Como se não bastasse propor uma reforma ministerial no próximo governo, quando tantos de nós esperavam que ele tomasse desde já a iniciativa de "arejar" o ministério, o ministro Paulo Bernardo revela --nas declarações dadas e citadas no texto abaixo reproduzido-- que segue sendo alguém doutro mundo.
Leiam com atenção. Ele insiste na tecla de que "se faz uma certa confusão entre os controles da comunicação eletrônico e a censura de conteúdo, que não será feita". E diz que o fundamental é a regionalização da produção, o que "não significa controle do conteúdo, porque a Constituição demarca o que pode ou não ser feito e proíbe embaraço ou restrições à plena liberdade de informação".
O jornal Valor, a quem ele deu estas declarações, entendeu que a "confusão" de que fala o ministro é feita pela "militância", que pelo visto quer "censura de conteúdo". É possível que Valor tenha razão, pois o ministro --em entrevista dada anteriormente à revista Veja-- criticou a militância por este motivo.
A pergunta que fica, entretanto, é a seguinte: quem deu ao oligopólio privado o direito de praticar "censura de conteúdo"? Não foi a Constituição, pois esta proíbe o monopólio.
O ministro, tão preocupado em explicar que não é a favor da censura de conteúdo, deve ter algum lampejo de que existe a censura praticada pelas empresas de comunicação. Talvez por isto, nos concede a seguinte pérola: "Precisamos discutir o conceito de monopólio. Na época em que a Constituição foi feita, em 1988, a situação era outra, as tiragens dos jornais eram muito maiores e a audiência da TV aberta bem mais expressiva. Os conceitos daquele tempo talvez não se ajustem aos tempos de hoje".
Realmente, precisamos discutir o conceito. Mas, qualquer que seja o "conceito", a realidade é que a comunicação no Brasil é controlada por um oligopólio. É este oligopólio privado que decide o que é ou não publicado. O que na prática significa censura. O problema é que para Paulo Bernardo e pessoas como ele, "censura" é algo praticado pelo Estado. A censura praticada pelo mercado, essa ao ministro parece ser parte da paisagem, talvez porque lhe escapem os "conceitos daquele tempo" em que todo militante de esquerda defendia de fato e de direito a comunicação como direito.
Em 5 de junho de 2014 11:17, Valter Pomar <pomar.valter@gmail.com> escreveu:
Proposta para lei da comunicação regionaliza produção de conteúdo - Valor Econômico
O governo estuda a apresentação de proposta para uma lei geral da comunicação eletrônica. A ideia, segundo o ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, é terminar a regulamentação dos quatro artigos da Constituição que tratam sobre a mídia. Na proposta, estarão as normas para coibir monopólios e oligopólios de emissoras e retransmissoras de rádio e TV. É o que a presidente Dilma Rousseff tem chamado de "controle econômico" da mídia.
De acordo com Paulo Bernardo, a ênfase do governo será dada entretanto em um aspecto que diz respeito à geração de conteúdo: haverá cotas mínimas para produções locais e independentes na grade de programação das emissoras, tanto para programas de caráter noticioso como de cultura e entretenimento. "A regionalização da produção precisa ser feita, porque é o que determina a Constituição em seu artigo 221. Isso não significa controle do conteúdo, porque a Constituição demarca o que pode ou não ser feito e proíbe embaraço ou restrições à plena liberdade de informação", disse o ministro em entrevista ao Valor Pro.
Atualmente, pelo Código Brasileiro de Telecomunicação, de 1962, a única exigência é a de uma cota de 5% da programação de TV e rádio que necessariamente precisa ser dedicada a jornalismo. Para o ministro, a regionalização do conteúdo é uma discussão mais relevante do que o da criação de mecanismos que limitem o tamanho de grupos de mídia, nos moldes da legislação argentina, cuja discussão judicial marcou quase todo o governo da presidente Cristina Kirchner e terminou com uma derrota do grupo de mídia Clarín na Suprema Corte daquele país. O grupo argentino foi forçado a apresentar um plano para seu próprio desmembramento.
"A questão brasileira é substancialmente diferente da realidade argentina. Lá existe uma multiplicidade de licenças que não existe aqui", disse Bernardo, para quem "a questão da titularidade dos meios de comunicação é menor que a da exigência de conteúdo regional". O ministro citou como um modelo a legislação adotada para a geração de conteúdo da TV por assinatura, que estabeleceu uma cota de 25% para produção nacional e independente. "Isso está funcionando bem e gerou um mercado ativo de produção audiovisual", disse. A exigência pode diminuir o espaço da geração das emissoras que são cabeça de rede na programação das emissoras afiliadas.
Segundo Paulo Bernardo, a propriedade cruzada de meios de comunicação eletrônica, que permite a diversos grupos serem donos de emissoras de rádio e TV, pode ser coibida, mas o ministro ponderou que a regulamentação do parágrafo quinto do artigo 220 da Carta, que veda a concentração midiática, deve ser feita com cautela. "Precisamos discutir o conceito de monopólio. Na época em que a Constituição foi feita, em 1988, a situação era outra, as tiragens dos jornais eram muito maiores e a audiência da TV aberta bem mais expressiva. Os conceitos daquele tempo talvez não se ajustem aos tempos de hoje", afirmou.
O controle da mídia foi objeto de uma proposta feito pelo ex-ministro da Comunicação Social Franklin Martins, que ocupou a pasta durante o segundo mandato do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A proposta não foi levada adiante no governo Dilma. "Nós tivemos outra prioridade, que foi o aumento da inclusão digital. Cumprida esta etapa, já que passamos de 38 milhões para 130 milhões de conexões, o tema pode voltar em um segundo mandato", disse Bernardo.
O ministro afirmou que a proposta que será elaborada pelo governo irá se distinguir da feita pela militância e pelos movimentos sociais. "Se faz uma certa confusão entre os controles da comunicação eletrônico e a censura de conteúdo, que não será feita. Nós não temos que regular o que sai em uma manchete ou em uma capa de revista", afirmou. O único ponto que afeta diretamente o conteúdo que deve entrar na proposta, de acordo com Bernardo, é algum ajuste no direito de resposta, previsto no inciso V do artigo 5 da Constituição. Por outro lado, "o setor patronal de radiodifusão não quer regulação alguma", ponderou.
Em uma única questão, Bernardo ressalvou que falava em nome pessoal, e não do governo: o ministro disse que irá defender a proibição de políticos e parentes até segundo grau serem cotistas de meios de comunicação. É uma norma que afetaria não apenas aliados do governo, como o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), como também oposicionistas como o presidenciável do PSDB, senador Aécio Neves (MG). " É preciso que haja apoio social para uma proposta desta natureza ir adiante", disse.
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