Projeto de resolução sobre conjuntura
(para debate na reunião do secretariado nacional da AE)
Mundo revolto, Brasil agitado: agosto de 2012 será um mês tenso.
Em primeiro lugar no terreno internacional, onde se destacam quatro conflitos.
O primeiro deles é a guerra na Síria. Independentemente da
avaliação que façamos sobre Assad, o partido Baath e o regime existente naquele
país, o que está em curso não é propriamente uma rebelião pela democracia, mas
sim uma batalha geopolítica impulsionada pelos Estados Unidos e aliados. Caso
Assad seja deposto, não teremos democracia nem bem-estar na Síria. Quem duvida
disto, deve olhar o que se passou no Afeganistão, Iraque e Líbia. Deposto
Assad, o que teremos será mais instabilidade regional e a estrada aberta para
um ataque direto contra o Irã. Isto parece estar muito claro para a presidenta
Dilma, mas não parece estar tão claro para setores do Itamaraty, que têm
subscrito notas aparentemente imparciais, mas que na verdade atrapalham a
percepção acerca do que efetivamente está em jogo. É preciso que o Brasil adote
uma postura mais forte, não apenas contra a intervenção militar estrangeira na
Síria, mas também denunciando a intervenção militar que já está em curso.
O segundo conflito é a crise na Europa. Como era previsível,
a vitória dos socialistas franceses não alterou o curso geral da política da
União Européia. Isto significa que principalmente Espanha, Itália e Portugal
–além de Grécia—continuam submetidos ao estrangulamento de suas políticas
sociais e a perda da soberania nacional. Embora a esquerda consequente esteja
presente, mobilizada e crescendo, o que está ocorrendo na Europa pode fortalecer
estrategicamente a ultra-direita (vide os resultados obtidos na Grécia e na
França pelo nacionalismo fascista) e na prática imediata tem ajudado a dar
maior liberdade para a política externa dos Estados Unidos. É preciso que o PT
e a esquerda latinoamericana tirem os ensinamentos da crise européia, não
apenas no que toca as características do capitalismo em geral, mas também no
que toca a necessidade de um programa de superação do neoliberalismo que de
fato toque em suas bases: o capital financeiro e as transnacionais. Sem ter
isso claro, o destino da esquerda social-democrata será o pântano
social-liberal.
O terceiro conflito que marca a conjuntura internacional é a
campanha eleitoral na Venezuela. Hugo Chavez segue liderando as pesquisas e,
por isto mesmo, a direita latinoamericana e seus patrões gringos buscam pintar
um quadro eleitoral diferente do real, preparando o ambiente para o pós-7 de
outubro. Deste ponto de vista, a integração da Venezuela ao Mercosul, além de
vantajosa para todos os países e para o processo regional, constitui também um
instrumento de proteção para a chamada Revolução Bolivariana, contra eventuais
tentativas de intervenção estrangeira. É preciso acelerar a integração, ampliar
o mais rapidamente que for possível o Mercosul –através da adesão de Equador e
Bolívia-- e fortalecer os mecanismos da Unasul. Ao mesmo tempo, é preciso
fortalecer a atuação internacional do PT, diretamente e através do Foro de São
Paulo, pois o sistema de partidos da esquerda latino-americana possui
debilidades que precisam ser superadas no curto prazo.
O quarto conflito é a eleição presidencial, em novembro, nos
Estados Unidos. Embora o mais provável ainda seja a vitória de Obama, não
devemos subestimar a força da direita cavernícola expressa pela candidatura
republicana. Nem devemos esquecer que Obama –no terreno da política
externa—assumiu a pauta da direita do Partido Democrata, capitaneada pela
senhora Hillary Clinton. Ou seja, se a vitória de Romney projeta uma hecatombe,
a de Obama não significa um desanuviamento. Neste sentido, o futuro depende da
organização político-social independente da classe trabalhadora estadounidense,
a começar pelos migrantes latinos.
No cenário nacional, o mês de agosto de 2012 também será
muito tenso.
De cara, temos o julgamento, no Supremo Tribunal Federal, do
chamado mensalão.
Dizemos do chamado, porque o próprio autor do
termo –o então deputado Roberto Jefferson, ainda hoje dirigente do Partido
Trabalhista Brasileiro— reconheceu em seu depoimento à Justiça que ele inventou
este termo, admitindo não ter existido pagamento mensal para que parlamentares votassem
de acordo com as posições do governo federal.
Dizemos julgamento no STF, mas deveríamos
acrescentar: & linchamento na mídia. Os grandes meios de comunicação
estão alinhados em torno de uma posição única, que lembra a rainha de Alice no
País das Maravilhas: cortar cabeças (no caso, condenar e
prender).
Como não existe mobilização social –nem a favor, nem contra
os réus—os meios de comunicação estão fazendo um esforço imenso para provocar tal
mobilização, seja nas ruas, seja nas urnas, direcionando-a contra o PT.
Para isto, fazem uma cobertura totalmente parcial do
julgamento. Um exemplo desta parcialidade são os dois pesos e duas medidas do
Supremo Tribunal Federal, ao tratar o chamado mensalão (que certa imprensa
adjetiva como petista) e o caso
similar envolvendo tucanos (que certa imprensa chama de mensalinho mineiro). O tucano ocorreu antes, mas
ainda não foi a julgamento; e neste caso, o STF decidiu desmembrar o processo.
No caso que envolve réus petistas, antecipou o julgamento e manteve tudo no
Supremo.
O julgamento foi marcado nesta data, aliás, exatamente para que
a super-exposição do assunto coincida com as eleições municipais. E a mídia
monopolista está fazendo um brutal esforço para que os réus sejam condenados,
especialmente aqueles cuja condenação possa causar danos ao Partido dos
Trabalhadores.
De nossa parte, reiteramos as posições que defendemos acerca
das causas da crise de 2005, acerca dos erros políticos cometidos por
importantes dirigentes do Partido, acerca do pano de fundo estratégico destes
erros, bem como reiteramos a defesa que o PT faz sobre a necessidade de adotar
o financiamento público de campanhas eleitorais.
Enquanto houver financiamento privado empresarial, haverá
corrupção. E a democracia será, como disse um famoso escritor estadounidense, o
melhor sistema que o dinheiro pode comprar.
Nosso posicionamento e nosso voto, nos debates travados no
interior do Partido dos Trabalhadores, foi absolutamente claro, seja na eleição
das direções partidárias, seja no Diretório Nacional: contra os que colocaram
em risco a sobrevivência do PT.
Mas os critérios do Partido, não são os critérios da Justiça.
O que é legal para a Justiça, não necessariamente é legítimo para o Partido. E
o que é legítimo para o Partido, não necessariamente é legal perante a Justiça.
É o caso, por exemplo, das ocupações de terra.
Também por isto, sempre condenamos qualquer tentativa de
submeter à Justiça Eleitoral as decisões adotadas pelo Partido (como fizeram,
para citar dois exemplos politicamente opostos, tanto Wladimir Palmeira em 1998
quanto João da Costa em 2012).
A ausência de controle democrático, a falta de
transparência, os critério de seleção e promoção, o modus operandi, aliado a
legislação voltada no fundamental para defender o status quo e o direito dos
grandes proprietários privados, fazem da Justiça o terreno privilegiado da
burguesia, não da classe trabalhadora.
No Supremo Tribunal Federal ou em qualquer outra instância
judicial, exigimos que eventuais condenações estejam baseadas na lei,
sustentadas em provas, com pleno direito à defesa, cabendo ao acusador o ônus
de provar, garantida a inocência do acusado até prova em contrário. Esta s
são as premissas básicas para que, mesmo quando questionamos o mérito das
decisões, elas possam ser formalmente legítimas.
A direita não está preocupada com isto. Pretende que o
Supremo Tribunal Federal atue como seu Partido, ou seja: que no comando esteja
a política que defendem, não a Lei. Por isso, se a aplicação da Lei indicar que
os réus devem ser absolvidos, eles corrigirão a conhecida máxima da seguinte
forma: aos amigos tudo, aos inimigos nem mesmo a Lei.
Sabendo disto, mesmo sabendo que há réus contra os quais não
há provas que permitam uma condenação; mesmo considerando as surpresas
positivas que podem derivar das características próprias da composição do
Supremo; mesmo sabendo que a pressão excessiva por parte da mídia pode provocar,
sobre alguns ministros do Supremo, um efeito oposto ao pretendido pela direita;
devemos preparar politicamente o Partido para a condenação de diversos réus
ligados ao PT, o que terá algum impacto sobre o transcorrer das eleições e
sobre seu resultado final.
Não imaginamos um impacto direto sobre as intenções de voto
do grande eleitorado, que em 2006 e 2010 já se manifestou, reelegendo Lula e
Dilma; sendo que a preferência popular pelo PT é hoje superior a dos demais
partidos somados. Mas uma eventual condenação pode impactar tanto em situações
municipais específicas, quanto pode ter um impacto geral sobre a capacidade de
mobilização militante do petismo, extremamente necessária em algumas cidades,
especialmente nas semanas que antecedem o horário eleitoral gratuito.
Um segundo elemento do cenário nacional é, exatamente, a
eleição municipal. Na maioria do país, ainda estamos numa fase de aquecimento
das campanhas: só nos últimos dez dias deste mês, com o início da campanha na
televisão, é que a campanha vai tomar conta do cotidiano da vida nacional.
Será neste momento que veremos quais candidaturas petistas souberam
apropriar-se da força do voto potencial no PT; e quais candidaturas aparecerão,
aos olhos do eleitor médio, como sendo as sintonizadas com a obra dos governos Lula
e Dilma.
Sabendo que ainda é cedo para avaliações definitivas, é
preciso entretanto acender o sinal amarelo: se dependesse da situação atual, o
quadro nacional estaria mais para negativo do que para positivo. Motivo pelo
qual não basta esperar que as coisas melhorem, após o início do horário
eleitoral gratuito. É preciso fazer um esforço imenso para mobilizar a
militância e politizar as campanhas, inclusive para neutralizar a tentativa que
a mídia faz para desgastar o PT.
É preciso levar em conta, também –este é o terceiro elemento
do cenário nacional— que o resultado eleitoral está vinculado ao maior ou menor
êxito do governo, nas medidas que visam manter a atividade econômica em níveis
compatíveis com a geração de empregos e salários de qualidade. Deste ponto de
vista, a batalha contra o setor financeiro e contra as transnacionais segue na
ordem do dia.
O que a General Motors busca fazer, demitindo apesar dos
subsídios e incentivos recebidos do governo por todo o setor automobilístico, é
nada menos que um acinte. Frente a isto, esperamos do ministro da Fazenda,
Guido Mantega, uma atitude pelo menos tão firme quanto a da presidenta Dilma,
que já deixou claro que subsídio deve estar vinculado a manutenção de empregos.
Neste sentido, reiteramos a
necessidade do movimento social se manter mobilizado em torno de suas demandas
e reafirmamos o conteúdo da nota Valorização
do funcionalismo, encaminhada por nós à direção nacional do Partido dos
Trabalhadores.
Tal nota encerra dizendo que: A valorização do funcionalismo público não
pode ser interditada em nome de suposta necessidade de contingenciamento
orçamentário. A experiência dos anos recentes já demonstrou que a melhor
maneira de enfrentarmos os efeitos (e as raizes) da crise econômica
internacional é aumentar o gasto público com equivalente aumento da capacidade
geral do Estado em prover serviços e infraestrura de qualidade para o conjunto
da população. Cabe ao PT cumprir um papel ativo na tentativa de fortalecer os
canais de diálogo e negociação efetiva entre o governo e o movimento sindical
do funcionalismo.
As dificuldades do mês de agosto confirmam algo que temos
destacado desde 2005: nosso Partido precisa retomar o debate estratégico. Temas
como a reforma política, a democratização da comunicação, as medidas de
proteção da economia nacional e a ampliação da nossa organicidade militante
precisam receber atenção permanente, de uma direção partidária que pretenda ser
algo mais do que administradora de campanhas eleitorais bianuais.
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