Recomendo a leitura da entrevista concedida pelo ministro Ricardo Berzoini ao jornalista Renato Rovai e disponível no endereço abaixo:
http://www.revistaforum.com.br/blogdorovai/2016/02/25/berzoini-defende-do-acordo-no-senado-politica-nao-e-tudo-ou-nada/
Recomendo por três motivos:
1) muitas divergências políticas à parte, Berzoini está ministro mas é petista;
2) Renato Rovai é uma pessoa de esquerda, simpático a Berzoini, portanto sua entrevista é confiável;
3) a maneira como Berzoini tenta explicar e justificar os motivos do governo explicita uma concepção estratégica que, mantida, nos levará de derrota em derrota, até o final.
Embora não esteja necessariamente de acordo, não me deterei aqui em questionar os argumentos de Ricardo Berzoini, acerca da situação atual do mercado internacional de petróleo, acerca da correlação de forças no Senado ou das diferenças entre o que foi aprovado e o projeto original do intragável José Serra.
Outros já o fizeram, em diversos artigos e entrevistas publicadas nos últimos dias e não teria nada a acrescentar.
Apenas peço aos leitores que atentem para o seguinte: segundo entendi da entrevista de Berzoini, a opção por um acordo foi motivada pelo avaliação de que seríamos derrotados.
Mas, se é assim, por qual motivo o senador José Serra também optou pelo acordo?
Uma possível explicação é: Serra também considerava a hipótese de ser derrotado.
A diferença é que, para Serra, o acordo era uma meia-vitória. Para nós, o acordo era (no mínimo) uma meia-derrota.
Registro, embora não tenha como provar, que Serra sabia que provavelmente seria derrotado e por isto preferiu a meia-vitória. O caráter (digamos assim) do senador indica que ele, se estivesse seguro da vitória, não aceitaria o acordo.
Mas admitamos, para fins de discussão, que o resultado era incerto. Sendo assim, por qual motivo o governo não quis correr o risco e escolheu fazer o acordo?
Segundo entendi, Berzoini dá duas explicações.
A primeira explicação é que "poderíamos ter marcado posição, trabalhado e torcido para ganhar. Ou a gente poderia negociar com pensamentos diferentes e buscar uma solução que não prejudicasse tanto a Petrobrás".
Ou seja: o texto aprovado tem "salvaguardas importantes" para a Petrobrás. E entre o risco de uma derrota total e uma meia-derrota, melhor esta última, que no limite (na opinião de Berzoini) preserva os interesses nacionais.
Acho que Berzoini "doura a pílula". O governo abriu mão de uma política de Estado. Passamos a ter uma política "de governo". E, como lembra Berzoini, "a presidência é resultante de uma eleição nacional. Hoje é a Dilma e daqui a três anos pode ser alguém de qualquer orientação política".
Mas o mais interessante na argumentação de Berzoini é a segunda explicação. Trata-se de uma teoria que, na minha opinião, explica o que denomino de "opção preferencial pelos péssimos acordos, no lugar de boas brigas".
Segundo Berzoini, "política não é tudo ou nada. Política não é ou eu aprovo o que eu quero ou não participo da discussão. Política é saber analisar a correlação de forças de um determinado ambiente, ver quais são as possibilidades para buscar o melhor resultado possível e tomar a decisão com base nisso".
Trata-se de uma versão expandida da famosa "arte do possível". Um raciocínio aparentemente carregado de bom senso e, não por acaso, de muito conservadorismo.
Aplicando o raciocínio de Berzoini, temos o seguinte:
a) num "ambiente" em que a correlação de forças é favorável, o "melhor resultado possível" é geralmente um acordo. Pois o acordo, num ambiente favorável, é uma meia-vitória, sem os custos de uma vitória completa e sem os riscos de uma derrota;
b) já num ambiente em que a correlação de forças é desfavorável, o "melhor resultado possível" é... também um acordo, pois neste ambiente a vitória é uma alternativa pouco provável, ao tempo em que é muito grande a chance de derrota.
Para o empresariado capitalista, esta "teoria" é ótima, pois mesmo quando a correlação de forças é favorável aos trabalhadores, estes nunca chegarão ao ponto de questionar o controle que a classe dominante mantém sobre a mídia e determinados aparatos de Estado.
Mas para os trabalhadores, esta "teoria" não é suficiente, pois ela nunca chega ao ponto de alterar estruturalmente os fatores de dominação já mencionados, para não falar do controle das empresas.
Sigamos adiante no raciocínio:
a) quando o "ambiente" é favorável, o preço pago por não arriscar "uma boa briga" só é percebido depois, quando os inimigos conseguem inverter a correlação de forças (usando para isto aqueles fatores de poder que ficaram intocados pelas "meias-vitórias"). Neste momento nos perguntamos: porque não fizemos isto? Porque não tentamos aquilo? Mas Inês já é morta;
b) quando o "ambiente" é desfavorável, o preço pago por não arriscar "uma boa briga" é percebido imediatamente, já na disputa seguinte, quando a correlação de forças se torna ainda pior, deixando como opções uma derrota ainda mais devastadora ou uma concessão ainda mais desmoralizante. E assim sucessivamente.
Novamente fica claro porque, para o empresariado, esta "teoria" acerca do que é política permite sobreviver com relativa tranquilidade nos momentos de correlação desfavorável e permite destruir a esquerda quando a correlação de forças muda.
Já para os trabalhadores, esta "teoria" não permite extrair todo o possível nos momentos de vacas gordas, ao mesmo tempo que conduz a um recuo sem fim nos momentos de vacas magras.
O mais grave, contudo, é que esta "teoria" acerca do que é a política não aponta, não indica, não sugere o que deva ser feito para alterar a correlação de forças a nosso favor, quando o "ambiente" é negativo.
É uma "teoria" que só funciona em tempos de vento a favor. Pois nesses momentos, mesmo fazendo concessões, a gente consegue avançar um pouco.
Mas e nos momentos de vento contra? Como parar de recuar e voltar a avançar?
A definição do que é política segundo Berzoini não responde a este tipo de pergunta.
Cada meia-derrota nossa é uma meia-vitória do inimigo. Eles avançam, nós recuamos. Com um agravante: não dispomos das mesmas reservas estratégicas (apoio internacional, controle de capitais, o oligopólio da mídia, pedaços da máquina do Estado etc.) que eles dispõem. Portanto, num "ambiente" desfavorável, a opção por meias derrotas tende a produzir apenas novas derrotas.
Ricardo Berzoini admite isto explicitamente quando diz que pode ser que "alguns que estão criticando o texto que saiu do Senado ontem se sintam na obrigação de defendê-lo na Câmara. Porque a opinião da maioria dos deputados sobre esse tema é mais complexa. Nós temos mais pessoas com visão liberal na Câmara do que no Senado".
Para deter o círculo vicioso de derrotas que geram derrotas, é preciso deter a ofensiva inimiga. Como fazer isto?
Claro que num "ambiente desfavorável", isto implica em escolher o momento certo, o tema certo, a melhor correlação de forças possível. Implica, inclusive, em não travar algumas batalhas, em aceitar meias-derrotas ou até mesmo em sofrer derrotas (os que jogam xadrez sabem que as vezes ceder uma peça é parte de uma ofensiva). Mas além disto tudo, para deter a ofensiva inimiga é preciso, também, alguma disposição de correr risco.
(Foi o que fizemos, por exemplo, quando Eduardo Cunha chantageou a bancada do PT, no final de 2015. Corremos o risco.)
Acontece que a "teoria" de política explicitada na entrevista de Berzoini padece de "aversão ao risco". Por isto, mesmo havendo sinais de que poderíamos ganhar na votação do Senado, a opção foi pelo acordo.
Berzoini não diz isto e certamente negará pensar isto, mas a prática tem demonstrado o que segue: nos últimos anos tem prevalecido, na prática de parte da esquerda brasileira, a "opção preferencial pelos péssimos acordos, no lugar do risco inevitável das boas brigas".
Berzoini nos dá um bom exemplo disto, quando fala o seguinte acerca da reforma da previdência: o "governo não tem nada a ganhar com a mudança que possa vir a ser feita em 2016 ou 2017, mas o país tem. É por isso que estamos debatendo o tema".
Acompanhem o raciocínio: o governo Dilma vai brigar com uma parte de sua base social, tornando-se ainda mais fraco, pavimentando o caminho para uma vitória da direita em 2018... e isto... fará o país ganhar??? De que "país" estamos falando???
Neste ponto, a "teoria" de política expressa por Berzoini revela seu lado patológico, uma mistura de síndrome de Estocolmo com tendência ao suicídio.
Claro: o único jeito de tornar tolerável, para pessoas de esquerda, um caminho que acumula derrotas, é convertendo focinho de porco em tomada.
Desta forma, nossa derrota é apresentada como um ato de sacríficio no altar da pátria. O programa do inimigo é apresentado como se fosse ao menos parcialmente nosso. E, num objetivismo digno do Conselheiro Acácio, ficamos sabendo que "o ajuste fiscal é uma realidade do mundo".
Da minha parte, entendo que os trabalhadores precisam de outra concepção de política, que nos oriente sobre como fazer para alterar a correlação de forças, o que implica em travar combates, mesmo quando não temos certeza da vitória. O papel da Petrobrás no pré-sal era e continua sendo bom motivo para um combate deste tipo. Combate que poderíamos ter vencido e que ainda podemos vencer.
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Berzoini defende acordo no Senado: política não é tudo ou nada
25 de February de 2016
Ministro da Secretaria de Governo defende articulação feita para aprovar substitutivo do senador Romero Jucá, que tira da Petrobras a operação única do pré-sal. “Política é saber analisar a correlação de forças de um determinado ambiente, ver quais são as possibilidades para buscar o melhor resultado possível e tomar a decisão com base nisso”, argumenta Berzoini
Blog do Rovai – Ontem foi aprovado um projeto originalmente do senador José Serra, com emenda do senador Romero Jucá, que contraria boa parte, senão a totalidade do discurso e dos compromissos assumidos pela presidenta Dilma na sua campanha de reeleição em relação ao pré-sal. Por que isso aconteceu, ministro?
Ricardo Berzoini – Em primeiro lugar porque o Senado é um espaço pluripartidário. Não é um espaço do governo federal e do poder Executivo. E lá há várias opiniões diferentes sobre o tema do petróleo e do pré-sal. Segundo porque o mercado do petróleo mudou radicalmente nos últimos anos. Não é mais o mesmo mercado de 2012, 2013 e do começo de 2104. E terceiro porque num ambiente em que se tem a possibilidade da aprovação de um projeto que era praticamente a exclusão da Petrobrás do pré-sal e foi possível evoluir para um texto que tem salvaguardas importantes para a empresa, tem que se levar em consideração isso. Política não é tudo ou nada. Política não é ou eu aprovo o que eu quero ou não participo da discussão. Política é saber analisar a correlação de forças de um determinado ambiente, ver quais são as possibilidades para buscar o melhor resultado possível e tomar a decisão com base nisso. Evidentemente que nem agradando a todos, mas buscando conciliar o que é possível na defesa dos interesses nacionais.
Blog do Rovai – Há senadores da base que dizem que faltou empenho do governo na primeira votação da urgência…
Berzoini – Havia senadores ausentes do país, senadores que não estavam na votação. O governo buscou o máximo possível de votos, mas nós não mandamos nos senadores. Posso garantir que empenho não faltou.
Blog do Rovai – Na votação de ontem à noite, o senador Lindbergh Farias e a senadora Gleisi Hoffman, que defende com muito empenho o governo na Casa, disseram que o governo fez uma negociação sem conversar com a bancada do PT sobre sua mudança de orientação e sobre o acordo que foi aprovado.
Berzoini – Nós mantivemos durante todo o dia conversas. Na segunda-feira à noite me reuni com líderes da base. É preciso entender que a nossa base não é homogênea. A nossa base é heterogênea e fizemos o debate para fazer uma análise mais profunda sobre as implicações da aprovação daquele projeto e eu disse que deveríamos buscar esse objetivo, ao mesmo tempo sabendo que havia um desejo de parte significativa dos senadores, tanto da base e como da oposição, de votar este projeto nesta semana. Ou seja, também não é um jogo onde o governo pilota de forma burocrática a sua base. A base do governo é heterogênea e o Brasil sabe disso.
Blog do Rovai – O governo vai defender o que foi aprovado ontem no Senado na Câmara?
Berzoini – O governo vai continuar acompanhando a tramitação e analisando o cenário. Pode ser que alguns que estão criticando o texto que saiu do Senado ontem se sintam na obrigação de defendê-lo na Câmara. Porque a opinião da maioria dos deputados sobre esse tema é mais complexa. Nós temos mais pessoas com visão liberal na Câmara do que no Senado.Poderíamos ter marcado posição, trabalhado e torcido para ganhar. Ou a gente poderia negociar com pensamentos diferentes e buscar uma solução que não prejudicasse tanto a Petrobrás.
O texto obriga o Conselho Nacional de Política Energética a oferecer à Petrobrás os blocos para serem contratados no regime de partilha. Não é verdade que ele acaba com o regime de partilha. Segundo, ele obriga depois que a resposta da Petrobrás seja enviada à presidência da República. A decisão final ainda passa pelo crivo da presidência. A presidência é resultante de uma eleição nacional. Hoje é a Dilma e daqui a três anos pode ser alguém de qualquer orientação política. É resultado do processo democrático. Ou seja, está assegurado que a Petrobrás terá o direito de forma voluntária como operadora a explorar o pré-sal.
Blog do Rovai – Essa é uma das críticas que estão sendo feitas, o que era uma questão de Estado passou a ser decisão de governo?
Berzoini – Na verdade, a definição das áreas que seriam exploradas ou não era do governo. A única coisa diferente era que a Petrobrás precisava participar obrigatoriamente de todos. Agora, a diferença é que ela pode escolher todos. Ou não. Não estou defendendo que este projeto melhora ou piora a exploração do pré-sal, mas sim que o projeto que foi aprovado, se a gente tiver condições de defendê-lo, vai permitir que a Petrobrás exerça totalmente ou quase totalmente a preferência da exploração.
Blog do Rovai – Ministro, como o senhor dialoga com o discurso de que hoje a presidenta Dilma governa com o plano de governo do candidato Aécio? Além dessa questão do pré-sal, tem a mudança da previdência, a privatização da CELG e mesmo o ajuste fiscal do jeito que vem sendo feito.
Berzoini – Você conhece minha posição sobre previdência há mais de 30 anos. Previdência Social é um tema complexo que tem a ver com expectativas econômicas e demográficas de longo prazo. Quando você percebe que o vento está mudando, tem a obrigação no Estado ou fora dele de discutir garantias para que o sistema continue forte. O governo não tem nada a ganhar com a mudança que possa vir a ser feita em 2016 ou 2017, mas o país tem. É por isso que estamos debatendo o tema.
O ajuste fiscal é uma realidade do mundo. Existe uma mudança de padrão de desempenho da economia mundial e no Brasil isso está um pouco mais grave por conta da dependência das commodities. A Vale, por exemplo, que apresentava lucros vultuosos, apresentou resultados negativos. Isso impacta na arrecadação. A gente tá buscando fazer o ajuste, garantindo que não haja redução do Minha Casa Minha Vida, no Bolsa Família, em programas de educação etc. Se a gente tiver uma postura frouxa, vai estourar a inflação. E por isso temos de fazer o ajuste.
Blog do Rovai – Qual a sua expectativa para este ano, ministro? O senhor concorda com as previsões de queda aproximada de 3 a 4% do PIB e inflação na casa dos 7 a 8%?
Berzoini – Eu diria que essas previsões não são alarmistas, são próximas da realidade. Estamos trabalhando para revertê-las, só que a situação do mundo é muito complexa. Hoje temos saldo na balança comercial, mas isso tem muito mais a ver com a queda da importação. Mesmo com câmbio mais alto, o que é uma decisão correta a meu ver, a exportação não aumentou. Por isso estamos trabalhando internamente para que alguns setores voltem a crescer. E por isso que a gente não vai mexer no Bolsa Família e nem no Minha Casa Minha Vida porque eles, além de gerarem emprego, garantem renda para parte da população. Hoje nós temos um desemprego que aumentou, mas que ainda é metade daquele que recebemos ao final do governo Fernando Henrique. O quadro é desafiador.
Blog do Rovai – Recentemente o senhor deu uma entrevista na qual foi duro com o juiz Sérgio Moro. Acha que ele é hoje o líder da oposição no Brasil?
Berzoini – Não acho isso, mas acho que o processo que ele conduz tem várias incongruências com o Estado Democrático de Direito. Hoje se induz à culpa precoce de pessoas que ainda não foram julgadas. Tanto no Judiciário como na Polícia Federal o combate à corrupção justifica o atropelamento do Estado Democrático de Direito.
Foto: Elza Fiúza/Agência Brasil
http://www.revistaforum.com.br/blogdorovai/2016/02/25/berzoini-defende-do-acordo-no-senado-politica-nao-e-tudo-ou-nada/
Recomendo por três motivos:
1) muitas divergências políticas à parte, Berzoini está ministro mas é petista;
2) Renato Rovai é uma pessoa de esquerda, simpático a Berzoini, portanto sua entrevista é confiável;
3) a maneira como Berzoini tenta explicar e justificar os motivos do governo explicita uma concepção estratégica que, mantida, nos levará de derrota em derrota, até o final.
Embora não esteja necessariamente de acordo, não me deterei aqui em questionar os argumentos de Ricardo Berzoini, acerca da situação atual do mercado internacional de petróleo, acerca da correlação de forças no Senado ou das diferenças entre o que foi aprovado e o projeto original do intragável José Serra.
Outros já o fizeram, em diversos artigos e entrevistas publicadas nos últimos dias e não teria nada a acrescentar.
Apenas peço aos leitores que atentem para o seguinte: segundo entendi da entrevista de Berzoini, a opção por um acordo foi motivada pelo avaliação de que seríamos derrotados.
Mas, se é assim, por qual motivo o senador José Serra também optou pelo acordo?
Uma possível explicação é: Serra também considerava a hipótese de ser derrotado.
A diferença é que, para Serra, o acordo era uma meia-vitória. Para nós, o acordo era (no mínimo) uma meia-derrota.
Registro, embora não tenha como provar, que Serra sabia que provavelmente seria derrotado e por isto preferiu a meia-vitória. O caráter (digamos assim) do senador indica que ele, se estivesse seguro da vitória, não aceitaria o acordo.
Mas admitamos, para fins de discussão, que o resultado era incerto. Sendo assim, por qual motivo o governo não quis correr o risco e escolheu fazer o acordo?
Segundo entendi, Berzoini dá duas explicações.
A primeira explicação é que "poderíamos ter marcado posição, trabalhado e torcido para ganhar. Ou a gente poderia negociar com pensamentos diferentes e buscar uma solução que não prejudicasse tanto a Petrobrás".
Ou seja: o texto aprovado tem "salvaguardas importantes" para a Petrobrás. E entre o risco de uma derrota total e uma meia-derrota, melhor esta última, que no limite (na opinião de Berzoini) preserva os interesses nacionais.
Acho que Berzoini "doura a pílula". O governo abriu mão de uma política de Estado. Passamos a ter uma política "de governo". E, como lembra Berzoini, "a presidência é resultante de uma eleição nacional. Hoje é a Dilma e daqui a três anos pode ser alguém de qualquer orientação política".
Mas o mais interessante na argumentação de Berzoini é a segunda explicação. Trata-se de uma teoria que, na minha opinião, explica o que denomino de "opção preferencial pelos péssimos acordos, no lugar de boas brigas".
Segundo Berzoini, "política não é tudo ou nada. Política não é ou eu aprovo o que eu quero ou não participo da discussão. Política é saber analisar a correlação de forças de um determinado ambiente, ver quais são as possibilidades para buscar o melhor resultado possível e tomar a decisão com base nisso".
Trata-se de uma versão expandida da famosa "arte do possível". Um raciocínio aparentemente carregado de bom senso e, não por acaso, de muito conservadorismo.
Aplicando o raciocínio de Berzoini, temos o seguinte:
a) num "ambiente" em que a correlação de forças é favorável, o "melhor resultado possível" é geralmente um acordo. Pois o acordo, num ambiente favorável, é uma meia-vitória, sem os custos de uma vitória completa e sem os riscos de uma derrota;
b) já num ambiente em que a correlação de forças é desfavorável, o "melhor resultado possível" é... também um acordo, pois neste ambiente a vitória é uma alternativa pouco provável, ao tempo em que é muito grande a chance de derrota.
Para o empresariado capitalista, esta "teoria" é ótima, pois mesmo quando a correlação de forças é favorável aos trabalhadores, estes nunca chegarão ao ponto de questionar o controle que a classe dominante mantém sobre a mídia e determinados aparatos de Estado.
Mas para os trabalhadores, esta "teoria" não é suficiente, pois ela nunca chega ao ponto de alterar estruturalmente os fatores de dominação já mencionados, para não falar do controle das empresas.
Sigamos adiante no raciocínio:
a) quando o "ambiente" é favorável, o preço pago por não arriscar "uma boa briga" só é percebido depois, quando os inimigos conseguem inverter a correlação de forças (usando para isto aqueles fatores de poder que ficaram intocados pelas "meias-vitórias"). Neste momento nos perguntamos: porque não fizemos isto? Porque não tentamos aquilo? Mas Inês já é morta;
b) quando o "ambiente" é desfavorável, o preço pago por não arriscar "uma boa briga" é percebido imediatamente, já na disputa seguinte, quando a correlação de forças se torna ainda pior, deixando como opções uma derrota ainda mais devastadora ou uma concessão ainda mais desmoralizante. E assim sucessivamente.
Novamente fica claro porque, para o empresariado, esta "teoria" acerca do que é política permite sobreviver com relativa tranquilidade nos momentos de correlação desfavorável e permite destruir a esquerda quando a correlação de forças muda.
Já para os trabalhadores, esta "teoria" não permite extrair todo o possível nos momentos de vacas gordas, ao mesmo tempo que conduz a um recuo sem fim nos momentos de vacas magras.
O mais grave, contudo, é que esta "teoria" acerca do que é a política não aponta, não indica, não sugere o que deva ser feito para alterar a correlação de forças a nosso favor, quando o "ambiente" é negativo.
É uma "teoria" que só funciona em tempos de vento a favor. Pois nesses momentos, mesmo fazendo concessões, a gente consegue avançar um pouco.
Mas e nos momentos de vento contra? Como parar de recuar e voltar a avançar?
A definição do que é política segundo Berzoini não responde a este tipo de pergunta.
Cada meia-derrota nossa é uma meia-vitória do inimigo. Eles avançam, nós recuamos. Com um agravante: não dispomos das mesmas reservas estratégicas (apoio internacional, controle de capitais, o oligopólio da mídia, pedaços da máquina do Estado etc.) que eles dispõem. Portanto, num "ambiente" desfavorável, a opção por meias derrotas tende a produzir apenas novas derrotas.
Ricardo Berzoini admite isto explicitamente quando diz que pode ser que "alguns que estão criticando o texto que saiu do Senado ontem se sintam na obrigação de defendê-lo na Câmara. Porque a opinião da maioria dos deputados sobre esse tema é mais complexa. Nós temos mais pessoas com visão liberal na Câmara do que no Senado".
Para deter o círculo vicioso de derrotas que geram derrotas, é preciso deter a ofensiva inimiga. Como fazer isto?
Claro que num "ambiente desfavorável", isto implica em escolher o momento certo, o tema certo, a melhor correlação de forças possível. Implica, inclusive, em não travar algumas batalhas, em aceitar meias-derrotas ou até mesmo em sofrer derrotas (os que jogam xadrez sabem que as vezes ceder uma peça é parte de uma ofensiva). Mas além disto tudo, para deter a ofensiva inimiga é preciso, também, alguma disposição de correr risco.
(Foi o que fizemos, por exemplo, quando Eduardo Cunha chantageou a bancada do PT, no final de 2015. Corremos o risco.)
Acontece que a "teoria" de política explicitada na entrevista de Berzoini padece de "aversão ao risco". Por isto, mesmo havendo sinais de que poderíamos ganhar na votação do Senado, a opção foi pelo acordo.
Berzoini não diz isto e certamente negará pensar isto, mas a prática tem demonstrado o que segue: nos últimos anos tem prevalecido, na prática de parte da esquerda brasileira, a "opção preferencial pelos péssimos acordos, no lugar do risco inevitável das boas brigas".
Berzoini nos dá um bom exemplo disto, quando fala o seguinte acerca da reforma da previdência: o "governo não tem nada a ganhar com a mudança que possa vir a ser feita em 2016 ou 2017, mas o país tem. É por isso que estamos debatendo o tema".
Acompanhem o raciocínio: o governo Dilma vai brigar com uma parte de sua base social, tornando-se ainda mais fraco, pavimentando o caminho para uma vitória da direita em 2018... e isto... fará o país ganhar??? De que "país" estamos falando???
Neste ponto, a "teoria" de política expressa por Berzoini revela seu lado patológico, uma mistura de síndrome de Estocolmo com tendência ao suicídio.
Claro: o único jeito de tornar tolerável, para pessoas de esquerda, um caminho que acumula derrotas, é convertendo focinho de porco em tomada.
Desta forma, nossa derrota é apresentada como um ato de sacríficio no altar da pátria. O programa do inimigo é apresentado como se fosse ao menos parcialmente nosso. E, num objetivismo digno do Conselheiro Acácio, ficamos sabendo que "o ajuste fiscal é uma realidade do mundo".
Da minha parte, entendo que os trabalhadores precisam de outra concepção de política, que nos oriente sobre como fazer para alterar a correlação de forças, o que implica em travar combates, mesmo quando não temos certeza da vitória. O papel da Petrobrás no pré-sal era e continua sendo bom motivo para um combate deste tipo. Combate que poderíamos ter vencido e que ainda podemos vencer.
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Berzoini defende acordo no Senado: política não é tudo ou nada
25 de February de 2016
Ministro da Secretaria de Governo defende articulação feita para aprovar substitutivo do senador Romero Jucá, que tira da Petrobras a operação única do pré-sal. “Política é saber analisar a correlação de forças de um determinado ambiente, ver quais são as possibilidades para buscar o melhor resultado possível e tomar a decisão com base nisso”, argumenta Berzoini
Blog do Rovai – Ontem foi aprovado um projeto originalmente do senador José Serra, com emenda do senador Romero Jucá, que contraria boa parte, senão a totalidade do discurso e dos compromissos assumidos pela presidenta Dilma na sua campanha de reeleição em relação ao pré-sal. Por que isso aconteceu, ministro?
Ricardo Berzoini – Em primeiro lugar porque o Senado é um espaço pluripartidário. Não é um espaço do governo federal e do poder Executivo. E lá há várias opiniões diferentes sobre o tema do petróleo e do pré-sal. Segundo porque o mercado do petróleo mudou radicalmente nos últimos anos. Não é mais o mesmo mercado de 2012, 2013 e do começo de 2104. E terceiro porque num ambiente em que se tem a possibilidade da aprovação de um projeto que era praticamente a exclusão da Petrobrás do pré-sal e foi possível evoluir para um texto que tem salvaguardas importantes para a empresa, tem que se levar em consideração isso. Política não é tudo ou nada. Política não é ou eu aprovo o que eu quero ou não participo da discussão. Política é saber analisar a correlação de forças de um determinado ambiente, ver quais são as possibilidades para buscar o melhor resultado possível e tomar a decisão com base nisso. Evidentemente que nem agradando a todos, mas buscando conciliar o que é possível na defesa dos interesses nacionais.
Blog do Rovai – Há senadores da base que dizem que faltou empenho do governo na primeira votação da urgência…
Berzoini – Havia senadores ausentes do país, senadores que não estavam na votação. O governo buscou o máximo possível de votos, mas nós não mandamos nos senadores. Posso garantir que empenho não faltou.
Blog do Rovai – Na votação de ontem à noite, o senador Lindbergh Farias e a senadora Gleisi Hoffman, que defende com muito empenho o governo na Casa, disseram que o governo fez uma negociação sem conversar com a bancada do PT sobre sua mudança de orientação e sobre o acordo que foi aprovado.
Berzoini – Nós mantivemos durante todo o dia conversas. Na segunda-feira à noite me reuni com líderes da base. É preciso entender que a nossa base não é homogênea. A nossa base é heterogênea e fizemos o debate para fazer uma análise mais profunda sobre as implicações da aprovação daquele projeto e eu disse que deveríamos buscar esse objetivo, ao mesmo tempo sabendo que havia um desejo de parte significativa dos senadores, tanto da base e como da oposição, de votar este projeto nesta semana. Ou seja, também não é um jogo onde o governo pilota de forma burocrática a sua base. A base do governo é heterogênea e o Brasil sabe disso.
Blog do Rovai – O governo vai defender o que foi aprovado ontem no Senado na Câmara?
Berzoini – O governo vai continuar acompanhando a tramitação e analisando o cenário. Pode ser que alguns que estão criticando o texto que saiu do Senado ontem se sintam na obrigação de defendê-lo na Câmara. Porque a opinião da maioria dos deputados sobre esse tema é mais complexa. Nós temos mais pessoas com visão liberal na Câmara do que no Senado.Poderíamos ter marcado posição, trabalhado e torcido para ganhar. Ou a gente poderia negociar com pensamentos diferentes e buscar uma solução que não prejudicasse tanto a Petrobrás.
O texto obriga o Conselho Nacional de Política Energética a oferecer à Petrobrás os blocos para serem contratados no regime de partilha. Não é verdade que ele acaba com o regime de partilha. Segundo, ele obriga depois que a resposta da Petrobrás seja enviada à presidência da República. A decisão final ainda passa pelo crivo da presidência. A presidência é resultante de uma eleição nacional. Hoje é a Dilma e daqui a três anos pode ser alguém de qualquer orientação política. É resultado do processo democrático. Ou seja, está assegurado que a Petrobrás terá o direito de forma voluntária como operadora a explorar o pré-sal.
Blog do Rovai – Essa é uma das críticas que estão sendo feitas, o que era uma questão de Estado passou a ser decisão de governo?
Berzoini – Na verdade, a definição das áreas que seriam exploradas ou não era do governo. A única coisa diferente era que a Petrobrás precisava participar obrigatoriamente de todos. Agora, a diferença é que ela pode escolher todos. Ou não. Não estou defendendo que este projeto melhora ou piora a exploração do pré-sal, mas sim que o projeto que foi aprovado, se a gente tiver condições de defendê-lo, vai permitir que a Petrobrás exerça totalmente ou quase totalmente a preferência da exploração.
Blog do Rovai – Ministro, como o senhor dialoga com o discurso de que hoje a presidenta Dilma governa com o plano de governo do candidato Aécio? Além dessa questão do pré-sal, tem a mudança da previdência, a privatização da CELG e mesmo o ajuste fiscal do jeito que vem sendo feito.
Berzoini – Você conhece minha posição sobre previdência há mais de 30 anos. Previdência Social é um tema complexo que tem a ver com expectativas econômicas e demográficas de longo prazo. Quando você percebe que o vento está mudando, tem a obrigação no Estado ou fora dele de discutir garantias para que o sistema continue forte. O governo não tem nada a ganhar com a mudança que possa vir a ser feita em 2016 ou 2017, mas o país tem. É por isso que estamos debatendo o tema.
O ajuste fiscal é uma realidade do mundo. Existe uma mudança de padrão de desempenho da economia mundial e no Brasil isso está um pouco mais grave por conta da dependência das commodities. A Vale, por exemplo, que apresentava lucros vultuosos, apresentou resultados negativos. Isso impacta na arrecadação. A gente tá buscando fazer o ajuste, garantindo que não haja redução do Minha Casa Minha Vida, no Bolsa Família, em programas de educação etc. Se a gente tiver uma postura frouxa, vai estourar a inflação. E por isso temos de fazer o ajuste.
Blog do Rovai – Qual a sua expectativa para este ano, ministro? O senhor concorda com as previsões de queda aproximada de 3 a 4% do PIB e inflação na casa dos 7 a 8%?
Berzoini – Eu diria que essas previsões não são alarmistas, são próximas da realidade. Estamos trabalhando para revertê-las, só que a situação do mundo é muito complexa. Hoje temos saldo na balança comercial, mas isso tem muito mais a ver com a queda da importação. Mesmo com câmbio mais alto, o que é uma decisão correta a meu ver, a exportação não aumentou. Por isso estamos trabalhando internamente para que alguns setores voltem a crescer. E por isso que a gente não vai mexer no Bolsa Família e nem no Minha Casa Minha Vida porque eles, além de gerarem emprego, garantem renda para parte da população. Hoje nós temos um desemprego que aumentou, mas que ainda é metade daquele que recebemos ao final do governo Fernando Henrique. O quadro é desafiador.
Blog do Rovai – Recentemente o senhor deu uma entrevista na qual foi duro com o juiz Sérgio Moro. Acha que ele é hoje o líder da oposição no Brasil?
Berzoini – Não acho isso, mas acho que o processo que ele conduz tem várias incongruências com o Estado Democrático de Direito. Hoje se induz à culpa precoce de pessoas que ainda não foram julgadas. Tanto no Judiciário como na Polícia Federal o combate à corrupção justifica o atropelamento do Estado Democrático de Direito.
Foto: Elza Fiúza/Agência Brasil
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