quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Quando “nada” diz tudo


O texto abaixo será publicado na edição de setembro do jornal Página 13. A editora do jornal autorizou sua divulgação antecipada neste espaço.

Eleições 2018

Quando “nada” diz tudo

Finalmente chegamos aos últimos episódios da segunda temporada do “Golpe”

Valter Pomar*

Quando tudo que estamos vivendo virar roteiro de uma netflix qualquer, dará uma boa minissérie com pelo menos três temporadas.

A depender do roteirista, a primeira temporada poderia começar no segundo turno de 2014, quando a cúpula do PSDB recebe a notícia de que Dilma Rousseff foi reeleita. E terminaria na condução coercitiva, indicando o que ocorreria na segunda temporada.

Esta, por sua vez, começaria na posse do “golpista que estava acampado na vice” – com direito a flashbacks do processo de “impeachment” -- e terminaria no anúncio do vencedor das eleições de 2018. O roteiro da terceira temporada, claro, dependeria de quem e como vencerá.

Claro que muito antes disto tudo virar roteiro, temos a vida real, onde protagonistas verdadeiros lutam entre si para definir o desfecho da história.

A batalha da impugnação

A candidatura Lula foi inscrita no dia 15 de agosto de 2018, numa atividade que contou com a presença de milhares de pessoas. Em seguida vieram: a decisão da ONU; novas pesquisas eleitorais; e ótimas atividades de campanha no nordeste. O respaldo político confirmado por estes lances atrapalhou os planos & os prazos do departamento jurídico do golpe.

A Procuradora Geral da República (PGR) impugnou a candidatura já no dia 15; mas uma decisão, salvo novo atropelo, ficou para os dias 30 ou 31 de agosto. Se a decisão for confirmar a impugnação, a defesa poderá fazer embargos. Uma decisão definitiva do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sairia no dia 3 de setembro. No caso de impugnação, esta decisão concederia ao PT dez dias para substituir a candidatura. Ou seja, 13 de setembro.

O PT pode e deve, também, recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF). Seja questionando a decisão do TSE com base na exceção prevista na Lei da Ficha Limpa, seja argumentando direito político líquido e certo respaldado pela ONU.

O STF pode receber ou não o recurso do PT; recebendo, pode conceder ou não liminar. Se o STF receber e conceder liminar, Lula poderá seguir candidato, com todos os outros direitos (inclusive de ser substituído e/ou de ter seus votos computados futuramente). Se o STF receber e não conceder liminar, isto significaria que o PT poderia manter a candidatura Lula, mas sem os direitos regulares e correndo o risco de ter a chapa e os votos anulados. Se o STF não receber o recurso, isto significaria que estariam formalmente encerrados os canais jurídicos da controvérsia.

O departamento jurídico do golpe fará de tudo para impugnar a candidatura antes de 17 de setembro. Esta é a data limite para que qualquer coligação substitua suas candidaturas. Impugnar depois geraria maiores controvérsias políticas e jurídicas, por exemplo, a de não reconhecer a vitória e não diplomar um presidente eleito por 50% mais 1 dos votos em primeiro turno.

Seja como for, a força exibida por Lula nas pesquisas e nas ruas constrange os golpistas e nos permite ganhar tempo. E para nós, ganhar tempo é fundamental.

(Aliás, os defensores do Plano B e similares devem ganhar um imã de geladeira onde esteja escrito: APRESSADO COME CRU.)

Para que a batalha da impugnação não encerre no dia 13 de setembro com uma vitória dos golpistas, precisamos aumentar ainda mais o tom e a pressão, manter a mobilização de rua, empreender novas ações, criar mais fatos políticos.

Campanha versus fraude

Alguns setores da esquerda brasileira defendem travar a batalha da impugnação sem colocar sobre a mesa a “arma”, ou melhor, a palavra de ordem “eleição sem Lula é fraude”.

É óbvio que tais setores reconhecem que impugnar Lula seria um ato fraudulento da (in)justiça, com o objetivo de forjar artificialmente o resultado das eleições. Mas aqueles setores acham que adotar aquela palavra-de-ordem poderia ampliar o abstencionismo, o voto nulo e branco, prejudicando as candidaturas de esquerda e beneficiando as candidaturas alinhadas com o golpe. Alertam, além disso, que adotar a palavra-de-ordem “eleição sem Lula é fraude” poderia afetar não apenas a eleição presidencial, mas também o desempenho da esquerda nas eleições para governos estaduais, Senado, Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas.

Os defensores da palavra-de-ordem eleição sem Lula é fraude respondem que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Consideram que a eleição que os golpistas trabalham para fraudar por antecipação é a presidencial. Afirmam que é necessário chamar as coisas pelo seu nome: democracia é democracia, golpe é golpe, fraude é fraude. Lembram que há várias maneiras de lidar com um governo golpista. A única maneira inaceitável é aquela que esconde, disfarça, mascara sua natureza. Entendem que há várias maneiras de lidar com uma fraude eleitoral, desde o boicote total até a participação. A única maneira inaceitável seria aquela que dê a aparência de que estaríamos diante de um processo normal, com a mesma legalidade e legitimidade de eleições anteriores. Propõem, finalmente, que os críticos da palavra-de-ordem “eleição sem Lula é fraude” considerem duas questões adicionais.

A primeira delas é: os golpistas precisam pagar muito caro, caso ocorra a impugnação. E chamar as coisas pelo nome aumenta o preço a pagar. Não é por outro motivo que eles preferem falar de impeachment e nós preferimos falar de golpe. Já está provado que a indignação com a injustiça é um dos motivos pelos quais cresce o apoio popular ao Lula. Deixar claro que estamos diante de uma fraude amplia a indignação. Pelo contrário, evitar falar de fraude arrefece a indignação.

A segunda delas é: caso impugnem Lula, ao decidir o que fazer, a esquerda teria que considerar todos os riscos envolvidos no processo eleitoral. Substituir Lula por outra candidatura poderia resultar numa vitória eleitoral da esquerda e forças progressistas, à condição de que consigamos transferir, para esta outra candidatura, a maior parte da atual intenção de voto lulista. Isto não seria fácil de fazer. Até porque, neste cenário, os golpistas que tiverem impugnado a candidatura Lula não parariam por aí. Caso efetivem a impugnação de Lula e mesmo assim não se livrem da ameaça de uma derrota, os golpistas apelarão para outras artimanhas.

A fraude, como o golpe, não é um ato, é um processo. Só estaremos preparados para novas fraudes, se tivermos clareza acerca do que estamos enfrentando. E se nossa postura for participar da eleição, e caso ao final sejamos derrotados, neste cenário a esquerda teria sido triplamente derrotada: impugnaram Lula, derrotaram seu substituto e elegeram um presidente que não poderíamos chamar de fraudulento e ilegítimo. Afinal ao participar, em alguma medida teríamos legitimado o processo. Legitimar o resultado de uma fraude antecipada é um risco que deve ser levado em devida conta.

Em resumo, podemos até decidir participar, mas esta decisão precisa levar em conta todos os riscos envolvidos. A decisão sobre o que fazer, caso a impugnação ocorra, é uma questão tática, não uma questão de princípio. Há prós e contras. Mas é preciso colocar sobre a mesa todas as alternativas. Não apenas aquela que defende participar, qualquer que seja o cenário.

Esperamos que a discussão acima resumida não seja necessária. Até porque, se nós enfrentamos problemas, o lado de lá também tem os seus.

Dilemas tucanos

Em primeiro lugar, se Lula participa das eleições, ele provavelmente ganha de qualquer adversário. Mas se a candidatura Lula for impugnada, isto não necessariamente contribui para colocar o PSDB no segundo turno.

Alckmin tem disto que o horário eleitoral gratuito pode levar o PSDB ao segundo turno. Mas, mesmo que consiga ir ao segundo turno, o candidato tucano pode ser derrotado, se do outro lado estiver alguém que se saia melhor na tripla polarização que está caracterizando esta campanha (sobre este tema, ver box).

O segundo dilema tucano é Bolsonaro. Supondo que alguma candidatura da “turma de Lula” estará no segundo turno, então Alckmin precisa não apenas crescer, mas também crescer tirando votos de Bolsonaro. Mas como fazer isso, num cenário de polarização? Se Alckmin tentar ele próprio assumir um discurso fascista, pode reforçar Bolsonaro. E se combate o fascismo, pode fortalecer outras candidaturas, que não a sua.

O terceiro dilema tucano: embora Alckmin seja o preferido da cúpula do golpe, é possível que surjam propostas de apostar em outras candidaturas (por exemplo, naquelas que pareçam ser da turma de Lula, como Marina e Ciro), ou mesmo propostas de buscar novos nomes (o que exigiria a renúncia de algum dos candidatos postos, como Meirelles, por exemplo).

O quarto e último dilema é o que fazer, caso tudo dê errado e pela quinta vez consecutiva Lula vença, diretamente ou por interposta pessoa, as eleições presidenciais. Ou, num cenário alternativo, que o número de votos brancos, nulos e abstenções seja superior ao 50% mais 1.

Considerando o conjunto dos dilemas tucanos, compreende-se o bordão “Lula ou nada”, adotado por setores do eleitorado. Alguns enxergam aí apenas uma opção eleitoral. Mas existe algo mais profundo: Lula é a única alternativa que tem começo, meio e fim. Todos os cenários sem Lula envolvem tantas incertezas, que seu desfecho mais provável é o aprofundamento da crise. Ou seja: ou é Lula, ou nada poderá ser como antes.

Valter Pomar é militante do PT e professor de relações internacionais da UFABC (SP).


Box

A tripla polarização

As eleições deste ano já são as mais polarizadas desde 1989. Há três polarizações: uma em torno do golpe, outra em torno do programa e outra acerca do sistema político.

De um lado os golpistas, de outro quem luta contra o golpe. De um lado os neoliberais, de outro os que defendem os interesses populares. De um lado os candidatos do “sistema”, de outro os que são ou parecem ser anti-sistêmicos.

Lula lidera as pesquisas, entre outros motivos, porque polariza muito bem, aos olhos da massa, nos três vetores. Lula é uma dupla vítima — do golpe e do “sistema” — e, ao mesmo tempo, seu nome é lido por parte do povo como um programa! Nos três vetores, Lula desempenha melhor que Ciro e Boulos, que imaginavam crescer num vácuo que até agora não existiu.

Bolsonaro está em segundo lugar nas pesquisas eleitorais porque polariza fortemente (e por isto perde mais do que ganha, eleitoralmente falando) nos quesitos golpista e neoliberal, e por outro lado se beneficia (ganha muito mais do que perde) ao ser visto por parte do povo como alguém antissistema.

Na resultante destes três vetores, Bolsonaro desempenha melhor que Alckmin, Meirelles, Álvaro, Marina e outras candidaturas da centro-direita, que perdem muitíssimo por serem golpistas e neoliberais, mas também perdem demais porque fedem a politica tradicional.

Esta situação causa desespero nas candidaturas de centro-direita, pois a combinação de vetores torna muito mais difícil tirar Lula e Bolsonaro da liderança das pesquisas.

A ação do governo e do parlamento golpista destacam espontaneamente o sentido programático da candidatura Lula. E cada passo que dão no sentido de impugnar Lula, o consolida como candidato anti-golpe e anti-sistema. E, pesadelo dos pesadelos, recupera a imagem pública do PT.

Por outro lado, dependendo de como a centro-direita tentar detonar Bolsonaro, há o risco da parcela “antissistema” de seus eleitores migrar para Lula.

Moral da história: para gente como Alckmin, o problema é triplo. Precisam tirar Lula, precisam tirar Bolsonaro e precisam crescer no eleitorado.
Já para o PT, o problema é simples: trata-se de continuar polarizando. E de polarizar cada vez mais. Nosso programa é relativamente claro sobre isso: revogação das medidas golpistas, programa de emergência para gerar empregos e viabilizar direitos, Assembleia Constituinte. Mas não basta programa no papel. É preciso um programa que o povão entenda. Lula as pessoas entendem.

Por isso sua ausência física precisa ser compensada por uma campanha Lula de extrema polarização: contra o golpe, contra o programa neoliberal do golpe e contra o apodrecimento do “sistema”. Para o povão, este é um triplex que faz sentido!


terça-feira, 21 de agosto de 2018

A tripla polarização

Todo mundo reconhece que as eleições deste ano já são as mais polarizadas desde 1989.

Mas nem todo mundo percebe que há três polarizações: uma em torno do golpe, outra em torno do programa e outra acerca do sistema político.

De um lado os golpistas, de outro quem luta contra o golpe.

De um lado os neoliberais, de outro os que defendem os interesses populares.

De um lado os candidatos do “sistema”, de outro os que são ou parecem ser anti-sistêmicos.

Lula lidera as pesquisas, entre outros motivos, porque polariza muito bem, aos olhos da massa, nos três vetores.

Lula é uma dupla vítima — do golpe e do “sistema” — e, ao mesmo tempo, seu nome é lido por parte do povo como um programa!

Nos três vetores, Lula desempenha melhor que Ciro e Boulos, que imaginavam crescer num vácuo que até agora não existiu.

Bolsonaro está em segundo lugar nas pesquisas eleitorais porque, ao mesmo tempo que polariza fortemente (e perde mais do que ganha, eleitoralmente, por isto) nos quesitos golpista e neoliberal, por outro lado se beneficia (ganha muito mais do que perde) ao ser visto por parte do povo como alguém anti-sistema.

Na resultante destes três vetores, Bolsonaro desempenha melhor que Alckmin, Meirelles, Álvaro, Marina e outras candidaturas da centro-direita, que perdem muitissimo por serem golpistas e neoliberais, mas também perdem demais porque fedem a politica tradicional.

Esta situação causa desespero nas candidaturas de centro-direita, pois a combinação de vetores torna muito mais difícil tirar Lula e Bolsonaro da liderança das pesquisas.

A ação do governo e do parlamento golpista destacam espontaneamente o sentido programático da candidatura Lula. E cada passo que dão no sentido de impugnar Lula, o consolida como candidato anti-golpe e anti-sistema. E, pesadelo dos pesadelos, recupera a imagem pública do PT.

(Aliás, sobre o PT e Lula, vale lembrar aquele dito famoso: o anúncio de nossa morte foi prematuro.)

Por outro lado, dependendo de como a centro-direita tentar detonar Bolsonaro, há o risco da parcela “anti-sistema” de seus eleitores migrar para Lula.

(Aliás, a esquerda não pode cometer frente a Bolsonaro o erro crasso & clássico  cometido por Cristovam Buarque contra Roriz. Não é desqualificando-o pessoalmente que vamos minar seu eleitorado, mas sim identificando-o com Temer.)

Moral da história: para gente como Alckmin, o problema é triplo. Precisam tirar Lula, precisam tirar Bolsonaro e precisam crescer no eleitorado. Mas como já foi dito, suas credenciais de golpista e neoliberal os puxam para baixo; e sua condição de políticos tradicionais piora ainda mais as coisas para o lado deles.

Já para o PT, o problema é simples: trata-se de continuar polarizando. E de polarizar cada vez mais.

Nosso programa é relativamente claro sobre isso: revogação das medidas golpistas, programa de emergência para gerar empregos e viabilizar direitos, Assembleia Constituinte.

Mas não basta programa no papel. É preciso um programa que o povão entenda. Lula as pessoas entendem.

Por isso sua ausência física precisa ser compensada por uma campanha Lula de extrema polarização: contra o golpe, contra o programa neoliberal do golpe e contra o apodrecimento do “sistema”. Para o povão, este é um triplex que faz sentido!

segunda-feira, 20 de agosto de 2018

Roteiro sobre classes sociais

Roteiro da aula sobre classes sociais, ministrada no dia 11 de agosto de 2018, no curso COMO DOMINA A CLASSE DOMINANTE, organizado pelo Sindicato dos trabalhadores do serviço público de Diadema e pela ELAHP.

Nesta aula vamos abordar o tema "classes sociais" da seguinte forma: 1) a relevância do tema; 2) o que são; 3) quais são; 4) como se relacionam; 5) desfechos possíveis da relação.

Relevância.

Convivemos o tempo todo com seres humanos. Estes seres humanos não são iguais. A maior parte das diferenças são sociais. Inclusive as que parecem ser biológicas, tem origem social e são socialmente interpretadas. A variável que organiza/infui/determina estas diferenças sociais é a "posição" que as pessoas ocupam no processo de produção e reprodução da vida em sociedade. Um dos elementos fundamentais nesta posição é a relação que as pessoas mantém com os meios de produção: se proprietários ou se produtores.

Como lidamos com estas diferenças? Consideramos que fazem parte da paisagem? Percebemos que elas são socialmente determinadas/construídas? Atribuímos estas diferenças a fatores como "educação" ou a relação com os meios de produção? Achamos que estas diferenças são insuperáveis ou que são historicamente superáveis? Achamos que a superação exige reformas, ou as vinculamos a necessidade de uma revolução?

A relevância do tema "classes sociais" decorre do que foi dito acima: na prática, as pessoas que vivem em sociedade são levadas a tomar posição frente as diferenças sociais existentes. E esta tomada de posição é "prática" e também "teórica". As teorias acerca das classes sociais decorrem da sedimentação, ao longo do tempo, desta tomada de posição.

O que são?

Não há uma única resposta, entre outros motivos porque cada classe social e cada fração de classe, em cada momento histórico, responde de maneira diferente a esta pergunta.

Mas no plano das teorias, na discussão sobre as classes sociais hoje, há dois tipos fundamentais de respostas: os que consideram que as classes são agrupamentos definidos pela renda, bens e educação (vice a definição da Secretaria de Assuntos Estratégicos do governo federal em 2012; vide, também, o critério adotado pela Associação Brasileira de Empresas e Pesquisas em 2014); e os que consideram que as classes são agrupamentos definidos pela posição que ocupam na produção e no poder.

As teorias que optam pela definição envolvendo produção/poder vinculam o controle dos meios de exercício de poder, ao controle dos meios de produção. Esta vinculação pode ser de diferentes tipos, motivo pelo qual se fala de classe exploradora/explorada, classe dominante/dominada.

As teorias que se baseiam no critério da produção/poder servem de fundamento para os que defendem que a superação da divisão da sociedade em classes só é possível através de uma revolução social.

Já as teorias que se baseiam no critério da renda/bens/educação servem de fundamento para os que defendem que a superação (ou pelo menos mitigação) da divisão da sociedade em classes só é possível através de grandes reformas sociais. 

Os dois critérios citados refletem aspectos da realidade, assim como reforma e revolução são métodos presentes no processo de transformação da sociedade. Observando a história, as reformas são mais frequentes que as revoluções. Mas as grandes mudanças de rumo da história estão fortemente relacionadas às revoluções sociais.

Quais são?

Há quem diga que as classes sociais são fenômenos contemporâneos ao capitalismo. Outros sustentam que as classes são fenômenos muito antigos. Os que pensam assim consideram que houve, até hoje, três grandes pares de classes sociais: senhores de escravos e escravos, latifundiários e servos, capitalistas e assalariados. Ao lado destes pares fundamentais, sempre existiram outras classes sociais. Por exemplo os camponeses livres (pequenos proprietários que não exploravam o trabalho de escravos, nem de servos, nem de assalariados). Também ocorria de conviverem, num mesmo momento histórico, as vezes numa mesma região, todas aquelas classes fundamentais. 

Portanto, se o motivo que nos leva a estudar quais são as classes é político, então é preciso delimitar muito claramente de que momento histórico estamos falando. E, se nossa opção é estudar as classes no Brasil de 2018, então é preciso lembrar o ensinamento de um mestre: a solução de um problema histórico passa por acompanhar a história deste problema.

No caso do Brasil, por exemplo, perceber que transitamos de uma situação em que o trabalho escravo era dominante, para uma situação em que o trabalho assalariado era dominante. Uma trajetória muito diferente da vigente na Europa Ocidental. Perceber, também, que o tipo de escravidão que havia no Brasil era diferente da escravidão "antiga". Perceber que os escravos foram em parte importante trazidos de outra região do mundo; e que num momento inicial, parte importante dos assalariados também veio de outras regiões do mundo. Perceber as relações de continuidade entre uma parte dos antigos latifundiários e uma parte dos capitalistas. Notar que tanto no passado quanto no presente existem outras classes, além das fundamentais. E perceber que cada uma destas classes possui características regionais, geracionais, de gênero e étnicas. Assim como perceber que, no caso da classe dos capitalistas (assim como no caso dos antigos latifundiários senhores de escravos) há uma relação muito intensa com classes exploradoras e dominantes em outras regiões do mundo.

Por todos os motivos acima expostos, deduz-se que existem três classes fundamentais (capitalistas, assalariados, pequenos proprietários), mas que cada uma destas classes possui diversas frações de classe. E que a compreensão de que quais são estas frações é fundamental para a ação política.

Por exemplo: existe uma burguesia nacional? Uma burguesia interna? Existem "classes médias"? Qual a relação entre os operários e a classe trabalhadora como um todo? Os trabalhadores do campo são uma única classe?

Como se relacionam?

A relação entre as classes envolve exploração, concorrência, exploração e dominação. O conjunto destas relações  é o que se denomina de luta de classes. Entre os que falam de luta de classes, há os que constatam a existência de conflitos e há os que, além disto, consideram que estes conflitos refletem um antagonismo estrutural antagônico.

Que formas assume este conflito, esta luta de classes: fundamentalmente a forma de luta econômico, de luta política e de luta ideológico.

Desfechos?

Ou a continuidade da sociedade dividida em classes, portanto a continuidade da exploração e dominação. Ou a superação da divisão da sociedade em classes.

Um ótimo exemplo para terminar a análise: o caso do "estado de bem estar social" na Europa.

SEM REVISÃO

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Eleição sem Lula é fraude! Ou não é?

No dia 15 de agosto, em Brasilia, uma multidão participou do ato simbólico de inscrição da candidatura Lula.

Candidato, Lula poderá disputar as eleições presidenciais de 2018. 

E, a julgar por todas as pesquisas divulgadas até agora, será eleito presidente, no primeiro ou no segundo turno.

Os golpistas pretendem impedir que isto aconteça. Por isso, condenaram, prenderam e agora querem impugnar a candidatura de Lula. 

Contraditando a legislação e a jurisprudência, querem não apenas impugnar, mas também impugnar rapidamente, para impedir que a candidatura Lula participe do horário eleitoral gratuito e esteja na urna eletrônica.

A aposta dos golpistas é que, sem Lula na disputa, eles venceriam as eleições presidenciais de 2018. E, com um novo presidente "aprovado pelas urnas", poderiam seguir adiante com seu programa antinacional, antipopular e antidemocrático.

Qual o nome disto? 

Como se deve caracterizar uma operação que visa alterar o resultado da vontade popular?

Eleição sem Lula é o quê?

É fraude!!! 

Foi desta constatação que surgiu a palavra-de-ordem eleição sem Lula é fraude, repetida várias vezes pelos manifestantes que inscreveram a candidatura do presidente no dia 15 de agosto.

Entretanto, há setores da esquerda brasileira que preferem não utilizar esta palavra-de-ordem. 

É óbvio que tais setores reconhecem que impugnar Lula seria um ato fraudulento da (in)justiça, com o objetivo de forjar artificialmente o resultado das eleições.

Mas aqueles setores acham que adotar aquela palavra-de-ordem poderia ampliar o abstencionismo, o voto nulo e branco, prejudicando as candidaturas de esquerda e beneficiando as candidaturas alinhadas com o golpe. 

Alertam, além disso, que adotar a palavra-de-ordem eleição sem Lula é fraude poderia afetar não apenas a eleição presidencial, mas também o desempenho da esquerda nas eleições para governos estaduais, Senado, Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas.

Os defensores da palavra-de-ordem eleição sem Lula é fraude respondem que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

Consideram que a eleição que os golpistas trabalham para fraudar por antecipação é a presidencial.

Afirmam que é necessário chamar as coisas pelo seu nome: democracia é democracia, golpe é golpe, fraude é fraude.

Lembram que há várias maneiras de lidar com um governo golpista. A única maneira inaceitável seria aquela que esconde, disfarça, mascara sua natureza.

Entendem que há várias maneiras de lidar com uma fraude eleitoral, desde o boicote total até a participação. A única maneira inaceitável seria aquela que dê a aparência de que estaríamos diante de um processo normal, com a mesma legalidade e legitimidade de eleições anteriores.

Propõem, finalmente, que os críticos da palavra-de-ordem eleição sem Lula é fraude considerem duas questões adicionais.

A primeira delas é: os golpistas precisam pagar muito caro, caso ocorra a impugnação. E chamar as coisas pelo nome aumenta o preço a pagar.

Não é por outro motivo que eles preferem falar de impeachment e nós preferimos falar de golpe. Já está provado que a indignação com a injustiça é um dos motivos pelos quais cresce o apoio popular ao Lula. Deixar claro que estamos diante de uma fraude amplia a indignação. Pelo contrário, evitar falar de fraude arrefece a indignação.

A segunda delas é: caso impugnem Lula, ao decidir o que fazer, a esquerda teria que considerar todos os riscos envolvidos no processo eleitoral. 

Substituir Lula por outra candidatura poderia resultar numa vitória eleitoral da esquerda e forças progressistas, à condição de que consigamos transferir, para esta outra candidatura, a maior parte da atual intenção de voto lulista.

Isto não seria fácil de fazer. Até porque, neste cenário, os golpistas que tiverem impugnado a candidatura Lula não parariam por aí. Caso efetivem a impugnação de Lula e mesmo assim não se livrem da ameaça de uma derrota, os golpistas apelarão para outras artimanhas. 

A fraude, como o golpe, não é um ato, é um processo. E só estaremos preparados para novas fraudes, se tivermos clareza acerca do que estamos enfrentando.

E se nossa postura for participar da eleição, e caso ao final sejamos derrotados, neste cenário a esquerda teria sido triplamente derrotada: impugnaram Lula, derrotaram seu substituto e elegeram um presidente que não poderíamos chamar de fraudulento e ilegítimo. Afinal ao participar, em alguma medida teríamos legitimado o processo.

Legitimar o resultado de uma fraude antecipada é um risco que deve ser levado em devida conta. 

Em resumo, podemos até decidir participar, mas esta decisão precisa levar em conta todos os riscos envolvidos. Atitude esta --considerar todos os cenários, inclusive os piores-- que muitas vezes não tomamos, na luta contra o golpe.

A decisão sobre o que fazer, caso a impugnação ocorra, é uma questão tática, não uma questão de princípio. Há prós e contras. Mas é preciso colocar sobre a mesa todas as alternativas. Não apenas aquela que defende participar, qualquer que seja o cenário.

Por fim, há um argumento adicional em defesa da palavra de ordem eleição sem Lula é fraude

Este argumento é o seguinte: suponhamos que a esquerda decida participar, consiga vencer e consiga tomar posse. 

O novo presidente agirá como? Exercerá normalmente seu mandato, apesar de ter feito campanha apresentando-se como substituto, apesar de ter sido eleito graças ao apoio de Lula e dos eleitores lulistas, que queriam votar em Lula e foram impedidos de fazer isso pelos golpistas? 

Ou, sabendo da fraude cometida no processo, fraude que mesmo driblada continuaria tendo que ser reparada, o novo presidente tomará imediata e prontamente todas as medidas necessárias para que possam ocorrer novas eleições, em que Lula possa disputar livremente? 

Esperamos que a discussão acima resumida não seja necessária. E que Lula possa disputar e vencer ele mesmo as eleições. Mas, considerando a disposição dos golpistas, é melhor estar preparado para tudo. 

Foi combinando resiliência, reconhecimento ao que fizeram os nossos governos, repúdio ao que fazem os golpistas, base de massas, radicalismo e criatividade que chegamos até aqui, contrariando não apenas o que a direita desejava, mas também contrariando os que na esquerda propunham o "Plano B e suas variantes".

Frente a nova situação criada pelo golpe, nossa vitória passa por não repetir velhas fórmulas.


segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Sobre 15 de agosto

Época de eleição, época de pesquisas.

Como há pesquisas de todos os tipos e sabores, cada um tem a sua preferida, com o respectivo analista a tiracolo.

Um destes analistas disse, nas últimas três quinzenas, três coisas diferentes: 

a) começou dizendo que 15 de agosto era como o Sol: a preferência por Lula derreteria quão mais perto chegássemos da data de inscrição da candidatura; 

b) depois afirmou que a preferência por Lula cresceria quão mais perto chegássemos do dia 15 de agosto; 

c) mais recentemente, disse que não apenas Lula, mas inclusive um nome indicado por Lula já estaria com vaga garantida no segundo turno.

Estas flutuações confirmam que acreditar em pesquisas & analistas não faz mal, mas deve-se acreditar com muita moderação. 

Seja como for, o que há de 100% seguro é que todas as chances que temos de vencermos as eleições presidenciais de 2018 passam por Lula candidato ou, pelo menos, pela transferência de votos de Lula para alguém que seja visto -- pelo povão lulista -- como seu "genérico".

Os golpistas sabem que a esquerda precisa de Lula para vencer as eleições. E, exatamente por isso, condenaram, prenderam e querem impugnar a candidatura de Lula. Mas nada disto impediu, até o momento, que o presidente siga liderando as pesquisas de opinião. 

Tal liderança decorre da combinação de algumas variáveis, entre as quais: a resiliência coletiva do petismo, a lembrança positiva que parte do povo tem dos governos nacionais encabeçados pelo PT e o sentimento de que a prisão de Lula é uma injustiça, que tem como objetivo impedir que ele concorra às eleições presidenciais.

A indignação contra a injustiça é uma variável importante do desempenho de Lula nas pesquisas de opinião. A percepção de que o presidente é vítima de injustiça melhora seus índices nas pesquisas. E, ao contrário, reduzir a indignação tende a reduzir nosso desempenho.

É também por isto que os meios de comunicação golpistas insistiram tanto, ao longo dos últimos meses, para que o PT desistisse de Lula e indicasse um "plano B". 

Se o PT tivesse feito isso, entre outros erros teríamos cometido o de passar mensagem de conformidade com uma possível impugnação de Lula, como se nesse caso estivéssemos diante de algo normal, corriqueiro, e não de um fraudulento e brutal atentado contra as liberdades democráticas, a soberania nacional e os direitos do povo.

Como o PT não caiu no canto de sereia do "plano B", os meios de comunicação golpistas passaram a especular sobre quem ocuparia a vice de Lula. 

Como é público, os meios de comunicação golpistas queriam que a indicação da vice tivesse o mesmo significado político da escolha de um "plano B". 

Entre outras coisas, eles queriam uma vice-com-cara-de-plano-B para que pudessem seguir escondendo a candidatura Lula, mas argumentando que o fazem porque o próprio PT teria reconhecido o supostamente inevitável

Queriam uma vice-com-cara-de-plano-B, também, para esvaziar de significado a inscrição da candidatura presidencial de Lula que será feita no dia 15 de agosto. Neste caso, o objetivo é facilitar e reduzir o preço político que pagarão aqueles que pretendem impugnar a candidatura Lula.

E, claro, com tudo isto viria o mais importante: reduzindo a indignação, reduzir a intenção de voto e, com ela, diminuir as chances de vitória não apenas de Lula, mas também de um eventual "genérico".

Cada um avalie, a luz do que foi dito, a correção maior ou menor dos movimentos feitos pelo Partido dos Trabalhadores desde o final-de-semana de 4 e 5 de agosto. Fizemos o melhor que podíamos ter feito para manter a candidatura Lula em total evidência e a indignação coletiva em ponto máximo? Os erros que eventualmente cometemos tiveram qual impacto no ânimo da base militante e eleitora? A resposta saberemos com certeza no dia 15 de agosto e no que virá logo em seguida.















terça-feira, 7 de agosto de 2018

Sobre o capital financeiro no programa de governo 2019-2022


Na sexta-feira dia 3 de agosto aconteceu a reunião do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores.

O primeiro ponto da pauta foi o debate sobre programa que o Partido apresentará para disputar as eleições presidenciais de 2018. 

O texto foi apresentado pelos três coordenadores: Fernando Haddad, Renato Simões e Márcio Pochmann.

Mediações a parte, a maioria das emendas apresentadas foi incorporada.

A única emenda recusada foi a seguinte: De um lado, o aprofundamento da competição bancária deverá ser estimulada pelos bancos públicos e pela difusão de novas instituições de poupança e crédito. Para tanto, é fundamental tomar medidas no sentido de superar o controle do sistema financeiro por um oligopólio privado, a revitalização dos bancos públicos, especialmente BNDES, BB e CEF e dos mecanismos de financiamento ao desenvolvimento nacional, tanto para a retomada da bancarização e da disponibilização dos serviços bancários, quanto para a ampliação do crédito aos pequenos negócios e à população de baixa renda.

A diferença entre esta emenda e o texto do programa residia na seguinte frase: é fundamental tomar medidas no sentido de superar

A emenda foi defendida por Valter Pomar, que argumentou entre outras coisas que não conseguiríamos cumprir nosso programa sem enfrentar esta questão.

Márcio Pochmann defendeu recusar a emenda, argumentando entre outras coisas que sua inclusão implicaria em tocar "na propriedade privada".

O Diretório Nacional, por maioria de votos, recusou a emenda.

Simultâneo a este debate, a página oficial de Ciro Gomes divulgou um documento que afirma, em seu ponto 4, o seguinte: 5. Desfarei o cartel dos bancos que, nos últimos 15 anos, concentraram, em apenas 5 deles, 85% de todas as operações financeiras do País, impondo ao nosso povo e à nossa economia a maior taxa de juros do mundo!

O texto de Ciro Gomes está disponível aqui: https://www.portalcirogomes.com.br/noticias/muita-calma-nessa-hora

Talvez Ciro seja um perigosíssimo inimigo da propriedade privada...

... ou talvez o Diretório Nacional do PT não tirou as devidas consequências da afirmação feita, pelo mesmo Márcio Pochmann ao apresentar o programa, segunda a qual o Brasil e o mundo vive uma crise de dimensões só comparáveis a dos anos 1930, quando vários governos capitalistas adotaram reformas profundas no seu sistema bancário financeiro.

É triste, mas grande parte da esquerda, inclusive grande parte da intelectualidade de esquerda, continua mesmerizada pela hegemonia do capital financeiro.



Insegurança jurídica

O sistema jurídico ampliado (tribunais + ministério público + polícia) jogou e joga um papel decisivo no golpe, em suas várias etapas.

Contribuíram para este papel decisões que tomamos, desde o Congresso Constituinte de 1988, passando pelo tipo de discurso que assumimos no Fora Collor, pelas opções de governo, pelas atitudes durante a chamada "crise do mensalão", até as seguidas ilusões republicanas durante o impeachment, o processo e a prisão de Lula.

A contribuição é tão relevante que alguns cunharam a expressão "PT jurídico", para designar uma corrente de opinião e um conjunto de atitudes práticas que colocam a política à reboque do jurídico; uma corrente que acredita que as batalhas jurídicas são vencidas no terreno da interpretação das leis.

A contrapartida disto, no dia a dia dos partidos de esquerda, vem sendo a crescente influência política de advogados e outros especialistas jurídicos.

Para citar três exemplos recentes: a crença de que o TRF4 iria absolver Lula ou pelo menos aprovar uma condenação que permitiria recurso; a crença de que o STF concederia o habeas corpus; a crença de que se Lula aceitasse a prisão, ele seria solto "em uma semana".

No período mais recente, a influência dos advogados & juristas foi agravada pela disputa entre os causídicos, não apenas acerca de diferentes procedimentos (embargos auriculares ou disputa pública, por exemplo), mas também acerca de diferentes e antagônicas análises acerca do que diz a legislação.

É o caso da recente polêmica acerca de quando deveria ser escolhida a candidatura do PT a vice-presidente da República, bem como acerca de quando as atas das convenções partidárias deveriam ser registradas.

De conjunto, um clima de “insegurança jurídica” para o qual não recordo precedente nas eleições presidenciais anteriores, acompanhado de disputas e trocas de acusações acerca das verdadeiras intenções dos especialistas envolvidos.

Nas próximas semanas se travará a batalha em torno do registro da candidatura Lula. Para quem entende que “eleição sem Lula é fraude”, toda vigilância será necessária para impedir novo campeonato de tiro-ao-pé.

quinta-feira, 2 de agosto de 2018

Os sete pontos (do Paulo Teixeira) sobre PSB e PT

O Diário do Centro do Mundo publicou um roteiro de sete pontos "sobre PSB e PT", cuja autoria é atribuída ao deputado Paulo Teixeira.

(O próprio Paulo Teixeira acaba de me informar que o texto seria da presidenta Gleisi Hoffmann).

O roteiro está no endereço abaixo:

https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/deputado-paulo-teixeira-do-pt-fala-do-acordo-com-o-psb/

O primeiro ponto diz que "É uma estrategia nacional resgatar aliança com o PSB, um partido em disputa. No Nordeste e Norte apoiarão Lula ou quem Lula Indicar".

A primeira frase é verdadeira. 

Acontece que a resolução da executiva nacional do PT não resgatou aliança alguma.

A resolução da executiva nacional do PT pagou caro para supostamente obter a neutralidade.

E a neutralidade significa que o PSB vai continuar como está: alguns com Alckmin, outros com Ciro, outros mais com Lula.


A segunda frase é reveladora.

Revela que um dos objetivos da resolução aprovada por maioria na CEN seria garantir o apoio não para Lula, mas para quem Lula vier a indicar.

Acredite quem quiser na solidez de uma promessa deste tipo, que não está escrito, que não está baseado na grande política, mas sim na permuta de candidaturas estaduais.

O segundo ponto diz que  essa ala do PSB (Ricardo Coutinho, Paulo Câmara, Capiberibe) tirou a direita do partido, e colocou o PSB contra a reforma trabalhista, a EC 95, a entrega da Petrobras e a privatização da Eletrobras.

Pergunto: se isto fosse verdade, se a esquerda socialista "tirou a direita do Partido", por qual motivo o PSB vai ficar neutro? Por qual motivo o PSB não decide apoiar Lula?

Pergunto ainda: de que partido é Beto Albuquerque? E de que partido é Márcio França, governador e candidato a governador de São Paulo? 

Ou será que Paulo Teixeira acha que Márcio França não é de direita???

Ainda sobre o ponto 2, me informa o companheiro Rodrigo César o seguinte:

Sobre o ponto 2, segue como votou a bancada do PSB na Câmara:

Impeachment
SIM - 29
NÃO - 3

Reforma trabalhista
SIM - 14
NÃO - 16

EC 95
SIM - 18
NÃO - 9

Abstenção - 1


O terceiro ponto diz que recompor uma frente política de esquerda no país é condição para o enfrentamento ao golpe e para tirar o Brasil da crise com uma política econômica inclusiva 

Novamente, a afirmação é verdadeira.

Mas o que a afirmação tem que ver com a resolução aprovada pela maioria da CEN do PT?

Tal resolução oferece apoio nos estados, não pede nada em troca, mas espera de fato a neutralidade e a retirada da candidatura de Márcio Lacerda em Minas Gerais.

Não vamos recompor uma frente política de esquerda, com este tipo de acordo.

O quarto ponto diz que o PCdoB, um dos partidos que compõe essa frente, via o entendimento com o PSB como condição para construirmos uma unidade do campo

De fato o PCdoB defende uma frente.

Mas isto que foi feito não parece nada com aquilo que o PCdoB defende.

Se parecesse, a Convenção do PCdoB teria tido outros desdobramentos.

O quinto ponto diz que desde o ano passado temos reforçado que nossas alianças ou acordos eleitorais se dariam no campo da centro esquerda. E listamos, e APROVAMOS, em resolução do PT que os partidos para construirmos isso eram PCdoB, PSB e PDT.

Também é verdade.

Mas, novamente, o que isto tem que ver com a resolução da CEN???

A resolução da CEN não foi um passo à frente em direção a uma aliança com PDT, PCdoB e nem mesmo PSB.

Neste momento não estamos com PDT, não estamos com PCdoB e o PSB vai, na melhor das hipóteses, adotar uma falsa neutralidade, que na prática favorece mais Alckmin do que a centro-esquerda.

O sexto ponto diz que nunca escondemos do PT de Pernambuco, dos movimentos sociais e de Marília, nossas conversas e nossos movimentos. Lutamos por uma coligação formal, mas não foi possível. Esse movimento é o recomeço da frente de esquerda no país, buscando resgatar um partido q historicamente esteve do nosso lado.

O sexto ponto omite uma informação fundamental, a saber: até o dia 1 de agosto, a posição do PT era construir uma aliança nacional com o PSB, em torno de Lula.

Isso (o objetivo de construir uma aliança nacional) nunca foi escondido do PT de Pernambuco, nem do PT de todo o país.

Mas o que foi feito dia 1 de agosto não foi isto.

O que foi feito dia 1 de agosto: uma maioria de integrantes da CEN concedeu o apoio do PT ao Paulo Câmara. Ponto. A resolução não fala mais nada.

É público que esta maioria esperava que, em troca, retirasse a candidatura de Márcio Lacerda em Minas Gerais e adotasse a "neutralidade" na disputa presidencial.

Neutralidade não é aliança nacional. 

Antes de 1 de agosto, a CEN não disse ao PT de Pernambuco que, em nome da suposta neutralidade e de Lacerda, a candidatura de Marília poderia ser retirada.

É uma ilusão achar que esta troca e esta neutralidade são o "recomeço da frente de esquerda no país" e o resgate do PSB.

O sétimo ponto diz que sem a eleição de Lula e a construção de um campo político NACIONAL progressista e popular não recuperaremos o país. Não vamos perder o foco do nosso enfrentamento. Estamos numa batalha pela devolução dos empregos, dos direitos dos trabalhadores e do povo, da nossa democracia e da nossa soberania.

Tudo verdade.

Mas o que a CEN decidiu não contribuiu nem um pouco para isto. 

O que a CEN decidiu, falemos francamente, foi oferecer Arraes, esperando colher Lacerda e a neutralidade.

O que o obteve com isto, até agora?

Uma enorme confusão, cujo desfecho está sendo escrito neste momento.

Infelizmente, o roteiro publicado pelo DCM e atribuído ao deputado Paulo Teixeira não descreve o que se pretendia, não descreve o que ocorreu e não descreve o que está ocorrendo.