Segue o roteiro da exposição que fiz no VII Seminário teórico entre
Partido Comunista da China e o Partido dos Trabalhadores do Brasil.O seminário ocorreu no dia 8 de abril de 2024, sob o título "Reforçar a
Construção de Partido no Poder e Explorar o Caminho de Modernização”.
Também fizeram exposições neste seminário, além dos chineses, a
presidenta Gleisi Hoffmann, o secretário de relações internacionais do
PT Romênio Pereira, a secretária executiva do Foro de São Paulo Monica
Valente.
Segue o roteiro da minha exposição.
Cabe a mim falar sobre a “Exploração de caminho de modernização conforme
às próprias realidades de país”.
Começo lembrando que a sociedade brasileira nasceu dependente das
potências metropolitanas da época, especialmente Portugal e Inglaterra.
Desde então e até hoje, o Brasil foi e segue sendo uma das sociedades
mais desiguais do mundo.
Para preservar esta desigualdade, a classe dominante brasileira sempre
fez de tudo para impedir que a maioria do povo tivesse acesso à
democracia.
Outra característica do Brasil é que nosso desenvolvimento é sempre
inferior às nossas possibilidades.
Toda vez que o Brasil começa a se desenvolver, algo acontece e a roda da
história nada para trás.
Como diz um ditado popular, somos o país do futuro, mas o futuro nunca
chega.
Para ser mais preciso, na maior parte da história do Brasil nós tivemos
crescimento, tivemos modernização, mas não tivemos desenvolvimento.
No Brasil costumamos falar de “modernização conservadora”, ou seja, uma
modernização que conserva a riqueza dos que já são ricos e o poder dos
que já têm poder.
Quando falamos de desenvolvimento, falamos não apenas de crescimento,
não apenas de acumulação de riquezas materiais.
Quando falamos de desenvolvimento, falamos da criação das condições para
a nossa sobrevivência no longo prazo.
Condições econômicas, sociais, culturais, ambientais, políticas.
Falamos de criar estas condições em escala planetária, em escala de
humanidade, em escala de civilização, em escala de modo de produção e
reprodução da vida.
Nesta escala mais ampla, falar em desenvolvimento é falar das forças
produtivas de toda a humanidade.
Se nós do Brasil quisermos contribuir positivamente para o futuro da
humanidade, precisaremos dar um salto de qualidade em relação a situação
atual.
E para isso teremos que fazer um imenso esforço produtivo e tecnológico,
cultural e político, para transformar as condições materiais e
espirituais de vida de nossa população.
Se trata de elevar a capacidade produtiva da sociedade como um todo e se
trata, também, de elevar a capacidade produtiva individual de cada um
dos brasileiros e brasileiras.
Um primeiro passo foi dado em 2022, quando reconquistamos a presidência
da República, derrotando a extrema-direita neoliberal.
A vitória de Lula impediu Bolsonaro de continuar na presidência.
Mas a vitória na eleição presidencial não basta. Há inúmeras tarefas
pela frente.
Hoje, a economia brasileira possui dois grandes pilares: a especulação
financeira e a exportação de produtos primários (minerais, vegetais e
proteína animal).
Hoje quem domina a economia brasileira é o agronegócio, a mineração, o
capital financeiro e o capital transnacional.
Um de nossos desafios é mudar esta situação.
Mudando esta situação, mudaremos as bases estruturais nas quais repousa
a distribuição de propriedade, riqueza e poder em nossa sociedade.
Uma questão central a ser resolvida, insuficiente em si mesma, mas sem a
qual as demais não terão solução a contento, é a reindustrialização do
Brasil.
Em 1980, nosso país estava se convertendo em uma grande potência
industrial.
Desde então, tivemos a crise da dívida externa e vários governos
neoliberais.
Como resultado disto, desde 1980 o Brasil veio se desindustrializando
fortemente.
Isso começou a mudar nos governos Lula e Dilma (entre janeiro de 2003 e
agosto 2016), que manifestaram a disposição de colocar um freio e até
de tentar reverter o processo de desindustrialização.
Mas aí tivemos o ciclo golpista iniciado no impeachment de 2016 e
continuado com os governos de Temer e Bolsonaro (agosto de 2016 a
dezembro de 2022).
Como resultado disto, o Brasil involuiu. Deixamos de ser uma quase
potência industrial e viramos uma subpotência agroexportadora e
minério-exportadora.
Além de prosseguirmos sendo um paraíso para o capital financeiro
especulativo.
A “desindustrialização” iniciada em 1980 foi uma verdadeira ponte para o
passado, que nos levou a experimentar hoje, no ano de 2024, uma situação
similar, mas pior, àquela situação vivida no Brasil, na década de 1920,
um século atrás.
A desindustrialização mudou a composição da classe dominante, mudou a
composição e as condições de vida da classe trabalhadora, mudou o
ambiente político e cultural no Brasil, mudou a relação do Brasil com o
mundo.
Foi nesse ambiente de desindustrialização que os neoliberais atuaram e
seguem atuando.
Foi em reação a esse ambiente de desindustrialização, que a esquerda
encabeçada pelo PT ganhou quatro eleições presidenciais seguidas (2002,
2006, 2010 e 2014) e voltou a ganhar, novamente, em 2022.
Foi também nesse ambiente de desindustrialização que os neofascistas
cresceram e seguem ameaçando.
Por todos estes motivos, um dos principais desafios estratégicos do
governo Lula é servir de ponto de partida para uma “transição”: sair da
condição atual, de subpotência agro-minério-exportadora & rentista, e
passarmos a ser uma potência industrial.
Mas uma potência industrial de novo tipo.
Por novo tipo, queremos falar tanto de uma capacidade científica,
tecnológica e industrial padrão século 21, quanto queremos falar de uma
relação totalmente diferente com a classe trabalhadora, com o meio
ambiente e com o mundo.
Achamos que a atual situação mundial é, apesar de seus perigos, propícia
para as mudanças e transformações que queremos fazer.
A atual situação mundial é marcada pelos desdobramentos da crise de
2008, pela pandemia da Covid 19, pelo agravamento da situação ambiental,
pela ascensão da República Popular da China, pela guerra da Rússia
contra a aliança Ucrânia/OTAN e, destacadamente, pelas tentativas que os
Estados Unidos fazem no sentido de reverter seu declínio enquanto
potência hegemônica.
O declínio dos Estados Unidos abre uma janela para que o Brasil e outros
países possam mudar o mundo e mudar o nosso lugar no mundo.
Adotar como objetivo central a reindustrialização nacional tem
implicações em nossa política externa. Por exemplo, em nossa relação com
a Europa. A Europa demonstrou, na segunda onda da crise de 2008 e agora
na Guerra da Ucrânia, sua submissão aos interesses estratégicos dos
Estados Unidos.
Por outro lado, na relação econômica com o Brasil e com a região, parte
das nações que integram a União Europeia insistem em firmar acordos que,
se fossem aceitos, acabariam reforçando a nossa condição
primário-exportadora.
Quanto aos Estados Unidos, estes já demonstraram sua disposição de fazer
de tudo – sabotagem, golpes, lawfare, guerras, cooptação, fábricas de
fakenews – para prejudicar a integração regional latino-americana e
caribenha.
E nós consideramos que a integração regional da América Latina e Caribe
é parte essencial de nosso projeto de reindustrialização.
Portanto, fazer do Brasil um polo mundial industrial, científico e
tecnológico entra em choque com as ambições e interesses dos Estados
Unidos e da União Europeia.
Mas entra em choque, também, com a classe dominante brasileira.
A classe dominante brasileira, o empresariado capitalista, já demonstrou
inúmeras vezes que está dominado pelos rentistas da especulação
financeira, pela turma do agronegócio e pelas potências estrangeiras.
Se depender dos capitalistas brasileiros, nosso país continuará
subalterno e subdesenvolvido.
Portanto, a reindustrialização do Brasil depende essencialmente da
classe trabalhadora.
Só a classe trabalhadora tem interesse em promover mudanças estruturais
na sociedade brasileira.
Só a classe trabalhadora está disposta a lutar para que deixemos de ser
uma economia primário-exportadora e controlada pelo capital financeiro.
Só a classe trabalhadora tem interesse em vincular a reindustrialização
com a redução das desigualdades sociais, culturais e ambientais.
Por tudo isso é que dizemos que, do ponto de vista estratégico,
programático e histórico, cabe ao governo Lula a missão de desencadear
um ciclo de desenvolvimento sustentável que reindustrialize o país, que
amplie o bem-estar social da maioria do povo, que amplie as liberdades
democráticas, que proteja nossa soberania nacional, fazendo tudo isso
de forma combinada com a integração regional.
Para dar conta destas tarefas, precisaremos entre outras coisas de mais
estado e mais empresas estatais.
Precisamos que o Estado brasileiro amplie substancialmente o
investimento público em apoio ao desenvolvimento da indústria brasileira
e em apoio ao desenvolvimento científico-tecnológico.
Precisamos que o Estado brasileiro adote fortes políticas de ampliação
do bem-estar social.
Precisamos superar a política monetária adotada, hoje, pela direção do
Banco Central brasileiro.
O Banco Central brasileiro mantém, há bastante tempo, a maior taxa de
juros reais do planeta.
Entre outros motivos, isso acontece porque o presidente e parte
majoritária da diretoria do Banco Central brasileiro foi nomeada pelo
presidente anterior, foi nomeada por Jair Bolsonaro.
Só em 2025 o presidente Lula poderá nomear um novo presidente do Banco
Central.
Cabe ao Estado, ainda, coordenar o investimento estrangeiro e nacional,
o investimento privado e público, a grande e a pequena e média empresas.
Apenas com o protagonismo do Estado, será possível combinar
desenvolvimento econômico com ampliação do bem estar social.
Em outras palavras, um desenvolvimento democrático e popular só será
alcançado com protagonismo do Estado.
Protagonismo de um Estado de novo tipo.
Afinal, o atual Estado brasileiro não está à altura das tarefas que
temos pela frente.
Nos países em que o capitalismo se desenvolveu exitosamente, ainda no
século XIX (desde a Inglaterra até os Estados Unidos, passando por
Alemanha e Japão), nos países chamados de "imperialistas", nesses países
o papel do Estado também foi muito importante.
Mas o Estado foi e segue sendo decisivo, nesses países, essencialmente
para proteger as empresas privadas e os interesses dos grandes
capitalistas.
Já nos países que foram colônias, nos países chamados de atrasados, de
dependentes ou de periferia, o papel do Estado é ainda mais
indispensável, mas no sentido de proteger os interesses da maioria do
povo.
Cumprem um papel importante, também, as empresas estatais.
Não haverá como superar o atraso em relação aos países economicamente
avançados, nem haverá como enfrentar a "concorrência" do imperialismo,
sem Estado e sem empresas estatais.
Os capitalistas privados brasileiros não conseguem, não podem, não
querem e não vão cumprir um papel de liderança no desenvolvimento do
Brasil.
Por isso, não haverá soberania nacional, bem-estar social, liberdades
democráticas e desenvolvimento enquanto a classe trabalhadora brasileira
não controlar as principais alavancas do poder (poder político,
cultural, econômico, militar) e usar estas alavancas para mudar
estruturalmente nossa sociedade.
Está aí a China para demonstrar o papel que o Estado joga no
desenvolvimento acelerado, na ampliação do bem-estar social e na
transformação da periferia em centro.
Sabemos que os Estados Unidos não têm interesse no desenvolvimento do
Brasil.
Motivo pelo qual o Brasil precisa ter capacidade de defender sua
soberania.
Defender a soberania depende, em primeiro lugar, das condições de vida
que o Brasil oferece a seus cidadãos.
Claro que as pessoas podem se mobilizar e se sacrificar por outras
motivações.
Mas no longo prazo, se queremos que a população brasileira defenda a
soberania, precisamos garantir o máximo possível de igualdade social.
Em segundo lugar, a capacidade de defesa depende da economia.
Em poucas palavras: oficinas e laboratórios, indústria e tecnologia.
Em terceiro lugar, a capacidade de defesa depende da democracia, no
sentido mais profundo da palavra.
Precisamos de uma política estruturada de maneira a fazer valer o ponto
de vista da maioria do povo.
Em quarto lugar, a capacidade de defesa depende da vizinhança: quanto
mais integração regional, mais soberania.
Finalmente, a soberania depende de Forças Armadas que estejam a serviço
do povo e não a serviço dos Estados Unidos.
Para terminar, repito que nós do Brasil estamos diante de uma equação
política e econômica muito complexa.
Esperamos ter a ajuda dos nossos amigos chineses nesse esforço,
inclusive no esforço de superar nossa atual condição
primário-exportadora.
Vale dizer que o exemplo chinês já nos é muito útil, pois demonstra tudo
que se pode conseguir, quando se tem uma noção clara sobre o longo
prazo, vontade política, persistência, capacidade de gestão, esforço
coletivo e esforço individual.
Evidentemente, nada disto teria ocorrido sem a Revolução.
Sem a Revolução, sem o Partido Comunista e sem a disposição de luta do
povo chinês, a China não seria o que é hoje.
Viva os 40 anos de relações entre o PT e o PC.
Viva os 50 anos de relação entre o Brasil e a República Popular.
Valter, a editora Caminho Luminoso editou as obras do Pedro Pomar. Vc poderia ajudar? São jovens trabalhadores.
ResponderExcluirhttps://www.instagram.com/p/C4vTUJ8OZdq/?img_index=1
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