A direção nacional da tendência petista
Articulação de Esquerda, reunida nos dias 27 e 28 de janeiro de 2018, em Recife
(PE), aprovou a seguinte análise da situação política, acompanhada de diretrizes
para nossa militância.
1. A condenação
em segunda instância do presidente Lula, no dia 24 de janeiro de 2018,
e a nova
tentativa de aprovar a reforma da previdência, prevista para o dia 19
de fevereiro, indicam que entramos em uma nova
etapa da ofensiva das forças golpistas contra as liberdades democráticas,
os direitos sociais e a soberania nacional.
2. Os
partidos de esquerda, os sindicatos e os movimentos sociais devem entrar em estado
de alerta máximo. O que ocorrer nas próximas semanas impactará não
apenas as eleições presidenciais de 2018, mas também definirá em que marcos vai
transcorrer a luta política e social nos próximos anos, em nosso país e com
fortes repercussões internacionais.
3. Ao
condenar Lula por unanimidade, ao ampliar a pena proposta pelo juízo de Curitiba
e ao revelar uma atuação absolutamente coordenada dos três desembargadores, o
TRF 4 surpreendeu apenas quem ainda mantinha expectativas em saídas jurídicas.
4. Seguindo
na mesma linha, na noite da quinta-feira 25 de janeiro veio a absurda apreensão
do passaporte de Lula e a consequente proibição da viagem de dois dias que ele
faria a Adis Abeba, sede da União Africana (UA).
5. Lula participaria, a convite da FAO/ONU, da
conferência semestral da UA, que reúne os presidentes dos 54 países do
continente. Na conferência, Lula comporia uma mesa formada por ex-presidentes
africanos. Essa decisão constitui um claro atentado ao simples direito de ir e
vir e contribui para a campanha pela prisão de Lula, campanha intensificada
ferozmente pela grande mídia nestes últimos dias, em especial por intermédio de
três revistas semanais golpistas.
6. Quando
dissemos, há alguns anos, que precisávamos de um “partido para tempos de
guerra”, esta afirmação foi vista por muitos setores como uma imagem retórica
exagerada. Hoje está claro que está em curso uma guerra; e como não nos
preparamos coletivamente para ela, estamos até agora sendo surpreendidos e
derrotados.
Abandonar as ilusões
7. Neste
sentido, a recente condenação do presidente Lula, no julgamento em segunda
instância realizado pela oitava turma do Tribunal Regional Federal da 4ª
região, precisa marcar o fim de todas as ilusões. Por
exemplo, as ilusões acerca de “até onde o lado de lá está disposto a ir” nesta
guerra. Está evidente que, para eles, trata-se de uma guerra de extermínio
contra o que consideram ser uma “organização criminosa”, estando em pauta cassar
a legenda do Partido dos Trabalhadores, condenar e prender o maior número
possível de seus líderes, criminalizar a luta social e estigmatizar o
pensamento de esquerda. Neste sentido, o objetivo vai muito além de impedir que
Lula dispute a eleição presidencial de 2018.
8. Falamos,
também, das ilusões acerca de “aproveitar as contradições no seio das forças
golpistas”. Claro que estas contradições existem, expressando-se em diferentes
pré-candidaturas presidenciais, em diferentes visões acerca do ativismo
judicial, em maior ou menor disposição de aplicar todos os itens do programa
neoliberal “Ponte para o Futuro”. Claro que devemos explorar toda e qualquer
contradição existente do lado de lá. Mas não devemos acreditar que estas
contradições sejam de monta a impedir que, por ação ou por omissão, o conjunto das
forças golpistas contribua na guerra de extermínio contra o PT.
9. Por
decorrência, é muito reduzida a possibilidade de fazer alianças com setores de
centro-direita e direita, em defesa da democracia e contra o fascismo. Eventuais
alianças com lideranças vinculadas a partidos que participaram do golpe e/ou
que apoiaram as medidas golpistas —
como é o caso do combativo senador Requião, abrigado no golpista PMDB — são casos excepcionais, cabíveis apenas em
situações como a citada, quando não contribuem para confundir nossas forças e
diluir nossa crítica. Por isto, embora alguns insistam em falar em “frente
ampla” e “aliança de centro-esquerda”, nosso esforço real deve ser o de
construir uma aliança da esquerda política e social, ou seja: com aqueles que
lutaram contra o golpe, contra as medidas golpistas e batalham pela sua
reversão.
10. Aqueles
setores do Partido que insistem em fazer alianças com partidos golpistas, em
eleições estaduais e proporcionais, acreditando que isto nos ajudaria a
preservar espaços institucionais, erram triplamente: a) nos deixam vulneráveis
a movimentos de “traição” mais do que anunciada, traição que pode ocorrer antes
ou depois da eleição; b) enfraquecem nossa crítica ao golpismo, geram confusão
em amplos setores da nossa base social e rebaixam nosso programa, especialmente
ali onde apoiamos candidaturas que se comprometeram não apenas com o
impeachment, mas também com as “reformas” golpistas; c) reduzem nossa
possibilidade de construir a unidade das forças de esquerda. Por isso,
reafirmamos: petista não se alia com golpista. Nossas alianças devem ser com
quem combateu o golpismo, rejeita as medidas golpistas e defende sua revogação.
11. Mais
do que reduzida, é nula a possibilidade de seduzir setores do grande
empresariado com promessas de que nosso regresso ao governo traria de volta os
bons tempos de “crescimento” e a “paz social”, verificados supostamente em alguns
anos dos governos nacionais petistas. O grande empresariado é o principal autor
do golpe, seu mandante e fiador. Como se percebe em todo o mundo, o grande
capital, especialmente o financeiro, não tem medo da recessão, do desemprego,
da crise social. Pelo contrário, estimula tudo isto.
12. Aliás,
o grande empresariado lutou contra os poucos aspectos progressistas existentes
na Constituição de 1988. O PT optou por não votar no texto final daquela
Constituição, por considerar que ele traduzia uma hegemonia de centro-direita.
As forças de centro e de direita criticaram o PT por isto, mas foi esta mesmo
centro-direita que operou para desfigurar o que havia de progressista na
Constituição de 1988, sob a acusação de ela deixaria o país "ingovernável",
especialmente porque constitucionalizava certos direitos sociais. Durante os
governos Collor, Itamar e Fernando Henrique, fizeram de tudo para descumprir e
reformar a Constituição. E se insurgiram contra os governos petistas, que no
fundamental se dedicaram a materializar os dispositivos constitucionais de 1988.
Sendo assim, o golpismo não se deixará sensibilizar por discursos que denunciem
a quebra do “pacto constitucional” de 1988. O lado de lá nunca quis pacto. E
não será agora, em que estão na ofensiva, que vão respeitar aquelas fronteiras.
13. Mais
que um rebaixamento programático, é pura perda de tempo a operação que fazem
alguns, de tentar reescrever a história de nosso partido. Somos, certamente, um
partido que lutou e luta sem tréguas pela democracia. Mas também somos um
partido que lutou e luta pelo socialismo, pelo bem estar social das amplas
massas, por uma democracia substantiva, algo que o grande capital e seus
aliados não aceitam. Reafirmar este sentido concreto da nossa luta pela
democracia é decisivo, porque será em torno desta luta que reconquistaremos o
apoio da maior parte da classe trabalhadora. E não em torno da defesa do
suposto “Estado Democrático de Direito”, que como se vê tem significados
distintos a depender da correlação de forças e da classe social de onde provém
o réu. Aliás, para a grande maioria do povo brasileiro, o chamado Estado Democrático
de Direito sempre foi uma ficção.
14. Outra
ilusão que devemos abandonar diz respeito à superestimação de nossas próprias
forças. Fomos vitoriosos em quatro eleições presidenciais seguidas. Mas não
conseguimos impedir o golpe. Não conseguimos impedir a aprovação, no Congresso,
de importantes medidas antinacionais e antipopulares
— embora tenhamos conseguido impedir a
votação e aprovação da primeira proposta golpista relativa à Previdência. Não
conseguimos impedir a condenação de Lula em segunda instância. E não temos
conseguido impedir o crescimento do conservadorismo político e ideológico,
inclusive em setores importantes da juventude e da classe trabalhadora.
15. Claro
que devemos valorizar nossa resistência, nossa capacidade de mobilização, o
apoio popular que se revela nas pesquisas de intenção de voto. Mas é preciso
reconhecer que nada disto foi suficiente, até agora, para derrotar a ofensiva
golpista. Ofensiva que, sempre é importante destacar, usa e abusa de instrumentos
que deixamos intocados — como as Polícias Militares e o oligopólio da comunicação — e
também de instrumentos que criamos e fortalecemos, por exemplo, ao conceder
amplo protagonismo e autonomia ao Ministério Público Federal e à Polícia
Federal, ou ao endossar legislações como a “Lei da Ficha Limpa” (que quase toda
a esquerda apoiou sem se dar conta do que implicava) e a “Lei Antiterrorismo”,
esta última na contramão dos movimentos sociais e do próprio PT.
16. Mesmo
no terreno eleitoral, não devemos superestimar nossas forças. Lula lidera as
pesquisas, mas a maior parte do eleitorado ainda não tem candidato. E não se
deve minimizar o desgaste causado por anos de propaganda negativa. Além disso,
caso ao fim e ao cabo prospere a interdição eleitoral de Lula, a esquerda
brasileira como um todo e o PT em particular enfrentarão um dilema de difícil
solução.
Eleição sem Lula é fraude
17. Este
dilema está resumido na palavra-de-ordem eleição sem Lula é fraude. O
problema se colocará caso a direita leve até o fim seu propósito de impedir que
Lula seja candidato às eleições presidenciais de 2018. Neste caso, haveria fundamentalmente
duas alternativas no que diz respeito às eleições presidenciais: ou participar
de uma eleição que consideramos fraude, no caso apoiando outra
candidatura à presidência; ou manter a candidatura de Lula, mesmo que seu nome
não apareça na urna eletrônica.
18. Embora
não haja nenhum debate oficial a respeito, já há quem defenda que, se Lula for
impedido de participar, ele poderia e deveria apoiar outra candidatura
presidencial. Esta posição, além de
legítima, é bastante simples de explicar para o povo e para uma esquerda que se
acostumou a priorizar os processos eleitorais. Entretanto, esta posição contém alguns
problemas que devem ser apontados e debatidos.
19. O
primeiro destes problemas é: seria possível, para uma esquerda que ainda não se
unificou em torno da candidatura Lula, se unificar em torno de outra candidatura?
O segundo destes problemas é o seguinte: seria possível, para a esquerda,
vencer as eleições presidenciais de 2018 com outra candidatura que não a de
Lula? Tudo indica que a resposta para estas duas questões é não.
20. Nesta
conjuntura não vemos como outra candidatura seria capaz de vencer as próximas eleições
presidenciais, mesmo que tenha o apoio explícito de Lula. É verdade que outra
candidatura presidencial poderia acumular forças para seu próprio partido ou
frente, poderia travar o debate político, denunciar a fraude, receber parte dos
votos de nosso eleitorado e potencializar as respectivas candidaturas aos
governos estaduais, Senado, Câmara e Assembleias Legislativas.
21. No
campo da luta contra o golpe, também existem – até agora -- as candidaturas
presidenciais do PCdoB, do PSOL e do PDT. Se mantidas, mesmo que denunciem
publicamente a fraude, mesmo que venham a
assumir explicitamente uma postura de “anticandidatura”, ao participar das
eleições presidenciais estariam obviamente participando de um processo que
consideramos ser e que dissemos publicamente que seria uma fraude. Portanto,
estaríamos em alguma medida legitimando um dos principais aspectos do golpe: a
interdição de Lula. Por tudo isto, nossa opinião sobre o tema é
a mesma posição que o PT aprovou em 16 de dezembro de 2017, ou seja: não há
“plano B”. Disto decorre que Lula é nosso candidato, em qualquer cenário.
22. Achamos
correto defender esta posição, não por razões morais, mas por razões políticas:
caso a situação evolua no sentido da fraude, manter a candidatura Lula nos
posicionará melhor para enfrentar o próximo governo da direita. Certamente não
se trata de uma decisão fácil. Razão pela qual consideramos necessário que o
assunto seja debatido, levando em consideração todos os desdobramentos que essa
questão tem para o futuro da esquerda e da classe trabalhadora brasileira.
23. Lembremos
que para as forças golpistas de centro-direita e direita, para o oligopólio da
mídia, para a cúpula do sistema judiciário e das Forças Armadas, para o grande
capital especialmente financeiro, é absolutamente inaceitável que a esquerda
possa voltar a governar o Brasil. Por isso “escalaram”: do impeachment foram
para a condenação de Lula, agora estão se preparando para sua prisão, e se
necessário for recorrerão a medidas ainda mais extremas, como a cassação da
legenda do PT, o adiamento das eleições, a mudança no regime político e a
intervenção militar aberta.
24. Abandonar todas as ilusões é uma premissa
para sobreviver e vencer a guerra que está em curso. Cabe, inclusive, abandonar
as bravatas. Temos a obrigação política de “escalar” nossa resistência, como
aliás tínhamos a obrigação de ter desencadeado ações
diretas após a sentença do TRF4. Mas se esta orientação não for acompanhada de
uma mudança no funcionamento de nossas organizações, se nossa “escalada” se
limitar aos discursos exaltados, e principalmente se nossa ação não tiver base
de massa, colheremos como resultado mais e mais derrotas. E quem se
beneficiaria destas eventuais derrotas, além da direita, seriam aqueles que nos
querem mais domesticados, linha auxiliar de forças de centro e portadores de um
discurso mais preocupado em acalmar do que em derrotar os “mercados”.
Contra-atacar em três frentes
25. A
condenação em segunda instância do presidente Lula confirma algo que dissemos
desde o primeiro momento: setores do golpismo estão dispostos a condenar e
prender Lula, assim como estão dispostos a cassar a legenda do Partido dos
Trabalhadores.
26. A
cúpula do sistema judiciário está majoritariamente comprometida, por ação ou por
omissão, com esta operação. Portanto, embora devamos usar todos os mecanismos
jurídicos que estão à nossa disposição (embargos de declaração, recurso
especial ao STJ, agravo junto ao STF etc.), é preciso ter consciência de que por
mais competente que seja, a simples defesa jurídica não será capaz de retardar e/ou
reverter a decisão de condenar e prender o presidente Lula.
27. O
mesmo raciocínio vale para o registro da candidatura Lula junto ao TSE. É
verdade que toda a jurisprudência e toda a legislação garantem o direito de
Lula concorrer às eleições presidenciais; assim como é evidente que, em
condições normais, o julgamento em última instância deste caso só ocorreria
depois das eleições presidenciais.
28. Entretanto,
como já dissemos e a vida já demonstrou diversas vezes, a cúpula do sistema judiciário está majoritariamente comprometida com o
golpe e fará valer as interpretações, os prazos e os expedientes que forem
necessários para impedir não apenas que Lula possa ser votado pela população,
mas inclusive que sua voz possa ser ouvida.
29. A
decisão de condenar e prender o presidente Lula tem como principal motivo
evitar o risco de uma vitória petista nas eleições presidenciais de 2018. Risco
evidenciado nas pesquisas de opinião, que apontam Lula em primeiro lugar.
Portanto e paradoxalmente, se Lula viesse a cair nas intenções de voto e/ou se
uma candidatura golpista viesse a assumir liderança folgada na eleição
presidencial, também seria mais fácil retardar ou até mesmo reverter a operação
em curso. Mas neste caso, não estaríamos diante de uma vitória, mas sim de uma
derrota.
30. Do
que foi exposto, concluímos que somente a luta política pode retardar e/ou
reverter a decisão de prender o presidente Lula e garantir que ele possa concorrer
às eleições presidenciais.
31. Entretanto,
a luta política que travamos até agora não foi intensa o suficiente para
impedir o impeachment e a condenação. Vale dizer que as mobilizações em torno
do 24 de janeiro foram afetadas pelas ilusões em um resultado “menos ruim”,
motivo pelo qual não se articularam ações diretas para reagir à injustiça. As
mobilizações também foram afetadas pelas diferenças de orientação quanto à
geografia das mobilizações: se deveríamos nos concentrar em Porto Alegre ou se
deveríamos fazer uma mobilização nacional.
Mas o principal problema é que as mobilizações foram basicamente da
militância, não envolvendo grandes setores do povo que nos apoia. Por isso, embora
os atos de Porto Alegre e São Paulo tenham sido expressivos, com destaque para
a participação da juventude, a reação às decisões do TRF4 foi inferior à
necessária. Este mesmo nível de mobilização não será o suficiente para impedir
a prisão e a inelegibilidade.
32. Sendo
assim, é preciso tomar medidas para ampliar a intensidade da luta política, em
três terrenos: na defesa do presidente Lula e do PT, na campanha eleitoral e na luta
social.
Defender o presidente e o PT
33. No
que diz respeito à defesa do presidente Lula, embora haja pelo menos seis outros
processos em curso, o mais importante e urgente é desmascarar a ilegalidade e a injustiça
da condenação adotada pelo TRF4; e tomar medidas práticas para enfrentar a
tentativa de prisão.
34. Não
se deve subestimar o efeito negativo da condenação sobre o estado de ânimo da
militância e de nossas bases sociais e eleitorais; nem se deve subestimar o
efeito positivo que a condenação teve sobre o estado de ânimo do eleitorado e
da cúpula das forças golpistas.
35. Para
enfrentar esta situação, o Partido dos Trabalhadores decidiu produzir e
distribuir dezenas de milhões de exemplares de um panfleto nacional unificado,
falando sobre a condenação, sobre a defesa da aposentadoria e sobre a
candidatura de Lula.
36. A
acusação que deu origem ao processo do tríplex afirmava que Lula era
proprietário de um apartamento no Guarujá. A acusação afirmava, também, que
este apartamento teria sido dado como parte das propinas resultantes de três
contratos firmados entre a Petrobrás e a OAS. Pois bem: nenhuma das duas afirmações
mostrou-se verdadeira. O apartamento não é, nem nunca foi de Lula. E como
confessou o próprio juízo de Curitiba, não há relação entre os contratos e o
apartamento.
37. De
nossa parte, faremos um panfleto nacional que, além de explicar a injustiça e ilegalidade
da condenação aprovada pelo TRF4, vinculará a defesa de Lula e de sua
candidatura com a convocatória do povo para mobilizar-se imediatamente CONTRA
O FIM DA APOSENTADORIA.
38. A
distribuição deste e de outros panfletos é uma das tarefas que podem vir a ser
assumidas pelos comitês populares em defesa da democracia e do direito de Lula
ser candidato. Cabe a estes comitês, também, informar a população tanto acerca
da possibilidade de Lula ser preso, quanto para reagir caso esta possibilidade
se materialize.
39. Denunciar
o risco de prisão é necessário, assim como teria sido necessário denunciar a
condenação certa pelo TRF4. Iludem-se os que acreditam que é negativo, tanto do
ponto de vista da comunicação, quanto do ponto de vista político e jurídico,
antecipar a ação dos inimigos.
40. Até
porque, caso os golpistas levem adiante a intenção de prender o presidente
Lula, é preciso opor resistência física, cívica e popular. As fardas e as togas, quando são utilizadas
para cometer ilegalidades e injustiças, não merecem respeito. Neste sentido,
devemos apresentar desde já a prisão como um caso de sequestro.
41. Caso
a prisão se consuma, é preciso deflagrar uma campanha nacional e internacional
pela imediata soltura, campanha que deve ser acompanhada de cerco
popular ao local do sequestro, assim como de medidas de desobediência
civil e ação direta em todo o país. Reiteramos que, nesta conjuntura, a
rebelião popular é não apenas algo justo, mas imprescindível. Vale dizer,
aliás, que estamos falando de insubordinação contra aqueles que estão rompendo
com os preceitos constitucionais.
42. Se não tiver base de
massas e não for orientada por uma linha política correta, a
radicalização das formas de luta — embora justa e necessária — pode
conduzir não apenas à repressão, mas também a certo isolamento dos setores mais
combativos, além de fornecer mais pretextos para que os golpistas atinjam
outras lideranças da esquerda política e social e procurem criminalizar e se
possível ilegalizar partidos e movimentos comprometidos com a resistência. Mas,
como muito
pior seria a prostração e desmoralização causada pela inação, devemos nos
empenhar em construir ações mais combativas, com base de massa e linha política
correta.
43. Neste
mesmo espírito, nossos governadores devem ser convocados a agir. Se o governo
Temer é golpista e ilegítimo, se estão rompendo a Constituição de 1988 e
atropelando a legalidade, cabe aos nossos governadores combinar discurso com
ações práticas, mesmo que simbólicas, em defesa da democracia. Aqui cabe
lembrar que o então governador gaúcho Leonel Brizola, que depois da renúncia do
presidente Jânio Quadros mobilizou o Rio Grande do Sul e o Brasil para garantir
a posse de João Goulart, articulando o apoio de setores democráticos do
Exército e da Brigada Militar, contribuindo para ativar a rede de rádios
conhecida como a “Cadeia da Legalidade” e apostando em derrotar o golpe através
da mobilização do povo. Também podemos citar a atitude do governador mineiro Itamar
Franco, quando o então presidente Fernando Henrique tentou privatizar a Cemig.
Itamar não apenas travou um debate público como também mandou a Polícia Militar
de Minas Gerais defender a empresa, inclusive com atiradores de elite. Embora
marcadamente teatral e nesse sentido muito distinto do que fez Brizola em 1961,
a atitude de Itamar foi importante para o debate político e para a defesa da
estatal mineira.
44. Igualmente
nossos parlamentares devem mudar sua atitude no Congresso nacional, adotando
cada vez mais práticas extraordinárias para impedir a aprovação das contrarreformas.
E nossas pré-candidaturas às eleições proporcionais e majoritárias devem ser
convocadas a mudar de atitude, compreender que nossa participação nas eleições
de 2018 será muito diferente das eleições anteriores. Até porque é preciso ter
claro que um setor do golpismo está disposto a não apenas demonizar
midiaticamente e estrangular financeiramente, mas também disposta a processar e
prender outros dirigentes partidários, cassar e tirar de cena a legenda do
Partido dos Trabalhadores.
45. O
antídoto para o risco de isolamento não é a passividade, mas sim a adequada
combinação entre a luta em defesa do presidente e do PT, com a campanha
eleitoral e com a luta social. Há uma relação direta entre a condenação e
prisão de Lula, e a continuidade da aplicação do programa golpista. E também há
uma relação direta entre a eleição de Lula e a revogação das medidas golpistas,
como a reforma trabalhista. Ou seja: defender Lula e o PT é também defender os
direitos da classe trabalhadora.
Intensificar a campanha eleitoral
46. As
caravanas e, de maneira geral, as atividades em que o presidente Lula está
presente são até o momento e devem continuar sendo um de nossos principais
mecanismos de mobilização e esclarecimento da população. Por isto mesmo, aliás,
um setor importante do golpismo está disposto a sequestrá-lo: para calar a
principal voz que temos para dialogar com os setores populares.
47. Entretanto,
no próximo período, além das caravanas, será necessário que a campanha adquira
cada vez mais autonomia em relação à presença física do presidente. Neste
espírito, é necessário constituir “comitês pró-Lula presidente” em todo o país.
De preferência, devemos partir para isto dos comitês já existentes em defesa da
democracia e do direito de Lula ser candidato.
48. Uma
mesma linha política – de enfrentamento ao golpe, às políticas golpistas e em
favor de sua revogação -- deve orientar nossas candidaturas a presidente,
governador, senado, Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas.
49. Não
questionamos o direito de outras candidaturas de esquerda e centro-esquerda
disputarem a eleição presidencial. Mas nossa opinião política é que, na atual
conjuntura, em especial após a decisão do TRF4, interessa aos golpistas que
haja várias candidaturas presidenciais no campo de centro-esquerda, pois isto
não os ameaça eleitoralmente. Além disso, passaria a impressão de que vivemos
numa situação de normalidade institucional.
50. Na
perspectiva de unificar as forças da esquerda, buscaremos garantir que todas elas
—
inclusive as que possuem ou pretendem lançar candidaturas próprias à
Presidência da República — participem do máximo de atividades conjuntas, com destaque
para o debate do programa que apresentaremos para as eleições deste ano.
51. Este
programa deve ter como fio condutor a revogação das medidas adotadas pelos
golpistas, bem como a convocação de uma Assembleia Constituinte e um programa
de emergência para viabilizar o crescimento, gerar empregos e retomar as
políticas sociais. Portanto, medidas que não têm como objetivo “acalmar o
mercado”, mas sim submeter “o mercado” às necessidades da maioria da população.
Algo diferente, portanto, da “Carta aos Brasileiros” de 2002.
52. Para
garantir isto, é preciso impedir que o processo de elaboração do nosso programa
de governo seja capturado por aqueles que, no passado recente, defenderam o
superávit primário, a reforma da Previdência e o giro ortodoxo praticado em
2015.
Ampliar a luta social
53. É
essencial derrotar a contrarreforma da Previdência. Primeiro, pelo impacto terrível
que esta “reforma” teria sobre a população pobre e trabalhadora. Segundo,
porque uma eventual aprovação significaria nova vitória da ofensiva
conservadora, antecipando outras. Quem defende Lula também se mobiliza contra a
“reforma” da Previdência. Até porque, se aprovada, terá que ser revogada.
54. O
melhor instrumento para derrotar a reforma da Previdência é uma greve geral, à
semelhança da que fizemos em 28 de abril. Não devemos subestimar as
dificuldades de realizar uma greve geral. Mas é preciso que a classe
trabalhadora, o conjunto dos dirigentes sindicais e lideranças populares, tenham
claro que uma greve geral, combinada com outras formas de luta e contando com forte
apoio popular, é instrumento essencial para deter as contrarreformas. Portanto,
devemos manter nossos esforços para viabilizar a greve.
55. Todavia,
nossas possibilidades não se limitam à greve. Como estamos às vésperas da
eleição, os parlamentares de direita estão mais sensíveis à pressão direta, por
exemplo: corpo a corpo nos gabinetes, corpo a corpo nos aeroportos, visitas
domiciliares aos parlamentares e correligionários, panfletos distribuídos em
suas bases eleitorais alertando para os riscos decorrentes do voto etc. Neste
tipo de ação, os setores progressistas das igrejas podem jogar um papel
destacado.
56. O
essencial é que a luta contra a reforma da Previdência seja vista como uma
tarefa do conjunto do Partido, das forças políticas e sociais. Neste sentido é
importante reforçar nossa participação e articulação na Frente Brasil Popular, com
a CUT e centrais sindicais, com o MST e movimentos da Via Campesina, com a UNE
e Ubes; e ampliar a articulação com a Frente Povo Sem Medo e outros setores.
57. Neste
mesmo sentido, é preciso que o Congresso do Povo, convocado pela Frente Brasil
Popular, integre o conjunto destas organizações, incorporando em sua pauta os
desafios de mobilização nesta luta imediata em defesa da aposentadoria e nas
demais lutas populares.
58. Conforme
a resolução do Diretório Nacional do PT, reunido no dia 16 de dezembro de 2017,
faz parte de nossa pauta a luta contra os efeitos da Emenda Constitucional 95,
que congelou por vinte anos os investimentos sociais; a luta em defesa dos
direitos trabalhistas; a luta contra as privatizações, a começar pela defesa da
Eletrobras; a luta em defesa da Petrobras e do regime de partilha no Pré-Sal; a
luta em defesa da soberania, contra os benefícios concedidos às petrolíferas
estrangeiras e a favor da política de conteúdo nacional; a luta em defesa dos
compromissos assumidos pelo Brasil no Acordo do Clima de Paris.
59. Faz
parte de nossa pauta, também, a defesa dos direitos humanos, civis e culturais,
contra as tentativas de permitir o trabalho escravo, de rebaixar a legislação
sobre o aborto, por meio da PEC 181 e outros projetos semelhantes, que
retrocedem no direito das mulheres; e a luta contra o obscurantista projeto da
“Escola Sem Partido”.
60. Nossa
pauta inclui, ainda, a defesa do SUS contra a falta de recursos, a privatização
e os retrocessos, a exemplo das mudanças na Política Nacional de Atenção Básica
e na Política Nacional de Saúde Mental.
61. Inclui,
igualmente, a luta contra a censura da produção artística e o ataque à presença
da igualdade de gênero e diversidade sexual nas bases curriculares.
62.
Também inclui a defesa das universidades públicas, o combate à criminalização
dos movimentos sociais e ao encarceramento e genocídio da juventude negra, a
luta contra o racismo, o feminicídio e a LGTBfobia.
63. Devemos
seguir mobilizando a juventude, denunciando o desemprego dos jovens, a perda de
direitos, o desmonte da educação pública e o genocídio da juventude negra, numa
agenda consonante com a Juventude do PT e a juventude representada nas
organizações da Frente Brasil Popular.
64. Devemos
contribuir na construção e implementação das resoluções da II Conferência da
Frente Brasil Popular e demais organizações do povo, dos trabalhadores,
juventudes, mulheres, negros e negras.
65. E devemos
tomar medidas contra a crescente agressividade da extrema-direita, que apela ao
terrorismo contra os movimentos sociais, pratica atentados contra a vida de
lideranças populares, além de alimentar alternativas eleitorais e não
eleitorais de natureza fascista e ditatorial.
66. Devemos
debater com a população a necessidade de revogar as medidas dos golpistas, a
necessidade de um programa que materialize o Brasil que o povo quer, mostrando
como isto se articula com a necessidade de uma Constituinte.
Um intenso calendário
67. O
ano de 2018 será marcado não apenas pela luta contra o governo Temer e suas “reformas”,
pela luta em defesa da democracia e do direito de Lula ser candidato, pela
campanha eleitoral em si, mas também por outras iniciativas importantes da
esquerda política e social, como o Fórum Social Mundial, o Fórum Alternativo das
Águas e o Congresso do Povo. E há efemérides como os 30 anos da Constituição de
1988, os 50 anos das batalhas de 1968, os 130 anos da falsa abolição e os 200
anos de nascimento de Karl Marx.
68. É
grande o risco desta agenda exaurir e dispersar nossas forças. Sem contar que
parte de nossas lideranças segue priorizando a organização de suas candidaturas
proporcionais e executivas. A única maneira de tentar evitar isto é definir
prioridades e coordenar as atividades, dentro e fora do Partido, junto às
frentes e organizações.
69. No
caso do Partido, é indispensável reorganizar a Comissão Executiva Nacional
(CEN) do PT. Grande número de integrantes da atual executiva —
inclusive a presidenta, três dos cinco vice-presidentes, os líderes, o secretário
de finanças e um dirigente encarregado do programa —
pretende candidatar-se às eleições proporcionais. Embora haja quem considere
isto apenas uma virtude ou algo simplesmente inevitável num partido que
escolheu disputar eleições, somos de opinião que, especialmente neste momento,
o Partido dos Trabalhadores precisa ter um núcleo dirigente capaz de dar conta não
apenas ou principalmente das tarefas eleitorais, mas também das demais tarefas
partidárias – entre as quais citamos a produção de um jornal partidário, para superar
a situação atual, em que o Partido paga a impressão e distribui jornais
produzidos por orientação de outras organizações políticas. Portanto,
proporemos que a próxima reunião do Diretório Nacional recomponha a CEN.
Uma nova etapa de acúmulo de forças
70. O
golpe será derrotado, mais cedo ou mais tarde, nas ruas e nas urnas. Mas
importa que seja derrotado o mais rapidamente possível, para evitar os
devastadores efeitos sociais, econômicos, políticos e ideológicos que resultam
do golpismo. A única maneira de derrotar o golpe em 2018 é combinando
mobilização e luta social, com a campanha de Lula presidente.
71. O
golpismo fará de tudo para impedir que Lula seja candidato e para impedir que vençamos
as eleições, inclusive violência física, adiamento das eleições e ações do
gênero. Se vencermos, farão de tudo para impedir a nossa posse e nosso governo,
da sabotagem do futuro governo até uma intervenção militar.
72. Para
enfrentar e derrotar o golpismo, necessitaremos ampliar muito o nosso enraizamento
na classe trabalhadora, nosso trabalho cotidiano de conscientização,
mobilização e luta do povo. Trata-se de retomar uma política de acúmulo de
forças de médio prazo, que exigirá a reorganização dos núcleos de base, a
retomada do trabalho social e político na base popular da sociedade, a formação
política em novas bases.
73. Ao
mesmo tempo em que lutamos para vencer as batalhas atuais, da “reforma” da Previdência
às eleições presidenciais de 2018, é preciso preparar o Partido e a classe
trabalhadora para um período de lutas muito mais duras, no terreno político e
social, nacional e internacional. Venceremos, mas para isso será preciso
alterar profundamente nosso modo de organização e funcionamento, ampliando
nossa combatividade e nosso enraizamento na classe trabalhadora.
74. Os
partidos de esquerda e os movimentos populares estão mobilizados, como
demonstraram as manifestações dos últimos dias. No entanto, só impediremos a
prisão de Lula e conquistaremos o seu direito de ser candidato com dezenas de milhões
de pessoas mobilizadas. Por isso, a importância de enraizar os comitês em todo
o Brasil e de conectar a situação de Lula com a defesa dos direitos nos locais
de trabalho, estudo e moradia. Recursos jurídicos, intenções de voto em
pesquisas, manifestos e postagens em redes sociais têm sua importância, mas o
decisivo é a mobilização popular.
75. Por todas estas razões, devemos girar toda
nossa mobilização para derrotar a reforma da Previdência quando esta for a
voto, no dia 19 de fevereiro ou depois. E assim também precisamos fazer contra
a privatização da Eletrobrás, contra todos os projetos que os golpistas
apresentarem nos próximos dias, assim como na ampla denúncia dos efeitos
sociais das políticas golpistas, como é o caso da febre amarela e dos casos de
queimadura que crescem por efeito colateral do aumento do
preço do butijão de gás.
76. Foi
a luta contra o fim da aposentadoria que impulsionou e radicalizou nossas
maiores manifestações, como é o caso da greve geral de 28 de abril e os 200 mil
do Ocupa Brasília.
77. Conectar a defesa de Lula com a luta pelos
direitos e contra a “reforma” da Previdência é evidenciar que querem
prender Lula para tirar o direito das pessoas se aposentarem. É a CUT
acelerar a mobilização nos locais de trabalho por uma paralisação nacional e
pela greve geral. É fortalecer a mobilização nos municípios, com plenárias e
reuniões abertas do PT, da FBP ou o que for mais amplo possível.
78. Como
dissemos no início deste texto, a ofensiva golpista entrou em uma nova etapa e
cabe à esquerda brasileira reagir à altura. Para tanto, teremos horas e dias e
não semanas. É neste prazo exíguo, imediato, que se resolverá uma batalha que
definirá uma parte importante de nosso futuro. A esquerda brasileira, a começar
pelo PT, deve responder à ofensiva da direita com a radicalização da luta
popular.
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