publicada em “Convergência Socialista” n. 109, o sr. Jacó Bittar, "o 1º vice-presidente do PT" declina uma série de pontos de sua avaliação sobre a campanha eleitoral e o desempenho do partido. Mesmo sabendo que as opiniões ali expressadas não representam o conjunto do pensamento de Jacó - e por isso mesmo - vamos nos arriscar a fazer aqui alguns comentários críticos sobre seus ditas.
Talvez incomodado pelo desempenho relativamente fraco do partido - e, por que não, dele próprio - Jacó, ainda que revele não possuir "dados suficientes para um balanço à nível nacional”, nos conta que:
"eu acho que participamos de um processo eleitoral onde as regras do jogo foram estabelecidas para dar continuidade a um processo de dominação sobre a classe trabalhadora"
Sábia descoberta esta, de que as regras do jogo burguês foram feitas para continuar burguês, paras como diz Jacó, impedir que "partidos como o PT pudessem levar sua proposta".
A luta de classes de fato não se dá sobre o terreno escolhido pelos trabalhadores. Ela se dá no terreno onde quem dá as cartas é a burguesia, onde a burguesia é mais forte. Por maior que seja a democracia, por maiores que sejam as vantagens que os trabalhadores disponham neste ou naquele momento, sempre prevalece no final das contas o fato: as regras do jogo são feitas para que o vencedor seja sempre burguês.
Não é por nada que naqueles momentos em que as classes exploradas parecem "vencer", a burguesia vem e, como menino mimado, tira a bola do jogo. Não é por nada que aos trabalhadores é vedado o acessoinstitucional” ao poder.
Mas enfim, Jacó mesmo fala que isto, as regras do jogo, "além do poder econômico", "não é novidade". Novidade mesmo e que nosso dirigente descubra o poder da TV. Eis a explicação: o PT teve pouco tempo de TV, a TV foi por onde passou 80 à 90% da propaganda, logo...
Quiçã fosse assim. Talvez os erros de nosso partido sejam sanados pela compra de uma emissora. Pois, como diz Jacó,
"Quércia, há 60 dias atrás, era um homem derrotado, e através da TV ele  conseguiu atingir  a população”.
Eis assim que Quércia não atingiu a população porque seu discurso foi correto, porque o plano cruzado lhe dava respaldo; porque defendeu o congelamento e atacou os sonegadores; porque apareceu como o candidato "dos pobres". Nada disso é a razão de sua vitória - mas sim porque ele conseguiu "atingir a população através da TV", pelo visto há candidatos de sobre pra fazer "merchandising" da Rede Globo...
"A campanha tem a ver mais e com um bom programa de TV, com o tempo maior".
Jacó é brilhante. Dada a descoberta, ele nos mostra que, se a burguesia continuar, usando com maestria o instrumento técnico -TV - ela está cotada para permanecer no poder a long time. Nem uma palavra sobre os acertos táticos dos candidatos da burguesia, sobre a predominância conservadora, sobre o apoio da população aos liberais burgueses. A MÍDIA é a esfinge que não conseguimos decifrar.
Mas consideremos que Jacó tenha razão, que a TV seja fundamental. Por que seria assim? Por que a população acaba votando em quem "usa melhor" este instrumento de comunicação, de massas?
Duas hipóteses. Ou o povo e burro, inculto, etc etc - e por isso acredita que o "bom patrão" vai resolver seus problemas - ou então discurso da burguesias AMPLIFICADO (e se trata disto) pelos meios de comunicação, tem uma BASE REAL, tem de fato penetração na população.
Na realidade, Jacó parte de uma premissa falsa - a de que, se tivéssemos mais tempo, nossas chances aumentariam proporcionalmente; que o tempona TV seja o fator predominante; ou, de uma forma mais geral, que se tivéssemos acesso a população nos mesmos termos da burguesia conseguiríamos disputar, também, nos mesmos termos.
Infelizmente, enquanto a burguesia domina no Brasil, há décadas, nós contamos os nossos tempos em anos. Ademais, temos de reconhecer com todas as letras que a população não acredita na proposta do partido, que o partido não e maioria na população, e que só um trabalho longo, que vai demandar muitas e muitas derrotas, pode nos transformar em maioria. Mas nada disso é surpresa para Jacó, ao fim de seus devaneios como o mais new-Mac-Luhan, papa da mídia global. Surpresa foi o PT, como ele diz, ter cometido um "grande equívoco". Ter "duzentos candidatos proporcionais que, por falta de uma direção política, tentaram fazer o mesmo jogo que a burguesia faz: concorrer em faixa própria, discutir, disputar com a burguesia voto a voto, coisa que não é o nosso forte. O nosso forte é a militância unificada defendendo uma proposta partidária".
A galinha tem asas, o que não quer dizer que ela voe tão alto quanto o gavião. O que tem a ver o fato de nosso forte "ser a militância unificada defendendo uma proposta partidária" com "disputar com a burguesia voto a voto"???
Pois pasmem, Jacó diz isso:
''concorrer em faixa própria, discutir, disputar com a burguesia voto a voto" é "fazer o jogo que a burguesia faz"!
Errado, Jacó, é disputar voto a voto com os companheiros do próprio partido, coisa que muita gente fez. Errado, Jacó, é não correr em faixa própria, é se confundir, as custas de um discurso "honesto" "decente", "educado", com tantos burgueses honestos, e educados” que tem por aí. Errado, Jacó, é não discutir.
Mas Jacó viu o mal, ainda que aponte a causa errada. O mal, no caso, foi não termos avaliado corretamente o quadro político em que se inseria a campanha; não termos centralizado a campanha nos deputados constituintes; termos nos perdido na discussão sobre os eixos do candidato a governador, antes, durante e, se não tomarmos cuidado, depois; o erro, enfim, foi ter feito o jogo da burguesia, priorizando uma campanha que não tivemos a coragem política de dizer perdida desde o início - que era a campanha para governador - e desdenhando na prática a outra, para a constituinte. Nesse sentido, e só nesse sentido Jacó tem razão, houve falta de direção política nossa direção, estadual e nacional, errou; e pagamos todos por isto.
Mas Jacó parece pensar diferente. Ele diz que:
"se tivesse havido uma unidade do partido em cima do Suplicy, que era quem polarizava a eleição porque era candidato a governador, teria sido diferente."
Eis ai o erro, a falta de direção que mesmo denunciou linhas atrás. Em primeiro lugar, não estava dado desde o inicio que Suplicy deveria "polarizar" a campanha. Muito pelo contrário, se tivéssemos seguido as deliberações do encontro estadual, o centro deveria ter sido a campanha para a constituinte. Em segundo lugar, não é verdade que não tenha havido "unidade" em torno do Suplicy. Não houve de nenhum setor do partido, boicote a campanha do candidato a governador, ou “não se unir” a ela. Em terceiro lugar, pressupondo que Jacó tenha razão: pressupondo que não tenha havido "unidade" em tomo de Suplicy; pressupondo tudo isto enfim: porque diabos "seria diferente"???
No frigir dos ovos, o que prevaleceu foi a orientação de apoiar Suplicy, de centralizar na campanha para governador, etc etc, tudo seguindo a receita Jacá - e no que deu senão no que vemos?
O erro político foi ter, desde a discussão sobre as candidaturas, cassando pela campanha eleitoral, e seguindo a intervenção de Jacó no debate, centralizado a atuação do Partido na campanha para governador, colocando em segundo plano a constituinte.
Jacó não entende isto, é claro. Ele foi dos que indicaram o Lula para candidato. A irresponsabilidade desta posição merece umas linhas. Em primeiro lugar, o centro da luta política no próximo período será a constituinte. Era segundo lugar? O companheiro Lula é o representante mais caracterizado da classe trabalhadora e do PT. Em terceiro lugar, e por isso e muito mais, sua presença na Constituinte era e é fundamental para ser o porta voz das opiniões de nosso partido. E o que queria Jacó e tanto queria que repete na entrevista que "meu  candidato era o Lula"? Ele queria que o Lula se enfiasse numa campanha derrotada, perdida, que ele não fosse à constituinte. Bela forma de queimar um dirigente, dando-lhe uma “missão impossível”. E isso porque?
"Eu achava que era a oportunidade de a gente colocar um divisor de águas, principalmente quando concorria António Ermírio de Moraes, (...) então nós deveríamos ter um sindicalista? um trabalhador saindo para a política neste momento."
Jacó, companheiro, toda hora e hora para "colocar um divisor de águas", não só a hora eleitoral. Ademais, que belo exemplo: Lula de um lado, Ermírio de outro, ambos candidato "que não representa" realmente o empresariado, o sr. Quércia.
Aos ingénuos, a pérola: "deveríamos ter trabalhador saindo para, a política neste momento". A par a estranheza do argumento (“sair para a politica”), que vamos deixar por conta do copy da entrevista, resta o obreirismos nada melhor para representar um trabalhador que um trabalhador. Origem de classe, Jacó, não quer dizer posição de classe, como tantos José de Fátimas, já mostraram.
Ademais, foi o sr. mesmo, sr. Jacó, que disse para quem quisesse vir, que "nós não queremos transformar o Suplicy em alternativa de governo, queremos transformá-lo era alternativa de poder" (trecho do discurso proferido por Jacó na comício de encerramento da campanha do PT na praça da Sé) - terá o choque eleitoral lhe mostrado súbita e impositivamente as vantagens de um "trabalhador" como candidato? Diz a música que quem sabe faz a hora. Jacó, sabendo que e chegada a hora de atribuir responsabilidades, atira sobre a direção (estadual):
"a direção continuou insistindo e não trabalhou pista; em cima da campanha do Suplicy, muito pelo contrário. Vários dirigentes estavam mais preocupados com suas próprias campanhas do que com a do partido e não houve unidade."
Num país onde candidatos ao governo estadual se atiram epítetos de "ladrão" e todos saem ilesos, nada mais natural que alguém se sinta no direito de fazer as acusações mais graves e sair despreocupado. Pois é grave acusar a direção de, "muito pelo contrário", não ter "trabalhado em cima da campanha do Suplicy" Provas, sr. Jacó, provas é o que exige sua acusação. Provas para que não pensemos que isto é mais uma desculpa como tantas foram as que nosso candidato "não trabalhador" usou durante a campanha para explicar nossos problemas. PROVAS!
Provas também para que possamos castigar os "dirigentes mais preocupados com suas próprias campanhas do que com a do partido", PROVAS? Seria positivo que a direção estadual divulgasse a lista de comparecimento às atividades unificadas do partido e coisas "simples", porem PROVAS, como as contribuições feitas para o CDEU - para que possamos ver quem apoiou, e quem DIZ que apoiou.
Enquanto as provas não vêm, só nós cabe lamentar a irresponsabilidade de um dirigente nacional do partido que nos diz que há quem nos tenha traído mas que não dá os nomes aos bois.
Mas os chifres sempre aparecem por sobre o muro, não há jeito. Pois não é o Jacó indignado com a direção que no diz que:
"nos não podemos fazer uma campanha classista com o Suplicy fazendo discursei não há essa possibilidade".
Pois então, a direção errou, por não ter apoiado Suplicy. Mas, pasmem,  não dá para fazer uma campanha classista com o Suplicy fazendo discurso" (????). E não e só:
"o Suplicy e um grande companheiro, o que mais poderia representar o partido agora em termos da consciência política que o partido formou."
Está dito: consciência política que se formou indicou o Suplicy, o Suplicy “fazendo discurso” não permite uma campanha classista, donde o PT precisa buscar seus eixos classistas que perdeu ao escolher Suplicy (e preterir Lula, leia-se nas entrelinhas).
A questão é que Suplicy:
"não tem o pique (!...), não tem o discurso de um classista".
Nada mais natural. A TV é o "estalo", Suplicy não tem "o pique". Classismo neles, Jacó. Além do mais...
"naquela oportunidade, o Suplicy estava muito desgastado, um desgaste por falta de direção política. A direção, por sua omissão, contribuiu muito para isto".
Quando o pensamento e muito complexo, a verdade aparece no final. Eis aqui: Suplicy estava muito desgastado, por falta de direção política. E como Suplicy "foi o candidato porque representava a vontade do partido". Eureka, o partido tinha "falta de direção política". O curioso, o estranho, e que Jacó não nos dê outra alternativa senão repetir os erros cometidos, que já indicamos.
Nem poderia ser de outra maneira. Desde o momento em que a burguesia tomou a iniciativa, com o Plano Cruzado 1, o partido perdeu definição tática. Faltou, por exemplo, pura clareza que nos permita definir o Quércia como um candidato de centro em SP. Faltou, por exemplo, clareza suficiente para entender que centrar a nossa atividade em torno da campanha do Suplicy era levar o partido a disputar com a burguesia em um terreno minado e errado. E, que Jacó me permita, faltou isto sim foi clareza à direção PRÁTICA do partido, que passou a ser de fato o sr. Suplicy, clareza para entender que a campanha não era um disputa de personalidades, mas de propostas políticas.
Mas senhor Jacó sabe bem onde está o problema para ele. Esta na votação obtida por Hélio Bicudo. E aí vai ele discutir sobre o potencial de voto do partido, se Bicudo era interessante para Quércia, etc..
É incrível onde leva o sectarismo. Ao invés do sr. Jacó se regozijar pelo fato de um candidato nosso ao senado, porque tem penetração social, porque penetra inclusive em áreas onde o conjunto do partido não penetra, ter conseguido expressiva votação - não, nada disto, o centro é mostrar que "essa oportunidade foi oferecida pelo outro partido (o PMDB)".
E mais: ao invés de desmontar o órgão oficial da burguesia liberal paulistana, a “Folha de SP” o sr . Jacó, no afã de obter apoio para seus comentários anti-direção estadual, dá-lhe sustentação. É por esses e por outros dirigentes que a Folha de São Paulo vai se transformando no órgão oficial do PT em SP.
Não cansado de defender o suicídio político do Lula, que, diz Jacó deveria ele sim ser nosso candidato a governador não cansado ainda de defender o centro da campanha no Suplicy, quando deveria ter sido nos constituintes; não cansado disto tudo, Jacó, nosso Jacó, falas:
"eu penso que daqui para a frente o PT não pode jogar todo o peso na Constituinte. Eu discordo da proposta do Lula, de referendum à Constituição. Acho que é jogar uma falsa expectativa."
Há coerência era Jacó, isto e certo. Passo uns tirar o principal líder do partido da Constituinte, lançando-o à governador. Passo dois; centrar na candidatura Suplicy a campanha de nosso partido. Passo três: "não jogar peso na Constituinte". E, passo quatro, voltar "à luta do dia a dia".
Mas calma com o andor. Jacó tem um pingo de razão. Se ele diz que não devemos jogar as nossas expectativas na Constituinte, mas sim no movimento de massas; se ele diz que o centro da atividade do partido deve estar na mobilização popular e a partir dela é que deve ser feita a intervenção na constituinte; então, muito bem, concordamos com Jacó. Mas é isso que quererá dizer Jacó? Ou ele quer propor uma volta à política destruída pelos fatos, de entender que a constituinte não vai ser o centro da luta política do próximo período? Que quererá dizer Jacó? Ora, ao que nos parece, deve ser o segundo caso. Não é ele que diz ser contrário a proposta de referendo do Lula? Jacó, venha comigo. A burguesia quer dá constituinte um conjunto de leis o mais conservador possível. Os trabalhadores querem um conjunto de leis o mais democrático possível. Passo lógico, a "burguesia faz com que a constituinte seja senão um "congresso constituinte". Derrotada no primeiro embate, os trabalhadores vão para a eleição dos deputados constituintes. A burguesia centra a disputa política em torno dos governadores, o PT cai na esparrela, e a massa dos deputados constituintes é conservadora. Terceiro passo: a constituinte deverá trabalhar fora da vigilância do controle e da mobilização popular. O PT propõe que a constituinte tenha suas sessões transmitidas para todo o país via TV, que a população. seja mobilizada. Quarto passo: a burguesia quer que seja promulgada a nova constituição por esses deputados eleitos. O PT quer que a constituinte seja referendada pela população.
É isto Jacó: a burguesia quer elitização, quer uma constituinte estritamente conservadora. A classe trabalhadora? Jacó, quer romper os estreitos limites que a burguesia quer impor, quer que o trabalhador participe em todos os momento, não só na hora de votar nos deputados. Será, Jacó, isto uma "falsa expectativa" ou será justamente por compreender que a constituição será uma obra conservadora (o que e. uma expectativa com que até Jacó concorda) que nos queremos que a população vote num referendum? Não cansado, Jacó alerta:
"A CUT quase que desaparece nesse processo eleitoral, o próprio PT e seus militantes praticamente desapareceram, nos movimentos sociais, das greves dos portuários, bancários (SIC), metroviários.”
Mentira Jacó, mentira. Vejamos um exemplo: enquanto não terminou a negociação salarial dos bancários, nosso companheiro Gushiken não fez, nem ele próprio, nem a massa de militantes petistas bancários sua campanha - pondo em razoável risco, aliás, sua própria eleição. Isto é uma mostra de "desaparecimento"?
O problema? Jacó, e o inverso. Os militantes do PT que atuam no movimento sindical participaram muito pouco da campanha, não participaram como deviam. Haja visto quantos sindicalistas que elegemos nesta campanha. Bancada federal paulista provável no dia que escrevo este artigo: 8. Movimento sindical: 2. Bancada estadual etc etc...: 10. Sindicalistas: 4. O que faltou, Jacó, foi não “estar muito mais presentes no  processo eleitoral” mas sim ter estado muito menos. Faltou empenho, empenho e empenho em especial dos companheiros sindicalistas. E os problemas que virão daí nós ainda veremos.
No fim, mas não ao cabo, Jacó inicia uma análise de conjuntura:
"o poder econômico impera, a correlação de forças não foi alterada". Brilhante, Jacó, a seguir por estes critérios enquanto a burguesia estiver no poder, enquanto o "poder económico imperar", NUNCA a correlação de forças mudará. Pois para Jacó o fato de ter vendido avassaladoramente o setor liberal do PMDB; o fato dá “esquerda independente” ter sido esmagada; o fato do  PT ter crescido; derrota do PDT no RJ, o fato do PFL ter sido derrotado e o PDS defenestrado; tudo isto, para Jacó, "nao alterou a correlação de forças". Parece-se Jacó aqui com Sir Ney, que disse que a correlação de forças em seu feudo não se alterou, e que ele só alteraria os ducados se vencesse o partido do cruzado Marco Maciel... Jacó, veja em que companhia andam tuas avaliações? Mas o que podemos esperar de um dirigente nacional que diz (sic):
"O PT tem o compromisso histórico de ser oposição, e sendo oposição não procurar fazer grandes análises do que o governo está aplicando. O que o governo está aplicando por excelência por anteciparão, nós temos que ser oposição, porque ele atende os interesses da classe empresarial, ao patrona não atende os interesses dos trabalhadores."
Pela primeira vez vejo era letra de forma, não importa nada, importa o INSTINTO. Não precisa fazer análise, basta ser contra "por princípio". Só que, companheirinho Jacó, sua tática só seria boa se a burguesia não vivesse tentando cooptar os trabalhadores. Porque a burguesia, Jacó, sabe que para manter o poder ela precisa fingir, disfarçar, cooptar, ceder e conceder. Se me entendes, companheirinho, fazer POLÍTICA. E se a burguesia faz isso para manter o poder, nós temos que fazer para conquista-ló. Se a burguesia cede, ANALISAR como cedeu e porque cedeu. Se a burguesia recua, ANALISAR e EXPLICAR porque recuou. ANASILAR, companheirinho, porque as massas tem que saber analisar do nosso ponto de vista cada passa dado pela burguesia.
Mas Freud explica. Na Idade Média os cavaleiros andantes iam (à cavalo) para as liças (combates) armados de lanças e escudos, com pesadas vestes (armaduras). O combate era feito de tal modo que os ataques eram feitos em linha reta, da qual os cavaleiros não se desviavam até que aquele mais forte derrubava o outro pela pura força física. Na corte do Rei Artur, o cavaleiro Lancelote, ANALISANDO, um dia desviou do seu cavalo do adversário, que caiu estrepitosamente por não ter previsto (ENTENDIDO -ANALISAR) que seu inimigo poderia fazê-lo. Mas os cavaleiros acabaram: eram românticos demais. Eis então que Jacó, educado nos mais perfeitos moldes da cavalariça, intenta repetir D. Quixote. Boa sorte, Jacó.
Ao cabo. O resto da entrevista de Jacó e dedicada a explicar o porque ele considera a eleição como “saldo positivo”; por que o LULA é "fundamental", o partido "precisa muito do companheiro Lula", etc etc; porque ele é favorável as tendências dentro do partido ("desde que não seja um partido dentro do partido); prometendo um documento  ("para que as coisas não fiquem mais como se fosse uma briga com este ou aquele companheiro); etc...
Sou de opinião que antes de se ter definido o quadro geral dos resultados eleitorais - o que deve acontecer dentro de mais uma semana, creio – é inviável fazer uma análise completa da conjuntura.  Uma coisa é certa: NÃO se trata de fazer uma análise em termos de se a campanha foi "positiva" ou "negativa". Não fosse por outras razões, toda a campanha tem “aspectos positivos” e “negativos”. Trata-se sim de fazer uma avaliação objetiva das forças em luta durante a campanha e quais saíram vencedoras e quais derrotadas, como e porquê. Trata-se ainda de verificar quais eram as tarefas do partido nesta eleição e quais as que cumprimos de fato. Trata-se enfim de fazer uma avaliação de conjuntura, e não um debate só sobre o PT. A luta política se faz combatendo os inimigos, avaliando suas forças e as nossas. Basta de internismo na vida partidária. Precisamos de politica, avaliação política e luta política.
Se desviarmos a discussão para quem deve ser nosso próximo presidente, ou ainda sobre os eixos do Suplicy, estaremos no caminho errado.
Dessa forma, faço minhas as palavras finais de Jacó: "trata-se de montar um esquema de  discussão  que   seja o mais  democrático  possível   e  que   o  resultado disso seja aplicado e seja cumprido pela direção do partido". Pois é Jacó, pena que as coisas certas sejam ditas no final.






De tédio não morreremos

Editorial
De tédio, não morreremos
Esta edição do jornal Página 13 corresponde aos meses de dezembro de 2013 e janeiro de 2014.
Nela, os leitores encontrarão um balanço do processo de eleição das direções partidárias, ocorrido em novembro de 2013. Não se trata de um balanço completo: pretendemos voltar ao assunto na edição que circula em fevereiro de 2014. Aproveitamos, também, para apresentar a bancada que representará a Articulação de Esquerda no Diretório Nacional do PT, empossado dia 12 de dezembro de 2013.
Encontrarão, também, textos analisando os desafios de 2014, em diferentes frentes: Igor Fuser aborda o cenário internacional, sob o prisma do Irã e da Venezuela; Breno Altman fala de pesquisas e eleições presidenciais; João de Deus trata da momentosa eleição maranhense; Rubens Alves fala da pauta pauta legislativa do próximo ano; Max Altman e Rodrigo César abordam, em dois textos distintos, o tema da reforma política; Jandyra Uehara trata dos desafios da CUT, com um texto específico dedicado aos trabalhadores da educação.
Página 13 republica, também, um texto de Valter Pomar, sobre o significado estratégico das prisões de Genoíno, Dirceu e Delúbio. E publica um inédito de Iole Iliada, sobre o debate de ideias no Partido dos Trabalhadores, a luz de um importante evento realizado pela Fundação Perseu Abramo, em novembro-dezembro de 2013.
Ricardo Menezes aborda os desafios da saúde pública, Jonatas Moreth fala da juventude petista, Patrick Campos e Adriele Manjabosco falam do recente congresso da União Brasileira de Estudantes Secundaristas. E Marcos Lazaretti, coordenador geral da UEE Livre do Rio Grande do Sul, fala da eleição do Diretório Central dos Estudantes de Santa Maria (RS).
Além disso, Página 13 traz um texto acerca de Marcelo Deda, militante petista, governador de Sergipe, que recentemente nos deixou.
*
Se não houver contratempos, esta edição de Página 13 começará a circular na abertura do V Congresso Nacional do Partido dos Trabalhadores, entre os dias 12 e 14 de dezembro de 2013.
Este Congresso foi convocado solenemente em dezembro de 2012. Mas desde o debate sobre a Convocatória do Quinto Congresso, ficou clara a existência, no Partido, de pelo menos duas posições distintas a respeito.
Todos reconheciam existir uma contradição entre as necessidades da luta política imediata, por um lado, e as diretrizes mais estratégicas e programáticas que deveriam emergir do Congresso, por outro lado.
Alguns propunham resolver esta contradição rebaixando o Congresso, transformando-o numa convenção eleitoral. Outros propunham resolver esta contradição, elevando nossa tática às necessidades de nossa estratégia.
A polêmica se traduziu, do ponto de vista prático, na elaboração de um documento de subsídio ao Congresso, que deveria ter sido debatido pela CEN, pelo DN e em encontros especiais, simultaneamente ao PED. E que, após o PED, seria refeito, incorporando as contribuições das teses apresentadas ao debate.
Tais debates nunca ocorreram. E o documento apresentado como contribuição ao V Congresso, assinado por apenas dois dos vários integrantes da comissão, é basicamente o mesmo produzido antes do PED.
Por sua vez, a chapa “Partido que muda o Brasil”, que disputou o PED com uma tese, abriu mão desta tese em favor do documento assinado por Marco Aurélio e Ricardo Berzoini. Convenhamos, não teria sido melhor que tal documento fosse apresentado e debatido pelos filiados ao longo do PED? Ou terá prevalecido a opinião, manifestada por um dos autores do documento, segundo o qual o PED não serve para “este tipo de debate mais de fundo”?
A Articulação de Esquerda divulgará, numa separata distribuída diretamente aos delegados e delegadas presentes ao V Congresso, uma análise crítica da contribuição escrita por Marco Aurélio e Ricardo Berzoni, cotejando com o que era dito pela tese da chapa “Partido que muda o Brasil” e propondo emendas.
Seja como for, o fato é que o V Congresso começa agora, mas não termina agora. O que foi convocado para o final de dezembro é uma sessão inaugural, composta por uma mesa de posse das novas direções (onde falarão Rui Falcão, Lula e Dilma Roussef); outra mesa dedicada a Genoíno, Dirceu e Delúbio; uma terceira mesa, onde Marco Aurélio e Berzoini apresentarão seu texto, seguido de opiniões dos presidentes da CUT, da coordenação do MST e da diretoria da UNE, depois do que terão (ufa!!!) o direito de falar os representantes das chapas que concorreram ao PED; e uma quarta mesa, dedicada a debater os temas programáticos e estratégicos, com base na contribuição de quatro intelectuais. Finalmente, no sábado 14 de dezembro, haverá a votação de resoluções.
Em algum outro momento, talvez em março de 2014, os/as delegados/as serão novamente convocados/as, para debater tática eleitoral. E talvez em 2015 se convoque novamente o Congresso. Enfim, os mais velhos devem se lembrar da chamada “tática-processo”; agora estamos diante do “congresso-processo”.
O essencial é que a maioria do Partido decidiu “não mexer em time que está ganhando”. Como diz a contribuição assinada por Marco Aurélio e Ricardo Berzoini: “No ano de 2014 a ação do PT estará concentrada na reeleição da companheira Dilma Rousseff à presidência da República, na expansão de suas bancadas no Senado Federal, na Câmara de Deputados e nas Assembléias Legislativas. Da mesma forma, terá papel central o aumento do número de seus governadores. Claro está que todos estes embates eleitorais exigirão a consolidação, ampliação e qualificação de nossas alianças políticas, essencial não só para vencer as eleições como para o exercício futuro dos governos em nível nacional e estadual. Ainda que as questões programáticas em jogo nas eleições de 2014 não possam ser separadas totalmente de uma política de longo prazo do partido, é necessário evitar que esses temas, de natureza estratégica, se sobreponham e confundam o debate eleitoral do próximo ano”.
Traduzindo: não estamos seguros de que a tática para 2014 ajude a política de longo prazo do Partido, mas estamos convictos de que colocar agora certos temas de longo prazo pode dificultar nosso desempenho eleitoral, assim é melhor não misturar as duas coisas.
Esta opção pode ter vários desdobramentos, inclusive dar certo. Mas há três variantes que nos preocupam.
Na primeira delas, perdemos as eleições por que não percebemos a necessidade de mudar a tática e a estratégia adotadas até aqui. Na segunda delas, ganhamos as eleições e fazemos um segundo governo a altura da tática, mas aquém das necessidades estratégicas, o que terá consequências até 2018 e em 2018. Na terceira delas, ganhamos as eleições e buscamos, após as eleições, fazer um giro na atuação do governo, sem ter construído, durante o processo eleitoral, as bases políticas necessárias para tal.
Não subestimamos a primeira variante. A direita está fazendo um grande esforço para produzir uma tempestade perfeita. E nosso governo tem reagido a isto de maneira recuada, fazendo um grande esforço para conciliar com os interesses do grande capital e do rentismo. As duas variantes projetam um cenário perigoso, econômica, política e eleitoralmente falando. Mas, ainda assim, ainda que no segundo turno, ainda que com dificuldades, o mais provável é nossa vitória com a reeleição da presidenta Dilma.
Mas, em caso da provável reeleição, a opção tática e estratégica da maioria do Partido não terá criado as condições para fazer um segundo mandato superior ao atual. É claro que esta nossa opinião deve ser matizada: uma vitória petista nos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e/ou Minas Gerais muda a correlação de forças políticas. Porém, já sabemos de longa data que a depender da política implementada pelos novos governos estaduais, uma vitória eleitoral pode se converter num problema político, como algumas prefeituras conquistadas em 2012 estão demonstrando.
Coerentemente com as posições que defendeu no PED, não esperamos da maioria da nova direção partidária uma mudança na tática ou na estratégia. Continuarão insistindo numa postura geral defensiva e aquém das necessidades e possibilidades da conjuntura e do período histórico.
Da nossa parte, vamos continuar insistindo na necessidade de um giro estratégico e tático, assim como no funcionamento do PT. Achamos que a conjuntura de 2014 tende a ser turbulenta, que a campanha eleitoral será muito difícil, que o PT precisa de outra postura e de outra política, seja para vencer, seja para governar, seja para transformar o Brasil.
Por isto, estamos seguros, nós que somos petistas, de tédio não morreremos.
E que 2014 seja um ano marcado por grandes lutas e grandes vitórias da classe trabalhadora brasileira.
Os editores



Texto escrito em 2000: Análise crítica das posições da Consulta Popular



O PT nunca foi uma unanimidade na esquerda brasileira. Na época da sua fundação, organizações como o PCdoB, o PCB e o MR-8 o acusaram de divisionista, valhacouto de revisionistas e agente da social-democracia.
Mesmo no interior do Partido, vários grupos consideravam que o PT era apenas uma legenda, uma frente, um expediente a partir do qual se podia alcançar as massas. Para a revolução, contudo, seria necessário construir um partido revolucionário, coisa que o PT não seria.
Essas críticas não impediram que o PT se transformasse, ao longo de duas décadas, no maior partido da esquerda brasileira. Maior do ponto de vista eleitoral, mas também e principalmente no que diz respeito à militância: é petista a maioria dos dirigentes da CUT, da Central de Movimentos Populares, do Movimento Sem-Terra, dos integrantes das pastorais sociais da igreja católica, bem como grande parte da juventude politicamente ativa.
Pelo menos desde 1990, contudo, o crescimento do Partido vem sendo acompanhado de problemas que repõem a questão: o PT é um partido socialista ou social-democrata? Um partido revolucionário ou reformista? Um partido à serviço das lutas sociais ou de carreiras eleitorais?
Desta ou de outras maneiras, milhares de petistas se questionam sobre o que está acontecendo com seu partido. Alguns abandonam a militância, outros se acomodam, outros buscam alternativas. Para um grande número de militantes, esta alternativa estaria no Movimento Sem-Terra e, mais recentemente, na Consulta Popular; para um número menos expressivo, estaria no PSTU ou, para ser mais preciso, na construção de uma organização que integrasse a esquerda petista, o PSTU e a militância da "esquerda social" que gravita ao redor do MST.
Em qualquer caso, a esquerda brasileira vive uma situação semelhante a enfrentada nos anos sessenta: um forte questionamento ao partido hegemônico (na época, o PCB, hoje o PT) e o surgimento de alternativas reais ou imaginárias.
A maioria destas alternativas não conseguiu implantar-se na classe trabalhadora, que continuou sob a influência do comunismo oficial e do PTB. Só o Partido dos Trabalhadores, vinte anos depois do início da crise do PC, conseguiu raízes sólidas entre os assalariados, pequenos proprietários rurais e setores médios.
Existem várias causas que explicam o fracasso das dezenas de organizações que tentaram suplantar o PC: a repressão militar, a luta armada, a opção pelo campo como cenário estratégico, o surgimento de uma nova classe trabalhadora, etc.
O mais curioso, entretanto, é que a maioria daquelas organizações rompeu com a linha pacifista do PC, mas não rompeu com a concepção estratégica que norteava aquela organização. Algo semelhante está ocorrendo hoje: várias tendências que integram a chamada esquerda petista e parte dos companheiros que animam a Consulta Popular são partidários de uma linha programática muito semelhante a da maioria moderada do PT. Semelhanças que afetam, ainda que mais na forma que no conteúdo, inclusive a elaboração teórica do PSTU, especialmente no que diz respeito a idéia de que vivemos um processo de "recolonização".
Estas semelhanças ficam dissimuladas pelas divergências táticas (Fora FHC?) e por algumas opções estratégicas (ruptura? papel da luta de massas e da disputa institucional?). Mas elas existem, como se pode perceber por exemplo com a leitura do livro A opção brasileira; ou numa resenha sistemática dos documentos das organizações citadas, que cada vez mais vertebram sua elaboração estratégica ao redor da "questão nacional", da "luta pela soberania e desenvolvimento econômico".
Longe de nós minimizar a importância da "questão nacional" nos dias que correm. Qualquer debate, raso ou profundo, sobre os problemas programáticos e estratégicos da revolução socialista no Brasil deve levar em conta a chamada questão nacional.
Ocorre que a crise teórica e prática vivida pelo PT e pelo conjunto dos movimentos sociais e da esquerda brasileira não será superada se substituirmos a luta pelo socialismo, pela defesa da "Nação Brasileira". Aliás, basta ler os documentos, ouvir os discursos e atentar para os movimentos da ala moderada do PT, para perceber que eles já aderiram, de mala e cuia, à um nacionalismo moderado.
Ocorre que um dos efeitos da globalização foi o fortalecimento do nacionalismo. O paradoxo é apenas aparente. A contradição que dominou o mundo, entre o fim da Segunda Guerra Mundial e o desmanche da União Soviética, foi aquela existente entre capitalismo e socialismo. Todas as demais contradições remetiam àquela, inclusive a contradição entre imperialismo e libertação nacional, entre democracia e ditadura, entre desenvolvimento e subdesenvolvimento. É por isto, aliás, que a luta contra o imperialismo, contra as ditaduras e contra o subdesenvolvimento era considerada por muitos como parte da “conspiração comunista”.
Na década de 80, os capitalistas venceram a batalha contra o campo socialista e agora estão atacando as conquistas democráticas, econômicas e sociais em todo o mundo. A contradição dominante no mundo, hoje, não é mais entre capitalismo e socialismo, mas sim inter-capitalista. Mais precisamente, a contradição entre as grandes nações capitalistas; e entre as grandes nações e as nações da periferia capitalista.
Um dos efeitos desta nova situação é o ressurgimento do nacionalismo, em suas mais variadas facetas. O nacionalismo de grande potência, típico dos Estados Unidos, que se considera o povo eleito para dominar o mundo. O nacionalismo xenófobo, do trabalhador e do pequeno empresário que estão sendo esmagados pelos capitalistas, mas descarregam sua raiva contra o imigrante. O nacionalismo das potências regionais. E o nacionalismo dos povos oprimidos.
Diante da nova situação, os socialistas de todas as matizes foram levados a reformular suas estratégias e programas. A maioria deslizou para a direita. Os social-democratas abandonaram o Estado de bem-estar social e passaram a administrar o neoliberalismo. Grande parte dos partidos comunistas e das guerrilhas, em particular latino-americanas, fez o mesmo percurso. A maioria abandonou a luta pelo socialismo, se limitando a lutar contra o neoliberalismo e por um capitalismo “menos cruel”, a ser obtido através de disputas eleitorais.
Acontece que a experiência do século XX demonstra que só teremos sucesso na luta pela soberania nacional, pelo desenvolvimento econômico, pelo bem-estar social e pela democracia, se tivermos sucesso na luta pelo socialismo.
O Estado de bem-estar social europeu é uma conseqüência direta e indireta da “ameaça comunista”. Sem o apoio político, econômico e militar do campo socialista, a luta pela libertação nacional teria tido menos êxito do que teve. Os experimentos “desenvolvimentistas” em vários países foram tolerados ou até incentivados pelos Estados Unidos, como uma forma de conter a revolução no terceiro mundo. Nosso desafio, portanto, está em incorporar a questão nacional, as reivindicações democráticas e pelo desenvolvimento econômico, no corpo de uma estratégia socialista. Mas para conseguir isso, nosso ponto de partida não deve ser a questão nacional, mas sim a “questão socialista”.
Aqui reside nossa principal divergência com as posições que nos parecem hegemônicas na Consulta Popular, tal como expressas no livro A opção brasileira: em nossa opinião, ali se faz uma abordagem nacionalista da questão nacional.
Já na “apresentação”, o livro diz sintetizar idéias que “vêm sendo formuladas nos últimos anos por um conjunto de pessoas, que têm em comum a confiança no povo brasileiro e a certeza de que pode construir um destino melhor para o país”. Logo depois, fala-se que “nos últimos anos, foram profundamente alterados os termos que organizam o debate político e cultural no Brasil. Generalizou-se a idéia de que não há mais a possibilidade de um desenvolvimento em bases nacionais”. Ou seja: o ponto de partida da Opção é o Brasil, “a viabilidade do Brasil”.
Por enquanto, vale registrar que a mesma inversão é feita por Marco Aurélio Garcia, coordenador-geral do II Congresso do PT, para quem o “socialismo petista” devia ser um subitem do grande eixo de discussão sobre um projeto nacional de desenvolvimento alternativo para o Brasil.
A Opção não indica que a crise do socialismo é uma das principais causas e conseqüências da alteração nos “termos que organizam o debate” no Brasil. A dificuldade que a esquerda brasileira passou a ter, nos anos 90, para enfrentar o debate político e cultural, advém principalmente da perda do referencial programático, ideológico, teórico do socialismo.
O debate existente no Brasil, dos anos 30 aos anos 80, foi entre diferentes projetos nacionais. A esquerda participou deste debate tendo como referência estratégica a luta pelo socialismo. As insuficiências da esquerda neste debate tinham relação direta com a concepção etapista do Partido Comunista, segundo a qual antes do socialismo deveríamos lutar pela “libertação nacional”, luta em que teríamos como aliada a burguesia “nacional”.
A medida em que a referência socialista perdeu força, a capacidade da esquerda intervir no debate “nacional” também se enfraqueceu. Isto quer dizer que, para recuperar força plena no debate “nacional”, a esquerda brasileira tem que simultaneamente reconstruir sua referência estratégica socialista.
Alguém pode dizer que esta crítica é um exagero. Afinal, a Opção afirma uma clara disposição de “pensar o impensável”, de “explicitar bases conceituais”, apresentar “fundamentos”, “um sistema de idéias”, “algumas coisas que ultimamente se tornaram impensáveis, na medida que rompem com as bases da organização socioeconômica atual do Brasil e reatualizam a idéia de um futuro socialista”. No final do livro, pode-se ler que, “se nos perguntarem se o projeto que esboçamos é de natureza socialista, responderemos que sim. O socialismo burocrático morreu. Mas não a idéia de que a solidariedade pode ser o princípio organizador da vida em comum”.
Além disso que citamos, a questão do socialismo merece uma citação no início do livro, outra no final, uma referência de rodapé à China, um breve comentário sobre o colapso do sistema soviético e uma afirmação mais substancial na página 172: “Parte da economia deve ser socializada — sob a forma de propriedade estatal ou pública não estatal — e parte deve manter-se sob controle privado, de modo que a sociedade combine dois grandes mecanismos de alocação de recursos. O setor privado não monopolista será incrementado, via multiplicação de pequenas e médias propriedades e empresas (...) Todo esforço será feito para criar uma base empresarial nacional ampla, descentralizada e disseminada.”
Estas breves referências mostram, por si, como é contraditória a relação da Opção brasileira (e da Consulta Popular) com o socialismo. Para começo de conversa, o princípio organizador da vida em comum no socialismo é a igualdade, não a solidariedade (expressão de forte trânsito na militância católica). E qual socialismo queremos “reatualizar”, se renunciamos explicitamente a um projeto internacional?
O objetivo final dos socialistas é a constituição de uma sociedade sem exploração nem opressão em escala mundial. Noutras palavras, trata-se de construir uma sociedade sem classes, sem Estado... e sem nações. É claro que este é o objetivo final, não o início da caminhada. No início do processo, os trabalhadores lutam contra sua própria burguesia e buscam tomar o poder de Estado “nacional”. A maior parte da luta anticapitalista é travada a partir das fronteiras nacionais. Mas travar a luta “a partir das fronteiras nacionais” e “a partir de uma perspectiva nacionalista” são duas coisas diferentes.
Quando a social-democracia alemã votou a favor dos créditos de guerra e apoiou seu governo na I Guerra Mundial, atuou a partir de uma perspectiva nacionalista. Quando os bolcheviques assumiram a postura “derrotista”, enfrentando não apenas o czarismo mas também os sentimentos patrióticos da maioria do povo russo, o fizeram a partir de uma perspectiva internacionalista. Quando os bolcheviques decidiram tomar o poder em outubro de 1917, pesou muito sua visão internacionalista, de que a revolução russa seria o ponto de partida da revolução socialista européia. Quando a União Soviética participou das negociações de Yalta, Teerã e Potsdam, pesou mais a visão nacionalista do PC Soviético.
Poderíamos prosseguir com os exemplos, mas é evidente que existe uma contradição potencial entre os interesses “nacionais” e “internacionais” da classe trabalhadora.
A Opção não faz esta distinção e, pior ainda, renuncia assumida e conscientemente a ter um “projeto”, uma perspectiva estratégica internacional. Segundo o livro, é “no espaço nacional que se podem definir metas claras, utilizar elementos de planejamento para alcançá-las e tratar seriamente a questão social; nele podem operar instituições democráticas abrangentes, aptas a formar uma vontade coletiva, forte o bastante para contrariar a marcha da insensatez. Nem o espaço local nem o global permitem que isso se dê. O primeiro é pequeno demais, fragmentado demais, e vive imerso no tempo curto de demandas imediatas sempre renovadas. O segundo é grande demais, complexo demais, pontuado pelo tempo longo das transformações muito lentas; como não tem instâncias que expressem a cidadania, reduz todas as relações humanas a relações de mercado. Embora sejam legítimas, as visões local e global, se predominarem, condenam a ação política a diferentes formas de impotência. Faltam, às duas, instituições decisivas.”
Não deixa de ser curioso encontrar quem diga, num século marcado por enormes e rápidas transformações de escopo internacional, que o espaço global é pontuado pelo “tempo longo” das transformações “muito lentas”. Mas sigamos adiante:
“É, antes de tudo, no âmbito da nação — pelo menos, de algumas nações — que as comunidades humanas atuais encontram a possibilidade de fazer história, ou seja, de viver em um tempo orientado, operando em um espaço suficientemente amplo para ensejar transformações profundas, e suficientemente manejável para torná-las viáveis. É nesse âmbito que nosso povo pode viver de acordo com suas tradições, suas regras e seus objetivos, fazendo aflorar suas potencialidades, que devem somar-se ao patrimônio geral da humanidade. É compartilhando essa identidade que pessoas distantes e desconhecidas, espalhadas por um vasto território, podem sentir-se solidárias umas com as outras e responsáveis por um destino comum, condição para que a barbárie não prospere”.
            A Opção considera que as visões “local” e “global” condenam a ação política à impotência, não percebendo que, no mundo atual, as vezes o “nacional” equivale ao “local”.
O internacionalismo sem base nacional é impotente (basta ver o que ocorreu com o trotskismo, com raríssimas exceções). Mas o nacionalismo sem projeto internacional também pode ser impotente, isto quando ele não se torna perigoso, como já vimos em algumas revoluções socialistas que sofreram desvios chauvinistas e tentaram impor ao movimento socialista o seu interesse particular, como sendo o interesse geral da classe trabalhadora do mundo.
Mas será possível construir um projeto e uma ação internacionais? A resposta começa a aparecer quando colocamos de ponta-cabeça o raciocínio exposto na Opção brasileira:
Se o “espaço nacional” é uma construção social e, “como toda idéia simultaneamente real e imaginária, a nação precisa ser permanentemente reinterpretada e recriada”, o que impede que construamos socialmente um “espaço internacional”?
Não é preciso “inventar” uma sociedade internacional. Essa sociedade existe, e não se manifesta apenas nas guerras e crises econômicas. Ela é um dos produtos da expansão capitalista dos séculos XIX e XX. É a base real que devemos tomar como ponto de apoio para um projeto internacional.
Se só “algumas nações” podem “fazer história”, então existiriam outras nações que não podem fazer história, são inviáveis.... O que os socialistas brasileiros têm a oferecer a estes países? Nada? Ou devemos oferecer um projeto internacional? Ou será que, no final do século XX, nosso “projeto” será mais tímido do que o de Bolívar? Por que aceitar como eterna a “inexistência de instâncias que expressem a cidadania, em escala internacional”? Por que achar que a ação internacional é impotente? Foram impotentes as “marchas contra a Europa do capital”?? São impotentes os encontros intercontinentais pela humanidade e contra o neoliberalismo??? É impotente a Via Campesina?? Foram impotentes as campanhas internacionais pela redução da jornada de trabalho? Por quais motivos é só no âmbito da nação, “que pessoas distantes e desconhecidas, espalhadas por um vasto território, podem sentir-se solidárias umas com as outras e responsáveis por um destino comum, condição para que a barbárie não prospere”? Por quais motivos estas palavras e estes objetivos não podem realizar-se em âmbito mundial?
Em defesa da Opção, vale dizer que nos tempos atuais até mesmo os trotskistas estão sofrendo uma forte influência nacionalista. O PSTU adotou a tese da "recolonização". Um dos principais dirigentes de O Trabalho (Daniel Gluckstein) sintetiza a fase atual da luta de classes como de "destruição das forças produtivas e cuja forma concentrada é a desagregação das nações”. Para Glukstein, "não há qualquer assimilação entre defesa da Nação, da soberania nacional, e o nacionalismo".
            Acontece que a história do movimento socialista no século XX está cheia de exemplos em que a defesa da soberania nacional transformou-se em nacionalismo. O problema está em que, partindo de uma mesma e justa afirmação — “o combate pela emancipação da classe operária não pode desenvolver-se no quadro de uma nação submetida” — pode-se concluir duas coisas diferentes: a de que primeiro luta-se pela emancipação nacional, para depois se lutar pela emancipação social; ou a de que se faz as duas coisas juntas.
É exatamente na primeira alternativa que reside o maior risco da “luta pela soberania nacional” transformar-se em “nacionalismo”.
            O ideário explicitado por A opção brasileira não constitui uma alternativa ao ideário nacional-desenvolvimentista, hegemônico no PT e na esquerda brasileira. Constitui uma tentativa, e nesse sentido merece todos os elogios. Mas uma tentativa que recauchuta conceitos que já eram equívocos nos anos 50 e 60. Revelando que algumas tentativas de superar o PT padecem do mesmo problema das organizações que buscavam superar o velho PC: capazes de uma profunda crítica tática e sobre as formas de luta e acúmulo de forças, não conseguiram superar os marcos teóricos da alternativa democrática e nacional.
Nossa crítica às posições nacionalistas presentes na Opção brasileira, feita ao longo dos últimos anos e acompanhada da crítica de outros companheiros, certamente influenciou segmentos da Consulta Popular a rever suas posições, a realçar o caráter socialista de seu programa ou a minimizar aspectos inaceitáveis, como a expectativa no apoio das Forças Armadas a um projeto popular.
Saudamos este progresso, embora ainda não tenhamos visto em nenhum lugar uma autocrítica formal e explícita das posições presentes na Opção; ao mesmo tempo em que vemos um reforço de aspectos verde-amarelos na "mística" tradicional das atividades da Consulta.
            Mas nossa crítica à Consulta Popular não se resume a questão programática. Ela se estende, também, a dois temas sobre os quais, até onde sabemos, não existe nenhum documento oficial da Consulta: as questões estratégicas e partidárias.
            Evidentemente, a Consulta Popular pode argumentar que não lhe cabe --uma vez que não se pretende um partido, nem se pretende concorrente ou alternativa ao PT-- elaborar sobre ambos os temas. Mas embora respeitemos a opinião que os companheiros têm sobre si mesmos, consideramos que a atividade prática que a Consulta desenvolve é de natureza para-partidária.
Ou seja: quando se reúnem militantes (não massa, mas militantes), para discutir um programa (não uma pauta de reivindicações, mas um programa), para formar quadros em torno de temas histórico-estratégicos e para discutir organizadamente ações comuns, é evidente que estamos diante de uma organização para-partidária, mesmo que não se assuma como tal.
            Um movimento social pode ter algumas destas características e continuar sendo um movimento social. É o caso do MST, que tem na luta pela reforma agrária e por outra política agrícola o "lastro" que mantém seu caráter de massa e de movimento social.
            Um grupo de movimentos sociais pode se articular para desenvolver ações comuns. É o caso da Central de Movimentos Populares, do Fórum Nacional de Lutas etc. Mas são articulações entre movimentos, não articulação de militantes.
            A Consulta Popular não é um movimento social, tampouco uma articulação de movimentos sociais. Trata-se de uma articulação de militantes, reunindo petistas e não-petistas. Mas não se considera, nem se pretende, nem se apresenta como um partido. Naturalmente, as pessoas e as organizações não são apenas o que pensam que são.
            Consideramos que a contradição entre o que a Consulta é, e o que ela pensa ser, é produto, por um lado, da incompetência do PT, em particular da esquerda petista, que não ofereceu espaços orgânicos para a militância cotidiana. O que leva muitos militantes do PT a buscar espaços coletivos que organizem sua militância cotidiana. Nesse sentido, nossa crítica à Consulta é antes de mais nada uma autocrítica.
Mas consideramos, também, que a indefinição sobre o caráter da Consulta serve, ao menos para parte dos seus impulsionadores, como biombo para esquivar-se de travar de maneira clara o debate acerca da questão partidária. Debate que implica em responder ao seguinte: o PT é o partido estratégico dos que lutam pelo socialismo no Brasil (ou, pelo menos, um dos partidos estratégicos), ou "adaptou-se ao regime", como gostam de dizer os dirigentes do PSTU?
            Afirmar que "o PT por hora segue sendo um instrumento necessário para chegar ao socialismo", fazer um balanço profundamente negativo do II Congresso do PT e não definir "qual a relação que devemos ter com o PT" significa, em linguagem popular, que não se deve acender vela boa para defunto ruim.
            Em nossa opinião, esta atitude expectante frente ao PT constitui uma política irresponsável. Cada militante que se descomprometeu com as assembléias que elegeram delegados ao II Congresso, por achar que o Partido não vale o esforço, que o importa é "a luta", é indiretamente responsável pela derrota do Fora FHC.
É preciso interromper a complacência com este tipo de atitude irresponsável, esquerdista, que considera "internismo e burocracia" a luta pelos rumos do PT. Comportamento que, de uma maneira geral, só faz sentido para aqueles que desconhecem a importância de um partido, que consideram que todo partido é burocrático por definição, que acham que a "ação" é tudo e o Partido, nada.
A idéia segundo a qual "o movimento é tudo, o partido é nada" --faz o jogo de setores da direita petista, que preferem que a esquerda constitua um novo partido.
Evidentemente, nossa crítica não se estende a todos os militantes da Consulta Popular. Mas é preciso fazê-la, com absoluta clareza, para que venha a luz a posição de segmentos expressivos e talvez hegemônicos da Consulta.
A Opção brasileira tem ares de programa, mas silencia acerca da estratégia e do partido. Um programa sem estratégia e sem partido é algo em si inquietante. A luta política, os movimentos táticos e estratégicos, a análise de conjuntura, não são diretamente dedutíveis das "grandes tendências" do processo histórico. Muito menos quando se desconhece a estrutura de classes da sociedade brasileira, reduzindo-a a apenas dois blocos: a "elite" e o "povo".
Visão simplista que certamente tem dificuldades em entender como o atual presidente da UDR pode criticar FHC por "entregar o país aos norte-americanos"; por que os grandes banqueiros brasileiros combatem a internacionalização do sistema financeiro nacional; por que a Ambev se apresenta como "multinacional verde-e-amarela" etc.
            As resoluções da Articulação de Esquerda desenvolvem nosso ponto de vista sobre as questões estratégicas e partidárias. Aqui gostariamos de destacar apenas duas questões fundamentais: o comportamento dos trabalhadores assalariados e o papel fundamental da chamada luta institucional no atual período histórico.
O peso do PT na sociedade brasileira, assim como seus problemas, estão intimamente vinculados a estas duas variáveis. Foram os assalariados, especialmente os operários, que hegemonizaram o processo de criação do Partido; e foi o impacto do neoliberalismo sobre esta classe que abriu passo à direitização partidária.
A relativa moderação dos assalariados, ao longo dos anos 90, moderação levada ao paroxismo pela maioria da direção da CUT, fez ressurgirem as teorias que prognosticam o papel "ontologicamente reformista da classe operária" e clamam por "outra classe" para vanguardear a luta pelo socialismo. Para Jacob Gorender, seriam os intelectuais. Para setores da Igreja Católica, mas também para Cristovam Buarque, os "excluídos". Para James Petras, o "novo campesinato" e assim por diante.
Em nossa opinião, entretanto, não haverá revolução socialista no Brasil, se não colocarmos em movimento a maior parte dos trabalhadores, que são assalariados e urbanos. E que, na sua maioria, estão empregados, na produção.
Os métodos políticos e organizativos necessários para mobilizar estes setores não são idênticos aos utilizados na luta do campo.
O descenso da mobilização dos trabalhadores assalariados urbanos, nos anos 90, teve como contraponto um lento mas persistente progresso eleitoral das esquerdas. Este fato constitui um bálsamo para a direita petista, e um anátema para a ultra-esquerda. Para nós, tem um duplo sentido: por um lado, a transformação do PT numa força institucional constituiu um obstáculo à ofensiva neoliberal; por outro lado, aprisionou nosso o partido, e grande parte da esquerda, no "beco eleitoral".
Não se sai deste beco negando a luta institucional, nem tampouco, como é óbvio, adaptando-se. Mas sim levando-a a suas últimas consequências.
A solução para os dois problemas --a passividade do mais importante setor da classe trabalhadora e a hegemonia do eleitoralismo na ação do partido mais importante da esquerda-- exige respostas mais complexas do que a mera "mobilização". Como se viu na greve dos professores do Rio Grande do Sul, existem contradições entre os lutadores do povo, que só podem ser equacionadas no terreno da ação político-partidária. E como se vê nas últimas semanas, um crescimento da mobilização popular não cria, num passe de mágica, as condições necessárias para a troca da via institucional pela via insurrecional.
Em qualquer dos casos, a questão fundamental que precisa ser respondida é se a existência do PT, e a existência de um PT com uma forte esquerda no seu interior, é um obstáculo ou uma alavanca para a solução daqueles dois problemas estratégicos, bem como para os problemas táticos cotidianos da luta de classes no Brasil.
Esta questão, como é óbvia, não pode ser respondida senão na prática. E é na prática que os ataques de ultra-esquerda ao PT são total inconseqüência, uma vez que ajudam, pela omissão, a que prevaleça no Partido a posição moderada.

Este texto, apresentado por Valter Pomar (SP) na III Conferência Nacional da AE, foi remetido para debate interno no conjunto da AE, pela Conferência.