http://www.ihu.unisinos.br/612628-7-de-setembro-a-historia-de-uma-liberdade-incompleta-e-da-resistencia-de-um-povo-algumas-analises
O que temos a celebrar neste 07 de
setembro em meio a crise política que o país está imerso?
Temos que celebrar
a disposição de luta de uma parte importante do povo brasileiro. Afinal, o
Brasil precisa de uma nova independência. Aquela que será bicentenária em 2022
manteve a monarquia e a escravidão, sem falar que deixamos de ser colônia
portuguesa para virar semicolônia inglesa. Precisamos de uma independência de
verdade, com efetiva igualdade e liberdade para a imensa maioria de nosso povo.
E isso só virá com muita luta, com muita disposição de fazer transformações
verdadeiramente revolucionárias.
O que vislumbrar para as manifestações
previstas para o 7 de setembro?
Logo
saberemos quantas pessoas vão atender a convocatória do bolsonarismo. Eles
estão fazendo um esforço imenso -nas redes, nos quartéis, nas igrejas e empresas
aliadas – e estão difundindo um discurso agressivo e golpista. Portanto, é
possível que haja bastante gente nas manifestações deles e é possível que
cometam atos de violência. Não devemos descartar, inclusive, que promovam “atentados
com falsa bandeira”, promovidos pela extrema direita mas atribuídos à oposição.
Da nossa parte, devemos nos esforçar para que em todas as cidades do país haja
manifestações pelo Fora Bolsonaro, preparadas por atividades menores nas
periferias, nos locais de trabalho, de moradia, de estudo, nos espaços de
cultura e lazer. Quanto maior o comparecimento, maior será a segurança das manifestações.
Devemos estimular as organizações partidárias, sindicatos e movimentos a
organizarem blocos, que compareçam unidos e identificados aos atos, assim como
dispersem em ordem ao final. Devemos contribuir, também, para que todas as
manifestações organizem sistemas de comunicação e de registro em vídeo e
fotografia dos atos. E para que todas as manifestações contem com equipes que
impeçam a ação de provocadores e infiltrados. Ou seja, além das medidas sanitárias
de proteção contra o vírus, é preciso tomar medidas políticas e de segurança
contra os cavernícolas aliados do vírus. Nosso objetivo no dia 7 de setembro
não é o de colocar mais pessoas que eles; nossos objetivos são realizar o Grito
dos Excluídos, como fazemos desde 1995, e garantir o direito democrático à
manifestação, ameaçado não apenas por Bolsonaro mas também por governos como o do
estado de São Paulo, que tentou impedir que a oposição pudesse se manifestar no
dia 7 de setembro.
Como construir um Brasil não só
independente, mas também democrático e igual?
No curto
prazo, derrotando o bolsonarismo e o neoliberalismo, elegendo Lula e implementando
um programa de transformações democrático e popular. Mas isso não basta: nosso
país precisa de uma revolução, nosso país precisa de socialismo. Não há outra
maneira de garantir soberania, liberdade, igualdade e desenvolvimento em favor
das maiorias. Para isso não bastam alguns anos de governos progressistas, que
fazem políticas públicas populares, para depois serem derrubados por golpes que
fazem a história andar para trás. Nossa classe dominante não se contenta em
manter o país submisso aos Estados Unidos, optou também por um modelo primário
exportador, que ademais serve de estufa para os capitais financeiros. Desde
1980 está em curso uma desindustrialização que – apesar dos esforços em sentido
contrários feitos entre 2003 e 2016 – destruiu boa parte do que foi feito depois
da revolução de 1930. E sem uma potente indústria, o Brasil não tem como garantir
empregos, salários, aposentadorias e políticas públicas de bem estar social
para os mais de 210 milhões de habitantes de nosso país. Sem destruir o pacto
das elites, sem abandonar o modus operandi da conciliação e da transição pelo
alto, sem uma versão plebeia da revolução de 1930, continuaremos sendo um país
em que boa parte da população é periodicamente lançada no desemprego, na fome,
no desespero, sem o direito nem mesmo de ter acesso a moradia, água limpa, saneamento
básico.
Em 2022 celebraremos 200 anos da
Independência. Quais são as expectativas para o próximo ano, considerando
também as eleições presidenciais?
Minha expectativa
é de que haverá muitos conflitos e que vai triunfar quem tiver mais força nas
ruas. Há uma crise no mundo, há uma crise em nosso país, crises múltiplas. E há
no governo um extrema direita, apoiada pelo partido militar e por outras forças
reacionárias, grupos que já demonstraram não estar de brincadeira. Eles não pretendem
perder a eleição e farão tudo para evitar isso, inclusive se necessário
colocando em questão as próprias eleições. Neste sentido, a luta pelo
impeachment de Bolsonaro continua sendo fundamental, pois cada dia a mais deste
cavernícola no governo é um dia a mais de conspiração contra o povo, contra a
soberania, contra o desenvolvimento e contra as liberdades. As pesquisas mostram
que, se as eleições fossem hoje, Lula venceria. Mas as eleições não são hoje e
a classe dominante possui muitas alternativas, desde apoiar Bolsonaro de novo,
passando por forjar uma “terceira candidatura”, até mudar as regras do jogo,
por exemplo via o tal semi-presidencialismo. Portanto, 2022 não será como 2002;
e mesmo que tudo corra como desejamos, os problemas que enfrentaremos serão
muito maiores do que os vividos entre 2003 e 2006. Logo, é preciso guarda alta,
disposição de luta e clareza sobre o que está em jogo. Até porque, para os
Estados Unidos é fundamental ter o Brasil como aliado na batalha que os gringos
travam contra a China. Bolsonaro é parte do problema, mas nossos inimigos são
muitos. Podemos triunfar, mas para isso é preciso saber que as eleições serão como
uma guerra.
Deseja
acrescentar algo?
Sim. Nos últimos
meses vi alguns setores questionando por quais motivos o povo brasileiro não estaria
fazendo o mesmo que fez, recentemente, parcela do povo chileno, paraguaio,
colombiano e até parte do estadounidense, para citar só estes casos. Acho este um
tema muito interessante, mas confesso que me preocupo menos com a atitude do povo
e me preocupo mais com certas atitudes de setores da esquerda, tipo não defender
o Fora Bolsonaro, tipo não querer fazer manifestações de rua, tipo propor não
fazer o Grito dos Excluídos no dia 7 de setembro, tipo achar que 2022 está
garantido etc. Acho que falta lógica para estes setores “quietistas” da esquerda.
Pois é óbvio que, para dar um exemplo apenas, se aceitarmos ser tirados da rua
agora, o que impediria a extrema-direita de usar o mesmo método a partir do 8
de setembro até a eleição presidencial? Ou alguém acha que vamos ganhar a
eleição, sem fazer campanha? Ou alguém acha que a campanha eleitoral será
tranquila? Ou alguém acha que a extrema direita não vai dobrar a aposta? O caso
é o seguinte: é preciso que a esperança vença o medo desde agora, não apenas na
eleição de 2022. Só uma imensa mobilização popular derrotará o bolsonarismo e o
neoliberalismo. É verdade que, para haver mobilização popular, não basta que a
esquerda dê o exemplo. Mas se a orientação da esquerda se limitar a um “aguarde
em casa e venha votar”, o desfecho será nossa derrota. Por isso dia 7 de
setembro estarei nas ruas. Sabendo dos riscos. Mas como já disseram, não se
derrota Al Capone com Woodstock. Muito menos com WO.
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