quarta-feira, 30 de agosto de 2023

O Globo não é dono da história

O Globo apoiou o golpe militar de 1964.

Décadas depois, fez uma suposta autocrítica.

O Globo apoiou o golpe de 2016.

Mas, neste caso, a hora da autocrítica ainda não chegou.

Pelo contrário.

No dia 29 de agosto, O Globo publicou um editorial intitulado "Não cabe a ninguém tentar reescrever história do impeachment".

O editorial pode ser lido no link abaixo:

Não cabe a ninguém tentar reescrever história do impeachment (globo.com)

Segundo o dito-cujo, "não tem cabimento" que parlamentares petistas estejam se mobilizando para "aprovar no Congresso uma resolução restabelecendo o mandato de Dilma".

A bem da verdade, não é  exatamente isso que está sendo proposto, mas sim algo parecido: anular as decisões e, portanto, reestabelecer simbolicamente o mandato interrompido pelo golpe.

Também a bem da verdade, a recente decisão do TFR-1 - arquivando processos contra Dilma - é toda cheias de "tecnicalidades", bem ao estilo Zanin.

Aliás, técnica jurídica serve para muita coisa, inclusive para justificar crimes, vide a decisão do STF validando a eleição indireta de Castelo Branco e o golpe de 1964.

Seja como for, a questão é política, não jurídica.

Aliás, O Globo reconhece isto. 

Segundo é dito no próprio editorial, não importa o que a justiça tenha decidido ou venha a decidir, pois "os processos de impeachment têm natureza política". 

Noutras palavras: legal ou ilegal, legítimo ou ilegítimo, justo ou injusto, a decisão é política.

Portanto, "como se trata de decisão com componente político, não cabe — nem jamais caberá — recurso sobre um impeachment". 

Para arrematar, o editorial cita Brosssard, para quem "as decisões do Senado são incontrastáveis, irrecorríveis, irrevisíveis, irrevogáveis, definitivas”.

Estas afirmações do editorial de O Globo precisam ser lidas e relidas pelos amigos de esquerda que acreditam na "justiça" e, pior ainda, pensam que o inimigo acredita também.

Mas se o impeachment é cláusula pétrea, por qual motivo o jornal dos Marinho se preocupa com a questão?

A resposta está aqui: "chamar de golpe o que aconteceu em 2016, como fazem os petistas, despreza a legitimidade das instituições que referendaram o impeachment de Dilma".

Ou seja, a preocupação de O Globo não é com quem estaria tentando "reescrever" a história passada.

A preocupação de O Globo é com quem poderia tentar escrever de outra forma a história presente e futura.

Por isso, autocrítica (como a suposta que fizeram acerca do golpe de 64), só quando não causar mais nenhum efeito prático.

Por isso, não aceitam chamar o golpe de 2016 de golpe, pois ainda dá tempo de rever as decisões tomadas desde 2016.

É também por isso que O Globo se diz preocupado com a legitimidade das "instituições", claro, com aquelas que defendem seus (deles) interesses,

Com a instituição presidência da República, não tiveram nenhuma preocupação, nem em 1 de abril de 1964, nem quando do golpe contra  a Dilma.

Tampouco se preocupam com o fato do Brasil não ser parlamentarista.

Caso se preocupassem com isto, se dariam conta de que é legalmente indiferente o número de parlamentares que votou a favor do impeachment.

Afinal, um crime continua sendo um crime, mesmo que cometido por uma grande turba verde-e-amarela.

Para quem não vai ler o editorial, transcrevo um trecho: o golpe foi apoiado por "um grupo heterogêneo de 367 dos 513 deputados (representando, apenas na votação nominal, 74,4% dos 57,4 milhões de votos para a Câmara) e por 61 dos 81 senadores (representando 74,9% entre os 155,1 milhões de votos ao Senado). Desrespeitar a vontade de parcela tão expressiva do Congresso equivale a desrespeitar o voto popular."

Lembramos: o Brasil não é parlamentarista, aqui não tem voto de desconfiança, para ter impeachment precisa ter crime de responsabilidade, não houve crime de responsabilidade, logo foi golpe.

O Globo dá uma fraquejada, no final de seu editorial, ao reconhecer que "Lula e os petistas têm o direito de acreditar que as pedaladas não eram motivo para o afastamento de Dilma, mas isso é irrelevante". 

E seria irrelevante, segundo O Globo, porque "a instituição encarregada democraticamente de tomar a decisão pensou o contrário". 

O curioso, nesse modo de pensar, é que se ele fosse válido, o mundo marcaria passo eternamente, sem nunca sair do lugar.

Pois o que uma maioria eventual "pensou" num certo momento, seria válido per omnia saeculo saeculorum.

Colocando de outro jeito: a "insistência do PT" em chamar o impeachment de golpe não visa "tentar confundir a opinião pública". Nossa insistência visa convencer a maioria do povo de que, em 2016, foi cometido um crime contra o povo.

Que o O Globo ache que isso "só contribui para pôr em xeque seu [do PT] próprio compromisso com as regras da democracia", apenas revela que o conceito de democracia do jornal dos Marinho é... golpista.

O Globo não é dono da história.

E a história ainda não terminou.

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Não cabe a ninguém tentar reescrever história do impeachment

EDITORIAL 29 AGOSTO 2023 | 2min de leitura

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou em visita a Luanda, em Angola, que a Justiça Federal absolvera Dilma Rousseff da acusação que levara a seu impeachment em 2016 — popularizada pela expressão “pedaladas fiscais”. Por isso, disse Lula, o Brasil devia desculpas a Dilma, “cassada de forma leviana”. Imediatamente parlamentares petistas começaram a se mobilizar para aprovar no Congresso uma resolução restabelecendo o mandato de Dilma.

A iniciativa não tem cabimento. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) apenas arquivou uma ação por improbidade administrativa contra ela e integrantes de seu governo sem julgar o mérito, referendando decisão da primeira instância. O motivo para o arquivamento, diz a decisão, é que Dilma, pelo cargo que ocupava, deveria responder por crime de responsabilidade, não por ação de improbidade. Foi justamente por crime de responsabilidade que foi julgada no Senado. Um novo julgamento na esfera administrativa equivaleria, segundo os juízes, a reabrir uma questão jurídica sobre a qual o Senado já se pronunciara ao condená-la.

Impeachment: Lula diz que é preciso discutir uma forma de compensar Dilma após Justiça arquivar caso das 'pedaladas'

Ainda que Dilma estivesse respondendo a processo criminal pelas pedaladas e fosse absolvida, isso em nada mudaria o veredito do Senado. O ex-presidente Fernando Collor foi, depois do impeachment, absolvido na esfera penal pelo Supremo. E não houve efeito nenhum na decisão do Congresso sobre seu mandato. Isso porque os processos de impeachment têm natureza política. O objetivo da deposição do governante não é puni-lo, mas tão somente proteger o Estado da má gestão. Como se trata de decisão com componente político, não cabe — nem jamais caberá — recurso sobre um impeachment. Nas conhecidas palavras do jurista Paulo Brossard na clássica monografia sobre o tema: “As decisões do Senado são incontrastáveis, irrecorríveis, irrevisíveis, irrevogáveis, definitivas”.

Chamar de golpe o que aconteceu em 2016, como fazem os petistas, despreza a legitimidade das instituições que referendaram o impeachment de Dilma. Primeiro, do próprio Supremo Tribunal Federal (STF), que estabeleceu o rito do processo seguido no Parlamento, onde foi comandado pelo então presidente do STF, Ricardo Lewandowski. O rito seguiu estritamente o que diz a Constituição. Ao falar em irregularidade, Lula dá a impressão de que Lewandowski teria chancelado uma trama golpista, algo impensável.

Em seguida, do Tribunal de Contas da União, cujo trabalho de análise das contas públicas embasou as acusações contra Dilma, de crimes fiscais previstos na Lei do Impeachment. Por fim, do próprio Parlamento. O impeachment foi aprovado por um grupo heterogêneo de 367 dos 513 deputados (representando, apenas na votação nominal, 74,4% dos 57,4 milhões de votos para a Câmara) e por 61 dos 81 senadores (representando 74,9% entre os 155,1 milhões de votos ao Senado). Desrespeitar a vontade de parcela tão expressiva do Congresso equivale a desrespeitar o voto popular.

Lula e os petistas têm o direito de acreditar que as pedaladas não eram motivo para o afastamento de Dilma, mas isso é irrelevante. A instituição encarregada democraticamente de tomar a decisão pensou o contrário. A insistência do PT em tentar confundir a opinião pública chamando o impeachment de golpe só contribui para pôr em xeque seu próprio compromisso com as regras da democracia.

A resolução & a cozinha


No dia 28 de agosto reuniu-se o Diretório Nacional do PT. A reunião foi virtual, ou seja, em sala zoom. O principal ponto de pauta foi a tática eleitoral. Foram apresentados 6 textos para o debate, que podem ser lidos aqui: 



O texto base escolhido foi o da CNB, que teve 34 votos. O Diretório Nacional tem 94 integrantes.

Constituiu-se então uma comissão de emendas, que produziu um texto substancialmente melhor do que o proposto originalmente pela CNB.

O texto definitivo foi aprovado pelo DN no dia 29, numa votação via grupo de zap.

O texto definitivo está aqui: 

Foram a voto duas emendas, que não obtiveram consenso na comissão de emendas.

As duas emendas que foram a voto são:

Emenda no ponto 25. É vedado apoio a candidatos e candidatas identificados com o projeto bolsonarista. Igualmente é vedado o apoio ou recebimento de apoio por parte do Partido ao qual Bolsonaro é filiado." 

Votaram nessa emenda: Natália Sena, Júlio Quadros, Valter Pomar, Carlos Zarattini, Elen Coutinho, Moara Saboia, Mariana Janeiro, Joaquim Soriano, Rosane Silva, Patrick Campos, Jandyra Uehara, Henrique Fontana, Cicero Balestro, Misiara Oliveira, Augusto Lobato, Sérgio Silva, Camila Moreno, Erisvaldo Tytta, Eloi Pieta, Edjane Rodrigues, Luizianne Lins, Sheila Oliveira, Aby Custódio, Milene Lauand, Cicera Nunes, Lucinha Barbosa, Paolla Miguel.

Emenda no ponto 12.A violência é um inaceitável método de ação adotado pelas instituições policiais estaduais”.

Votaram nessa emenda: Natália Sena, Júlio Quadros, Valter Pomar, Carlos Zarattini, Elen Coutinho, Moara Saboia, Mariana Janeiro, Joaquim Soriano, Rosane Silva, Patrick Campos, Jandyra Uehara e Vitor Quarenta

Participaram das duas votações, feitas no grupo de zap, 56 integrantes do DN.

Sobre o extremamente revelador sentido dessas duas votações, comentarei depois.

Veja a seguir a íntegra da Resolução do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT) sobre as eleições para prefeitos e prefeitas e vereadores e vereadoras, em 2024.

RESOLUÇÃO DO DIRETÓRIO NACIONAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES

1. As eleições municipais de 2024 demarcam um momento estratégico para a construção de uma sólida aliança popular e democrática que promova a recondução do Governo Lula em 2026 e o projeto nacional baseado na ampliação das liberdades democráticas, dos direitos sociais, do combate à desigualdade, da inclusão social, do desenvolvimento, da industrialização, da defesa do meio ambiente, da soberania nacional e da integração regional.

2. Somos um partido nacional, temos um projeto para o país, com desafios que envolvem o conjunto do Estado brasileiro e elegemos Lula para a Presidência da República nas eleições mais adversas da nossa história. As eleições municipais de 2024 acontecerão nesse contexto histórico, em que precisamos fortalecer o PT e a esquerda brasileira, consolidar uma forte Frente Democrática e Popular no país para implementar nosso Programa de Reconstrução e Transformação do Brasil, com políticas estruturantes e transformadoras nos municípios brasileiros.

3. Neste sentido, tendo como estratégia política central a continuidade do projeto democrático popular representado pelo Presidente Lula e pelo PT, escolhido pelo povo nas eleições de 2022, é fundamental, neste processo eleitoral de 2024, estimular candidaturas próprias do PT, bem como a construção de alianças partidárias com o campo democrático e popular, cujo centro tático é a defesa do projeto democrático popular e do governo Lula. O PT, como o maior partido de sustentação desse projeto estratégico para o povo brasileiro, deve liderar esse processo de construção.

4. Para alcançar resultados satisfatórios e o crescimento do partido, devemos priorizar a reeleição de nosso projeto nas cidades que atualmente governamos, bem como a reeleição de nossas atuais bancadas de vereadores e vereadoras, assim como investir prioritariamente nas cidades com maior densidade político-eleitoral, destacando-se aquelas com maiores chances de vitória, através de pesquisas e análises do processo pré-eleitoral, bem como a competitividade de cada candidato, considerando a capacidade de construção de alianças.

5. Além disso, devemos empenhar esforços para garantirmos candidaturas do PT nas eleições das capitais onde tenhamos lideranças despontando em pesquisas e/ou onde tenhamos obtido vitórias ou votações significativas nos dois últimos pleitos; nos municípios com mais de 100 mil eleitores; nos municípios caracterizados como polo regional e nos municípios que possuem emissora de TV de caráter regional.

6. O PT deve ainda ter um cuidado especial com os pequenos municípios, com o objetivo de garantirmos a retomada e/ou constituição de bancadas nestes territórios, disputando as eleições majoritárias, sempre que possível.

7. Para tanto é importante que o governo do presidente Lula, além de conversar com governadores e prefeitos sobre projetos e programas, principalmente os constantes do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, também dialogue com as bancadas do campo progressista no sentido de colher sugestões e encaminhar investimentos importantes que devem ser ampliados ou que ainda não foram contemplados institucionalmente.

8. É nossa obrigação, como partido no governo, sustentar as políticas convergentes com os compromissos de campanha e, ao mesmo tempo, apontar deficiências e apresentar propostas num debate crítico, transparente e construtivo.

9. Na presente conjuntura, não faz sentido a tramitação no Congresso de uma proposta de reforma administrativa que é essencialmente contrária à promoção de políticas públicas de interesse da maioria do povo, além de precarizar o serviço público, servindo a um projeto neoliberal que foi derrotado nas urnas em 2022.

10. Assim como é importante aprovarmos a proposta do ministro Fernando Haddad de taxação dos super ricos, dos fundos offshores. Mais do que necessidade de trazer receitas ao Orçamento da União, é uma questão de justiça tributária e social, em um país onde os pobres pagam mais impostos do que os ricos. E reafirmar nosso compromisso com os investimentos públicos nas áreas sociais e em infraestrutura, o que é fundamental para começarmos a enfrentar a enorme desigualdade econômica em nosso Brasil. Neste ponto, os recursos para saúde e educação são fundamentais, sendo muito importante a recuperação e manutenção dos pisos constitucionais para essas duas áreas asseguradas pelo governo do presidente Lula.

11. Também é urgente uma tomada de posição contundente em relação ao papel dos militares em nossa democracia, delimitando suas funções ao que está previsto na Constituição. O comprovado envolvimento de oficiais graduados, ex-comandantes, bem como policiais militares e outros membros das Forças Armadas na sustentação da tentativa de golpe em 8 de Janeiro não permite leniência. A punição exemplar dos golpistas, inclusive no âmbito militar e, quando comprovado, de oficiais de alta patente, é essencial para impedir que se volte a articular contra a democracia.

12. Para além das ações positivas sobre Segurança Pública já em curso no atual governo, é urgente que se aprofundem medidas com o objetivo de consolidar uma política nacional para essa área. A violência é um método inaceitável de ação por parte das polícias estaduais, que atinge a população mais jovem, pobre e preta do nosso país, assim como tem incidência nos próprios policiais. Os governadores têm a oportunidade e o desafio, junto com o governo federal, de mudar situações como essas, buscando enfrentar as organizações criminosas com base numa política maior de inteligência e investigação. Cabe ao PT ajudar nesse debate e seus desdobramentos.

13. No momento em que o Supremo Tribunal Federal deve retomar o julgamento do “marco temporal”, manifestamos a expectativa de que a Suprema Corte reafirme os direitos dos povos indígenas, como ocorreu em decisões anteriores. Esta expectativa de uma atuação em defesa da civilização é reforçada por recentes decisões e avanços do STF neste sentido. São eles: a equiparação da ofensa contra pessoas LGBTQIA+ ao crime de injúria racial; a abertura de ação sobre a violência contra povos indígenas Guarani-Kaiowa pela Polícia Militar de Mato Grosso do Sul; a manutenção, ainda que parcialmente, do princípio da insignificância e o avanço na descriminalização do porte de cannabispara uso pessoal, passo importante para a mudança na equivocada e letal política de guerra às drogas.

14. A partir de 10 de fevereiro de 1980, em mais de quatro décadas de destacada atuação, o PT se tornou o maior partido político de esquerda da América Latina e um dos maiores do mundo. Com sua história construída junto aos movimentos sociais e populares e ao movimento sindical, como também nas instâncias institucionais do Legislativo e do Executivo, o PT se tornou a principal força política do país em defesa da democracia, da soberania nacional e dos interesses populares, presente em todos os momentos da vida do país, especialmente nos mais difíceis.

15. O resultado dessa trajetória faz do PT o partido mais lembrado em pesquisas de popularidade, muito distante das demais agremiações, posição atualmente reforçada pelo retorno do presidente Lula ao comando do país e, com isso, a retomada da democracia, do desenvolvimento econômico e da inclusão do povo no crescimento do país. Mas resta pendente o desafio de transformar este apoio popular ao PT em mobilização e organização em torno de mudanças democráticas e populares, além de voto em nossas candidaturas.

16. A luta cotidiana impõe a constante mobilização para garantir, por um lado, os avanços e conquistas em todos os setores e, por outro, impedir retrocessos. Retrocessos buscados tanto pela ultradireita derrotada nas eleições, quanto pelos demais setores neoliberais, antidemocráticos, antinacionais e antipopulares.

17. Assim, as eleições municipais em 2024, para prefeitos e prefeitas e vereadores e vereadoras, são um campo de batalha especial e decisivo para promover a disputa política na sociedade, ampliar a presença física e orgânica do partido nos territórios e fortalecer o projeto e as alianças do Partido dos Trabalhadores para as eleições de 2026.

18. Devemos primar por sinalizar à sociedade o nosso compromisso com o futuro do nosso projeto, a partir do fortalecimento de novos quadros e de novas lideranças políticas, criando condições para uma corajosa transição geracional, de gênero e de raça nas nossas representações.

19. Isso implica orientarmos a constituição de chapas proporcionais que sejam representativas da diversidade da construção do nosso partido, com a manutenção de políticas afirmativas relacionadas especialmente às mulheres, à população negra, além da juventude, da população LGBTQIA+ e dos povos originários.

20. Independente da Legislação Eleitoral que deverá sofrer alterações no próximo período, o PT deve manter seu compromisso efetivo com as políticas afirmativas que foram exitosas nos últimos pleitos resultando na ampliação das bancadas do PT de mulheres, jovens, negras e negros e LGBTQIA+.

21. Promover o debate dos temas concretos que afetam a vida de seus habitantes de forma articulada com os projetos e as ações no plano federal, para ganhar potência eleitoral e fortalecer o projeto nacional, deve ser prioridade tanto do Partido, quanto dos militantes petistas que estão a frente de tarefas nos governos integrados pelo partido, em todos os níveis.

22. É importante que, tanto quanto possível, todas as candidaturas do partido ou apoiadas por ele sejam colocadas publicamente neste ano de 2023, inclusive de vereadores e vereadoras, sem prejuízo de manifestação das instâncias superiores em consonância com a tática eleitoral definida pela direção nacional.

23. A articulação eleitoral nacional do PT deve levar em conta sermos integrantes da Federação Brasil da Esperança, deve buscar o fortalecimento das relações com a Federação Psol-Rede, assim como buscar ampliar as relações com os partidos que apoiaram Lula no primeiro e no segundo turno das eleições de 2022.

24. Além disso, devemos considerar a ampliação do leque de alianças nos municípios a partir de lideranças de partidos que compõem ou que expressam alinhamento ao Governo do Presidente Lula.

25. Acerca da política de alianças, o Diretório Nacional determina o seguinte: 1) para além da nossa Federação, estão autorizadas alianças com a Federação integrada por PSOL e Rede; 2) estão autorizadas alianças com partidos e lideranças que apoiaram Lula no primeiro turno das eleições de 2022; 3) não é necessária aprovação prévia no caso de receber apoios de partidos e lideranças que apoiaram Lula no segundo turno das eleições de 2022.

26. É vedado apoio a candidatos e candidatas identificados com o projeto bolsonarista.

27. Esse é um desafio particular da campanha para as eleições de 2024, por proporcionar oportunidade privilegiada para ampliar a Frente Popular e avançar na unidade em torno de um projeto comum.

28. O PT realizará uma Conferência Eleitoral no mês de dezembro, de forma híbrida, com a participação das Executivas de todos os Diretórios Estaduais. Serão convidados a participar todos os pré-candidatos e pré-candidatas que disputarão as eleições de 2024. A conferência deverá trazer na sua centralidade a discussão sobre a conjuntura e a tática eleitoral, a comunicação e marketing eleitoral, pesquisa, organização de campanha, programa de governo, arrecadação e finanças e outros a serem incorporados. Fica a cargo do GTE Nacional a organização da atividade.

29. O PT nesse terceiro governo Lula, prepara as bases não apenas para um quarto governo Lula, cuja eleição de 2024 é um momento essencial, mas deve buscar consolidar um amplo bloco de alianças na sociedade, construindo no âmbito local um programa fundamentado nos Direitos Humanos, na ampliação de direitos e dos serviços públicos, na redução das desigualdades sociais e na democratização da gestão com controle social e participação popular.

30. Um programa que apresente uma nova matriz de desenvolvimento local, sustentável e inclusivo, que impulsione uma economia produtiva e criativa e que dê consequência a transição energética que o Governo Lula inicia no país, fazendo o contraponto às experiências neofascistas, neoliberais e de direita, que no último período ganharam terreno nos territórios municipais.

31. Que expresse a retomada das políticas sociais, apresentando uma proposta de Segurança Pública no âmbito local que considere a escuta dos trabalhadores e das comunidades, enfrentando a violência policial; que apresente uma política de educação que parta de uma concepção democrática, em contraponto ao projeto das escolas cívico-militares, garantindo uma educação inclusiva com oferta de educação integral e vagas para todos e assegurando a gestão democrática nas redes de ensino público.

32. Que ressignifique a política de assistência social, fortalecendo a geração de renda, o combate à fome, a economia solidária, o empreendedorismo popular e a moeda social; que tenha compromisso com o fortalecimento do SUS – garantindo na ponta o acesso aos serviços e programas do Governo Federal.

33. Que vise a ampliação e popularização da política de cultura; que repense a mobilidade urbana por meio dos recursos de tecnologia verde e da Tarifa Zero; que promova o fortalecimento dos serviços e dos servidores públicos, a oferta de creches públicas e outros serviços públicos de cuidado, assim como promova o apoio à Reforma Agrária, com compras, assistência e transporte.

34. Que combata as desigualdades no âmbito do território enfrentando a gentrificação e a segregação, em diálogo com os públicos excluídos dos processos de desenvolvimento urbano e alvos preferenciais da exclusão e da violência nos territórios, como as populações trabalhadoras, periféricas, negras, LGBTQIA+, crianças e adolescentes, as juventudes, e as mulheres.

35. Um programa, por fim, que fortaleça no território as políticas de desenvolvimento com distribuição de renda que sirvam para afiançar e sustentar politicamente um pacto de longo prazo de distribuição de renda e riqueza, desenvolvimento econômico para o Brasil e soberania, liderado pelo presidente Lula e pelo PT.

36. O PT e nossos aliados, da forma mais unificada possível, necessitam fortalecer um projeto de participação social e democracia participativa que seja um norte programático. A iniciativa do governo em relação ao Plano Plurianual é correta e necessária e pode avançar na organização do Orçamento Participativo, a partir dos municípios.

37. É preciso, portanto, organizar a batalha político-eleitoral desde já. Definir as candidaturas majoritárias, construir alianças potentes, elaborar programaticamente cada município brasileiro, definir uma tática nacional para todas as grandes cidades, construir chapas de vereadores e vereadoras fortes e diversas. E promover a mobilização social no maior número possível de municípios para a construção política de muitas vitórias eleitorais para mudar a realidade das cidades e localidades, contribuir com as transformações necessárias no país, para reeleger Lula em 2026 e fortalecer nosso projeto democrático e popular de país.

Brasília, 29 de agosto de 2023.
DIRETÓRIO NACIONAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES


segunda-feira, 28 de agosto de 2023

Marxismo cultural

Acabo de receber, enviado pelo professor Francisco Teixeira, o Novo Dicionário Crítico do Pensamento das Direitas (Edupe, 2022).




Organizado por Francisco Carlos Teixeira da Silva, Sabrina Evangelista de Medeiros, Alexander Martins Vianna, Karl Schusrter e Dilton Cândido Santos Maynard, reuniu 149 participantes e traz 176 verbetes (isso se não fiz a conta errada), um deles sobre Javier Milei.

Abaixo, o verbete sobre marxismo cultural, de minha autoria.

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A criação da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) em 1922, a vitória soviética na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a formação de um “campo” de países socialistas, bem como a expansão de movimentos e partidos influenciados pela tradição marxista tiveram imensas repercussões no modo de pensar e no modo de agir dos capitalistas e de seus representantes políticos e ideológicos.

Entre estes, por volta dos anos 1950, não eram poucos os que acreditavam que o capitalismo estaria com seus dias contados ou, pelo menos, frente a uma situação que ameaçava profundamente os fundamentos do “modo de vida da civilização ocidental”, a “democracia”, a “religião” e os “bons costumes”.

Foi em nome de combater estas ameaças que, nas décadas seguintes ao final da Segunda Guerra, os governos dos Estados Unidos e de seus aliados lançaram mão de guerras imperialistas, de golpes militares e de expedientes ditatoriais de todo tipo, contando inclusive com a colaboração de nazistas e fascistas.

No plano ideológico, construiu-se então o que se convencionou chamar de “mentalidade da Guerra Fria”, expressa de diferentes formas, desde trabalhos acadêmicos de primeira linha até uma variada filmografia de qualidade questionável, formando uma subcultura de massa bastante influente.

Sendo este o histórico, parecia razoável supor que a desaparição dos “socialismos” do Leste Europeu e da própria URSS (1991) produziria, entre seus vários efeitos colaterais, a desaparição do anticomunismo. Mas não foi isso o que ocorreu.

A chamada mentalidade da Guerra Fria sobreviveu e metamorfoseou-se, assumindo diferentes formas desde 1991 até hoje. Uma destas formas pode ser vista na abordagem adotada por diferentes governos dos Estados Unidos contra a República Popular da China, especialmente na sequência da crise financeira de 2008. Outra daquelas formas é a ofensiva contra o denominado “marxismo cultural”.

Segundo os partidários desta ofensiva, a desaparição da União Soviética teria obrigado os comunistas a mudar de conduta. Do ponto de vista teórico, os comunistas teriam trocado Lênin por Gramsci; do ponto de vista político, teriam deixado de lado a estratégia abertamente revolucionária de luta pelo poder, adotando em seu lugar uma estratégia de conquista do poder “a partir de dentro”, através da hegemonização não apenas de instituições estatais, mas também da chamada sociedade civil, com destaque para a conquista de “corações e mentes” através da influência cultural (sendo essa uma das explicações para a denominação “marxismo cultural”).

Efetivamente, depois da desaparição da URSS muitos comunistas abandonaram o objetivo de construir uma sociedade baseada na propriedade coletiva dos meios de produção, repudiaram a revolução como método legítimo e indispensável de transformação histórica e passaram a exaltar conceitos como a “guerra de posições” e a já citada “disputa de hegemonia”.

Neste sentido, os que falam de “marxismo cultural” estão referindo-se a aspectos aparentes de um fenômeno real. Mas, como sabemos, se a essência fosse igual a aparência, não haveria ciência. Para começar, nada disto é novo: muito antes da URSS desaparecer, comunistas, socialistas, socialdemocratas e pessoas de esquerda de variadas orientações e procedências já defendiam posições que são hoje catalogadas como “marxismo cultural”. A rigor, portanto, não constitui novidade que existam marxistas que enfatizem a dimensão “político-cultural” da luta pelo socialismo.

Neste sentido, os que atualmente falam de “marxismo cultural” estão “arrombando porta aberta”, apresentando como novidade e acreditando sinceramente ser novidade algo que simplesmente não é novidade. Para compreender por quais motivos isso acontece, não apenas como um fenômeno característico deste ou daquele autor, mas como um traço de toda uma tradição intelectual, é preciso levar em conta as características do capitalismo contemporâneo e o tipo de “ideologia” e de “ideólogos” que ele fomenta.

Ficou para trás o tempo em que os defensores do capitalismo podiam oferecer, com mínima credibilidade, uma perspectiva de futuro para toda a humanidade, com ampliação das liberdades, do bem-estar, do desenvolvimento, da soberania e da paz mundial. Já faz algum tempo em que não há como esconder que o horizonte oferecido pelo capitalismo é de crise ambiental, desigualdade social, autoritarismo político, militarização crescente e descarte dos seres humanos por máquinas. Sendo assim, é cada vez mais difícil sustentar a defesa do capitalismo em bases racionais, lógicas, científicas e humanas.

Isto ajuda a explicar por quais motivos parcelas crescentes dos que defendem o capitalismo recorrem ao pensamento medieval, fundamentalista e anticientífico. Neste aspecto, não se trata propriamente de uma novidade: o nazismo alemão, o fascismo italiano, o franquismo espanhol e o salazarismo português também foram, em seu tempo, uma mistura aparente paradoxal de mitologias reacionárias, de uma filosofia irracionalista e de “ferramentas” modernas (como o rádio e o cinema). Aliás, o termo “marxismo cultural” tem, entre seus antecedentes, um termo cunhado por Adolf Hitler: “bolchevismo cultural”.

Tampouco constitui uma novidade a natureza ideologicamente totalitária desta tradição intelectual que se organiza em torno da crítica ao chamado marxismo cultural. Absolutamente tudo corre o risco de ser etiquetado – pelos participantes daquela tradição - como “marxismo cultural” ou relacionado a ele: o comunismo, o socialismo, a socialdemocracia, as ideias progressistas, o feminismo, o antirracismo, os direitos dos LGBT, a participação popular, o voto eletrônico, as vacinas, o jacobinismo, o iluminismo etc.

Alguns intelectuais, não apenas de esquerda, criticam a bizarrice desta atitude, mas é importante lembrar que por detrás da bizarrice existe algo muito perigoso, tão perigoso quanto aquela lógica que começou defendendo o mais tosco antisemitismo e terminou implementando o extermínio em massa de judeus em fornos de gás. Tanto no nazismo quando na extrema direita do primeiro quartel do século 21 encontramos a mesma incompatibilidade – expressa no terreno das ideias – entre o capitalismo e a vida. Nada, absolutamente nada, que preserve a vida está à salvo da “arma da crítica” e da “crítica das armas” desta extrema-direita. A referida incompatibilidade, que se materializa por exemplo na mais abjeta naturalização e banalização da violência e da morte, é potencializada por dois fenômenos dos tempos atuais: por um lado a hegemonia do capital financeiro, a mais desumana das frações do capital; e, por outro lado, certas dinâmicas da moderna comunicação de massa, cuja rentabilidade se beneficia dos piores instintos e medos.

É nesse caldo de cultura – individualista, egocêntrico, imediatista, egoísta – que brotam como fungos os “intelectuais orgânicos” do capitalismo moderno e sua tara pelo “marxismo cultural”. Profundamente incultos, adeptos de todo tipo de teoria da conspiração, lacradores e muitas vezes alpinistas sociais, devotam um ódio profundo ao marxismo, não propriamente por conhecer as ideias das variadas tendências que compõem esta tradição, mas porque odeiam profundamente a noção fundamental defendida por Marx e Engels, a saber: a de que a humanidade é insustentável sem a igualdade.

Finalmente: o “marxismo cultural” existe? Num certo sentido existe, mas apenas como um espantalho que um setor da direita construiu para espancar.

 

Bibliografia

CARVALHO, Olavo. O jardim das aflições. Rio de Janeiro: Diadorim. 1995.

COSTA, Iná Camargo. Dialética do marxismo cultural. São Paulo: Expressão Popular, 2019.

HICKS, Stephen. Guerra cultural. São Paulo: Avis Rara, 2021.

HITLER, Adolf. A minha luta. Porto: Edições Afrodite, 1976.

LUKÁCS. G. El asalto a la razón. México-Bueno Aires: Fondo de Cultura Económica, 1959.

Valter Pomar técnico industrial em artes gráficas formado pelo SENAI. Graduado, mestre e doutor em história formado pela USP. Professor de relações internacionais e da pós graduação em economia política mundial da UFABC. Diretor da Fundação Perseu Abramo e membro do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores.

 



sexta-feira, 25 de agosto de 2023

Z de Zanin, não de zebra

Quando Lula indicou Zanin para o STF, só tínhamos uma certeza: a de que o novo ministro seria garantista.

E ressaltamos ser péssimo avalizar um nome para o Supremo, que lá poderia ficar por quase três décadas, sem conhecer suas posições acerca dos grandes temas.

E não deu outra.

Como já imaginavam alguns, mas não sabia a maioria, Zanin votou de forma conservadora no tema das drogas, dos furtos insignificantes, da homofobia/transfobia e dos "escritórios de parentes".

Fez isso por convicção?

Fez isso para deixar claro que é independente?

Ou por ambos motivos?

Seja como for, não deu zebra: a maioria das indicações de Lula e Dilma ao Supremo foram do mesmo padrão.

E ser garantista não basta.

Pois num Estado da direita, a defesa formalista do "Estado de direito" às vezes se confunde com a manutenção do status quo.



 

quinta-feira, 24 de agosto de 2023

A vitória em 2024 começa a ser construída em 2023

 A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda (Dnae) vai se reunir no dia 27 de agosto. Nesta reunião, um dos pontos de pauta é o debate sobre a tática eleitoral do Partido. O texto abaixo trata deste assunto. A versão final será divulgada no dia ao término da reunião da Dnae, como contribuição à reunião do Diretório Nacional do PT que será no dia 28 de agosto. Agradecemos sugestões, comentários, emendas, críticas que nos cheguem até o dia 26 de agosto.

O Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores inicia sua reunião prestando uma homenagem a Maria Bernadete Pacífico. Sua vida foi dedicada às boas lutas. E seu assassinato demonstra o quanto ainda é necessário avançar, para que o Brasil seja um país efetivamente seguro para as grandes maiorias de nosso povo, que são mulheres, negras, periféricas e trabalhadoras.

A tentativa de golpe do 8 de janeiro, os dados do Anuário de Segurança Pública, a violência sistemática contra parlamentares de esquerda, entre outros casos de violência sistêmica, demonstram que no Brasil – de forma similar ao Equador, a Argentina e a outros países da região - o tema da segurança pública ocupa um lugar importante nas preocupações da população e ocupa um lugar central na retórica da extrema direita. Isso apesar de muitos integrantes da extrema direita, assim como da direita “tradicional”, estarem direta e indiretamente vinculados, tanto às causas estruturais da violência, quanto a práticas criminosas.

Dada a relevância do tema e a importância de contribuir com uma opinião do Partido acerca da política a ser implementada onde somos governos, bem como com o que deve ser defendido onde somos oposição, o Diretório Nacional do PT convoca, para o mês de setembro de 2023, uma reunião que será dedicada a debater exclusivamente o tema segurança pública. De saída, reafirmamos a necessidade de um ministério dedicado à Segurança Pública e a necessidade da desmilitarização da segurança pública, conforme detalhado no documento “Segurança Pública”, Terrorismo de Estado e Direito à Vida e às Liberdades Democráticas.

As eleições de 2024 terão um componente estritamente municipal. Mas as eleições municipais de 2024 tendem a ser, principalmente, um confronto entre as três grandes correntes políticas que hoje disputam a sociedade brasileira: a extrema direita, a direita tradicional e a esquerda. Nesse sentido, constituem mais uma etapa da guerra que o neofascismo e o neoliberalismo travam contra o povo brasileiro. As eleições de 2024 constituem, também por isso, um momento de acúmulo de forças tendo em vista as eleições parlamentares, governamentais e presidencial de 2026.

Pelos motivos acima expostos, a tática do PT em 2024 não pode ser a mesma adotada nas eleições de 2022. Em 2022, nossa linha foi isolar e derrotar o bolsonarismo. Em 2024, nossa linha deve ser a de fortalecer o campo democrático popular, fortalecer a esquerda, fortalecer o PT. Na prática isso inclui estimular o lançamento de candidaturas petistas e de aliados de esquerda, em todas as cidades onde existimos; e trabalhar pela vitória do maior número possível de candidaturas petistas.

O balanço de 2024 não pode ser “candidaturas da oposição venceram na maior parte das cidades”, mas também não pode ser “candidaturas da base do governo venceram na maior parte das cidades, mas a esquerda e o PT venceram em pequeno número de cidades”.

Em alguns casos, nossas candidaturas servirão para fortalecer a esquerda em âmbito local e preparar o terreno para as disputas futuras. Em outros casos, nossas candidaturas iniciarão o processo eleitoral já com perspectivas de vitória, tendo as condições para buscar reunir em torno de si um leque mais amplo de forças, para além da esquerda. Isso vale tanto para as candidaturas majoritárias, quanto para as candidaturas proporcionais.

Num e noutro caso, nossas candidaturas devem aproveitar o processo eleitoral para defender nossas propostas para as cidades brasileiras, articulando essas propostas com a defesa do programa de reconstrução e transformação do Brasil.

Nossas candidaturas devem defender o governo Lula, nossos governos estaduais e municipais petistas, a atuação de nossas bancadas e de nosso Partido, bem como defender a atuação dos partidos de esquerda, dos sindicatos e movimentos sociais.

Nossas candidaturas devem defender a necessidade de uma política econômica de industrialização de novo tipo, alicerçada na ampliação dos investimentos públicos, a serem viabilizados através de uma reforma tributária que faça os ricos pagaram impostos, ao mesmo tempo que isente os pobres e reduza a carga tributária sobre os chamados setores médios.

Nossas candidaturas devem contribuir para a retomada da mobilização social e para o debate político em geral, dando especial atenção neste momento para temas como a revogação da chamada reforma do ensino médio, a luta pelo cumprimento do piso de enfermagem e da educação, para a construção de uma campanha de massas em favor de que os ricos paguem impostos, para a defesa da retomada do controle público sobre a Petrobrás e a Eletrobrás.

Nossas candidaturas devem travar o debate público em defesa dos direitos de todos os setores explorados e oprimidos.

Nossas candidaturas devem contribuir para que a militância se mantenha motivada e mobilizada. Isso foi decisivo para a vitória de 2022 e será igualmente decisivo para as vitórias em 2024 e 2026.

Onde o PT governa cidades, devemos nos esforçar para reeleger nosso projeto. Onde o PT governa estados, devemos fazer um esforço especial para eleger petistas para dirigir as principais cidades do estado, a começar pelas capitais.

O Diretório Nacional determina que a escolha das candidaturas deva ser feita até o final de novembro de 2023. Com base no mapa das candidaturas escolhidas pelo Partido, realizaremos, em dezembro de 2023, uma reunião do Diretório Nacional, ampliada com a participação de todas as executivas estaduais do PT, para aprovar a política de distribuição do fundo eleitoral. 

Especificamente sobre a Federação, o Diretório Nacional reconhece que a Federação não afetou positivamente nosso resultado eleitoral em 2022 e cria constrangimentos e pode afetar negativamente nosso resultado eleitoral em 2024. E está tomando medidas para atenuar os problemas decorrentes.

Acerca da política de alianças, o Diretório Nacional determina o seguinte:

1/estão autorizadas alianças com a Federação integrada por PSOL e Rede;

2/estão autorizadas alianças com partidos que apoiaram Lula no primeiro turno das eleições de 2022;

3/alianças com partidos que apoiaram Lula no segundo turno das eleições 2022 dependem de aprovação prévia pela respectiva direção estadual, sem prejuízo de recurso à direção nacional;

4/estão proibidas alianças com partidos que apoiaram Bolsonaro no primeiro e no segundo turno das eleições de 2022.

O sucesso do PT nas eleições 2024 depende, em boa medida, do sucesso do governo Lula. Neste sentido, reafirmamos a necessidade de acelerar o ritmo das medidas, enfatizar as políticas de transformação e travar uma intensa disputa política e ideológica sobre o futuro do nosso Brasil.

É simbólico, neste sentido, que os criminosos de 8 de janeiro sejam punidos com o rigor da lei. Sem anistia, nem para os que invadiram os palácios, nem para os que financiaram, planejaram e acobertaram a intentona golpista, a começar pelos criminosos fardados. E, evidentemente, sem anistia para quem pretendia voltar à presidência, nos braços de uma operação GLO.

É simbólico, também, que a justiça tenha reconhecido – ainda que indiretamente – que o impeachment de 2016 foi um golpe.

A justiça reconheceu, tardiamente, que nunca houve base legal para o processo de impeachment. Mas esta decisão não anula os efeitos do golpe de 2016 contra o povo brasileiro, contra nossas liberdades democráticas, contra nossos direitos sociais, contra nossa soberania, contra nosso desenvolvimento. Da mesma forma, a anulação dos processos contra o companheiro Lula não anula os efeitos do governo eleito em 2018, de forma fraudulenta, uma vez que o líder das pesquisas fora afastado irregularmente.

Nesse sentido, é ao governo Lula que cabe fazer justiça, não à companheira Dilma Rousseff nem ao próprio Lula, mas ao povo brasileiro, reconstruindo tudo o que foi destruído, recuperando tudo o que foi roubado, punindo os malfeitores e, principalmente, retomando o caminho da transformação do Brasil.

Nosso governo está chamado a contribuir para uma missão histórica, que inclusive transcende as fronteiras do Brasil. Mas só teremos êxito se ampliarmos nosso apoio junto a classe trabalhadora, se dermos um salto de qualidade na atuação de nosso Partido e se impusermos derrotas estruturais tanto à extrema-direita neofacista quanto aos neoliberais.

Neste sentido, mais do que comemorar os êxitos parciais obtidos até agora, o esforço principal do PT deve ser vencer as batalhas presentes e futuras, entre as quais: i/mudar a política do Banco Central e ii/derrotar a ditadura do capital financeiro; iii/garantir forças armadas comprometidas com a defesa da soberania nacional; iv/impor à maioria de direita do Congresso o respeito às prerrogativas constitucionais do executivo e v/criar as condições para construir uma maioria de esquerda no Congresso nacional; vi/democratizar o sistema judiciário; vii/quebrar o oligopólio da comunicação; viii/executar uma política de reforma agrária e ix/enfrentar o agronegócio e a mineração; x/iniciar um novo ciclo de desenvolvimento do Brasil, com industrialização, alta tecnologia e proteção do meio ambiente. Tudo isto combinado e à serviço de xi/melhorar rápida e profundamente a qualidade de vida da maioria do povo brasileiro, com empregos, salários, direitos trabalhistas e sociais, políticas de moradia, saúde, educação e cultura. Vistas de conjunto, as batalhas presentes e futuras demandam xii/um processo Constituinte, na linha do que já decidiu o sexto congressos do PT.

A Constituição de 1988 tinha imensas limitações, bem explicadas por Lula quando informou – na fase final do Congresso Constituinte – que a bancada do PT votaria contra o texto final, ao mesmo tempo que assinaria a Carta. Posteriormente, cerca de 120 emendas constitucionais alteraram o texto aprovado, geralmente acentuando seu caráter conservador. Quem deseja transformar o país, não pode aprisionar nossos direitos e liberdades nos marcos de 1988. Nem tampouco pode retardar a revogação das medidas adotadas pelos governos pós golpe de 2016: reafirmamos a necessidade de xiii/revogar as contra reformas trabalhista e da previdência, bem como destacamos que o correto teria sido aumentar o salário mínimo – como defendeu a CUT – para no mínimo R$ 1.382,71 e já a partir do início de 2023, como forma de compensar o confisco salarial resultante da inflação. Reafirmamos, também, que é preciso achar maneiras de recuperar o que foi confiscado desde o golpe.

Em resumo, o sucesso do governo Lula depende em parte das realizações administrativas, que melhorem efetiva e rapidamente a vida do povo; mas depende substancialmente da luta política e ideológica. O combate ao neoliberalismo e ao neofascismo está no seu início, não no seu fim. E as eleições de 2024 são uma parte importante deste processo. Neste sentido, são eleições municipais mas com imenso significado nacional.

 

 

“Segurança Pública”, Terrorismo de Estado e Direito à Vida e às Liberdades Democráticas

A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda (Dnae) vai se reunir no dia 27 de agosto. Nesta reunião, um dos pontos de pauta é o debate sobre a proposta de resolução intitulada "Segurança Pública versus Terrorismo de Estado". A proposta original de resolução foi elaborada pelo companheiro Pedro. O texto abaixo sofreu algumas alterações. A versão final será divulgada no dia ao término da reunião da Dnae. Agradecemos sugestões, comentários, emendas, críticas que nos cheguem até o dia 26 de agosto.

Proposta de resolução sobre “Segurança Pública”, Terrorismo de Estado e Direito à Vida e às Liberdades Democráticas

Quando você for convidado

Pra subir no adro da Fundação Casa de Jorge Amado

Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos

Dando porrada na nuca de malandros pretos

De ladrões mulatos

E outros quase brancos

Tratados como pretos

Só pra mostrar aos outros quase pretos

E são quase todos pretos

Como é que pretos, pobres e mulatos

E quase brancos, quase pretos de tão pobres são tratados

E não importa se olhos do mundo inteiro possam

Estar por um momento voltados para o largo

Onde os escravos eram castigados

[...]

Ninguém é cidadão

Se você for ver a festa do Pelô

E se você não for

Pense no Haiti

Reze pelo Haiti

O Haiti é aqui

O Haiti não é aqui

[...]

Cento e onze presos indefesos

Mas presos são quase todos pretos

Ou quase pretos

Ou quase brancos, quase pretos de tão pobres

E pobres são como podres

E todos sabem como se tratam os pretos

[...]

Pense no Haiti 

Reze pelo Haiti 

O Haiti é aqui. 

O Haiti não é aqui


(“Haiti”, de Gilberto Gil e Caetano Veloso) 


1.Às vésperas de completar-se o sexagésimo aniversário do golpe militar de março-abril de 1964, é preciso reconhecer que um dos mais persistentes legados da Ditadura Militar é o Terrorismo de Estado, cuja expressão cotidiana é a atuação das Polícias Militares espalhadas pelo país. A Ditadura Militar não inventou o Terrorismo de Estado (que foi inaugurado no Brasil pela dominação portuguesa), mas lhe deu novas feições, especialmente a partir de 1968, com o AI-5 e diversas outras medidas. 

2.As Polícias Militares já existiam antes da Ditadura Militar, mas esta as centralizou e as colocou sob a direção do Exército. Além disso, os generais criaram a maior e mais poderosa Polícia Militar do país, quando determinaram a unificação da Força Pública de São Paulo com a Guarda Civil. Nos anos 1970, os generais iniciaram as PMs nas trilhas da repressão política, incorporando-as aos DOI-CODI. Isso ocorreu fortemente no DOI-CODI do II Exército, em São Paulo, onde mais de 50 opositores da Ditadura Militar foram assassinados, conforme revela documento oficial, e cerca de mil foram torturados(as). 

3.Encerrada a Ditadura Militar, em 1985, os generais saíram da cena política, ao menos explicitamente, mas deixaram as Polícias Militares como “tropa de ocupação” do país. Assim, ao longo de décadas, as PMs vêm agindo livremente nas favelas e bairros periféricos, impondo o terror  cotidianamente, sem prestar satisfação a quase ninguém. As PMs tornaram-se a polícia mais letal do mundo, matando “suspeitos” em escala industrial, em geral a pretexto de contornar a “resistência armada”.

4.Governadores(as) dos estados foram, não raramente, incentivadores e cúmplices desta matança realizada pelas PMs sem que o Exército, seu suposto controlador por meio da Inspetoria Geral das Polícias Militares, fizesse um gesto sequer para interrompê-la. A pena de morte, que não existe na legislação brasileira, foi instituída de facto pelas PMs que ao mesmo tempo julgam os “suspeitos” e executam a sentença informal, à sombra de governos estaduais que quase sempre exortam e chancelam o comportamento policial. 

5.No Rio de Janeiro surgiu em 1995, por iniciativa do governador Marcello Alencar (PSDB), a “gratificação faroeste”, concedida aos policiais militares mais eficientes na tarefa de executar “suspeitos” e presumidos “bandidos”. Um dos governadores fluminenses mais identificados com a política de extermínio de supostos marginais foi Sérgio Cabral (PMDB), um ladrão de colarinho branco que mais tarde seria preso por incontáveis atos de corrupção, que ademais levaram o Estado a uma situação falimentar. 

6.A Polícia Militar do Rio de Janeiro praticou infindável série de crimes, mas bastam dois deles para definir sua natureza: o fuzilamento da juíza Patricia Acioli em Niterói, em 2011, e o sequestro seguido de tortura (numa “Unidade de Polícia Pacificadora”!), assassinato e desaparecimento do corpo do pedreiro Amarildo, em 2013. Crimes hediondos praticados por ordem de oficiais superiores: o tenente-coronel comandante do 7º Batalhão da PM-RJ (São Gonçalo) e o major comandante da UPP da Rocinha (Rio de Janeiro, capital), respectivamente. 

7.Tristemente exemplar o caso de execução da corajosa juíza Patricia Acioli. Ela foi covardemente assassinada porque vinha investigando, e mandando prender, policiais militares milicianos do 7º Batalhão que forjavam “autos de resistência” para justificar os assassinatos que cometiam. E foi assassinada porque não recebeu a devida proteção. Reportagem do G1 realizada dez anos depois revelou que o tenente-coronel que ordenou e participou do fuzilamento de Patricia com 21 tiros continuava recebendo salário de R$ 39 mil, pois o processo de sua expulsão da PM ainda não fora concluído. 

8.A reportagem apurou também que entre 2011 e 2021 o 7º Batalhão matou, sozinho, 1.099 pessoas. A letalidade da PM em São Gonçalo aumentou exponencialmente após a execução da juíza. Nesse mesmo período, a PM do Rio de Janeiro perpetrou o chocante total de 9.609 homicídios. 

9.Em São Paulo, onde o governador Paulo Maluf, com o beneplácito do Exército, criou a ROTA, já nos anos finais da Ditadura Militar, sucessivos mandatários estimularam a política de “bandido bom é bandido morto”. Ao longo de um quarto de século no qual governos do PSDB se revezaram no comando do Estado, a letalidade policial bateu sucessivos recordes. “Quem não reagiu está vivo”, verbalizou, em certa ocasião, o então governador Geraldo Alckmin ao defender a PM após mais uma chacina.

10.Outras Polícias Militares também se notabilizaram pela prática de atrocidades. Como a do Pará, envolvida na morte de garimpeiros e outras pessoas na Ponte de Marabá, em 1987; no massacre de 19 trabalhadores sem-terra em Eldorado dos Carajás, durante a presidência de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e o governo estadual de Almir Gabriel (PSDB), em 1996; na chacina de nove posseiros e uma posseira, torturados e assassinados na Fazenda Santa Lúcia, em Pau D’Arco, em 2017; e em diversos outros crimes. 

11.Ou a PM da Bahia, responsável pela brutal repressão à Marcha do Descobrimento (em 2000) e por inomináveis atrocidades, como o sequestro e assassinato do jovem Davi Fiuza (16 anos), escolhido para ser sacrificado na macabra iniciação, ou “batismo”, de aspirantes a oficial em 2014, e a chacina do Cabula, terrível episódio no qual 12 jovens negros perderam a vida, em 2015. Neste ano de 2023, em apenas quatro dias, entre 28 e 31 de julho, a PM da Bahia assassinou 19 pessoas, entre elas um garoto de 13 anos. Foram sete mortes em Camaçari no dia 28, oito em Itatim no dia 30, e quatro em Salvador no dia 31. 

12.O governador Jerônimo Rodrigues (PT), em recente declaração pública, procurou racionalizar essas chacinas. De forma semelhante, quando das execuções do Cabula o então governador Rui Costa (PT) buscou justificá-las por meio de analogia com o futebol: os policiais têm de agir com rapidez, ”como um artilheiro em frente ao gol”.  

13.Frente a tanta opressão, frente a tanto sangue derramado, frente a tanta dor de pessoas simples do povo às quais são negados direitos elementares e o próprio direito à vida, como é possível falar-se em “democracia” ou em “estado de direito”? Pois o Terrorismo de Estado é o exercício da violência desmedida pelos detentores do poder político, à revelia de quaisquer limites, sejam eles de ordem jurídica, política ou moral. 

14.“Terror é a capacidade que tem o Estado de atuar sobre os corpos dos cidadãos sem ter que reconhecer limites na intensidade das intervenções ou dos danos e sem ter que enfrentar efetivas regulações na determinação dos castigos e proibições. Terror é a capacidade absoluta e arbitrária de um Estado de inventar, criar e aplicar penas e castigos, sem outros limites que não as finalidades que ele próprio definiu”, formulou o sociólogo chileno Tomás Moulian (Chile Actual: anatomia de un mito, 2002). 

15.Somente o Terrorismo de Estado, com sua capacidade de igualmente obter silêncio cúmplice de uma expressiva parcela da sociedade, pode explicar o espantoso massacre de setores da classe trabalhadora e das populações periféricas praticado pela Polícia Militar de São Paulo em maio de 2006. Cerca de 500 brasileiros e brasileiras tiveram sua vida apagada, em geral aleatoriamente, por atos de vingança de policiais militares desejosos de retaliar ataques do PCC que haviam resultado no assassinato de mais de 40 soldados da PM. 

16.Nesse caso, o Terrorismo de Estado ficou patente, ainda, na conivência do governo estadual e na recusa do Ministério Público (MP-SP) a investigar as centenas de mortes ocorridas em poucos dias, que lotaram os necrotérios. Num curto intervalo de tempo, a PM paulista cometeu uma quantidade tal de assassinatos que suplantou o número oficial de execuções praticadas pela Ditadura Militar ao longo de duas décadas. Quase cinco Carandirus. Mesmo assim, os crimes de maio de 2006 não foram federalizados, e nenhum dos seus responsáveis chegou a ser punido.

17.Embora existam outras forças policiais em atividade no país, como as Polícias Civis, a Polícia Federal e as guardas civis municipais, é a Polícia Militar que, por contar com maiores efetivos e maior poder de fogo (e por sua própria natureza militarizada), acaba ditando e moldando o modelo de “segurança pública” vigente. Que se baseia na vigilância extrema e repressão permanente aos corpos negros, pobres ou desviantes; na proteção do patrimônio e não da população; na “guerra às drogas”, com incursões brutais nas favelas e comunidades; no encarceramento em massa de jovens negros e pobres por meio de prisões preventivas; na repressão aos movimentos sociais, partidos políticos de esquerda e povos indígenas; e na prática de todo tipo de ilegalidades (por exemplo, a PM não pode espionar e não pode ter “inteligência”). 

18.Sempre que aconteceu, a participação das Forças Armadas em “operações de garantia da lei e da ordem” (GLO), nome pomposo para o emprego de contingentes do Exército e da Marinha em ações de natureza policial a pedido de governos estaduais, redundou em ações desastrosas e funestas para a população. Episódio emblemático, nesse sentido, foi o assassinato do músico Evaldo Rosa dos Santos e do catador de latas Luciano Macedo, em 2019, no Rio de Janeiro, por uma tropa do Exército. “O Haiti é aqui”, como na canção de Gil e Caetano, porque sabe-se que a participação do Brasil nas tropas da ONU acantonadas naquele país envolveu brutalidades contra a população haitiana e serviu de treinamento para posteriores operações de GLO.

19.Cabe lembrar, aliás, que o assassinato de Marielle e Anderson ocorreu durante uma GLO; e os envolvidos são, em grande número, integrantes ou ex-integrantes da Polícia Militar. 

20.Terrorismo praticado pela PM amplia insegurança da população

21.As recentes chacinas ocorridas na Bahia, em São Paulo e no Rio de Janeiro, todas praticadas pelas respectivas Polícias Militares, inserem-se no trágico contexto histórico acima delineado, e o reiteram. Não foram “raio em céu azul”, ao contrário confirmam uma trajetória de Terrorismo de Estado e de quase absoluta impunidade. Os governadores Cláudio Castro (PL), do Rio de Janeiro, e Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo, são bolsonaristas que apostam nos dividendos políticos e eleitorais oferecidos por uma postura “linha dura” em matéria de “segurança pública”. 

22.A chamada “Operação Escudo” da PM de São Paulo, em andamento na Baixada Santista enquanto se elaborava esta resolução, produziu pelo menos 18 “mortes violentas intencionais” até o dia 22 de agosto. Todas elas de pessoas pobres assassinadas pela PM. Conforme denúncia da população local, a partir de determinado momento os policiais militares dedicaram-se a derrubar barracos de moradores(as). Apesar de todas os protestos, que partiram da Ouvidoria das Polícias, da Ordem dos Advogados do Brasil, da Comissão Justiça e Paz, da Defensoria Pública, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania e de diferentes entidades e movimentos sociais, Tarcísio deu continuidade à “operação”. 

23.Se por um lado repetem o padrão de extermínio puro e simples que caracteriza a atuação dessas forças policiais, por outro lado essas recentes matanças de populares negros e pobres parecem refletir o inconformismo das PMs frente à conjuntura nacional desfavorável para determinadas lideranças do neofascismo, como o ex-presidente Jair Bolsonaro, ameaçado de prisão, e os altos oficiais do Exército e da PM do Distrito Federal implicados na tentativa de golpe de 8 de janeiro.

24.Igualmente de enorme gravidade é o assassinato da líder quilombola Maria Bernadete Pacífico, executada com 12 tiros na sua própria casa, na região metropolitana de Salvador, no último dia 17 de agosto. Apesar das inúmeras ameaças que vinha sofrendo, a proteção oferecida pela PM a Mãe Bernadete, como ela era conhecida, era “para inglês ver”. 

25.Não basta repudiar e denunciar esses crimes repugnantes. Diante deles, torna-se necessidade imperiosa do Partido dos Trabalhadores dar início a um amplo debate interno sobre a questão da chamada “segurança pública” e sobre a questão correlata das Forças Armadas, na ótica de rejeitar toda e qualquer prática que configure o Terrorismo de Estado. O debate interno deve nos preparar para a discussão externa na sociedade. 

26.No combate sem tréguas ao bolsonarismo, o tema da segurança pública é central e será ponto de destaque nas eleições municipais de 2024. Neste confronto com os neofascistas, ao formular e defender diretrizes programáticas para essa área, o PT não pode abrir mão das liberdades democráticas e, inversamente, deve opor-se ao Terrorismo de Estado. Ao contrário do que dizem inclusive alguns setores do PT, o terrorismo de Estado não consegue combater o crime, não consegue combater o tráfico, não consegue garantir a segurança da população.

27.Quem realmente deseja enfrentar o crime, em todas as suas modalidades, precisa alterar de alto a baixo o funcionamento das polícias militares. E precisa ser implacável contra o terrorismo de Estado, motivo pelo qual aplaudimos a decisão adotada pelo ministro da Justiça acerca dos policiais rodoviários federais que assassinaram Genivaldo Santos,

28.Como parte do debate acerca da política de segurança, propomos a adoção das seguintes medidas:

29-Divulgar sistematicamente a proposta de desmilitarização das Polícias Militares e das demais polícias, inclusive das guardas civis municipais, algumas das quais vem recebendo armamento pesado, como fuzis, e passando por processo de militarização que é preciso reverter. 

30.-Instituir, imediatamente, um Grupo de Trabalho sobre Segurança Pública, Desmilitarização e Direito à Vida, do qual participem os NAPPs de segurança pública, os Setoriais de Direitos Humanos, de Negras e Negros e de Mulheres, petistas que estejam atuando nos governos de todos os níveis liderados pelo PT, pesquisadores convidados(as), representantes de movimentos sociais etc., com a finalidade de retomar a elaboração partidária sobre este tema e que, no curto e médio prazo, desenvolva propostas que permitam às nossas candidaturas enfrentar e derrotar a demagogia dos candidatos de direita e extrema-direita nas próximas eleições.

31.-Monitorar, por intermédio da Executiva Nacional, as ações levadas a cabo por nossos governos, na área da chamada segurança pública, nos níveis federal, estadual e municipal. Nesse sentido, cabe propor ao governo da Bahia uma reunião, no mais curto prazo, para discutir o modo de atuação da Polícia Militar da Bahia, até por se tratar do Estado que ostenta os maiores índices de letalidade policial do país. 

32.Reafirmamos: é necessário punir exemplarmente os envolvidos nos crimes de 8 de janeiro, inclusive os mandantes, os financiadores e os cúmplices fardados, não apenas os policiais, mas também os membros das Forças Armadas. O Brasil precisa de uma política de Defesa democrática deliberada e implementada, não de um ministro de “Defesa dos militares”. O Brasil precisa de Forças Armadas, não desta instituição que aí está, submissa a interesses estrangeiros, dedicada a tutelar o povo e envolvida em todo tipo de malfeito. Anistia, não! 

33.Por fim, propomos que o governo federal convoque uma solenidade nacional, nos dias 31 de março e 1 de abril de 2023, para marcar o dia nacional de combate aos golpes, contra as ditaduras militares e contra o terrorismo de Estado.