(parte 2 do texto em construção)
Cenário internacional
Vejamos
então quais as principais características
do atual cenário internacional: as crises,as guerras e
a instabilidade generalizada.
Tais
características decorrem do predomínio avassalador do capitalismo,
do domínio do capital oligopolista e financeiro, do
decorrente aguçamento dos conflitos intercapitalistas e
dodeclínio da potência hegemônica.
As políticas
neoliberais, hegemônicas em âmbito mundial desde os anos 1990, resultaram
numa ampliação da polarização social e política,
bem como resultaram no aprofundamento das agressões imperialistas
contra a soberania nacional dos países economicamente mais
frágeis.
As políticas
neoliberais e as ações imperialistas impulsionadas
pelo consórcio formado pelos Estados Unidos, União Europeia e Japão geram
alternativas e reações de diferentes tipos e conteúdos.
É o caso
dos BRICS, com destaque para a China, Rússia e – durante os
governos Lula e Dilma – também o Brasil.
É o caso dos
chamados governos progressistas e de esquerda na
América Latina.
É o caso
das lutas políticas e sociais impulsionadas por forças de esquerda que
atuam na Europa, África, Ásia e Estados Unidos.
A resposta às
políticas encabeçadas pelos EUA também pode assumir formas historicamente
reacionárias. É o caso do fundamentalismo terrorista, mesmo onde
constitui uma resposta ao terrorismo de Estado praticado pelos Estados Unidos e
seus aliados maiores e menores, entre os quais Israel e Arábia Saudita.
Outro exemplo
de alternativa reacionária é o populismo de direita expresso
por Trump e Le Penn, pelas forças fascistas e neonazistas na Ucrânia, Grécia e
em diversos países do Leste Europeu, pelos partidos ultraconservadores cuja
força eleitoral cresce em todos os países da Europa Ocidental, inclusive nos
países nórdicos conhecidos por seu estado de bem-estar social.
Tanto o
neoliberalismo quanto o populismo de direita conduzem, por diferentes caminhos,
ao agravamento da instabilidade, das crises e das guerras.
O
“protecionismo” e o “globalismo” de grande potência são diferentes formas que o
imperialismo pode assumir e ambas já conduziram o mundo, ao longo do século
passado e deste, a inúmeras guerras. Exemplo disto são os grandes tratados que
estavam sendo negociados durante o governo Obama e que foram questionados por
Trump durante a campanha eleitoral: tanto os movimentos para viabilizá-los,
quando a desistência contém um forte potencial desestabilizador.
Hoje, como já
aconteceu no passado, a manutenção da paz e da democracia, as perspectivas de
desenvolvimento e até mesmo a sobrevivência da humanidade dependerão
fundamentalmente da capacidade de reação da classe trabalhadora, dos setores
populares, das forças progressistas, democráticas e de esquerda.
As principais
características do cenário internacional -- as crises, as
guerras e a instabilidade generalizada -– só podem ser compreendidas se levarmos em
consideração um conjunto de aspectos e variáveis, surgidos em
diferentes momentos da história recente, mas que hoje conjugam-se na composição
do cenário internacional. Citamos:
a) a hegemonia do capitalismo: nunca como antes na história, os
capitalistas e o capitalismo como modo de produção foi tão hegemônico quanto
hoje;
b) a natureza do capitalismo contemporâneo: com a financeirização e a
especulação, há uma contradição e dissociação cada vez maior entre os circuitos
da produção material e os circuitos da valorização do capital. Sendo importante
lembrar que, depois de 2008, os “bancos grandes demais para quebrar” se
tornaram ainda maiores, produto da inexorável tendência à concentração e
centralização do capital;
c) a crise do capitalismo: desde os anos 1970, convivem níveis de
crescimento muito baixos, a ocorrência em espaços de tempo cada vez menos de
crises de variados tipos e profundidade, desembocando em 2008 em um colapso
geral que recorda o de 1929, cujas causas não foram superadas, pelo contrário;
d) o declínio da potência hegemônica: embora seja a principal potência
militar e emissora da moeda de maior trânsito internacional, os Estados Unidos
perderam peso econômico, vivem uma crise interna de grandes proporções e tem
sua hegemonia crescentemente contestada, motivos que tornam possível falar em declínio
relativo;
e) a ascensão de outros polos de poder: ao contrário do unilateralismo
pretendido pelos EUA após o fim da URSS, o mundo atual é crescentemente
multipolar, com destaque para os BRICS;
f) a disputa entre diferentes vias de desenvolvimento capitalista:
diferente do período 1945-1991, em que os conflitos internacionais estavam
fortemente atravessados pela luta entre capitalismo e socialismo, hoje o
conflito dominante se dá entre diferentes maneiras de organizar o capitalismo,
cabendo às alternativas socialistas uma pequena influência;
g) a formação de blocos e acordos: como o cenário internacional é profundamente
diferente daquele prevalecente no imediato pós-Segunda Guerra, as instituições
multilaterais como a ONU, o FMI, o Banco Mundial e mesmo a Organização Mundial
do Comércio vão perdendo peso e importância frente a uma multiplicidade de
acordos e tratados, que -– como ocorreu antes da Primeira e da Segunda guerras
mundiais – são sintomas de crise, não de ordem;
h) a defensiva estratégica da classe trabalhadora: aumento das taxas de
exploração, redução na remuneração, piora nas condições de trabalho, reversão
de direitos sociais, estreitamento das liberdades democráticas, enfraquecimento
dos sindicatos e partidos, perda de espaços institucionais, fortalecimento de
valores individualistas, ampliação dos conflitos entre os diferentes segmentos
de trabalhadores e recomposição da própria classe trabalhadora.
Como o mundo hoje é mais capitalista que nunca, é fundamental
compreender o que está ocorrendo hoje com este modo de produção baseado na
exploração do trabalho assalariado.
O cerne da questão está no atual estágio de desenvolvimento das forças
produtivas do capitalismo, especialmente nos Estados Unidos e na Europa.
Quanto mais se eleva a produtividade do trabalho e, portanto, a extração
de mais-valia relativa, mais o capitalismo se enreda em suas variadas
tendências estruturais: decréscimo de sua taxa média de lucro; concentração,
centralização e exportação de capitais, tanto na forma financeira quanto na
forma de transferência de plantas industriais, promovendo crescente
globalização do capitalismo; redução da participação de trabalho vivo no
processo produtivo; crescente desemprego estrutural e pauperização das massas
trabalhadoras das sociedades capitalistas, tanto desenvolvidas quanto
periféricas avassaladas ao capitalismo central; acentuação da natureza de
classe do Estado; incompatibilidade crescente entre capitalismo, bem-estar,
democracia e soberania nacional.
Essas tendências foram acirradas a partir de 2008, com as crises
financeiras e econômicas globais que tiveram como epicentros os Estados Unidos,
a Europa e o Japão.
A propagação dessa crise afeta, principalmente, os países que viram seus
parques industriais serem desmontados por políticas de “relocalização” de
unidades fabris, e/ou concentração na produção de commodities minerais
e agrícolas, e/ou disseminação do rentismo como forma de reprodução do capital.
Características comuns tanto aos países capitalistas desenvolvidos, quanto
àqueles que se subordinaram ao “Consenso de Washington”.
Esse conjunto de processos leva à acumulação, em extratos diminutos da
população, da maior parte das riquezas real e fictícia produzidas pelas
corporações e sociedades capitalistas. Noutras palavras, uma burguesia mundial
cada vez mais rica e cada vez menos numerosa.
Ao mesmo tempo, aquele conjunto de processos faz com que encolha a
capacidade social de consumo, ao serem criadas massas cada vez maiores de
trabalhadores deserdados e/ou mal remunerados.
Nos Estados Unidos, Europa e Japão, a questão do desemprego, inclusive
de trabalhadores qualificados –até então considerados como parte de uma suposta
“classe média”—tornou-se um dos aspectos mais grotescos da crise, em contraste
com a riqueza acumulada por 1% a 2% da população.
Frente a este quadro que recorda o que ocorreu no princípio do século
XX, alguns acreditam que a solução poderia vir da adoção de políticas
semelhantes as que foram implementadas, nos anos 1930, durante o New
Deal de Roosevel.
Noutras palavras, alguns acreditam que a solução estrutural para a crise
atual poderia resultar da ampliação dos investimentos públicos, que resultariam
na melhoria das condições sociais dos milhões de desempregados e “excluídos”,
produzindo um efeito “dinamizador” sobre a economia e a geração de empregos,
contribuindo assim para superar a crise.
Evidentemente somos a favor de ampliar os investimentos públicos. Mas
tomado isoladamente, isto é insuficiente para enfrentar a crise atual. Aliás,
cabe lembrar que nos Estados Unidos dos anos 1930:
a) para ampliar os investimentos públicos, foi necessário enfrentar a
oposição dos capitalistas, que tudo fizeram para impedir que as ações do Estado
tivessem um efeito positivo real na dinamização da produção e do emprego;
b) apenas a participação na Segunda Guerra Mundial retirou a economia
capitalista dos EUA da crise iniciada em 1929.
Talvez nada explicite melhor o caráter destrutivo do capitalismo: a
guerra -- seja a produção bélica, seja a destruição das riquezas até então
acumuladas, seja a reconstrução posterior, seja a nova correlação de forças
internacional, seja a Guerra Fria e as guerras quentes ocorridas depois da
Segunda -- jogou um papel fundamental na criação das condições para um novo
ciclo de crescimento econômico capitalista, que se estendeu até o final dos
anos 1960, início dos anos 1970.
O complexo industrial-militar –- absolutamente irracional do ponto de
vista dos interesses da sociedade como um todo -- é extremamente “eficiente”
para os fins da acumulação de capitais.
Mas a indústria bélica também experimenta –- em escala ainda mais
acelerada -- as mesmas transformações científicas e tecnológicas do conjunto da
“indústria produtiva”. Aliás, a indústria bélica é uma das que mais reduz o uso
de força de trabalho em seu processo produtivo. Ou seja, é uma das indústrias
que mais tende a elevar a produtividade do trabalho e a extração da mais-valia
relativa. E, portanto, é uma das indústrias que tende a níveis muito acelerados
de descarte do trabalho vivo, agravando o desemprego, os distúrbios sociais e
econômicos típicos do capitalismo.
Uma das perguntas que se pode fazer é porque quais motivos os
capitalistas e o modo de produção capitalista, mesmo quando estão em crise, não
adota “natural” e “espontaneamente” políticas de emprego e renda, que poderiam
resultar em ampliação do consumo e da produção, reestabelecendo assim os ciclos
cuja interrupção constitui a causa e o efeito da crise.
A resposta é simples: o grande capital, especialmente aquele situado nas
altas esferas financeiras, prefere produzir mais-valia sem passar pelo processo
de produção material. Dito de outra forma, preferem transformar o
conjunto da mais-valia anterior em mais-valia ampliada, sem “desperdiçar” nada
disto em salários diretos e indiretos.
Talvez esta seja uma das maiores provas do caráter anti-social dos
capitalistas e do capitalismo: os “investimentos públicos”, especialmente
aqueles que voltados a resolver “problemas sociais”, implicam numa certa
distribuição da mais-valia fora do circuito real do capital.
Sendo este um dos motivos pelos quais clama no deserto aqueles que
pretendem civilizar e humanizar o capitalismo e os capitalistas, tentando
convencê-lo de que ele poderia lucrar mais se todos vivessem melhor. Claro que
o keynesianismo pode converter-se novamente em uma opção para setores do
capital, mas isto só acontece quando a classe trabalhadora coloca sobre a mesa
uma alternativa mais radical, que converte – aos olhos da burguesia -- a
intervenção do Estado na economia em “mal menor” que protege o capitalismo de
seus próprios demônios.
Isto ajuda a entender por quais motivos a especulação financeira e o
saqueio direto de riquezas, como é o caso dos recursos naturais, assumem
crescente importância, a partir dos anos 1970. O capitalismo maduro assume
formas que lembram a violência brutal da acumulação primitiva de sua infância.
Isto vai das patentes, licenças e propriedade intelectual que recorda os
monopólios contra os quais se levantou a burguesia nascente, passa por uma
divisão internacional de trabalho de tipo colonial, por uma destruição
implacável da natureza que rememora o ocorrido em países onde se instalaram os
latifúndios escravistas, tudo isto se combinando com as formas mais extremadas
de extração da mais-valia relativa, com novidades tecnológicas como as
nanotecnologias e a biotecnologia.
Também por isto, o complexo industrial-militar dos Estados Unidos e da
Europa Ocidental continuam sendo desenvolvidos como pilares estratégicos. Isto
não só para a defesa de seus territórios e sociedades, mas principalmente para
a subordinação de outros territórios e sociedades.
Estados Unidos e Europa Ocidental necessitam de recursos minerais e
energéticos de outros países, assim como de mercados, e áreas de contenção ou
de ataque. Não por acaso os Estados Unidos têm mais de 1000 bases militares em
todo o mundo, e há muito interferem militarmente em toda parte onde seus
interesses estejam, real ou imaginariamente, em perigo.
As guerras de Reagan, nos anos 1980, disseminaram-se pela América
Central, África e Oriente Médio. As guerras de Bush, nos anos 2000, afetaram
ainda mais os já conflagrados Afeganistão e Iraque, devastando grandes regiões.
As guerras de Clinton causaram imensas destruições no sul da Europa (antiga
Iugoslávia). As guerras de Obama, realizadas por drones, e as de
ingleses e franceses, com o emprego de bombardeiros, na África do Norte e no
Oriente Médio, destruíram grande parte da Líbia e da Síria, e são responsáveis
pelas provocações contra a Rússia, que levaram aos conflitos na Ucrânia, assim
como pelo evidente “cerco” de contenção à China, no arco que vai do Japão às
Ilhas Spratley. E antes mesmo de tomar posse, Trump inicia uma escalada verbal
com a China.
Os Estados Unidos têm sido o principal agente de geração e difusão do
chamado “terror jihadista” por todo o mundo. Eles financiaram e armaram a Al-Qaeda.
Depois, financiaram e armaram outros grupos do mesmo tipo para,
hipoteticamente, enfraquecer a Al Qaeda, e/ou para derrubar governos que não
lhes eram simpáticos, a exemplo da Síria.
O resultado mais dramático dessa intervenção imperial nos assuntos
internos de outros países, em especial no Oriente Médio, foi o surgimento do
Estado Islâmico e a disseminação de grupos terroristas islâmicos por todo o
norte da África, por vários países da Ásia, e no próprio interior dos Estados
Unidos e de países europeus. Muitos deles são apoiados, financeira e
militarmente, por governos aliados dos Estados Unidos, a exemplo da Arábia
Saudita, Catar, Emirados Árabes e Turquia.
Os Estados Unidos, depois do fracasso da guerra do Vietnã, e dos
desastres de sua intervenção direta no Iraque e no Afeganistão, se esforçam
para fazer com que “suas guerras” sejam manejadas por controle remoto e lutadas
por outros, inclusive mercenários, conforme vem sendo feito por Obama.
O resultado tem sido o armamento contínuo de Estados e grupos que
utilizam o terrorismo como uma das principais formas de ação e que, na prática,
ao invés de “disseminarem a democracia”, procuram instaurar regimes
absolutistas, despóticos e sanguinários, a exemplo do ISIS.
Em tais condições, não é qualquer ponto fora da curva que tenha se
originado uma dolorosa e mortífera onda de refugiados, oriundos principalmente
da África, Oriente Médio e Ásia, que tenham se multiplicado grupos terroristas
por toda parte, e que tenham surgido ou ressurgido correntes políticas
semelhantes ao fascismo e ao nazismo, tanto na Europa quanto nos Estados
Unidos.
O caso dos Estados Unidos
Em 2008 a crise econômica teve como epicentro os Estados Unidos. Hoje, a
crise política mundial também tem seu epicentro lá. Crise que tem na incerteza
um componente adicional, uma vez que há uma grande dose de imprevisibilidade no
comportamento do futuro presidente dos EUA.
A eleição de Donald Trump nas recentes eleições para a presidência dos
Estados Unidos é um símbolo dos tempos em que vivemos, no cenário
internacional. Quem quer que preste atenção séria às entrevistas e aos
discursos de Trump e os compare ao que diziam os populistas de direita na
Alemanha e na Itália dos anos 1920 e 1930, encontrará muitas semelhanças. Como
também encontrará muita semelhança entre as massas populares alemãs daquela
época, desempregadas e desesperadas, que se deixaram envolver pelo hitlerismo,
do mesmo modo que os desempregados e desesperados brancos norte-americanos,
assim como parcelas dos setores médios e inclusive de migrantes legalizados,
estão sendo envolvidos pelo “trumpismo”, ou pelo Tea Party norte-americano.
Estamos vivendo um momento internacional que possui semelhanças
inquietantes com o que ocorreu na crise dos anos 1930 e, de forma mais ampla,
no período entre guerras (1914-1945).
Naquela época, sob hegemonia do liberalismo, ocorreu uma imensa crise
econômica e social, política e militar. Por diversos motivos, as revoluções
socialistas não foram vitoriosas, senão na Rússia de 1917. De conjunto, tanto a
social-democracia quanto o comunismo fracassaram em transformar a crise em
ponto de partida para a superação do capitalismo. Seja para superar a crise,
seja para debelar a ameaça de uma revolução social, parcelas crescentes do
grande capital e da direita tradicional foram aderindo às teses do populismo de
direita. Esta foi uma das causas da ascensão do fascismo na Itália, do
franquismo na Espanha e do nazismo na Alemanha. O populismo de direita não era
liberal: pelo contrário, fez crescer o papel do Estado, do planejamento e do
protecionismo nacionalista. Mas o populismo de direita, na medida que estava a
frente de grandes potências capitalistas, era também expansionista,
imperialista, racista, anti-democrático, anti-socialista e anti-comunista. O resultado
disto foi a Segunda Guerra Mundial.
Talvez como nunca na história recente, tivesse sido tão necessária a
existência de uma alternativa partidária e eleitoral da esquerda nos Estados
Unidos. Benny Sanders tinha mais chances de disputar o voto dos setores
populares que optaram por Trump, entre outros motivos para rejeitar a candidata
“democrata” Hillary Clinton, inicialmente a preferida de Wall Street, cúmplice
das políticas neoliberais adotadas pelos governos Clinton e Obama, defensora
acérrima do intervencionismo militar dos Estados Unidos.
Olhando em perspectiva histórica, a principal surpresa nas eleições
americanas foi a vitalidade demonstrada pela pré- candidatura Bernie Sanders,
que procurou conquistar os desempregados e desesperados americanos para outra
perspectiva. Que isso tenha emergido nos Estados Unidos é algo alentador. No
entanto, é preciso reconhecer que ainda falta um longo caminho para que os
movimentos sociais e políticos de esquerda daquele país se desenvolvam a ponto
de impor outra política, capaz de evitar aventuras militaristas.
Os cenários internacionais
Só as forças de esquerda, populares e democráticas têm condições de
deter a contraofensiva reacionária que empurra o mundo para crises cada vez
maiores e nos ameaça com guerras cada vez mais destrutivas.
Mas para isto será preciso que a classe trabalhadora e seus
representantes políticos percam todas as ilusões em que será possível defender
o bem-estar social, defender as liberdades democráticas, defender a soberania
nacional e defender uma nova ordem mundial, sem impor uma derrota profunda às
forças capitalistas e a seus representantes políticos, sem oferecer uma
alternativa nova e radical para o mundo em que vivemos.
Nunca o mundo foi tão capitalista quanto é hoje. E é exatamente por isto
que nunca o mundo foi tão desigual, conservador e violento. Devemos tirar todas
as consequências desta verdade simples: é preciso recolocar em debate uma
alternativa global ao sistema dominante no mundo. Até para evitar o mal maior,
até para conseguir as mínimas reformas, é preciso lutar por transformações
efetivas no modo de produzir e distribuir as riquezas em nossa sociedade, na
maneira como as pessoas se relacionam entre si e com a natureza.
A crise que o capitalismo enfrenta, desde 2008, pode ser enfrentada de
duas maneiras fundamentalmente diferentes:
a) ou rebaixando ainda mais o nível de vida dos trabalhadores, causando
catástrofes sociais e ambientais, jogando para a direita o ambiente ideológico
e político, empurrando o mundo para a guerra;
b) ou transformando as riquezas acumuladas nas mãos do capital
oligopolista e financeiro em investimento público, em ampliação do bem-estar e
recuperação do meio-ambiente, desmontando s arsenais militares e girando para a
esquerda o ambiente ideológico e político.
Não existe caminho do meio, num momento de crise como o que vivemos. As
políticas intermediárias são possíveis quando tanto os de baixo quanto os de
cima tem mais paciência que medo, mas principalmente quando
há crescimento econômico que torne factível redistribuir a renda futura. Quando
não há crescimento econômico, quando há decrescimento, se estabelece uma luta
pela expropriação, o medo toma conta e se fecham os “caminhos do meio”.
Tampouco existe reforma pelo alto para a situação que estamos vivendo.
As forças que causam a crise e que se beneficiam dela são as mesmas que dominam
o poder político, econômico, militar e ideológico nos Estados Unidos. É por
isto que as ações práticas do governo dos EUA ampliam a crise, seja quando estimulavam
o globalismo, seja agora em que parece predominar o protecionismo. E em ambas
vertentes, inviabilizam as liberdades democráticas: tanto na Europa quanto nos
Estados Unidos, a democracia liberal abrem caminho, tanto na forma quanto no
conteúdo, para regimes cada vez mais autoritários. A globalização hegemonizada
pelo capital financeiro não é compatível nem mesmo com os níveis de democracia
existentes antes da crise dos 1970.
Os Estados Unidos, ainda a maior potência do mundo mas que está vendo
sua hegemonia declinar, não têm unidade e/ou capacidade para construir uma
alternativa à crise que vivemos. Mas ainda tem os meios para tentar bloquear ou
retardar a mudança, ou pelo menos matar e morrer tentando.
Lembremos mais uma vez que aquele país só superou a crise dos 1930
graças à Segunda Guerra Mundial. E quando a Segunda Guerra terminou, o complexo
industrial-militar continuou apostando em novas guerras e na corrida
armamentista. A política da era Bush pai-Clinton-Bush filho-Obama não foi,
portanto, algo inesperado ou surpreendente.
É por isso, também, que os Estados Unidos operam de maneira agressiva
contra os BRICS, especialmente contra a China e a Rússia. O governo russo deu
vários sinais de que considerava Hillary Clinton mais perigosa. Mas isto não
quer dizer que a vitória de Trump elimine a variável guerra do cenário mundial:
seus atritos com a China, antes mesmo de tomar posse, confirmam este risco.
A dinâmica da crise mundial é mais poderosa e tende a empurrar os EUA em
direção à guerra. Quem pode evitar este desfecho, em primeiro lugar, é o povo
dos Estados Unidos.
O movimento sindical, a intelectualidade de esquerda, os setores
democráticos daquele país estão chamados a agir de maneira autônoma frente aos
dois grandes partidos do Capital, o Republicano e o Democrata.
Quem pode evitar a guerra e construir outra ordem mundial é, em segundo
lugar, a classe trabalhadora e os povos das demais regiões do mundo. Neste
particular, o povo da América Latina e Caribe já deu, continua dando e ainda
deve dar uma grande contribuição.
A situação da América Latina e Caribe
A América Latina e o Caribe foram vítimas, entre os anos 1960 e 1990, de
governos ditatoriais e neoliberais, que aprofundaram as piores características
da história de cada um dos países da região: a dependência externa, a falta de
democracia e a desigualdade social.
A partir de 1998, teve início um ciclo de governos progressistas e de
esquerda que, malgrado suas debilidades e diferenças, apontou num sentido
oposto: ampliação do bem-estar e da igualdade social, ampliação das liberdades
democráticas, soberania nacional e integração regional.
A partir da crise de 2008 e seus efeitos, mais a ação do governo dos
Estados Unidos e da oposição de direita, somada aos erros e as limitações das
experiências “progressistas e de esquerda”, abriu uma fase de contraofensiva
reacionária que vem derrotando os governos progressistas e de esquerda na
região e colocando na defensiva as forças sociais e partidárias vinculadas aos
trabalhadores.
Aonde a direita voltou ao governo, assiste-se não apenas a um retrocesso
social, mas também a um retrocesso econômico e político, bem como a um giro na
política externa, que volta a ser subalterna aos interesses dos EUA.
A recente eleição nicaraguense demonstrou que não é inevitável a derrota
dos governos progressistas e de esquerda. Porém, a difícil situação da
Venezuela e a derrota sofrida no Brasil e na Argentina criaram um novo cenário
estratégico. O fato de vários governos progressistas existirem e se apoiarem uns
aos outros foi uma variável importante para um avanço compartilhado. A ofensiva
reacionária age no sentido oposto.
A esquerda latino-americana e caribenha está convocada a deter a
ofensiva reacionária, reconquistar os espaços perdidos, alcançar novas vitórias,
criar as condições para que a Unasul e a Comunidade de Estados Latinoamericanos
e Caribenhos voltem a ter protagonismo no cenário internacional, em favor da
paz e de outra ordem econômica e política internacional. Descobrir quais os
caminhos para fazer isto exigirá um balanço detalhado de como chegamos até
aqui, do qual se possa extrair uma diretriz de como seguir em frente em uma
nova situação, distinta daquela vigente entre 1998 e 2016, mas em alguns
aspectos semelhante aquela que vigia nos anos 1990, mas em outros aspectos uma
situação totalmente nova.
Até a crise internacional de 2008, os governos progressistas e de
esquerda vinham conseguindo contornar seus limites,
contradições e erros. Mas a partir da crise internacional de 2008, a
deterioração dos preços das commodities, a dependência financeira e comercial,
a força dos oligopólios –especialmente estrangeiros -- e a fraqueza do Estado
tornaram cada vez mais difícil a situação, agravando um conjunto de problemas
que já vinham se acumulando (fadiga de material, limites da estratégia adotada,
timidez nas políticas de integração, políticas macroeconômicas que mantiveram a
predominância do setor agroexportador e o peso do setor financeiro etc).
Noutras palavras, a crise internacional funcionou como um catalizador de
diversos fenômenos, revelando que a dependência externa continua sendo uma
variável fundamental a superar, através da integração regional, da
industrialização, do fortalecimento do Estado e da soberania nacional, em todos
os seus aspectos, do alimentar à defesa, passando pela comunicação.
A crise e a contraofensiva reacionária atingiu o conjunto dos países
governados pelas forças progressistas e de esquerda. Seja onde foi adotada uma
variante mais “confrontacionista”, seja onde foi adotada uma variante mais
“negociadora”, verificou-se uma deterioração das condições políticas,
econômicas e sociais, que afetou o apoio da classe trabalhadora aos governos
progressistas e de esquerda, levando a derrota eleitoral na Argentina, criando
espaço para o impeachment no Brasil e possibilitando uma maioria parlamentar de
direita na Venezuela.
Cada país da América Latina e Caribe tem sua própria história,
irredutível e única. Mas os episódios desde 2008 – Honduras, Paraguay,
Argentina, Venezuela, Brasil ... -- confirmam mais uma vez que nossas
diferenças, que são relevantes, convivem com imensas semelhanças, entre as
quais:
a) nossas classes dominantes preferem subordinar-se a Washington do que
construir experiências democráticas e progressistas de desenvolvimento
soberano;
b) nossas classes dominantes e seus representantes políticos e
midiáticos tem com a democracia uma relação meramente instrumental;
c) nossas classes dominantes preferem ganhar dinheiro através da
desigualdade e da dependência às metrópoles, do que através da integração
regional e da ampliação do consumo.
É por isto que as classes dominantes da América Latina e Caribe atacam
duramente tanto governos moderados quanto radicais. O que lhes importa e
desagrada é serem governos de esquerda, ou seja, governos que tem compromisso
com os interesses da classe trabalhadora e das maiorias populares.
Melhorar a
vida do povo através da ação de governos
No ambiente estratégico dos anos 1990, a maioria dos partidos e
organizações de esquerda da América Latina e Caribe foi convergindo na prática
e também no plano das formulações para uma estratégia que consistia -- malgrado
profundas diferenças históricas, sociais, políticas e ideológicas -- em buscar
melhorar a vida do povo através de políticas públicas que seriam implementadas
a partir de espaços legislativos e executivos conquistados através de processos
eleitorais.
Tais políticas públicas foram de diferentes tipos
(universais/distributivas ou focalizadas/compensatórias) e implementadas com
diferentes graus de confronto, negociação e aliança com as “elites” locais e
com os “imperialismos”.
Em alguns casos, aquelas políticas públicas foram precedidas ou
acompanhadas de processos constituintes, que resultaram em reformas importantes
e foram acompanhadas de uma retórica radicalizada, embora em nenhum caso tenham
implicado em revoluções no sentido clássico deste termo (ou seja, na
expropriação econômica e política da classe dominante). Noutros casos, aquelas
políticas públicas foram implementadas sem processos constituintes, sem nenhuma
tentativa de reforma nas estruturas políticas, sociais e econômicas, no Estado
e na relação entre as forças sociais, além de acompanhadas de uma retórica
explicita e assumidamente “moderada”.
Apesar destas múltiplas e importantes diferenças, havia um núcleo comum,
o que permite dizer que estávamos diante de variantes de uma mesma estratégia.
Este núcleo consistia, como já foi dito, na implementação de políticas públicas
a partir de posições conquistadas através de processos eleitorais. Neste
aspecto, esta estratégia e cada uma de suas variantes eram todas elas
profundamente diferentes da estratégia adotada pelos que dirigiram a Revolução
Cubana de 1959.
No caso cubano tivemos a conquista do poder (e não do governo), pela
luta armada (não pela via eleitoral), a partir da qual se introduziram não
apenas novas políticas públicas, mas também transformações no padrão de
desenvolvimento vigente até então em Cuba, mudanças que incluíram da reforma
agrária à transição socialista. Entretanto, as grandes revoluções – como a
haitiana, a mexicana e a cubana -- não são planejadas: elas acontecem devido
à condensação de contradições internas a cada país, com os estímulos maiores ou
menores fornecidos pelo ambiente regional e mundial. Nos dias de hoje, o
ambiente de instabilidade internacional é acompanhado pela interdição posta,
pelas classes dominantes da região, a qualquer política de reformas.
Apesar da oposição da maior parte da classe dominante e de seus
representantes políticos, os governos progressistas e de esquerda entre 1998 e
2016 obtiveram êxito – maior ou menor em cada caso – no que diz respeito a
melhorar a vida do povo, ampliar as liberdades democráticas, afirmar a
soberania nacional e ampliar a integração regional.
Entretanto, a partir de um determinado momento -- que variou de país
para país, mas que em todos os casos ocorreu depois da crise internacional de
2008--, os governos progressistas e de esquerda passaram a enfrentar crescentes
dificuldades, que resultaram em perda de apoio popular e no crescimento da
oposição de direita.
Como no Chile dos anos 1970, predominou na classe dominante dos países
latino-americanos e caribenhos a política de enfrentamento contra os governos
progressistas e de esquerda. Utilizou-se de tudo um pouco: oposição política e
midiática, sabotagem burocrática e econômica, ações diplomáticas abertas ou
encobertas, mobilização de massa e ações subversivas clandestinas.
Aliás, a esquerda latino-americana e caribenha que chegou ao governo
entre 1998 e 2016 tem muito aprender com a experiência da chamada “via chilena
para o socialismo”. Inclusive com o fato de sermos vítimas de uma campanha
anticomunista, que atinge inclusive partidos que –- ao contrário do que fizeram
o presidente Salvador Allende e o governo da Unidade Popular (1970-1973) –-
nunca vincularam sua ação governamental ao objetivo de chegar ao socialismo.
Frente a uma nova situação estratégia, a esquerda da região está chamada
a produzir uma nova estratégia. Ontem como hoje, um dos componentes desta
estratégia continuará sendo a integração da América Latina e do Caribe,
variável fundamental para o êxito da estratégia democrático-popular e
socialista no Brasil e também para o êxito da estratégia que a esquerda venha a
adotar em cada país da região. Caso o protecionismo prometido por Trump se
materialize, mais espaço haverá para uma estratégia de integração.
Não é a primeira vez que a esquerda regional está chamada a produzir uma
nova estratégia. O mesmo ocorreu no início dos anos 1990, em que enfrentávamos
os efeitos combinados da ofensiva neoliberal e da crise do socialismo de tipo
soviético. Naquele momento, o Foro de São Paulo foi um espaço muito importante
para o diálogo e a elaboração de novas estratégias.
Diretrizes para
a ação internacional no atual período
Devemos ser internacionalistas, por razões programáticas e estratégicas.
Programaticamente, porque defendemos um mundo socialista. Estrategicamente,
porque as vitórias da classe trabalhadora e das esquerdas contribuem umas com
as outras.
Devemos manter relações com partidos, organizações e militantes das mais
diferentes orientações políticas e ideológicas. Devemos manter diferentes
níveis de cooperação com os que compartilham as premissas do respeito à
autodeterminação dos povos, às liberdades democráticas e ao bem-estar social.
Neste diálogo com forças de esquerda, nacionalistas, populares,
socialistas e comunistas, o mínimo denominador é a integração regional, o
desenvolvimento soberano, a ampliação do bem-estar social e das liberdades
democráticas dos nossos povos. Até porque a experiência recente confirmou que
não haverá “progressismo em um só país”.
Neste contexto de hegemonia capitalista, crise do capitalismo, ampliação
das contradições intercapitalistas, conflito entre o bloco liderado pelos EUA
contra os BRICS, instabilidade, crise e guerra, a alternativa está em construir
um forte movimento internacional, ancorado nas classes trabalhadoras e nos
setores populares, que consiga não apenas resistir, mas também conquistar
governos, reorientando assim a economia e a politica mundiais.
Nos tempos em
que vivemos, capitalismo significa instabilidade, crises e guerras. Nos Estados
Unidos e na Europa, as classes dominantes e seus partidos, assim como
importantes setores da esquerda tradicional, comprometeram-se com políticas
neoliberais e/ou capitularam diante do populismo reacionário. A guerra, sob a
forma regional ou mundial, é um risco crescente. Frente a barbárie capitalista,
reafirmamos a escolha por uma sociedade sem exploração nem opressão, o
socialismo.
Os principais
traços do socialismo são:
a) a mais
profunda democracia. Isto significa democracia social; pluralidade ideológica,
cultural e religiosa; igualdade de gênero, igualdade racial, liberdade de
orientação sexual e identidade de gênero. A igualdade entre homens e mulheres,
o fim do racismo e a mais ampla liberdade de expressão sexual serão traços
distintivos e estruturantes da nova sociedade. O pluralismo e a
auto-organização, mais que permitidos, deverão ser incentivados em todos os
níveis da vida social. Devemos ampliar as liberdades democráticas duramente
conquistadas pelos trabalhadores na sociedade capitalista. Liberdade de
opinião, de manifestação, de organização civil e político-partidária e a
criação de novos mecanismos institucionais que combinem democracia
representativa e democracia direta. Instrumentos de democracia direta,
garantida a participação das massas nos vários níveis de direção do processo
político e da gestão econômica, deverão conjugar-se com os instrumentos da
democracia representativa e com mecanismos ágeis de consulta popular, libertos
da coação do Capital e dotados de verdadeira capacidade de expressão dos
interesses coletivos;
b) um
compromisso internacionalista. Somos todos seres humanos, habitantes de um
mesmo planeta, casa comum a que temos direito e de que todos devemos cuidar. O
capitalismo é um modo de produção que atua em escala internacional e, portanto,
o socialismo deve também propor alternativas mundiais de organização social.
Apoiamos a autodeterminação dos povos e valorizamos a ação internacionalista,
no combate a todas as formas de exploração e opressão. O internacionalismo
democrático e socialista é nossa inspiração permanente. Os Estados nacionais de
vem ter sua soberania respeitada e devem cooperar para eliminar a desigualdade
econômica e social, bem como todos os motivos que levam à guerra e aos demais
conflitos políticos e sociais. Os organismos multilaterais criados após a
Segunda Guerra Mundial deverão ser reformados e/ou substituídos, capazes de
servir como superestrutura política de um mundo baseado na cooperação, na
igualdade, no desenvolvimento e na paz;
c) um planejamento
democrático e ambientalmente orientado. Uma economia colocada a serviço, não da
concentração de riquezas, mas do atendimento às necessidades presentes e
futuras do conjunto da humanidade. Para o que será necessário retirar o
planejamento econômico das mãos de quem o faz hoje: da anarquia do mercado
capitalista, bem como de uma minoria de tecnocratas estatais e de grandes
empresários, a serviço da acumulação do capital e, por isso mesmo, dominados
pelo imediatismo, pelo consumismo e pelo sacrifício de nossos recursos sociais
e naturais;
d) a
propriedade pública dos grandes meios de produção. As riquezas da humanidade
são uma criação coletiva, histórica e social, de toda a humanidade. O
socialismo que almejamos, só existirá com efetiva democracia econômica. Deverá
organizar-se, portanto, a partir da propriedade social dos meios de produção.
Propriedade social que não deve ser confundida com propriedade estatal; e que
deve assumir as formas (individual, cooperativa, estatal etc.) que a própria
sociedade, democraticamente, decidir. Democracia econômica que supere tanto a
lógica do mercado capitalista, quanto o planejamento autocrático estatal vigente
em muitas economias ditas socialistas. Queremos prioridades e metas produtivas
que correspondam à vontade social, e não a supostos interesses estratégicos de
quem comanda o Estado. Queremos conjugar o incremento da produtividade e a
satisfação das necessidades materiais, com uma nova organização do trabalho,
capaz de superar a alienação característica do capitalismo. Queremos uma
democracia que vigore tanto para a gestão de cada unidade produtiva, quanto
para o sistema no conjunto, por meio de um planejamento estratégico sob o
controle social.
Falar
em socialismo como objetivo estratégico parece ser contraditória com a
afirmação que vivemos num período de defensiva estratégia da esquerda, no
âmbito internacional.
Defensiva estratégica
Um
período de defensiva não significa um período de passividade. Num período de
defensiva travam-se grandes lutas, se obtém vitórias e até avanços.
O que
caracteriza um período como sendo de defensiva é o objetivo dele.
Num
período de defensiva, o objetivo principal é defender as conquistas antigas e
recuperar o terreno perdido. Ou seja: os avanços parciais visam recuperar o
status quo ante, o que já tínhamos e agora perdemos.
A
defensiva não dura para sempre. Uma situação de defensiva pode se converter em
uma situação de equilíbrio (relativo, como qualquer equilíbrio) e este pode se
converter numa situação de ofensiva estratégica.
O que
permite a defensiva se converter em ofensiva é a mudança no estado de ânimo da
classe trabalhadora. E esta mudança ocorre em parte como reação à ação dos
inimigos e em parte por ação das diferentes vanguardas da classe, numa
combinação de elementos.
Evidente,
se existe o propósito de criar as condições para sair de uma situação de
defensiva, então a ação das vanguardas deve ajudar a classe trabalhadora a
mudar seu estado de ânimo.
Para
isto é preciso elaborar e saber diferenciar as propostas de curto, médio e
longo prazo. E para isto é preciso saber escolher muito bem as batalhas que
devem ser travadas em cada momento, levando em conta (embora invertendo os
termos) o ensinamento implícito na famosa frase: “nem tão devagar que pareça
afronta, nem tão depressa que pareça medo".
E por
isto é importante, especialmente quando estamos na defensiva, ser o mais
didático, paciente e correto no debate de ideias. Pois nos momentos de
defensiva, de recuo, de confusão, as forças inimigas ampliam sua influência
também no terreno das ideias.
Nossa
ação não decide tudo, mas nossa ação não é irrelevante. Mais do que isto: nos
períodos de ofensiva, quando a vanguarda erra, as massas passam por cima. Mas
num período de defensiva, quando a vanguarda erra, quem passa por cima de nós
são os inimigos.
Por
isto é tão importante, num período de defensiva, acertar. Acertar nas palavras
de ordem, acertar nas politicas organizativas, acertar nos métodos de trabalho
etc.
Do
ponto de vista organizativo, a principal batalha é defender nossas organizações.
E afirmar o princípio da unidade da classe, da unidade das forças populares, da
unidade do nosso campo político e social.
Nesta
perspectiva, os sindicatos e a central sindical cumprem papel decisivo, porque
são organizações que estão (ou que deveriam estar, ou que podem estar) em
contato direto e cotidiano com a maior parte da classe trabalhadora.
Também
cumpre papel muito importante a disputa de eleições e o exercício de mandatos
parlamentares e governamentais.
Sabemos
que a conquista de maiorias eleitorais faz parte da disputa pelo poder, mas não
“resolve” a maior parte do “problema” do poder.
Em
primeiro lugar, porque mesmo quando obtemos vitórias, a classe dominante -- e
seus partidos – conquistam minorias eleitorais mais ou menos expressivas.
Além
disso, há elementos de poder que não sofrem influência direta da disputa
eleitoral, tais como a ingerência externa, o poder econômico, o oligopólio da
mídia, o judiciário, as forças de segurança.
Além
disso, embora não resolvam o problema do poder, as vitórias eleitorais da esquerda
aguçam a disputa pelo poder, tornando mais violenta a disputa de hegemonia
cultural, comunicacional, ideológica, política e econômica.
Quando
as forças reacionárias conseguem afastar a esquerda do governo (seja pela via
eleitoral ou do golpe, seja este clássico ou jurídico-parlamentar), elas voltam
dispostas a reduzir ao mínimo as possibilidades de que a história se repita.
Isto é
ainda mais verdadeiro hoje em dia, em que as forças reacionárias na América
Latina e Caribe aprenderam com as derrotas que sofreram a partir da eleição de
Hugo Chavez em 1998; e também porque a situação do capitalismo as empurra a
adotar medidas para recompor rapidamente sua rentabilidade e controle, medidas
que só serão politicamente viáveis se forem acompanhadas de alterações
profundas na correlação de forças entre as classes; o que por sua vez as levará
a tentar fechar e colocar ferrolhos nas “portas” que permitiram à esquerda
acessar espaços executivos e legislativos, para implementar políticas públicas
que melhorassem a vida do povo.
Neste
emaranhado de questões, o aspecto ao qual devemos dar atenção principal é o
estado de ânimo, consciência, organização e mobilização das camadas populares,
especialmente da classe dos trabalhadores assalariados.
Para
isto é importante realizar uma análise das classes sociais, de seus interesses
de médio e longo prazo, de como eles se articulam e conflitam entre si.
Além
disso, faz-se necessário debater:
1)
como travar a disputa pelo "poder econômico"?
2)
como disputar a hegemonia ideológica sobre a sociedade?
3)
quais são as indispensáveis reformas democráticas no âmbito econômico, social,
cultural e político?
Quando
saímos do plano nacional e passamos a análise do plano regional, a questão pode
ser posta da seguinte forma: sem integração regional, não é possível melhorar a
vida do povo de maneira profunda, veloz e permanente.
Entretanto,
qual padrão de integração regional é necessário, se falamos em processos de
mudança mais profundos, mais velozes e mais duradouros? Por exemplo: como articular
a integração entre Estados e a integração entre os setores sociais
comprometidos com os projetos de transformação?
Quando
saímos do plano regional e passamos à análise do plano mundial, a questão pode
ser posta assim: como o processo de transformações nacionais e de integração
regional se articula com a “guerra” (com cada vez menos aspas) mundial entre
diferentes projetos de desenvolvimento?
Do
ponto de vista teórico, precisamos enfrentar a análise do capitalismo do século
XXI, a retomada do balanço da luta pelo socialismo no século XX, assim como um
balanço dos governos “progressistas e de esquerda” na América Latina e Caribe.
Estratégica, tática e análise
de conjuntura
As
definições estratégicas podem ser perfeitas no papel, mas se a tática for
equivocada, de pouco adiantará.
Ou
seja: não é provável que vença uma guerra alguém que perde todas as batalhas de
que participa. Pois de derrota em derrota não se constrói a vitória final,
embora seja impossível vencer sem antes ter sido derrotado; e seja
imprescindível extrair lições da cada uma das derrotas.
A
estratégia visa alterar a correlação de forças entre as classes sociais num
plano fundamental: o do poder de Estado. E a partir daí, agir sobre o terreno
das relações de produção.
A
tática visa alterar a correlação de forças entre as classes sociais em níveis
menos fundamentais: no governo, no parlamento, nas eleições, nas lutas sociais
etc.
Ambas (estratégia
e tática) dizem respeito à correlação de forças entre as classes sociais; ambas
se articulam; e no limite ocorrem batalhas táticas com efeitos estratégicos
(aquela batalha tática em que se decide a “tomada do poder” é também uma
batalha estratégica, ou seja, mesmo tendo vencido todas as anteriores, perder
esta batalha pode significar perder a guerra).
Noutras
palavras: voltamos ao ponto de partida. Tudo depende da análise das classes
sociais e da luta de classes.
A
análise de conjuntura (ou seja, a análise de um conjunto de elementos) tem por
objetivo medir a correlação de forças entre as classes sociais e definir quais
passos táticos devem ser dados para acumular forças em direção aos objetivos
estratégicos.
Como
“medir” se estamos acumulando? É preciso verificar qual o nível de consciência,
organização e mobilização da classe trabalhadora, vis a vis as demais classes
sociais.
Vladimir
Lenin dizia que a essência do marxismo é a análise concreta da situação
concreta, que o marxismo é um guia para a ação.
“Situação
concreta” e “ação” podem dizer respeito a períodos de tempo mais ou menos
longos, em territórios mais ou menos extensos.
Podem
dizer respeito à estratégia deduzida da análise das tendências de
desenvolvimento de uma sociedade ao longo dos últimos 100 anos; ou dizer
respeito à tática deduzida da análise de uma sociedade ao longo dos últimos 100
meses.
Podem
dizer respeito à análise da situação de uma empresa, de uma cidade, de um
estado, de um país, de um subcontinente, de um continente, do mundo.
Quando
falamos de análise de conjuntura, estamos nos referindo a uma análise concreta
de uma situação concreta mais curta no tempo e restrita no espaço.
Isto é
assim não por conta da incapacidade de quem analisa, mas sim por conta da natureza
do fenômeno analisado.
A
análise de conjuntura é uma análise da correlação de forças em luta, correlação
que em última análise remete para dois “sujeitos”: as classes sociais (no
âmbito de cada país) e os Estados (expressão desta luta de classes no âmbito
internacional).
A
correlação de forças se altera com muita rapidez ao longo do tempo; e num mesmo
momento, mas em territórios diferentes, também apresenta enormes diferenças.
Por
isto, analisar a conjuntura de um século ou analisar a conjuntura do mundo
inteiro é, na verdade, estudar várias conjunturas encadeadas ou simultâneas.
Isto é
perfeitamente possível de fazer, mas neste caso estaríamos realizando não uma
“análise de conjuntura” --ou seja, das tendências de curto/médio prazo-- mas
sim uma análise das tendências de médio/longo prazo, portanto uma “análise de
estrutura”.
A
análise “estrutural” é fundamental, até porque sem ela a análise de conjuntura
torna-se volúvel. Da análise de conjuntura deriva a tática, da análise de
estrutura deriva a estratégia.
Há
análises de conjuntura para todos os gostos e sabores; assim como há diferentes
maneiras de analisar a conjuntura; não havendo consenso sobre o que significa
“analisar”, nem tampouco sobre o que significa “conjuntura”.
As
análises da conjuntura fazem parte... da conjuntura. A difusão de determinadas
interpretações, narrativas, conclusões, propostas faz parte da luta política
permanente que se trava em nossa sociedade. Por isto é fundamental saber que
não existe análise neutra, acima e a parte daquela luta.
A
classe trabalhadora está submetida à influência da ideologia da classe
dominante (os capitalistas). Reconhecer isto e desenvolver de forma consciente
seu próprio ponto de vista é parte integrante da luta por fazer da classe
trabalhadora a futura classe dominante.
Faltou um detalhe MINIMALISTA... Eis:
ResponderExcluirMas sério mesmo para o ano de 2017, é o seguinte:
O problema é a SUAVE & disfarçada truculência do PeTê... Repare:
É evidente que o Petismo se utiliza de técnicas das mais brilhantes de publicidade, brilhantes, mas ENGANA-TROUXA...
Petista apenas & só se preocupa com PSDB e outras ASNEIRAS. Que amor enrustido! Só fala a toda hora e minuto sobre PSDB etc.
Mas petista nem se lembram do PeTê mesmo… Vejam um único exemplo bem simples:
::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
A Semiótica do Coração Valente
::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
Mas quanto a tudo isso o que importa é a publicidade & a propaganda, somada com a baranguice de VELHA — tal qual Dilma. Eis:
Grave mesmo é isso aqui:
GOLPE e «CORAÇÃO VALENTE»:
São clichês publicitários elaborados por 1 publicitário! Tal qual o preso milionário JOÃO SANTANA (o “Feira”…). São tais quais a frase publicitária de iogurte da DANONE, assim, veja:
«DANONINHO VALE POR 1 BIFINHO». [ou: “CVC pensando em você”].
Nunca jamais houve GOLPE; assim como DANONINHO jamais VALE POR 1 BIFINHO… E o slogan petista “Coração Valente” é uma frase feliz em termos publicitários (fazer a cabeça via mitologia), mas de um vigarismo extraordinário.
[e reparem.., tudo isso tem a ver com Educação grosseira do Governo Petista. A pior da América inteira].