Em situações de crise, tem sido muito comum a esquerda brasileira preferir um péssimo acordo a travar uma boa luta.
Hoje, que ironia, a direita gourmet vive um dilema parecido.
Este pedaço da direita é o principal responsável pelo golpe de 2016, assim como pela condenação, prisão e interdição da candidatura de Lula.
Este pedaço da direita foi, ademais, cúmplice da vitória de Bolsonaro.
Assim como é sócio majoritário das políticas neoliberais do cavernícola.
Entretanto, a direita gourmet - expressão tradicional de parte importante da classe dominante brasileira - chegou a conclusão de que Bolsonaro é um homem marcado para.. perder as próximas eleições presidenciais.
O que fazer?
Tentar tirar Lula de novo? A preços de hoje, isso exigiria contar com alternativas indizíveis.
Tentar tirar Bolsonaro, abrindo espaço para uma candidatura presidencial gourmet supostamente capaz de derrotar Lula?
Crescentes setores da classe dominante estão aderindo a esta segunda alternativa.
Vale a pena lembrar por qual caminho tais setores chegaram nesta conclusão.
Começaram apoiando Bolsonaro contra Haddad, acreditando que as instituições conseguiriam controlar o cavernícola.
Não deu certo.
Depois apostaram na tutela militar sobre Bolsonaro.
Tampouco deu certo: a tutela militar é cum Bolsonaro, não contra ele.
Em seguida disputaram a presidência da Câmara dos Deputados. Conseguiram inclusive atrair setores importantes da esquerda para esta operação "imperdível".
Mas Bolsonaro pagou o aluguel do Centrão.
Mais recentemente, a direita gourmet passou a depositar suas expectativas no Supremo, talvez acreditando que a famiglia poderia ser pressionada a aceitar algum tipo de “impunidade premiada”.
Mas o clã Bolsonaro até agora não aceitou a oferta e preferiu partir para o enfrentamento, acusando o STF de golpista.
Diferente da esquerda, que foi às ruas dizendo “não vai ter golpe” mas nada fez de concreto a respeito, Bolsonaro está se movimentando.
E tem apoios muito mais consistentes que Collor.
Os atos bolsonaristas do dia 7 de setembro colocaram a direita gourmet diante de uma encruzilhada.
Se recuarem, Bolsonaro terá vencido.
Mas se optarem por uma "boa briga", o que vai ocorrer?
Suponho que devam estar se perguntando...
...qual a posição do governo Biden e qual sua capacidade de influenciar os militares brasileiros contra o trumpismo tupiniquim?
... a cúpula das forças armadas, que até agora deu todos os sinais de respaldo a Bolsonaro, poderia mudar de posição?
... quanto custaria fazer o Centrão, mais especificamente Arthur Lira, alterar sua postura?
... o que poderá fazer o STF, se Bolsonaro realmente descumprir suas determinações?
... e, mesmo que tudo dê certo e Bolsonaro venha a ser afastado, quem sairá ganhando com isto?
Suspeito que esta última deva ser a maior preocupação da direita gourmet.
Pois de nada adiantaria - para eles - derrotar Bolsonaro, se o beneficiário final da operação for a oposição de esquerda.
Pois o que está efetivamente em jogo, para eles, não são as liberdades democráticas, nem tampouco as instituições.
O que está em jogo para a direita gourmet são as políticas neoliberais.
É por isso que, além das perguntas acima, a direita gourmet deve estar se perguntando o que fará a esquerda.
Estaria por exemplo disposta a tratar Mourão como tratou Itamar?
Estaria disposta a fazer um pacto que preserve as contrareformas neoliberais feitas desde 2016?
Na sequência, trataremos disto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário