Uma companheira cutista adorou e me enviou para ler o texto abaixo, do professor Roberto Leher.
https://aterraeredonda.com.br/a-greve-das-universidades-e-institutos-federais/#_edn14
É um textão, acompanhado de notas e referências. Mas, dada a recomendação, li. E recomendo que seja lido, pois contém informações e opiniões úteis.
Entretanto, diferente de quem mo recomendou, politicamente falando achei o texto de Leher meio extemporâneo, mais para “balanço de uma derrota” do que para “orientação para as batalhas decisivas”.
Mas esta minha impressão pode ser decorrente da minha relativa ignorância sobre o tema, assim como de meu “lugar de fala”. Ouvi falar da Andes nos primórdios, quando eu era estudante secundarista. Muito tempo depois, acompanhei o debate sobre a criação do Proifes, acerca do qual me posicionei contrário desde a véspera. Voltei a prestar atenção ao Andes depois de 2012, inclusive devido a desastrosa posição adotada pela entidade frente ao golpe de 2016 e frente a prisão de Lula.
Aí passei num concurso, entrei na UFABC, me sindicalizei, fui eleito (2x, em momentos alternados) tesoureiro da Associação Docente e, para meu azar, fui enviado como delegado a três congressos do Andes (São Paulo, Porto Alegre e Rio Branco). Digo para meu azar, porque, na minha opinião, os congressos do Andes reúnem o pior da burocracia de esquerda, com o pior da burocracia acadêmica. Basta, como exemplo, dizer que os congressos duram em torno de uma semana…
Nos congressos, tomei contato direto com o que sabia que existia, mas ainda não tinha visto em ação: o partido chamado “Andes pela base”. Evidentemente os integrantes deste “partido” não concordam com esta definição acima. E, verdade seja dita, nos últimos anos têm feito esforços para assumir outra postura e se comportar apenas como tendência sindical. Vale dizer que, ou fazem isso, ou perderão o controle do Andes: na última eleição, por exemplo, sua chapa (apoiada por outros setores, como o PCB) teve 43% dos votos, contra 41% da chapa encabeçada por petistas e 13% da chapa encabeçada pelo PSTU.
Vale dizer, também, que o número total de professores que participou na mais recente eleição do Andes foi inferior a 20 mil, portanto menos de 10% da categoria. Isto não faz do Andes uma anomalia, pois grande parte dos sindicatos brasileiros têm um percentual semelhante de associados, muitas vezes até menos. Mas serve como indicador do que estamos falando: uma minoria da categoria, dirigida por uma minoria da minoria.
Feito este preâmbulo, comento a seguir o que achei politicamente problemático no texto do professor Leher.
Minha primeiras observação diz respeito ao seguinte trecho: “em meio ao silêncio e ao medo de parte importante da sociedade e mesmo de setores relevantes das universidades e institutos, ousaram resistir ao processo de fascistização ao longo do governo de Jair Bolsonaro”.
Compreendo os motivos pelos quais a “narrativa” de Leher começa em 2019. Mas o “silêncio e o medo” começaram sua escalada antes e a política da diretoria do Andes frente ao golpe e frente à prisão de Lula contribuíram e muito para dificultar as coisas. E as diferenças políticas sobre como enfrentar Bolsonaro refletiram isso. Por outro lado, tem razão Leher ao dizer que, em 2022, a diretoria do Andes apostou na eleição de Lula.
Minha segunda observação diz respeito ao Congresso do Andes que precedeu a greve. Nele houve uma polêmica, uma divisão na diretoria e uma decisão aprovada por escassa maioria. Em resumo: deflagrar imediatamente ou acumular para a greve. Sobre isto, o texto de Leher nada fala.
Portanto, são dois silêncios sintomáticos, que dizem respeito às divergências existentes no “partido”.
Minha terceira observação diz respeito ao seguinte trecho: “Por que o governo e a própria Executiva do PT[13] optaram por derrotar de modo ilegítimo e rude o movimento grevista (…)?”
Que o governo na prática buscou derrotar a greve, não há dúvida. Mas de onde Leher tirou a “informação” de que a executiva do PT optou por isto? Do meu texto, que ele cita nessa passagem, é que não foi. A executiva do PT pode ser acusada de muitas coisas, mas disso não. Pelo contrário, a posição da executiva do PT foi e segue sendo a favor de uma saída negociada.
Meu palpite é que Lehre, nessa questão, pensa parecido com alguns amigos que tenho numa certa tendência petista. Do mesmo jeito que esses amigos tratam a base do Andes e sua diretoria como se fossem uma coisa só, parecida com o PSTU, Leher trata o governo e a executiva nacional do PT como se fossem uma coisa só, parecida com o Proifes.
Registro, entretanto. o tratamento cuidadoso que Leher concede ao presidente Lula. No que ele faz bem, pois se existe alguma chance de mudar o rumo imediato das coisas, ela passa por Lula..
Minha quarta observação diz respeito a culta e bela descrição que Leher faz acerca da Universidade. Há passagens que reputo poéticas, tais como esta: “O engajamento de um docente ou de um técnico e administrativo à vida universitária e à educação básica é uma opção política e de amor à humanidade. Necessariamente integral, apaixonada, concentrada, pois assim exigem os processos de pesquisa, extensão e de ensino e aprendizagem”.
Infelizmente, Leher não inclui na sua descrição o “lado B” da coisa toda. Dito de outra forma, este ideal resenhado por Leher é muito, mas muito distante da vida real. Leher sabe disto, tanto é assim que reclama (corretamente) contra a reforma da previdência realizada em 2003 e contra os resultados do “acordo” de 2012. Mas porque sua descrição é tão distante da realidade?
Sejam quais forem os motivos, penso que neste ponto reside parte da explicação para boa parte da crescente desconexão entre a diretoria do Andes e a maior parte de nossa categoria. Desconexão, é bom dizer, que atinge também setores da oposição.
O fato é que, pelos supracitados e por muitos outros motivos, a Universidade de hoje não é a descrita por Leher. Motivo pelo qual se impõe uma, pelo menos, atualização da política do Andes. Mas a atual diretoria, como as anteriores, resiste bravamente a isso. Chega a ser tocante a devoção que a diretoria revela frente a certas “metodologias” e “cadernos” do passado.
Nessa perspectiva, a diretoria opta, muitas vezes, por estigmatizar a opinião de quem segue no Andes, segue na greve e teve 41% de votos na última eleição.
O próprio Leher, em seu texto, coloca várias vezes no mesmo saco os setores “agora parcialmente organizados na Proifes e em outras correntes internas ao ANDES-SN”.
De nossa parte, seguiremos fazendo o esforço de manter a greve e, ao mesmo tempo, pressionar o PT, para que incida no governo.
Mas não tem como não.perguntar: se estamos fazendo isso, por que somos postos no mesmo patamar dos pelegos? A quem interessa issso? Será que o “núcleo mais militante” que Leher acha que representa será capaz de vencer sozinho?
(Registre-se que, enquanto Leher nos coloca no mesmo patamar dos pelegos, dirigentes do Proifes nos chamam de jumentos a serviço do PSTU!)
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