O TEXTO A SEGUIR ESTÁ EM DEBATE, PORTANTO TUDO QUE SEGUE PODE SER ALTERADO.
O Diretório
Estadual do PT paulista aprovou, em reunião realizada em novembro de 2022, um
texto de “BALANÇO ELEITORAL”.
O texto “inicia
o processo de avaliação das campanhas Lula Presidente e Haddad Governador no
Estado de São Paulo, abrindo o debate a ser aprofundado em seminário no início
de 2023, com o objetivo de planejar a atuação do PT no próximo período”.
Para
contribuir com este debate, além das opiniões apresentadas na reunião do
Diretório e além das emendas propostas ao texto, a direção estadual da
tendência petista Articulação de Esquerda apresenta o texto a seguir, composto
de duas partes.
A primeira
parte faz uma crítica do “BALANÇO ELEITORAL” aprovado pela direção estadual do PT
SP.
A segunda parte
apresenta nosso ponto de vista, também inicial, sobre o tema.
CRÍTICA AO
TEXTO DA DIREÇÃO ESTADUAL DO PT SP
Nossa
primeira diferença em relação ao texto divulgado pela direção está no destaque dado
a chamada frente ampla.
O texto
afirma: “O êxito eleitoral que garantiu a vitória de Lula no 2º turno se dá não
somente pela consolidação da frente ampla, acertada aliança democrática na
derrota do fascismo nas urnas, mas também pelo imenso esforço e dedicação das
lideranças e militantes que estiveram nas ruas e nas redes em uma eleição disputadíssima”.
Claro que
numa disputa tão apertada, todo voto conta, todo apoio é importante. Mas os dados
são inegáveis: quem garantiu a vitória foi o eleitorado tradicional da esquerda.
A contribuição eleitoral oriunda dos aliados de centro-direita e direita foi
marginal.
Ou seja:
pode ter sido certo ou pode ter sido errado fazer a “frente ampla”, mas é propaganda
enganosa dizer que foi a frente ampla com eles que “garantiu a vitória de Lula”.
Que eles
mesmos digam isso, é compreensível. Que nós acreditemos e ainda difundamos esta
mentira, é um erro imenso, que na prática resulta em dar a eles um peso desproporcional
no futuro governo.
Nossa segunda
diferença em relação ao texto divulgado pela direção estadual está na atitude
frente a força revelada pelo cavernícola, pela extrema-direita e pelo neofascismo.
Evidente que
devemos comemorar e muito a nossa vitória. Mas não podemos confundir
comemoração com análise. A análise precisa reconhecer nossos pontos fortes e
fracos, assim como apontar os pontos fortes e fracos do nosso inimigo. E a
verdade é que nosso inimigo fez um governo de merda, por quatro anos, conquistou
58 milhões de votos, cresceu mais do que nós no segundo turno, elegeu forte bancada
de parlamentares e governadores.
Este desempenho
não é devidamente destacado no documento da direção estadual do PT SP. O
documento reconhece que “o bolsonarismo, ainda que derrotado nas urnas, está
enraizado na sociedade, portanto nossa construção democrática nessa disputa
deve ser orgânica e permanente”. Certamente os autores do documento reconhecem
que dizer isso e dizer nada é praticamente o mesmo. Ademais, nada se fala
acerca da derrota que sofremos na disputa para o senado, saindo vencedor um energúmeno.
Nossa terceira
diferença: talvez como resultado do torcicolo analítico citado anteriormente –
os fatos bons a gente destaca, os fatos ruins a gente esconde – o documento faz
um balanço sobre São Paulo que oculta o lado B da situação.
O documento
afirma o seguinte: “O PT ganhou na capital e na região metropolitana, retomando
“cinturão vermelho” (...) evoluímos de 32,03% (7.212.132) para 44,76%
(11.519.882) dos votos válidos (...) Ganhamos a eleição na Grande São Paulo e
perdemos no interior, todavia, cabe registrar que a participação dos do estado
de São Paulo no total dos votos nacionais evoluiu de 15,30% (2018) para 19,09%
nesta eleição”.
O documento
afirma também que a “votação do PT foi a maior de toda sua história nas
disputas estaduais”, pela “primeira vez desde 2002 conseguimos colocar nossa
candidatura no segundo turno para governador”, “embora tenhamos sofrido uma
derrota eleitoral, obtivemos uma vitória política”.
Tudo isto é verdade
e deve ser comemorado. Mas o documento não se contenta em comemorar os fatos e
dá um passo além, afirmando o seguinte: “O resultado conquistado no estado foi
decisivo para a vitória de Lula e Alckmin”. Isto é um exagero. Afinal, nós perdemos
em São Paulo e Bolsonaro ganhou em São Paulo. O que pode e deve ser dito, isto
sim, é que o trabalho feito em São Paulo contribuiu para impedir que Bolsonaro
virasse o jogo a seu favor. Mas o que foi “decisivo” mesmo foram as vantagens
conquistadas nos estados do nordeste do Brasil.
Reconhecer
isto não é uma tolice regional, é um desafio político: temos que entender por
quais motivos no sul e sudeste do país a extrema direita demonstrou ser eleitoralmente
tão forte. E não vamos nos dar ao trabalho de entender isto, se não aceitarmos
que o problema existe.
O documento da
direção estadual não parece acreditar que o problema existe. Chega a comemorar
as “decisões políticas acertadas que possibilitaram a votação do Partido no
Estado crescer 12,7 pontos percentuais em comparação a 2018, sendo este o maior
crescimento do país. Mesmo com a diminuição da votação do PT em alguns estados
do Norte e Nordeste, o crescimento em São Paulo, e em todo o Sudeste, foi
decisivo para a vitória de Lula”.
A verdade é:
São Paulo em 2018 foi um desastre completo. Crescer em relação aquele ano não deveria
ser uma surpresa. E a votação do bolsonarismo no sudeste – com exceção de MG – foi
decisiva para eles trem chegado com 58 milhões de votos. Não reconhecer este
fato é quase um negacionismo estatístico.
Nossa quarta
diferença em relação ao documento está contida na seguinte afirmação: “Os dados
demonstram a importância do PT ampliar sua inserção nos interiores, fortalecer
os diretórios municipais e potencializar
a construção política junto a diversos agentes políticos nos movimentos sociais, das lutas de bairro,
culturais, por moradia e organizações sindicais. É necessário promover a
formação de quadros, impulsionar candidaturas ao legislativo e executivo nos
municípios a partir de uma acumulação tática e estratégica, capilarizando o
partido pelo estado”.
Claro que
concordamos com tudo isto. Mas a pergunta é: onde está a novidade? Por qual
motivo nada disto foi feito? Por que a direção estadual do Partido deixou chegarmos
a um ponto tal, em que o Partido praticamente desapareceu como força organizada
em grande número de cidades? Ao falar do que deve ser feito e não explicar por
quais motivos não foi feito, o documento sinaliza para o seguinte: nada será
feito.
Nossa quinta
diferença em relação ao documento está relaciona ao que é dito na frase: “A
Política de defesa da candidatura do Haddad aos ataques do candidato Rodrigo
Garcia, que buscava nos tirar do segundo turno, mostrou-se acertada, pois o
risco da polarização nacional com Bolsonaro, como foi constatado, poderia
impulsionar a campanha de Tarcísio, acarretando no risco de não irmos para o
segundo turno”.
O texto falha,
de saída, em não desenvolver o raciocínio todo. Uma parte do nosso partido
imaginava que iriamos para o segundo turno em primeiro lugar e que seria mais “fácil”
derrotar Tarcísio do que derrotar Garcia. Esse cálculo se baseava num pressuposto
falso: o de que o eleitorado do PSDB votaria maciçamente contra a extrema
direita. Não foi nada disto que aconteceu. O eleitorado tradicional do PSDB
optou por Tarcísio, parte já no primeiro turno e outra parte no segundo turno.
Isto posto,
a conclusão é: a tática adotada na eleição em São Paulo, frente a duas
candidaturas de direita, pode ter sido (ou não) eleitoralmente “acertada”, mas
isto não muda o seguinte: não se derrotará o bolsonarismo em São Paulo nas
eleições, se antes ele não for derrotado na luta política e social. O que
inclui fazer oposição de verdade na Assembleia Legislativa...
Nossa sexta
e principal diferença em relação ao documento está contida no seguinte trecho: “O
PT de São Paulo sai fortalecido, como o maior partido de oposição no estado, e
mais preparado para enfrentar os desafios de sustentação do governo Lula e
assim criar alternativas de enfrentamento dessa extrema-direita em São Paulo,
preparando-se para as próximas disputas políticas e eleitorais”.
Certamente o
PT de SP saiu destas eleições eleitoralmente melhor do que entrou. Mas o tom – “o
PT de SP sai fortalecido” – não corresponde a realidade, salvo é claro para
quem acha que a força se define pelo número de mandatos parlamentares. A
verdade é que nossa força vem do enraizamento organizado na classe trabalhadora
e nesse quesito estamos muito pior do que estávamos. Reconhecer isto sem meias
palavras é essencial para mudar a situação.
CONTRIBUIÇÃO
PRELIMINAR DA AE
A eleição
de Lula, no segundo turno das eleições presidenciais de 2022, é um fato de
imensa importância. Do ponto de vista mundial, permite engajar o Brasil na
construção de uma ordem baseada na paz, no desenvolvimento e no atendimento às
necessidades dos povos. Do ponto de vista continental, permite retomar, ainda
que em novas bases, o processo de integração regional que estava em curso antes
da crise de 2008 e da ofensiva das forças de direita. Do ponto de vista
nacional, torna possível interromper o retrocesso e cria melhores condições
para lutarmos por transformações profundas em nossa sociedade, em benefício das
classes trabalhadoras. E do ponto de vista imediato, impede o que aconteceria
em caso de vitória da extrema-direita: uma escalada repressiva e violenta
contra as forças democráticas, populares e socialistas.
A grande
responsável por nossa vitória no segundo turno foi a militância que foi às ruas
defender a eleição de Lula e das demais candidaturas das forças democráticas e
populares, em particular das candidaturas petistas. Por isso, constitui uma
obrigação dirigir o mais profundo agradecimento a cada militante, assim como a
cada eleitor e eleitora que no dia 30 de outubro compareceu às urnas para votar
13. Foram estas pessoas, na sua maioria pobres, negros e negras, mulheres,
moradores da periferia, trabalhadores e trabalhadoras com consciência de
classe, residentes em todos os cantos de nosso país, mas especialmente na
região nordeste, que nos permitiram conquistar esta vitória. É graças a todos e
todas que hoje podemos dizer: vencemos!
Tão logo
foi proclamada a vitória, ao mesmo tempo que a militância se dirigia aos pontos
de concentração para comemorar, uma parcela minoritária da extrema direita
iniciou o bloqueio nas estradas e as concentrações em frente aos quartéis,
pedindo – as vezes explicitamente, as vezes disfarçadamente – um golpe militar.
No momento, esta mobilização da extrema-direita não tem força para converter-se
numa ameaça imediata. Entretanto, convocamos todos e todas a se manter de
prontidão, pois está evidente que seguem vivas, atuantes, perigosas e armadas
as forças que deram o golpe de 2016, que praticaram a fraude de 2018, que
sustentaram as políticas neofascistas e neoliberais do governo cavernícola,
entre 2019 e 2022. Dentre as muitas lições que é preciso tirar do processo
iniciado em 2016 – processo que nossa vitória em 2022 deve servir para começar
a enterrar – está a de que não devemos nunca subestimar nosso inimigo, a de que
não devemos nunca superestimar o compromisso democrático das chamadas
“instituições” e da direita gourmet e, acima de tudo, a de que não devemos
temer esta gente, pois como demonstramos várias vezes, as elites e seus
serviçais podem ser derrotados.
Mas, para
que esta derrota seja efetiva e completa, muito ainda precisa ser feito. E para
isto, é necessário tirar todas as lições do período 2016-2022, a começar pelo ocorrido
nas eleições deste ano. Neste sentido, é preciso que as direções do campo
democrático-popular – em todos os níveis, das organizações de base até as
organizações nacionais –realizem um balanço detalhado do processo eleitoral,
com o objetivo de aprender com o ocorrido, de verificar os pontos acertados e
os pontos errados das diferentes linhas políticas implementadas, de corrigir
práticas e procedimentos. Ou aprendemos com o passado, ou ele continuará a nos
assombrar.
Neste
sentido, orientamos nossa militância a cobrar das direções setoriais e
municipais, assim como do Diretório Estadual do PT, que convoquem reuniões
presenciais de balanço do processo eleitoral. Não como um processo rápido,
burocrático, com o objetivo de aprovar resoluções autocongratulatórias, mas
como um processo real de estudo e debate. Orientamos nossa militância, também,
a contribuir com este processo de balanço partidário, convocando reuniões
abertas de balanço, produzindo estudos e textos, estimulando que todo o Partido
faça o mesmo.
Isso é
particularmente importante de ser realizado na região sudeste, em especial no
estado de São Paulo. Da votação obtida por Lula no segundo turno, o maior
número de votos absolutos veio de residentes nos estados do sudeste:
22.793.826. Sem este resultado, Lula não teria sido eleito. Entretanto, quando
consideramos as proporções, fica evidente que o maior número de votos em Lula
em proporção ao eleitorado total foi obtido na região Nordeste. De eleitores
residentes no nordeste, Lula recebeu 22.534.967 votos, sendo que no Nordeste
está 26,63% do eleitorado total. Já no sudeste, onde está 43,38% do eleitorado
total, recebemos os já citados 22.793.826.
Nos quatro
estados do Sudeste, o resultado de Lula no segundo turno foi o seguinte:
-foi o mais votado
em Minas Gerais (50,20% dos votos válidos)
-ficou em
segundo lugar em São Paulo (44,76% dos votos válidos)
-ficou em
segundo lugar no Rio de Janeiro (43,47% dos votos válidos)
-ficou em
segundo lugar no Espírito Santo (41,96% dos votos válidos)
Nos quatro
estados do sudeste, também fomos derrotados nas eleições para governador e
senador, com exceção do Espírito Santo, onde Renato Casagrande (PSB) foi
reeleito. Mesmo em Minas Gerais, onde Lula foi o mais votado nos dois turnos, o
bolsonarismo triunfou na eleição para governo e senado.
No
Espírito Santo, em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, o PT não teve candidatura
própria ao governo do estado. O PT teve candidadura própria ao Senado no Rio de
Janeiro, embora esta fosse uma candidatura muito contestada, por sua postura no
mínimo dúbia em relação ao governador bolsonarista Cláudio Castro. E teve
candidatura própria ao governo no estado de São Paulo, com o companheiro
Fernando Haddad. Por estes e outros motivos, cada estado da região sudeste
merece uma análise em separado.
No caso
de São Paulo, é importante destacar que – pela primeira vez desde 2002 –
conseguimos colocar nossa candidatura no segundo turno para governador. Neste
sentido, embora tenhamos sofrido uma derrota eleitoral, obtivemos em certo
sentido uma vitória política.
Tanto no
primeiro quanto no segundo turno, nossa candidatura conseguiu vencer em cidades
importantes, a começar pela capital São Paulo. Olhando de conjunto a situação,
era possível vencer, era possível eleger pela primeira vez o governador de São
Paulo. Cabe, portanto, analisar os motivos que não tornaram isso possível.
Entre os
motivos que explicam nossa derrota eleitoral, citamos os seguintes:
-debilidades
estruturais do PT no estado de São Paulo, acumuladas há muitos anos, entre as
quais destacamos: a desaparição dos diretórios do Partido em muitas cidades e a
parlamentarização da vida partidária;
-debilidades
na campanha eleitoral propriamente dita, como por exemplo a relação entre as
campanhas proporcionais e a campanha para governador;
-ilusões na
força de nossos aliados (Márcio França, Geraldo Alckmin);
-subestimação
da força de nossos inimigos (Rodrigo Garcia, Tarcísio de Freitas)
Estavam
corretos os que diziam que as eleições de 2022 se dariam num momento de máxima
fragilidade do tucanato. São exemplos disso o fato de Alckmin ter saído do
PSDB, ido para o PSB e se convertido em vice de Lula; e o fato de Dória ter
renunciado a sua candidatura a presidente, deixado de ser candidato a
governador e depois saído do PSDB. Havia a expectativa de que, nesse cenário, a
opção por fazermos uma aliança com a principal expressão do tucanato paulista –
o ex-governador Geraldo Alckmin – e com o ex-governador Márcio França ampliaria
muito nossas chances de vitória. Pelo mesmo motivo, havia a crença de que a
vitória seria mais fácil se o segundo turno fosse contra Tarcísio de Freitas,
inclusive pelo fato de o candidato da extrema-direita não ter vida política
anterior no estado de São Paulo.
Os
resultados eleitorais mostram que as supracitadas expectativas eram infundadas
ou, no mínimo, exageradas. Na disputa pelo Senado, Márcio França foi derrotado
pelo astronauta. E na disputa para governador, Tarcísio terminou em primeiro
lugar tanto no primeiro quanto no segundo turno. E não há sinais de que o
acréscimo eleitoral de Alckmin e Márcio para Haddad tenha sido expressivo.
Evidentemente, isto não quer dizer que outra tática e outra política de alianças
teriam obtido melhor resultado eleitoral. Mas não temos dúvida de que o
resultado não confirmou os discursos grandiloquentes feitos em defesa da chapa
Lula-Alckmin, segundo os quais esta chapa seria o passaporte para nossa vitória
em São Paulo.
De toda
maneira, o PT de São Paulo saiu desta eleição maior do que entrou, seja em
número de deputados eleitos na Assembleia Legislativa, seja no desempenho de
nossa candidatura a governador. Mas isto não pode servir de pretexto para não
avaliarmos no detalhe nossos erros, em particular no que diz respeito ao
funcionamento do Partido, especialmente de nosso Diretório estadual.
Este
balanço e a devida correção de rumos é indispensável para o êxito de nossa
oposição ao governo Tarcísio de Freitas. Não devemos subestimar a vitória deste
bolsonarismo tecnocrático e miliciano no estado de São Paulo, combinado a
presença de governadores de tipo similar em Minas Gerais e no Rio de Janeiro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário