No dia 5 de março, a direção nacional da tendência
petista Articulação de Esquerda debateu a conjuntura nacional e aprovou uma
resolução política. O texto a seguir é a segunda versão desta resolução,
ainda pendente de revisão final e emendas.
Alerta máximo
A situação política continua se
agravando. A contraofensiva conservadora coloca em primeiro plano a tentativa
de condenar sem julgamento o presidente Lula. Setores da Polícia Federal, do
Ministério Público e da Justiça articulam abertamente um golpe contra o governo
e contra a esquerda. A presidenta Dilma Rousseff não toma medidas práticas
contra os golpistas e, ao mesmo tempo, insiste em promover pautas conservadoras,
como o ajuste fiscal e a reforma da previdência. A militância democrática,
popular e socialista sai as ruas em defesa da democracia e contra o golpismo,
convocando atividades em todo o país nos dias 8, 18 e 31 de março. O Diretório
Nacional do Partido dos Trabalhadores e a Frente Brasil Popular exigem outra
política econômica. As forças de direita convocam manifestações para o dia 13
de março e alguns siderados defendem intervenção militar. A judicialização da
política, a partidarização da justiça e a criminalização da luta social apontam
para uma profunda crise institucional. Avoluma-se a crise econômica, a
recessão, a desindustrialização, com terríveis efeitos sociais, entre os quais destaca-se
o desemprego. Diante deste quadro, a direção nacional da tendência petista
Articulação de Esquerda, reunida no dia 5 de março de 2016, aprovou uma
detalhada resolução política, para ser lida e debatida pela militância da
tendência e do Partido.
1. Na sexta-feira, 4 de março de
2016, o povo brasileiro foi despertado com uma notícia impactante: o presidente
Luís Inácio Lula da Silva havia sido conduzido pela Polícia Federal para
prestar um depoimento à “Operação Lava Jato”. Lula já havia deposto em outras
situações. A novidade neste caso foi a “condução coercitiva”.
2. A atitude da PF, do Ministério
Público e da Justiça foi totalmente ilegal: a chamada “condução coercitiva” só
pode ser adotada quando alguém é chamado a depor e recusa comparecer. Acontece
que o presidente Lula nunca se recusou a comparecer quando convocado e desta
vez sequer foi intimado.
3. Portanto, o que ocorreu foi um sequestro
cometido por agentes do Estado. A presidente Dilma, mais do que
manifestar inconformismo, deve demitir das funções de direção e submeter ao
devido processo legal os agentes públicos responsáveis por este crime.
4. O sequestro do presidente Lula teve
óbvias motivações políticas. Desde o início da “Operação Lava Jato”, sabíamos
que o juiz Moro e seus cúmplices estavam forjando as provas necessárias para o
impeachment da presidenta Dilma, para a cassação da legenda do PT e para a
prisão do ex-presidente Lula. Infelizmente, parte da esquerda brasileira não
acreditou que Moro seria capaz de ir tão longe. Esqueceram que a direita
reserva a lei apenas para os amigos. Para os inimigos, nem mesmo a lei.
5. O que ocorreu no dia 4 de março,
esperamos, acabou com estas ilusões. Ficou nítido, mais uma vez, que a
esquerda brasileira está sendo vítima de uma operação de cerco e aniquilamento.
6. Os motivos são claros: se a
esquerda continuar governando o Brasil, ou mesmo se continuar com força
eleitoral e capacidade de mobilização social, os conservadores terão imensa
dificuldade para alcançar seus três objetivos estratégicos: a) realinhar o
Brasil aos Estados Unidos, afastando-nos da integração regional e dos BRICS; b)
reduzir substancialmente a remuneração direta e indireta da classe
trabalhadora, visando assim ampliar ao máximo a rentabilidade do capital; c) diminuir
o exercício das liberdades democráticas pelos setores populares, impedindo
assim que a a resistência popular bloqueie as políticas neoliberais.
7. Para deter esta ofensiva
conservadora, a esquerda brasileira está convocada a mudar de estratégia, a
mudar a política do governo, a unificar e mobilizar a classe trabalhadora e
demais setores populares, a ganhar as eleições presidenciais de 2018.
8. Os próximos dias e semanas serão
decisivos, tanto para o Brasil quanto para a América Latina e Caribe. O que
ocorreu no dia 4 de março serviu de ensaio para todas as forças políticas.
Ficou evidente até onde a direita pretende ir. Ficou evidente qual a disposição
de resistência da esquerda. Ficaram claras as fortalezas e debilidades de cada parte.
Ficou evidente que não está em jogo apenas Lula, o PT e Dilma. Ficou evidente
que a
crise se aproxima de um desenlace. Ficou evidente que este desenlace
será decidido, em última instância, por quem tiver maior apoio social e
iniciativa política.
9. A contraofensiva conservadora
constitui, essencialmente, uma reação aos avanços que a classe trabalhadora
arrancou nos últimos anos. Desde 2011 esta reação vem sendo agravada pela combinação
entre a situação internacional e as opções políticas do governo Dilma, que oscilou
entre concessões sem contrapartida e enfrentamentos sem plano.
10. O reacionarismo é um movimento
pluriclassista: sua “tropa de choque” é composta por setores médios. Embora não
participem expressivamente das manifestações “coxinhas”, setores populares
foram atraídos ou pelo menos neutralizados. Mas a direção do processo é do
grande capital. Se alguém tinha dúvida a este respeito, recomendamos observar o
comportamento dos “mercados” ao longo do dia 4 de março: exultaram quando
acharam que o presidente Lula iria para a cadeia. E ficaram preocupados quando
o viram em cadeia nacional, após o depoimento, informando que a “jararaca” está
viva, forte e principalmente combativa.
11. A contraofensiva conservadora é articulada
por partidos de centro-direita, setores da ultradireita não partidária, o
oligopólio da mídia, entidades do grande capital e frações do aparato de Estado,
com seus respectivos enlaces internacionais. Todos estes setores comungam dos três
objetivos estratégicos citados no ponto 6 deste documento. Mas não possuem
unidade tática.
12. Parte da direita defende como
centro da tática o afastamento da presidenta Dilma Rousseff (via impeachment ou cassação da chapa no
TSE). Outra parte defende como centro da tática empurrar o governo Dilma a
executar um ajuste neoliberal (deixando para 2018 a conquista plena do governo
federal).
12. As duas táticas da direita se
retroalimentam: ao tentar neutralizar o impeachment adotando a política
econômica da direita, o governo perde apoio popular, o que ajuda o golpismo a
ganhar terreno.
13. Independente destas variações
táticas, o protagonismo da contraofensiva conservadora está nas mãos de uma facção
do aparato de Estado, composta por setores do Ministério Público Federal, da Policia
Federal e da Justiça.
14. A ação destes setores – empenhados
em judicializar a política, partidarizar a justiça e criminalizar os movimentos
sociais – tem como um de seus objetivos realizar a “modernização neoliberal” do
aparato de Estado, blindando-o de maneira mais eficiente contra a esquerda e
contra os setores populares.
15. O tipo de “democracia” que brota
deste processo, temperado pela ofensiva ideológica do conservadorismo, cria um
ambiente cujo parentesco com o fascismo é cada vez mais notável.
16. A contraofensiva conservadora não
se limita ao Brasil: atinge todos os países da América Latina em que a esquerda
chegou ao governo desde 1998. O que existe de particular no caso brasileiro é
que uma vitória da direita aqui teria efeitos maiores, mais duradouros e mais
sistêmicos sobre o conjunto da região.
17. O pano de fundo da contraofensiva
conservadora é a crise internacional, o aguçamento da contradição
intercapitalista e os movimentos que os EUA vêm fazendo para recuperar o seu
“quintal”, ou como dizem nossos vizinhos, seu pateo trasero.
18. A crise internacional de
2007-2008 não resultou numa derrota do neoliberalismo: nos países centrais, a
resposta foi a concentração e centralização de capitais, transferindo o custo
da crise para o setor público, para as classes trabalhadoras e para as
periferias do mundo. Este processo econômico e social vem sendo acompanhado de
medidas políticas e militares que empurram a situação internacional em direção
a conflitos cada vez mais agudos. As diferentes reações vindas da esquerda não
foram potentes e/ou consequentes o suficiente para enfrentar esta situação. Uma
das decorrências disto, no caso da América Latina, é a perda de parte do que
foi conquistado desde 1998, como na Argentina e na Venezuela.
19. No caso brasileiro, a atual contraofensiva
conservadora começou em 2011, passando por vários momentos, com destaque para a
disputa das ruas (2013), a campanha presidencial (2014) e a mobilização coxinha
(2015).
20. Em dezembro de 2015, os setores
populares detiveram momentaneamente a contraofensiva, aproveitando-se para isto
de uma divisão tática na direita. Abriu-se então um curto período de
“armistício”, que coincidiu com as festas de final de ano e as primeiras
semanas de janeiro.
21. Entretanto, a atitude do governo
Dilma, insistindo na combinação tóxica entre o ajuste fiscal e uma orientação
política recuada, criou as condições ideais para que a contraofensiva conservadora
recuperasse seu fôlego, às vésperas do Carnaval.
22. Com o governo submetido e
submisso, a contraofensiva da direita está neste momento concentrada em tentar
ganhar por “WO” as eleições de 2018, combinando tentativas de julgar e condenar
Lula com uma devastadora campanha midiática.
23. A concentração dos ataques em
Lula não quer dizer, entretanto, que tenham sido abandonadas as outras
operações conservadoras, tais como a ameaça de interrupção do mandato da presidenta
Dilma, as operações para colocar o PT na ilegalidade, ameaças contra o movimento
social e sindical combativo, além da implementação -- via governo e parlamento
-- da pauta conservadora detalhada na Agenda Brasil e no documento “ponte para
o futuro”.
24. A contraofensiva da direita tem
grande impacto no povo e na esquerda. Num contexto de piora nas condições de
vida, parcela importante da população é mesmerizada pela narrativa da direita. Na
esquerda, a massa dos militantes quer reagir, quer lutar e cobra das direções
que faça o mesmo e cumpra seu dever: oferecer uma linha política e dar
diretrizes claras sobre o que fazer.
25. Nas direções, há diferentes
posturas. Organizações esquerdistas dividem-se entre os que apoiam a
mobilização popular contra o golpe e aqueles que preferem fazer coro, explicita
ou implicitamente, ao discurso da direita acerca da corrupção.
26. Na Frente Brasil Popular
percebe-se vontade e capacidade de reação. Aliás, os fatos demonstram o acerto
que foi construir a FBP e o erro daqueles que insistem em dividir forças e
gastar energias na construção de outro tipo de frente, mais estreita e mais
confusa politicamente. Por outro lado, o protagonismo da FBP – especialmente da
Central Única dos Trabalhadores – fará a direita atacar estas entidades.
27. A direção do Partido dos
Trabalhadores, por sua vez, até agora não demonstrou estar à altura das necessidades.
Isto ocorre por diversos motivos: em parte por ser alvo direto de grande parte
dos ataques, em parte por debilidades em sua direção nacional, mas
principalmente devido aos erros políticos acumulados, em particular a
insistência em uma estratégia superada pela realidade. Embora as
responsabilidades por tudo isto sejam distribuídas desigualmente, é importante
dizer que estão presentes em todos os setores do Partido.
28. É inacreditável, por exemplo, que
a direção nacional do PT não tenha discutido com antecipação e preparado um
“plano de contingência” para enfrentar algo como o que ocorreu no dia 4 de
março. Fica aqui, por sinal, um dos ensinamentos: cada organização deve
preparar planos de contingência, pois a tendência é de agravamento da situação
e não se deve contar apenas com o entusiasmo e disposição de sacrifício da
militância. Por mais “vietnamita” que seja nossa militância, a ausência de uma
direção à altura abre caminho para a confusão, com direito a manifestações
múltiplas e variadas de desânimo, derrotismo, desmoralização, recriminações
mútuas e traições.
29. Frente a este quadro, é preciso
manter a cabeça fria, produzir análises consistentes, construir atividades e
instrumentos unitários, oferecer pontos de referência prática e teórica para
quem estiver disposto a combater a direita, o oligopólio da mídia, o grande
capital, o imperialismo.
30. A contraofensiva da direita é
poderosa, mas não é onipotente. Eles podem vir a nos derrotar, mas não nos
derrotaram. O esforço para desmoralizar, julgar e prender Lula é um dos muitos
sinais disto.
31. Enquanto setores da esquerda
(inclusive do próprio PT) dão o Partido como destruído ou pelo menos
neutralizado eleitoralmente, concedendo entrevistas a órgãos de imprensa em que
começam a falar do PT no pretérito, o comportamento hegemônico na direita é
outro: continuam considerando Lula e o PT como forte alternativa eleitoral para
2018.
32. Portanto, ainda existem condições
para deter
a contraofensiva conservadora
e criar as condições para retomar nossa
ofensiva. No curto prazo, atingir estes objetivos exige combinar alterar
a estratégia da esquerda, mudar a política do governo, reconquistar o apoio da
classe trabalhadora, mobilizar as forças populares e vencer as eleições de 2018
33.Nosso objetivo é dar conta de
todos estes objetivos. Mas é preciso dizer claramente: se o governo Dilma
Rousseff não mudar de política, especialmente se não mudar de política
econômica, será muito difícil e quase impossível derrotar o golpismo. O que nos
colocaria em situação muito mais difícil para reorganizar as forças e dar conta
dos demais objetivos. Por isto, é preciso concentrar energias no esforço de
fazer o governo mudar de política. E isto inclui dizer para a presidenta da
República: cumpra o programa que venceu as eleições de 2014 e atue
imediatamente contra os golpistas que agem em nome do governo e do Estado
brasileiro. Não basta manifestar inconformismo e indignação: é
preciso esmagar a quinta coluna e mudar imediatamente de política econômica.
34. Derrotar a contraofensiva da
direita exige articular diferentes formas de luta: disputa ideológica, mobilização
social, ação governamental e parlamentar, disputa eleitoral. Entretanto, o
critério de êxito em todas e cada uma destas formas de luta é a ampliação da
consciência, mobilização e organização da classe trabalhadora. Em última
análise, é isto que fará a diferença entre derrota e vitória, tanto tática
quanto estratégica.
35. O apoio da classe trabalhadora
será maior ou menor, a depender de vários fatores, nos quais o governo federal
joga um papel fundamental. Hoje, o governo não está conseguindo proteger os
trabalhadores da crise e, pior, está adotando ou deixando adotar medidas que
aprofundam os efeitos da crise sobre a classe trabalhadora. Se isto não mudar
imediatamente, será cada vez mais difícil convocar os trabalhadores para
defender as liberdades democráticas e lutar contra o golpismo. E se tornará
cada vez mais difícil manter a esquerda como alternativa de governo.
36. O Diretório Nacional do PT
aprovou, no dia 26 de fevereiro de 2016, uma proposta de política econômica
alternativa. A reação furiosa da direita contra esta proposta mostra que estamos
no rumo certo.
37. A reação do ministro Nelson
Barbosa às propostas do PT foi de indiferença irritada. Aliás, o senhor Barbosa
está se demonstrando mais nocivo ao país, do que foi seu antecessor Joaquim
Levy. A insistência no ajuste fiscal de
longo prazo, na reforma da previdência e em outras concessões aos mercados –
entre as quais a retomada de fato das privatizações – está tendo como
consequência desmontar tudo o que de positivo fizemos desde 2003.
38. Frente aos ataques da direita e a
irritação do governo, o Partido dos Trabalhadores precisa reagir defendendo as
propostas aprovadas pelo Diretório Nacional. O rumo geral destas propostas é
correto: a forma de sair da crise é dobrar a aposta no que fizemos no segundo
mandato de Lula.
39. Embora sigam no rumo certo, falta
às propostas aprovadas pela direção nacional do PT: a) uma análise crítica da
primeira etapa do governo Lula, quando predominou a política social-liberal de
Palocci; b) uma ênfase e consequência maiores no combate aos oligopólios em
geral e ao oligopólio financeiro em particular; c) uma compreensão mais precisa
do papel da (re)industrialização como decisiva para o sucesso de uma
alternativa democrático-popular e socialista; d) a afirmação clara de que um
novo governo petista não pode ser (e não será, mesmo que quiséssemos) uma
repetição do que foi feito no segundo
mandato de Lula. “Dobrar a aposta” significa não apenas fazer mais: implica em
fazer diferente, implica em fazer reformas estruturais, implica em enfrentar os
oligopólios.
40. Por quais motivos a presidenta
Dilma insiste na política de ajuste fiscal, logo ela que durante os dois
governos Lula foi fundamental no combate às posições de Antonio Palocci? Há
várias hipóteses a respeito. A causa fundamental, em nossa opinião, é política.
A tradição política e ideológica em que ela foi formada (o nacional-estatismo)
deposita todas as suas fichas na ação do Estado como “promotor do
desenvolvimento”, supostamente acima dos conflitos sociais. Quando o Estado tem
recursos, o nacional-estatismo exibe imenso vigor. Mas quando o Estado esgota seus
recursos, o nacional-estatismo enfrenta um impasse: para recuperar a
capacidade de investimento, é preciso escolher entre taxar os ricos ou sangrar
os pobres. E não há como taxar os ricos e, ao mesmo tempo, conciliar com eles.
Acontece que a presidenta Dilma, como grande parte do PT e da esquerda
brasileira, segue prisioneira da estratégia da conciliação. Esta estratégia deu
“resultados positivos”, quando o capitalismo internacional oferecia condições
adequadas para isto e enquanto os capitalistas aqui instalados conseguiam
compatibilizar pequenas concessões feitas à classe trabalhadora com os imensos
lucros com que estão acostumados. Hoje, a situação mudou. Por isto, independente
do que pensemos acerca do que foi feito, nossa linha precisa mudar.
41. A esquerda brasileira está
convocada a mudar de estratégia. É preciso derrotar os que insistem em
defender, explícita ou implicitamente, a estratégia de conciliação, que nas
condições atuais conduz a capitular frente ao programa social-liberal e
capitular frente ao golpismo.
42. Mudar de estratégia será um
processo longo, difícil e complexo. Como em 1990-1995, ocorrerão cisões e
conversões surpreendentes, tanto de grupos quanto de pessoas. No caso do
Partido dos Trabalhadores e da CUT, os atuais alinhamentos internos serão
inevitavelmente revistos, uma vez que tanto na minoria quanto na maioria há
setores que compartilham de posições antagônicas.
43. A mudança de estratégia inclui,
entre muitos aspectos, um balanço do período 2003-2014, especialmente esclarecer
como foi possível uma inflexão conservadora como a atual. Como já dissemos, a
presidenta Dilma venceu as últimas eleições presidenciais defendendo o legado
do período 2003-2014. Reeleita, tornou-se prisioneira de um aspecto deste
legado: a conciliação de classe. Desde 2011, a conciliação não resulta mais em
bônus para as classes trabalhadoras.
44. Para retomar o crescimento com
ampliação dos direitos sociais, da democracia e da soberania nacional, é
preciso fazer o grande capital pagar a conta, e isto implica em abandonar a estratégia
da conciliação.
45. É preciso dizer claramente que,
ao menos até agora, a presidenta Dilma Rousseff não se dispõe a fazer isto.
Pelo contrário, enaltece medidas conservadoras como o ajuste fiscal e a reforma
da previdência.
46. A reforma da previdência não é
apenas “inconveniente” do ponto de vista tático: ela é desnecessária e acima de
tudo regressiva, do ponto de vista programático e ideológico.
47. O ajuste fiscal não é um detalhe:
trata-se da materialização prática de uma concepção que impede que o Estado
seja utilizado como instrumento de outra política.
48. Portanto, os danos econômicos causados
pela Operação Lava Jato sobre a Petrobrás são plantados em terreno fértil, solo
adubado por uma lógica anti-Estado, anti-industrialização e pró-capital
financeiro.
49. Caso a presidenta Dilma Rousseff
insista na atual política, ela estará na prática rompendo com o Partido dos
Trabalhadores. E isto também precisa ser dito com todas as letras, até porque
não compartilhamos da concepção segundo a qual devemos assistir calados e
passivos a destruição de um projeto que custou tanto suor, sangue e lágrimas de
várias gerações.
50. Aliás, nos causa espécie a
atitude subalterna que tantos quadros importantes da esquerda brasileira mantem
diante da presidenta, dizendo “nos corredores” aquilo que não dizem
diretamente. Apesar das enormes diferenças que temos com suas posições, a
presidenta Dilma é uma militante cuja trajetória respeitamos e, se não fosse
por outros motivos, este é mais do que suficiente para que falemos com
franqueza. E falar com franqueza inclui dizer que, se não mudar de rumo, a
presidenta será cúmplice ativa da tentativa que a direita faz de destruir a
esquerda brasileira.
51. A mudança de estratégia inclui,
também, uma crítica das concepções políticas que ganharam espaço, na esquerda
brasileira, durante a crise final do socialismo soviético.
52. Uma síntese destas concepções
políticas é a chamada “estratégia da revolução democrática”, que na sua versão
mais extremada inclui imensas ilusões nas alianças com os inimigos, no
“republicanismo” e no Estado de Direito.
53. Uma nova estratégia exige
reconhecer o antagonismo entre as classes sociais, o caráter de classe do
Estado, a necessidade de combinar reforma com revolução, tática com estratégia,
o papel dirigente da classe trabalhadora, o papel de vanguarda do Partido e o
papel diretor da teoria. Nada disto é patrimônio do esquerdismo, do
vanguardismo e do academicismo. Ao contrário, são ideias que devem ser
abraçadas e defendidas por cada trabalhadora e cada trabalhador com consciência
de classe.
54. Da classe trabalhadora dependerá
o resultado da disputa que travamos agora e no futuro. Parte importante da
classe trabalhadora tem os sindicatos e a CUT como referência. Outros setores
se referenciam em diferentes tipos de organizações, boa parte das quais está na
Frente Brasil Popular.
55. A Frente Brasil Popular
demonstrou ter amplitude, consistência e potência estratégica maiores do que as
de iniciativas concorrentes.
56. Participam da Frente Brasil
Popular setores que compartilham três objetivos fundamentais, mesmo quando os
articulam de maneira distinta: a defesa das liberdades democráticas, contra o
golpismo; a defesa de outra política econômica; a defesa de reformas
estruturais.
57. A Frente Brasil Popular não
substitui nem concorre com as organizações que dela participam; ao mesmo tempo,
convive e busca unidade de ação com outras organizações frentistas.
58. É fundamental o engajamento, na
construção da Frente Brasil Popular, do conjunto do Partido dos Trabalhadores,
da Central Única dos Trabalhadores e dos sindicatos que a integram, do
Movimento Sem Terra e das entidades que influencia. Assim como é fundamental a
participação do Partido Comunista do Brasil, da CTB, da UNE e Ubes. É a partir
destas organizações que a Frente Brasil Popular conseguirá capilaridade
nacional, influência de massas e converter-se em espaço para a atuação de
cidadãos e cidadãs que não estão, nem pretendem estar, vinculados a nenhuma
organização político-social.
59. Para grande parte do povo, as
eleições são um dos poucos momentos de maior participação política. Também por
isto, o PT, as esquerdas, o campo democrático-popular e socialista não abrem
mão do objetivo de disputar e vencer as eleições presidenciais de 2018, para
colocar o governo a serviço do povo.
60. A luta contra os que pretendem
nos excluir das eleições presidenciais de 2018 inclui a luta contra os
derrotistas que, calculando ser alto o risco de derrota, escolhem ajudar os
inimigos desistindo previamente do combate. Hoje, apostar em saídas
conciliatórias não é apenas um crime, é um erro: a direita está tão perto de
obter uma vitória estratégica, que a maior parte dela não tem interesse algum
em acordos; por outro lado, a esquerda só vai conseguir mobilizar, se
estivermos convencidos de que o perigo é real e imediato.
61. O Partido dos Trabalhadores terá candidatura
própria nas eleições de 2018, não apenas porque queremos vencer e seguir
governando, mas também porque nas condições atuais, uma candidatura petista é a
melhor forma de manter viva a polarização entre o campo popular e os setores
conservadores, polarização que organiza desde 1989 a luta de classes no Brasil.
62. Seja por conta da influência
popular acumulada, seja por conta dos ataques da direita, nas condições atuais a
candidatura Lula é a melhor alternativa eleitoral de que dispõe o campo
democrático-popular.
63. Ao mesmo tempo, o Partido dos
Trabalhadores, a esquerda brasileira e o campo democrático-popular estão
chamados a um duplo esforço: a) por um lado, construir outras alternativas
eleitorais, tanto para 2018 quanto para o futuro; b) por outro lado, construir
uma estratégia que não se limite às disputas eleitorais.
64. Independente do que ocorra agora
e em 2018, a experiência vivida pelo PT e pelo conjunto da esquerda durante os governos
Lula e Dilma confirmaram tudo o que já se sabia acerca dos riscos da conciliação
de classes, dos limites da via eleitoral, da promiscuidade com o empresariado,
dos danos que causa conceder aos indivíduos um papel superior ao das
organizações coletivas.
65. Por isto, a indispensável autocrítica
e a necessária inflexão estratégica devem ser feitas ao mesmo tempo em que
lutamos por ganhar as eleições de 2016 e 2018. As dificuldades de fazer isto
são menores do que as dificuldades que resultariam de uma derrota.
66. Caso fossemos derrotados, agora
ou em 2018, a direita teria os meios para buscar aplicar uma estratégia de “terra
arrasada”. Ademais, isto poderia empurrar setores da esquerda para uma
disjuntiva similar à de 1964: radicalismo sem base social versus moderação ampla, geral e irrestrita. Também
para evitar este cenário, disputaremos para vencer as eleições presidenciais de
2018.
67. Não luta para vencer, quem não
acredita no risco da derrota. Por isto, dizemos claramente: a contraofensiva da
direita pode ser vitoriosa. Mais que isto: se não alterarmos a correlação de
forças, a ofensiva da direita será vitoriosa.
68. Há várias maneiras de isto
acontecer, entre as quais: impeachment, cassação da chapa presidencial pelo
TSE, condenação de Lula, inviabilização do PT, implementação do programa da
direita por imposição do parlamento ou por capitulação do governo Dilma.
69. Em alguns destes casos
combinam-se a vitória da direita com a desmoralização da esquerda. Os cenários são
tão complexos que na própria direita surgem especulações sobre a conveniência da
presidenta romper formalmente com o PT, propor um “acordo nacional” envolvendo
o governo e as próximas eleições, ou mesmo renunciar. Já na esquerda há quem
entenda que o governo já rompeu, na prática, com o PT. Ao mesmo tempo, há quem
considere encerrado o ciclo do petismo e/ou do lulismo.
70. Sem prejuízo do bom debate sobre
todas as questões, defendemos que se coloque a política no comando e a defesa
da classe trabalhadora em primeiro lugar.
71. Convocamos a presidenta Dilma
Rousseff a mudar de posição, a implementar o programa aprovado pelo Diretório
Nacional do PT em sua reunião de 26 de fevereiro de 2016.
72. Caso isto ocorra, a esquerda terá
melhores condições para mobilizar suas bases sociais contra o golpismo. Sabemos
que, frente a um governo que aplica um programa de esquerda, o capital, o
oligopólio da mídia e as forças de direita reagirão com fúria redobrada. As
ameaças golpistas se tornarão ainda mais intensas. Mas neste caso enfrentarão uma
esquerda vitaminada pela defesa de um governo que está a serviço do povo. Esta
é a linha que defendemos: mudança na política do governo, mudança na estratégia
do Partido, preparar-se para conflitos cada vez mais agudos. O que inclui
maiores cuidados com a segurança das manifestações, maior critério na análise
das informações, um acompanhamento profissional da evolução da conjuntura.
73. Como já foi dito, a presidenta
Dilma Rousseff não deu até agora sinais de que possa fazer uma inflexão à esquerda.
Pelo contrário, são cada vez mais amplos os sinais, não apenas de capitulação,
mas de conversão a pontos de vista conservadores. Isto prejudica a mobilização
das bases contra o golpismo, amplia a necessidade de mobilizar contra a
política do governo e aprofunda a esquizofrenia da situação política nacional
(a direita tentando derrubar um governo que aplica seu programa, a esquerda
tentando defender um governo que vai contra seu programa).
74. A inflexão neoliberal do governo
não paralisa a direita, que segue com a iniciativa estratégica. Por isto, os setores
populares não tem alternativa boa a não ser continuar defendendo mudanças na
política do governo, mesmo que a presidenta não dê sinais de que vá
mudar.
75. Entretanto, frente a um governo com
torcicolo, não resta outra alternativa ao PT, aos aliados e aos movimentos
sociais, senão defender o governo contra o golpismo e ao mesmo tempo combater
a política econômica do governo. Aos esquerdistas que nos criticam por lutar
contra o golpismo, dizemos: uma esquerda que ajuda a direita nunca está correta.
Aos moderados que nos criticam por combater a política do governo, dizemos o
mesmo: uma esquerda que ajuda a direita nunca é correta.
76. Do ponto de vista tático, apesar
de toda a contradição, não há alternativa melhor. Além disso, do ponto de vista
estratégico, a defesa das liberdades democráticas e de um programa econômico alternativo
permite agrupar os setores populares, nas mobilizações de agora, nas eleições
futuras e no que venha a ocorrer depois.
77. Reafirmamos, por tudo isto, a
necessidade de um encontro nacional extraordinário do Partido dos Trabalhadores,
para atualizar nossa orientação estratégia, programática e tática, inclusive nossa
posição frente ao governo Dilma. E deixamos claro, mais uma vez: a presidenta,
desde o início de seu segundo mandato, vem seguindo um caminho de ruptura com o
Partido dos Trabalhadores e com a esquerda.
78. Dezenas de milhões de
trabalhadores e de trabalhadoras ajudaram a construir o PT, desde 1980. Hoje, o
Partido corre o risco de ser destruído por uma combinação entre a ação da
direita e nossos erros.
79. Os erros políticos e
organizativos cometidos por nosso Partido, especialmente pelos setores que
comandaram o PT desde 1995, são extremamente graves. Um exemplo singelo disto
foi ter filiado o senador Delcídio do Amaral. Outro exemplo foi a aproximação
com Marcos Valério. Nos dois casos, introduzimos em nosso meio uma tecnologia corrupta
de financiamento de campanha, tecnologia desenvolvida e aplicada até hoje pelo
PSDB.
80. É preciso corrigir estes e outros
erros, correção que deve ser feita a tempo de impedir a derrota que a direita quer
nos infligir. Alguns setores do PT não querem reconhecer seus erros, outros não
sabem como fazer a devida correção, havendo ainda os que desistem do PT.
80. Nós não desistimos do PT. E por
isto mesmo devemos trabalhar manter no partido e também para filiar aqueles militantes
que não acreditam que os setores atualmente majoritários na direção do PT sejam
capazes de mudar, ou que não acreditam que a esquerda petista seja capaz de
tornar-se maioria, especialmente considerando as regras atualmente vigentes nas
eleições internas.
81. Ao mesmo tempo, devemos trabalhar
para que saiam imediatamente do Partido os oportunistas que pretendem apenas manter
seus mandatos. Alguns destes oportunistas fazem, ocasionalmente, discursos de
esquerda, mas sua conduta prática demonstra outra coisa.
82. Alguns dizem que estão saindo agora,
mas que voltarão ao Partido depois das eleições. Outros articulam sair do
Partido depois das eleições de 2016, a tempo de construir alternativas para
2018. A estes oportunistas, recomendamos que saiam já e que não voltem.
83.Aos militantes sinceros, conclamamos
que sigam conosco na luta por um PT democrático, socialista e revolucionário. O
PT é muito maior e muito melhor do que determinados dirigentes e grupos
internos.
84. Nos dias 8, 18 e 31 de março de
2016, as forças populares sairão mais uma vez às ruas, reafirmando a defesa da
democracia e de outra política econômica. Manteremos a guarda alta frente às
provocações da direita: não temos dúvidas de que estes setores querem forjar
confrontos, para que apareçam como “vítimas”.
85.Como diz o documento aprovado pelo
Diretório Nacional do PT, “o futuro está na retomada das mudanças”. E o êxito
das mudanças depende do governo mudar de política, do PT mudar de estratégia e
da classe trabalhadora defender seus interesses imediatos e históricos. Cada
militante deve cumprir seu dever. Cumpriremos com o nosso.
Brasília, 5 de março de 2016
No presente momento, o caminho mais curto é Lula falar com as massas. Elas tem ouvidos para o grande líder.
ResponderExcluirO ponto central é apenas um: Dilma deixar de lado a agenda neoliberal e governar para os trabalhadores, principalmente aqueles que são a base da piramide. São esses que são facilmente cooptados pela direita, já que só têm uma fonte de informação: TV globo. Essas pessoas chegam ao trabalho já esculhambando o governo e, durante o dia, recebem uma avalanche de manifestações negativas daqueles do andar de cima. Nesse momento, já aderem ao discurso do patrão pois é coerente com o que assustiu na TV na noite anterior. E assim Dilma e o governo vão perdendo seu mais importante sustentáculo. Ou ela deixa de lado sua teimosia e modifica o foco ou fatalmente será engolida pelo tsunami reacionário. E pior, levará o PT.
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