A Terra é Redonda publicou, no dia 15 de junho, mais um artigo do professor Gil Vicente Reis de Figueiredo.
O artigo pode ser lido aqui: Fortalecer
o PROIFES - A Terra é Redonda (aterraeredonda.com.br)
Ao menos em parte, o presente artigo do professor Gil
Vicente é uma resposta a um texto escrito por mim e disponível no seguinte
endereço:
Valter
Pomar: Sobre os argumentos do Proifes, segundo o professor Gil
Como no anterior, Gil Vicente começa seu artigo “remoendo o passado”, ou seja, afirmando ser necessária a “apresentação do histórico do que vem fazendo cada entidade” e meio que me acusando de querer “defender o ANDES”.
Começo por aí: como o próprio Gil Vicente reconhece, eu não defendo a diretoria do Andes, muito menos seus “desatinos”.
Tampouco concordo com a orientação política que predominou no ANDES, desde 2003
pelo menos. Mas um sindicato é maior do que sua diretoria. E não se deve sair
de um sindicato, porque discordamos de sua orientação.
Por isso, a “comparação” que realmente me interessa – entre o Andes e o PROIFES – é saber qual dos dois tem mais representatividade na categoria. E a resposta é: o ANDES.
O Andes tem Associações Docentes em mais de 50 universidades, o PROIFES em menos de 10 universidades.
Vale dizer que, mesmo “torturando”
os números, o próprio professor Gil chega à seguinte conclusão: “dos 63.518
docentes federais sindicalizados pela ANDES e pelo PROIFES, a ANDES detém
46.280, ou seja 72,9%, enquanto o PROIFES, 17.238, ou seja, 27,1%”.
[Alerta: como a maior parte dos sindicatos brasileiros, o movimento sindical docente representa uma minoria da categoria. Nesse sentido, ser “mais representativo” não significa situação confortável.]
Isto posto, suponhamos que a folha corrida do PROIFES fosse mesmo tão maravilhosa quanto diz o professor Gil Vicente. Por qual motivo então, depois de tanto tempo, tempo em que o ANDES cometeu tamanhos “desatinos”, ainda assim o ANDES continua maior do que o PROIFES?
Há vários motivos para isto, mas na minha opinião há uma razão fundamental: o Andes é um sindicato legítimo. Já
o PROIFES é em boa medida algo artificial, produto de uma reação errada contra uma política errada.
Explico: um sindicato deve ser
autônomo frente aos governos e aos partidos. No início do governo Lula 1, as diretorias do ANDES operavam na
linha de partidarizar a entidade. Como reação a isto, os fundadores do PROIFES acabaram criando um apêndice do governo.
Gil Vicente diz que essa acusação não passaria de “notícia falsa”; segundo ele, é o Andes que “requenta e repete até hoje”
que “o PROIFES seria uma entidade governista, criada pelo então presidente Lula
e seus ministros para enfraquecer a ANDES”.
Lamento informar ao professor Gil Vicente duas coisas.
Primeiro: tire “Lula e seus ministros” da história. Nessa história não tem tanto plural, tem mais singulares: a operação contou com a participação de gente de um ministério (o da Educação) e de um setor da CUT. Aliás, um setor de um setor...
Segundo: a tendência de que eu faço parte no PT e na CUT denunciou a criação do PROIFES como peleguismo desde o primeiro dia. Note que naquela época, como hoje, não temos nada que ver com a orientação "desatinada" da diretoria do Andes.
Mais detalhes a respeito, estão nas
edições de outubro e dezembro de 2008, do jornal Página 13: Encarte
Sindical - Proifes e Andes | Página 13 (pagina13.org.br)
As duas atitudes – subordinar a
partidos e subordinar a governos - são deletérias. Mas como o ANDES tem história e base
social, ele resistiu melhor à partidarização e ao esquerdismo. Não quer dizer que não haja danos enormes, não quer dizer que não possa voltar a piorar. Mas hoje estamos
melhor do que estávamos no passado recente (a desfiliação da CSP Conlutas é um exemplo disso).
Já o PROIFES, como não tem a
mesma história, nem a mesma base social, não conseguiu crescer e, neste exato
momento, está passando por uma imensa crise.
Parte de sua base entrou na
greve, outra parte recusou a proposta do governo; mesmo assim, o PROIFES achou
por bem assinar a proposta. Pior, ao invés de manter sua autonomia, em alguns momentos conspirou
com o governo contra os interesses de sua própria base.
Veja: o fato de um governo ser encabeçado por um petista, não deve levar ninguém a defender que os sindicatos se convertam em chapa-branca. Uma coisa é apoiar a eleição, reconhecer avanços, valorizar o diálogo, ser aliados na luta contra a oposição de direita etc. Outra coisa é transformar os sindicatos em correia de transmissão e porta-vozes do governo.
Obviamente, esta atitude do PROIFES gera um
imenso mal-estar, inclusive em parte de sua base. Mas, ao invés de reconhecer a origem do problema, Gil Vicente prefere “remoer
o passado”. Aliás, nem todo o passado: como ele próprio reconhece, no texto anterior
ele não mencionou “a existência de uma oposição na ANDES”. Convenhamos, não mencionar a
existência de pelo menos 41% da categoria não é um detalhe.
Para dissimular o defeito de fabricação do PROIFES, o professor Gil Vicente diz que a criação se deu por conta da falta de democracia no
ANDES.
Bom, não acho que o Andes seja um paraíso, conforme comentei aqui: Valter Pomar: Comentários ao texto de Roberto Leher sobre a greve nas universidades
Mas, diferente do professor Gil Vicente, acho que é possível vencer as eleições no ANDES. É verdade que a diretoria do ANDES cometeu irregularidades e até mesmo fraudes, para poder vencer eleições? Na minha opinião, sim: foi o que aconteceu, por exemplo, na última eleição, em que a diretoria do Andes manobrou para tirar do processo dois colégios eleitorais, a UFMG e a UFSCar.
Mas, mesmo assim, considero que era possível a oposição ter vencido; basta dizer que o número de votos que nos separou da vitória foi muito pequeno, em torno de 2 a 3% do total.
Também, diferente do professor Gil Vicente, não considero que a influência das Associações Docentes na condução da política do Andes seja um obstáculo para a democracia.
Claro que é preciso fazer um esforço redobrado para que as assembleias representem a massa dos professores e não apenas sua vanguarda. Mas, ao contrário do que diz o professor, os conselhos de Associações não são um passeio tranquilo para as diretorias do Andes.
Independente disto, pergunto
ao professor Gil Vicente: as restrições à democracia são uma peculiaridade do ANDES ou são
uma característica de grande parte do movimento sindical? E, se forem uma característica
de grande parte do movimento sindical, vamos adotar como regra rachar os
sindicatos? Por exemplo, nas Associações Docentes que o professor Gil Vicente critica, ele
defende a criação de associações paralelas?
A verdade – na minha opinião - é
que os fundadores do PROIFES adotaram um método tipicamente esquerdista (rachar
a base de um sindicato), para poder implementar uma política de direita (perder a autonomia frente ao governo).
Agora, eu chamo tudo isto de “remoer o passado”, porque mesmo que isso tenha relevância, muito mais relevância na minha opinião tem a atitude do PROIFES neste santo ano de 2024. Ou seja, mesmo que tivessem feito tudo certo antes, agora os diretores do PROIFES cometeram imensos "desatinos", para usar o termo do professor Gil Vicente.
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O PROIFES tem todo o direito de achar que, em 2024, não era o momento de fazer a greve. O que não é razoável é desconhecer que a greve existe, inclusive na base do próprio PROIFES.
É verdade que o professor Gil é
forçado, no seu artigo, a reconhecer que “a favor da greve pesou a enorme insatisfação de
docentes e técnico-administrativos, decorrente da precarização do investimento
e do custeio das nossas universidades e institutos federais, e, sobretudo, da
deterioração acentuada do poder aquisitivo dos nossos salários, exacerbada pelo
congelamento de seis anos imposto pelos dois governos anteriores”.
Mas se a insatisfação existe, como lidar com ela? A resposta do professor Gil é uma pergunta: a de que se faz necessário “um olhar que vá além do próprio umbigo: qual é, neste momento, a leitura da sociedade a respeito da continuidade da atual greve?”
Infelizmente, o professor não
respondeu devidamente, no texto criticado, a sua própria questão. Se respondesse, talvez fosse obrigado a reconhecer que há uma
divisão na sociedade. E os maiores críticos à greve são os setores
neoliberais, que exigem do governo que use o dinheiro dos impostos para seguir
financiando o sistema financeiro.
Ao não falar deste tema, o professor Gil consegue "esquecer" de citar a variável fundamental que explica “porque a proposta do PROIFES foi aceita e a da ANDES rejeitada?”
[Aceita pelo governo, é bom que se diga, pois a
maior parte da base -inclusive parte do PROIFES - rejeitou a proposta.]
Gil Vicente diz textualmente: “A
aceitação quase integral da reestruturação proposta pelo PROIFES, por parte do
governo, foi, portanto, uma escolha acertada, dada de um lado a sua qualidade
e, em contrapartida, o caráter retrógrado e frágil da outra proposta”.
Perdão, professor Gil, mas a proposta do PROIFES foi aceita pelo governo, não por causa de sua “qualidade”, mas pelo baixo custo, digamos assim.
E a grande questão, no que diz respeito ao debate sindical, não é saber se o governo Lula teve um “comportamento
pouco republicano na mesa de negociação”; a grande questão é saber por quais motivos
o PROIFES teve uma atitude tão pouco sindical.
Refiro-me, entre outras coisas,
ao seguinte: “ambas as entidades entendiam ser essencial um reajuste já neste
ano. O que diferiu foi a avaliação. O PROIFES entendeu que a proposta do
governo era o limite ao qual se poderia chegar – uma avaliação que demandava
coragem, mas precisava ser feita. E a ANDES, inconformada com a aceitação das
propostas de reestruturação do PROIFES, apostou na continuidade e na
radicalização do enfrentamento ao governo Lula, achando que com isso irá dobrar
a posição de falta de reajuste em 2024. O futuro dirá quem interpretou corretamente
a realidade”.
Não é preciso esperar o futuro, nem se trata de interpretação: o PROIFES, ao aceitar assinar o acordo, contribuiu para que o governo se mantivesse irredutível em diversas questões. E, onde o governo avançou, foi em grande medida porque houve greve, não porque o PROIFES negociou bem ou apresentou a melhor proposta.
Ademais, o real “limite” do governo não era a falta de dinheiro, pois recursos existem; o “limite” era e segue sendo político. E política é, em grande medida, correlação de forças. E o PROIFES foi a mão amiga, estendida na hora certa, que ajudou o governo contra os grevistas (não contra o capital financeiro, não contra a direita, mas contra os grevistas).
O PROIFES ajudou
o governo. E acha que é isto mesmo que deveria ter feito, pois o governo Lula é o nosso
governo. Fez certo?
Na minha opinião, neste caso não fez certo. O governo Lula é um governo de frente. Nesta frente há uma disputa. Na sociedade há uma disputa.
Se nessa disputa concreta, a da greve, estivessemos enfrentando a disjuntiva “matar a fome da maioria do povo” versus “aumentar o salário dos docente”, eu não hesitaria em defender o acordo proposto ou algo parecido.
Mas a disjuntiva real que está sendo imposta é a seguinte: “manter a transferência de recursos para o setor financeiro” versus “aumentar os recursos para políticas públicas”.
Quem tiver dúvida a respeito, recomendo ouvir a entrevista do presidente Lula, disponível no endereço logo a seguir, especialmente quando ele desanca os que querem fazer o ajuste fiscal no lombo do povo: 🔴 Presidente Lula concede entrevista à imprensa na Itália (youtube.com)
Sendo esta a situação, o correto (tanto do ponto de vista estritamente sindical, quanto do ponto de vista politico mais geral) teria sido e segue sendo continuar a pressão sobre o governo, em favor de mais políticas para o conjunto da classe trabalhadora (inclusive o conjunto da educação, professores, técnicos etc.). Pois o objetivo desta pressão é tirar dinheiro dos banqueiros.
Neste sentido, quem olhou para o
próprio umbigo foi o PROIFES. Refiro-me à recente decisão publicada
pelo Diário Oficial e comentada por mim aqui: Valter
Pomar: Proifes: é dando que se recebe
A esse respeito, confesso que nunca
contaria um segredo para o professor Gil Vicente. Pois ele não conteve a
felicidade e escreveu o seguinte: “como é sabido, a ANDES apelou à justiça para
buscar derrubar o acordo assinado entre o governo e o PROIFES, orientando suas
SS a moverem, nesse sentido, dezenas de processos, com pedidos de liminar. Só
um deles logrou êxito. A publicação do Registro Sindical do PROIFES, ocorrida
esta semana, jogou uma pá de cal nessas tentativas, que a esta altura perderam
seu objeto, posto que baseadas exatamente na falta desse documento”.
[Fique aqui o registro: escrever "orientando suas SS" não é bom uso de siglas para economizar espaço; depois, não reclame da dureza das resposta.]
Mas como este tipo de confissão pode ser mal interpretada, o professor
complementa logo a seguir: “é preciso repudiar com veemência acusação mentirosa que circula
nas redes sociais, de acordo com a qual a concessão do registro do PROIFES pelo
governo Lula seria uma espécie de retribuição dada à Federação pela assinatura
do recente acordo”.
Convenhamos, professor, coincidências existem, mas neste caso não dá para acreditar que tenha sido só isso.
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No final do seu texto, o
professor Gil Vicente critica a iniciativa de mais de 200 professores filiados
ao PT, dentre os quais 13 presidentes de Associações Docentes, de procurarem a
executiva nacional do Partido dos Trabalhadores.
Entre outras coisas, Gil Vicente reclama da "tal solicitação" porque ela "passa a impressão de que estaria em curso uma tentativa de influenciar, pela via partidária, o rumo dos acontecimentos, de forma a beneficiar a aceitação da proposta da ANDES, propondo-se para isso não honrar o acordo já firmado pelo governo (também do PT) com o PROIFES. Convenhamos: bastante incorreto e totalmente inadequado. Até porque já haviam sido encerradas as negociações”.
Vamos por partes.
As negociações haviam sido encerradas, numa combinação entre uma pequena parte do movimento e o governo. A maior parte do movimento estava lutando para reabrir a negociação. Onde está escrito, no manual de bom comportamento do dirigente sindical, que fazer isto é errado?
Ademais, o governo não é do PT. "A culpa é
do PT", sempre, mas o governo é de frente, frente muito ampla, aliás.
O direito a “influenciar” é amplo, geral e irrestrito. Partidos existem e tem um papel na vida política do país. Quem acredita em política sem partidos é a outra turma.
O que os 13 pediram foi que o PT usasse sua influência para reabrir as negociações e ampliar o
atendimento das reivindicações.
Claro que se isso acontecesse, cairia por terra o argumento do PROIFES, acerca dos “limites”. Aliás, o negociador do governo deixou explícita, numa reunião da executiva do PT, sua intenção de "salvar a cara" do PROIFES.
Talvez por isso
o PROIFES tenha se movimentado, no sentido de pressionar o governo a “manter o
acordo”, leia-se, no sentido de não ampliar o atendimento das reivindicações.
Nesse sentido, reitero: o PROIFES
agiu contra os interesses de sua base e a favor do seu umbigo, digo, registro.
Haveria outros aspectos a comentar no texto do professor Gil Vicente, mas é melhor deixar estes e outros assuntos para o balanço geral do processo, que precisa incluir ademais uma análise da ação do Andes, bem uma análise da ação do governo e de outros protagonistas do processo.
Assim, para encerrar me limito a fazer mais uma observação, neste caso sobre o último parágrafo do texto de Gil Vicente, onde ele diz o seguinte: “A tentativa de cancelar o PROIFES e, ao mesmo tempo, fechar os olhos para os erros da direção da ANDES é, assim, um desserviço à construção de um novo cenário de representação – em que todos sejam ouvidos, de forma ampla e transparente. Muito melhor escolha será a de fortalecer o PROIFES, vindo para a Federação: propositiva, plural e verdadeiramente democrática”.
Professor Gil, da minha parte e da parte de muita gente, não vejo nenhum movimento para “cancelar” o PROIFES. Não que ele não mereça. Mas não é preciso fazer movimento algum nesse sentido. O próprio PROIFES está se esforçando muito para ser “cancelado”. E não parece precisar da ajuda de mais ninguém.
E talvez seja assim, pelo seguinte motivo: ser derrotado em uma greve faz parte da vida. Cometer erros também. Mas ser pelego é uma arte, não é para qualquer um.
SEGUE O TEXTO CRITICADO
Fortalecer o PROIFES
Por GIL VICENTE REIS DE FIGUEIREDO*
A tentativa de cancelar o
PROIFES e, ao mesmo tempo, fechar os olhos para os erros da direção da ANDES é
um desserviço à construção de um novo cenário de representação
Cabe, de início, parabenizar o site A Terra é
Redonda por sua atitude aberta e democrática, ao publicar textos com
diferentes visões, argumentos e opiniões sobre assuntos de interesse público.
No dia 4 de junho de 2024, o professor Valter
Pomar postou, nesse site,
comentários a respeito de artigo que aí publiquei anteriormente, intitulado “Em defesa do acordo assinado pelo
Proifes”. Apresento a seguir algumas considerações a respeito, além
de outras reflexões sobre as negociações havidas com o governo federal, bem
como esclarecimentos relativos a notícias falsas que vêm sendo difundidas.
Não se pode apagar a história e nem viver do
passado
De acordo com Valter Pomar, os dois primeiros
parágrafos do meu texto anterior se dedicaram a “remoer o passado”, falando dos
acordos assinados pelo PROIFES e do papel desempenhado pela ANDES a partir dos
anos 2000. Aqui acredito que o termo ‘remoer’ não se aplica à necessária
apresentação do histórico do que vem fazendo cada entidade. É compreensível
que, para quem insiste em defender a ANDES, essa comparação seja
desconfortável.
Por outro lado, é também inquestionável que todos
os aperfeiçoamentos da carreira, vantagens e benefícios salariais conquistados
nos últimos vinte anos resultam dos acordos assinados pelo PROIFES, sem os
quais os docentes do Magistério Superior (MS) e do Ensino Básico, Técnico e
Tecnológico (EBTT) estariam hoje em situação bastante precária. Enquanto que,
ao mesmo tempo, inúmeras posições atrasadas ilustram a trajetória da ANDES
nesse período, contrastando lamentavelmente com sua atuação anterior, em prol da
redemocratização.
Contudo, não precisamos recuar no tempo para que
essas diferenças fiquem claras. Ainda agora, em 2024, o PROIFES voltou a
firmar, junto com diversas entidades, o acordo do qual resultou, a partir deste
mês de maio, o aumento do auxílio alimentação e outras vantagens. Esse acordo
foi assinado pelo PROIFES, mas não pela ANDES.
As oposições da ANDES
Essas considerações nos levam a outra questão: de
fato não mencionei, no texto anterior, a existência de uma oposição na ANDES.
Cabem aqui duas observações a respeito. A primeira é que para os apoiadores do
PROIFES essa preocupação está de longa data superada.
A segunda é que é compreensível e natural que
alguns colegas, como o professor Valter Pomar, queiram que seja muito bem
explicitado que pertencem à oposição da ANDES, posto que não querem que suas
posições sejam confundidas com o que diz e faz a situação: a categorização do
governo do presidente Lula (primeiro mandato) como neoliberal, merecedor,
portanto, de ferrenho ataque, sob a forma de uma greve logo organizada contra
ele; a contraposição visceral ao REUNI (programa de investimentos para expansão
das universidades públicas), com invasão violenta de reitorias, justificada, de
acordo com eles, pelo ‘apoio unânime dos professores de todo o Brasil’; a
oposição à lei das cotas; a recusa a caracterizar o ‘impeachment’ da presidente
Dilma como golpe; dentre muitos outros pontos. Portanto, é justo deixar claro
que setores da oposição no âmbito da ANDES – embora insistam em permanecer sob
a sua sombra – não podem ser responsabilizados pelos inúmeros desatinos
políticos há tempos praticados pela entidade.
De qualquer forma, vale dizer que não é de hoje que
há oposição na ANDES. Em 2004, essa oposição – a então ‘ANDES-Sind’ – era muito
forte. Naquele ano lançamos uma chapa para concorrer às eleições da entidade.
Tivemos 10.537 votos (48% dos votos válidos), contra 11.413 (52%) da situação.
As irregularidades do pleito foram flagrantes. Nada mudou de lá para cá: as
irregularidades continuam, como denunciado mais de uma vez pelo Renova ANDES
(hoje grupo majoritário de oposição na ANDES).
Essa situação nos levou – naquele mesmo ano de 2004
– a analisar a validade da tese de continuar disputando as eleições da ANDES.
Nossa reflexão chegou a dois obstáculos, a nosso ver intransponíveis, que a ela
se opunham. De um lado, estava evidente que a direção da ANDES tinha formas
peculiarmente criativas de conduzir as eleições do sindicato. De outro, havia
uma razão mais profunda, de natureza estrutural. Explico.
Nas eleições da ANDES podem votar todos os
filiados, diretamente em urna. As diretrizes políticas que norteiam a entidade,
no entanto, são aprovadas em instâncias da entidade, Conselhos de Associações
Docentes (CONADs) e Congressos, cujos ‘delegados’ são eleitos em assembleias,
em cada ‘Seção Sindical’ (SS). Não é, assim, suficiente ganhar as eleições da
ANDES para poder dirigir a entidade. Muito pelo contrário, porque quem foi às
urnas para eleger a direção da ANDES não necessariamente vai às assembleias, intermináveis
e por vezes manipuladas; logo, não estará nos CONADs e Congressos, que são as
instâncias em que aquelas diretrizes são definidas – e que a diretoria deve
cumprir, de acordo com o estatuto, seja lá qual for o programa pelo qual se
elegeu. Uma insuperável contradição.
Assim é que, pelas razões acima, o grupo que fundou
o PROIFES, com a adesão ampla e altamente majoritária dos integrantes da
‘ANDES-Sind’, decidiu, a partir de 2006, abandonar a ideia de ‘disputar a ANDES
por dentro’, como se dizia no jargão da época. Optou-se por fortalecer o
PROIFES, como alternativa democrática e plural à organização ultraesquerdista e
pretensamente vanguardista do movimento docente federal na ANDES. A direção
dessa entidade, em vez de reconhecer com a devida honestidade política as divergências
existentes, criou notícias falsas, que requenta e repete até hoje: o PROIFES
seria uma entidade governista, criada pelo então presidente Lula e seus
ministros para enfraquecer a ANDES.
Para nós é absolutamente claro – com todo o devido
respeito a diferenças de opinião – que a tentativa do Renova ANDES de ganhar as
eleições dessa entidade e governá-la está fadada ao fracasso, não apenas pelo
fato de que a disputa eleitoral se dá sob pesado uso, pela situação, da máquina
sindical da ANDES, mas, sobretudo, pelo fato de que, estruturalmente, há um
controle sobre os processos de decisão política da entidade, definidos pela
militância das assembleias e pelos ‘delegados’ aí eleitos, e não pelo conjunto
de filiados que votam nas eleições da diretoria.
Greves
A greve é um importante e legítimo instrumento de
pressão da classe trabalhadora, a ser usado como último recurso, quando se
chega a um impasse incontornável. O que não pode ser apoiado é que, estando
processos de negociação em curso, como ocorria este ano na Mesa Específica e
Temporária da Educação, em pleno funcionamento, seja deflagrada uma greve.
Há, além disso, que considerar que, nas atuais
circunstâncias, é particularmente desafiadora a correlação de forças políticas
que atuam no Brasil. Não devemos minimizar o impacto dos dois governos
anteriores ao atual, em que as universidades e institutos federais estiveram
sob forte ataque, sem que nenhum espaço de diálogo tenha sido aberto, nem com
professores ou técnico-administrativos (TAs), nem com quaisquer servidores
públicos de outras categorias. Há que constatar também que, nesse período,
houve um intenso movimento de desqualificação – junto à sociedade civil – das
nossas instituições e do que aí é feito, inclusive com acusações estapafúrdicas
vindas de titulares da própria pasta da Educação.
Do ponto de vista das forças que defendem a elite
predatória e seu projeto político, é compreensível esse movimento: somos um
entrave, além de desnecessários. Desnecessários porque, da perspectiva do
aprofundamento da subalternidade e do entreguismo, em nada contribuem a
formação de profissionais qualificados ou a produção de conhecimento voltada ao
desenvolvimento científico e tecnológico soberano. E um estorvo, porque as
nossas instituições são berço do pensamento crítico, a ser eliminado por quem
se opõe à proposta de que alcancemos, no Brasil, cidadania plena para todos.
Em um contexto, portanto, em que o diálogo com o
governo estava aberto e em andamento, e em que narrativas sobre as nossas
instituições, sobre a importância do nosso trabalho, estão sob forte disputa,
construir e levar adiante uma greve longa e desgastante, que esvazia nossas
instituições e prejudica nossos alunos, não foi a melhor opção. A favor da
greve pesou a enorme insatisfação de docentes e técnico-administrativos,
decorrente da precarização do investimento e do custeio das nossas
universidades e institutos federais, e, sobretudo, da deterioração acentuada do
poder aquisitivo dos nossos salários, exacerbada pelo congelamento de seis anos
imposto pelos dois governos anteriores. É necessário, porém, um olhar que vá
além do próprio umbigo: qual é, neste momento, a leitura da sociedade a
respeito da continuidade da atual greve?
Reestruturação: porque a proposta do PROIFES foi
aceita e a da ANDES rejeitada?
De início, agradeço ao professor Valter Pomar pela
concordância em relação à análise que fiz no texto anterior, seja no que se
refere à “crítica a pontos da proposta inicial do Andes, seja na defesa de
detalhes da proposta final do governo, seja ao apontar problemas na
contraproposta apresentada no dia 27 [pela ANDES]”. Considero, ainda assim, que
essa temática merece ser revisitada.
A proposta de reestruturação de carreiras
apresentada pelo PROIFES deu continuidade ao acordo de 2015, quando essa
entidade e o governo Dilma assinaram acordo que, pela primeira neste século,
conquistou a reorganização das nossas carreiras: a partir de agosto de 2019
(última etapa do acordo), todos os vencimentos docentes passaram a ser gerados
logicamente a partir do chamado salário base – o do professor auxiliar(A) / DI,
nível 1, 20h, graduado. Alcançar esse avanço foi muito importante, porque as
malhas salariais das carreiras constituíam, antes disso, um emaranhado de
centenas de números sem relação uns com os outros.
Entretanto, a negociação entre os PROIFES e o
governo que resultou naquele acordo esbarrou em problemas orçamentários, e os
percentuais defendidos pelo PROIFES não foram integralmente concedidos. O
PROIFES propunha degraus de 5% entre todos os níveis existentes, estimulando a
promoção e a progressão na carreira, mas o governo, alegando falta de
disponibilidade de recursos, concedeu degraus de apenas 4% entre os níveis de
Adjunto(C)/DIII e Associado(D)/DIV.
A proposta de elevar esses degraus de 4% para 5%
foi, naturalmente, reapresentada ao governo nas negociações deste ano.
Adicionalmente, o PROIFES insistiu na eliminação das duas primeiras classes,
com a criação de uma ‘classe de entrada’ com nível salarial 16,3% mais alto que
o atual, tornando nossas carreiras muito mais atrativas.
A proposta de ‘reestruturação’ da ANDES/Sinasefe
(‘Sete pontos indissociáveis’), de outra parte, é atrasada e antiacadêmica:
propõe eliminar as classes (titular, associado e adjunto, no magistério
superior), tornando as carreiras anacrônicas em relação a todas as demais
existentes no Brasil e no mundo; demanda a redução da Retribuição por Titulação
(RT), diminuindo o estímulo à formação docente – a RT de doutor, segundo a
ANDES, deveria ser rebaixada, passando dos atuais 115% para 75%; dentre
diversos outros aspectos negativos, que apontei no texto original. Além disso,
se opõem essas entidades à elevação dos degraus e ao aumento significativo dos
salários dos recém contratados, conforme defendido pelo PROIFES.
A aceitação quase integral da reestruturação
proposta pelo PROIFES, por parte do governo, foi, portanto, uma escolha
acertada, dada de um lado a sua qualidade e, em contrapartida, o caráter
retrógrado e frágil da outra proposta. Diante disso, seria de muito bom tom
rever a afirmativa de que haveria um ‘jogo combinado’ entre o PROIFES e o
governo, que poderia ser interpretada – embora certamente não tenha sido essa a
intenção – como teoria conspiratória: uma acusação sem provas ao governo do
presidente Lula de ter tido um comportamento pouco republicano na mesa de
negociação.
É de se esperar também, nesse episódio, uma
avaliação crítica, serena e criteriosa das duas propostas de reestruturação. É
fundamental trabalhar no campo dos argumentos concretos, não das especulações,
razão pela qual reitero aqui uma questão séria já apontada no meu primeiro
texto: a ANDES, em sua última proposta, defende que o salário dos atuais
docentes em início de carreira (estágio probatório, que dura três anos) e dos
futuros contratados, seja cerca de R$1.300 menor, todo mês, do que o que já
está consignado no acordo firmado pelo PROIFES, o que causaria a esses
docentes, no período, prejuízo de mais de R$50.000,00. O que dizer sobre isso?
Sobre reajustes lineares
Apresentamos, neste tópico, uma rápida consideração
sobre reajustes lineares. A ANDES de início reivindicou reajuste de 53%, além
de exigir a revogação de todas as reformas previdenciárias. Nenhuma dessas
demandas é incorreta, claro, mas ambas eram (e são), neste momento, totalmente
irrealistas, aparentemente desenhadas com a intenção de gerar impasses
intransponíveis. Ao final, após a apresentação, pelo PROIFES, de índices de
reposição de 3,5% (2024), 9,5% (2025) e 4% (2026), a ANDES encaminhou proposta
muito similar – 3,69% (2024), 9% (2025) e 5,16% (2026). Em relação aos
reajustes em 2024, essas propostas não foram aceitas.
O diagnóstico aqui foi consensual: ambas as
entidades entendiam ser essencial um reajuste já neste ano. O que diferiu foi a
avaliação. O PROIFES entendeu que a proposta do governo era o limite ao qual se
poderia chegar – uma avaliação que demandava coragem, mas precisava ser feita.
E a ANDES, inconformada com a aceitação das propostas de reestruturação do
PROIFES, apostou na continuidade e na radicalização do enfrentamento ao governo
Lula, achando que com isso irá dobrar a posição de falta de reajuste em 2024. O
futuro dirá quem interpretou corretamente a realidade.
Representatividade do PROIFES e da ANDES: chega de
notícias falsas!
Entrar nesse tema é de suma importância, porque
permitirá superar afirmativas incorretas dos que, por desconhecimento ou má fé,
vêm difundindo a tese (falsa) da ‘falta de representatividade’ do PROIFES.
A ANDES é um sindicato interestadual (antigamente
nacional, mas hoje não mais, por estar impedida de representar os docentes em
vários estados brasileiros). Possui ‘Seções Sindicais’ (SS), que representam
docentes de várias esferas, no setor público: distritais, municipais, estaduais
e federais. Uma consulta à internet sobre os resultados das últimas eleições da
ANDES mostra que as SS correspondentes a universidades e institutos federais (o
chamado ‘Setor das Federais’) são 55, com um total de filiados que, em 2023,
era de 46.280.
O PROIFES, por seu lado, é uma Federação. Existem
11 Sindicatos federados. Um deles, o Sind-PROIFES (fundado originalmente com o
nome de PROIFES Sindicato), pode, por seu estatuto, acolher professores
federais de todo o Brasil, e tem filiados em nada menos do que 44 instituições
(26 universidades e 18 institutos federais). Os outros 10 sindicatos do PROIFES
representam professores de 22 universidades e institutos federais. Em vários
casos, um mesmo sindicato representa docentes de várias instituições. A ADUFG,
por exemplo, representa professores da UFG, UFCAT e UFJ; a APUB representa
professores da UFBA, IFBA, UFOB e UNILAB-Malês; o SindPROIFES-PA representa
professores da UFPA, IFPA e UFRA; a ADUFRGS representa professores da UFRGS, do
IFRS, do UFCSPA e do IFSUL. O número total de filiados do PROIFES nessas 66
instituições é de 17.238.
Qual é o número de docentes federais, hoje? Nas
universidades e institutos federais, somos hoje um pouco mais de 200.000. Isso
significa que a representação conjunta do PROIFES e da ANDES, em termos de
sindicalizados, é de pouco mais de 30% do total da categoria.
Por outro lado, dos 63.518 docentes federais
sindicalizados pela ANDES e pelo PROIFES, a ANDES detém 46.280, ou seja 72,9%,
enquanto o PROIFES, 17.238, ou seja, 27,1%. Essa é a proporção de representação
de cada qual.
Entretanto, a forma de consulta aos professores
muda significativamente a representatividade real das posições defendidas por
cada entidade, em especial quando se trata de adesão (ou não) a greves e
aprovação (ou não) de propostas apresentadas pelo governo. Isso porque, na
ANDES, a definição em relação a essas questões se faz unicamente em
assembleias, sem consultas a todos os filiados – e este último método é, de
forma geral, o adotado pelos sindicatos do PROIFES, quando de decisões
relevantes. Assim, uma busca aos dados disponíveis na internet e nas redes
sociais mostra que o número de filiados que participaram de assembleias da
ANDES para a definição de entrada (ou não) em greve foi de aproximadamente
10.000, enquanto que nas consultas do PROIFES votaram cerca de 7.000 docentes.
Em outras palavras, a ANDES ouviu 21,6% de sua
base, e o PROIFES, 40,6%. Essa é a realidade dos números. Logo, o mito que se
procura criar – a falta de representatividade do PROIFES – não tem sustentação
nos dados objetivos. Mas há mais do que isso. Os posicionamentos da ANDES se
referem unicamente ao que pensam os professores que vão às assembleias, que,
como visto, constituem uma pequeníssima parcela do total de docentes.
Muitos optam por não ir a esses encontros, em
especial quando se trata de debater e votar questões polêmicas. Para que se
tenha uma ideia do nível de tensão que aí pode ocorrer, basta mencionar que em
assembleia recente um professor que defendia a não aceitação da proposta do
governo agrediu outro, que era a favor, com um soco no olho (fato gravado em
vídeo e publicado na internet/redes sociais). Logo, as posições da ‘categoria’
definidas pela metodologia da ANDES se referem às opiniões majoritárias dos militantes
que vão às assembleias.
Em contrapartida, os sindicatos vinculados ao
PROIFES realizam também assembleias, mas, em geral, optam por definir seu
posicionamento – em questões importantes – por intermédio de ‘consultas
eletrônicas’ adicionais, em que todos os professores têm direito ao voto,
inclusive os que por alguma razão não podem ou não querem ir às assembleias.
Por isso o número de docentes consultados pelo PROIFES é percentualmente muito
maior. As posições da ‘categoria’, pois, conforme definidas pela metodologia do
PROIFES, se referem a opiniões majoritárias de um conjunto proporcionalmente
maior de filiados.
É provável que essa diferença de aferição de
opiniões contribua significativamente para diferentes conclusões para uma mesma
pergunta (como a aceitação ou não de proposta do governo, por exemplo), posto
que os dois conjuntos de votantes são, em cada caso, muito diferentes. A esse
respeito, não tenho dúvida de que a metodologia do PROIFES tende a resultar em
posições mais próximas e representativas das que efetivamente correspondem às
opiniões majoritárias do conjunto dos professores federais.
Agora, uma coisa é clara: pelos números acima, fica
absolutamente evidente que a tentativa de minimizar e deslegitimar a
representação do PROIFES é propaganda enganosa, motivada, em muitos casos, por
interesses escusos dos que, não tendo capacidade e/ou vontade política de
negociar e firmar acordos, tentam retirar do PROIFES o legítimo direito de
fazê-lo.
Além disso, como é sabido, a ANDES apelou à justiça
para buscar derrubar o acordo assinado entre o governo e o PROIFES, orientando
suas SS a moverem, nesse sentido, dezenas de processos, com pedidos de liminar.
Só um deles logrou êxito. A publicação do Registro Sindical do PROIFES,
ocorrida esta semana, jogou uma pá de cal nessas tentativas, que a esta altura
perderam seu objeto, posto que baseadas exatamente na falta desse documento.
Fundamental aqui acrescentar duas observações.
Primeira: o PROIFES cumpre, há muito tempo, as
condições requeridas para a obtenção do Registro Sindical, que já vem, assim,
bastante atrasado. Segunda: é preciso repudiar com veemência acusação mentirosa
que circula nas redes sociais, de acordo com a qual a concessão do registro do
PROIFES pelo governo Lula seria uma espécie de retribuição dada à Federação
pela assinatura do recente acordo. Como não é possível contestar o mérito da
obtenção do registro, busca-se desonestamente difundir desqualificações espúrias.
Lamentável.
Destacamos a seguir algumas questões presentes nos
parágrafos finais do texto-comentário do professor Valter Pomar.
A mesa de negociação deve tratar de propostas de
categorias, não de partidos políticos
A primeira tem a ver com a afirmação de que ‘seria
possível avançar mais nas negociações’, isso na opinião de parte do PT, sendo
mencionados especificamente “13 presidentes/as de associações docentes que
integram o ANDES”. Vale lembrar que, aqui, o professor se refere à carta
que os 13 presidentes enviaram à presidente do PT, solicitando “com urgência
uma reunião da executiva nacional para tratar da greve docente federal”. Duas
considerações sobre este ponto. Uma delas é que a matéria em tela diz respeito a
toda uma categoria, com professores das mais diferentes opiniões políticas e
filiações partidárias e, portanto, tem que ser republicanamente discutida pelo
todo, e não por uma parte.
A outra é a seguinte: uma tal solicitação passa a
impressão de que estaria em curso uma tentativa de influenciar, pela via
partidária, o rumo dos acontecimentos, de forma a beneficiar a aceitação da
proposta da ANDES, propondo-se para isso não honrar o acordo já firmado pelo
governo (também do PT) com o PROIFES. Convenhamos: bastante incorreto e
totalmente inadequado. Até porque já haviam sido encerradas as negociações.
A contraproposta da ANDES, embora extemporânea, é
‘assimilável’; mas é muito ruim
A segunda questão tem a ver com a afirmativa do
professor Valter Pomar: “o fato é que provamos, por a + b, que o custo total de
aceitar a contraproposta da ANDES é totalmente assimilável na atual
correlação”. Dois aspectos chamam a atenção. De entrada, a condição de ser
‘totalmente assimilável na atual correlação’ é necessária, mas não é
suficiente. Temos acordo em um ponto: a proposta da ANDES é de fato
‘assimilável’ orçamentariamente, até porque prejudica bastante os docentes no
início da carreira – e assim economiza recursos, em especial consideradas novas
contratações.
Mas isso não basta: a proposta, nesse e em outros
aspectos (e essa é uma discussão da qual não se deve fugir), é de péssima
qualidade. Não vou repetir aqui os argumentos que já apresentei no primeiro
texto, mas o fato é que, em relação a esse ponto fundamental (a baixa qualidade
da proposta da ANDES), não foi elencado por Valter Pomar nem um único
contra-argumento. O outro aspecto é que, aparentemente, faltou compreender um
dado de realidade: as negociações já estão encerradas. Quem disse isso foi o
governo (do PT). Está marcada uma mesa, sim, para hoje, 14 de junho, mas é com
o MEC e tratará apenas de questões ‘sem impacto orçamentário’. Criar
‘factóides’ a respeito só gera falsas expectativas e, a bem da verdade, deveria
ser evitado. Portanto, a esta altura é irrelevante se a contraproposta da ANDES
é ou não ‘assimilável’.
Numa mesa de negociação, todos têm que ser ouvidos,
não apenas os grevistas
Uma terceira questão refere-se a uma divergência de
fundo. Mesmo que as negociações não tivessem terminado, e mesmo que um termo de
acordo não tivesse sido assinado, não há concordância com a afirmativa de
Valter Pomar, no sentido de que, se o governo quiser ‘um desfecho para a
greve’, terá que “negociar com as entidades que representam a maioria dos que
estão em greve”. O governo tem que negociar – e assim o fez – com todas as
entidades representativas, e o PROIFES é uma delas, e não apenas com porta-vozes
de docentes em greve.
Não poderiam de forma alguma ser desqualificados,
como interlocutores, representantes de docentes que não estivessem em greve.
Entrar (ou não) em greve é uma decisão a ser respeitada, mas que não pode
interferir no direito de ser ouvido numa mesa de negociação, que é de todos os
docentes, não só dos que escolheram a greve como forma de luta. Agora, um
‘desfecho para a greve’ virá, seja a partir de uma avaliação equilibrada, seja,
à falta dela, por falta de sustentação.
Fortalecer o PROIFES: a melhor alternativa do
movimento docente
Ainda bem que, em 2004, foi fundado o PROIFES. Não
fosse isso, teríamos ficado duas décadas sem assinar termos de acordo, porque
essa não é definitivamente a vocação dos que, durante todo esse tempo, vem
dirigindo a ANDES. É de domínio público que a atual oposição da ANDES não
concorda com quase nada do que a situação faz – até aí temos pleno acordo;
ocorre que, ao adotar a tese inatingível de vencer as eleições e, depois disso,
dirigir a entidade, esse grupo, na prática, acaba por se confundir com a própria
situação e sua atuação política desastrosa e sectária, que em nada contribui
para a defesa dos interesses reais dos professores federais.
A tentativa de cancelar o PROIFES e, ao mesmo
tempo, fechar os olhos para os erros da direção da ANDES é, assim, um
desserviço à construção de um novo cenário de representação – em que todos
sejam ouvidos, de forma ampla e transparente. Muito melhor escolha será a de
fortalecer o PROIFES, vindo para a Federação: propositiva, plural e
verdadeiramente democrática.
*Gil Vicente Reis de Figueiredo é professor
aposentado do Departamento de Matemática da Universidade Federal de São Carlos
(UFSCar). Foi o primeiro presidente do PROIFES.
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