- A presidenta Dilma Rousseff está tentando retomar a iniciativa neste começo do ano político. Entre todas as medidas que o Governo avalia como necessárias para superar a crise (prorrogação da DRU, volta da CPMF, reforma da Previdência...), qual deveria ser a prioridade?
A presidenta não está retomando a iniciativa. Para citar um texto do Alexandre Fortes a respeito de outro assunto, o que a Presidenta está fazendo "talvez possa ser resumida pela clássica frase do jogador João Pinto, do Benfica: 'O time estava à beira do abismo, mas tomou a decisão correta e deu um passo à frente'..."
Ou seja, frente a um ataque da direita, a presidenta foi defendida pela esquerda, mas as medidas apontadas como necessárias para superar a crise adotam o receituário da direita e prejudicam a esquerda, a classe trabalhadora, o povo.
A prioridade, em minha opinião, deveria ser outra: reduzir os juros, investir bilhões na produção, no desenvolvimento, nas políticas sociais, na geração de emprego e renda. Ou seja, dobrar a aposta que fizemos diante da crise de 2007-2008.
- Nas próximas semanas veremos o embate nas ruas entre os defensores do Governo Dilma (e também do ex-presidente Lula) e os movimentos pró-impeachment. Porém, a minha impressão é que o ambiente está bem mais calmo que entre março e agosto do ano passado. Haverá um novo acirramento agora que passou o carnaval?
Haverá, não. Há um acirramento. A diferença é que o governo está capitulando ao programa da direita, motivo pelo qual o alvo agora é no fundamental o PT e o presidente Lula. A direita, o oligopólio da mídia e o grande capital continuam acenando com o impeachment, que continua sendo uma ameaça. Mas o bombardeio principal é contra Lula e o PT. Um dos líderes do PSDB na Câmara dos Deputados pediu a cassação da legenda do PT. E o juiz Moro vazou para a imprensa investigações diretas contra Lula. Portanto, a direita decidiu não apenas acirrar, mas está disposta a impedir que possamos disputar as eleições de 2018. O lado positivo é que isto demonstra que não somos cachorro morto.
- Nos últimos dias corre o rumor de que um grupo do PT está planejando a criação de um novo partido mais à esquerda, talvez depois das eleições municipais. Pode realmente acontecer uma cisão?
Nos momentos de crise, existe de tudo: gente desanimada, desesperada, desbundada, desmoralizada, desmobilizada. Assim como há oportunistas preocupados não com o futuro do país, ou da esquerda brasileira, ou do PT, mas sim com terem uma legenda para disputar nas próximas eleições. Cá entre nós, se alguém quer sair do PT por razões políticas, saia logo. Escolher uma data para sair por conta da legislação eleitoral não é demonstração de que desejam algo mais à esquerda. Pelo contrário, quem age assim quer algo com todos os defeitos do PT, mas sem suas qualidades. Isto posto, não acho que esteja no cenário nenhum tipo de cisão. O risco, como expliquei antes, vem da direita, vem da tentativa da direita destruir, interditar, inviabilizar a existência do PT. Este é o risco. Frente a este risco, o resto é coisa menor.
- Como se vê, dentro do PT, a chegada de um liberal à presidência da Argentina e a recente vitória da oposição de direita na Venezuela? Está havendo uma mudança de rumo na região, ou são apenas casos pontuais?
Está em curso, há tempos, uma contraofensiva da direita. Não há nada de pontual, é um processo sistêmico, que tem relação com a crise internacional e seus efeitos na região, tem relação com o fato da direita ter aprendido com nossas vitórias e tem relação com as debilidades, deficiências e erros da própria esquerda e de nossos governos. A questão, portanto, não é se está havendo uma mudança de rumo. A questão é se esta mudança de rumo se completará, resultando em muitos anos de hegemonia conservadora; ou se vamos conseguir impedir que esta mudança de rumo se complete e, com isto, vamos retomar a ofensiva da esquerda. Em 1939, os nazistas sonhavam que o terceiro Reich ia durar centenas de anos. Virou pó. É este o estado de ânimo que nós, de esquerda, devemos ter frente a direita. Até porque, se não os enfrentarmos e derrotarmos, o preço será muito alto e será pago pela classe trabalhadora de agora e das futuras gerações.
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