segunda-feira, 3 de outubro de 2022

Aberta a disputa pelo “troféu Janones”

O cidadão mandou, eu obedeci: no sábado 30 de outubro, André Janones lacrou e mandou printar o seguinte: “(...) a surra amanhã vai ser MUITO (sic) maior do que as pesquisas mostram! Os institutos não conseguem pegar o movimento de rede das últimas hora (sic) e, esse ano, esse movimento será a nosso favor!”

Pura bazófia. A votação final de Bolsonaro foi maior do que a prevista pela maioria das pesquisas. Motivos possíveis: i/amostra incorreta; ii/abstenção de gente que ao ser pesquisado declarara intenção de votar em alguém; iii/recusa dos bolsonaristas em responder as pesquisas; iv/onda bolsonarista na reta final; v/tudo isto junto e misturado.

Uma das conclusões a tirar da barrigada de Janones é que não basta ter pesquisa, é preciso interpretar corretamente. E a interpretação inclui uma premissa: pesquisa não é eleição. Portanto, quem decide o resultado da eleição é a luta política, que não termina enquanto a urna não fecha. Também por isso, não adianta confundir desejo com realidade. O desejo era vencer no primeiro turno. E certamente era possível transformar este desejo em realidade. Mas bastava fazer uma análise política objetiva para perceber que, embora possível, vencer no primeiro turno não era a hipótese mais provável.

Bom, não deu outra. A eleição foi para o segundo turno e muita gente entrou em estado de choque, não porque tenha ocorrido uma surpresa, um acidente inexplicável e imprevisível, mas sim porque estavam dando como absolutamente garantido o que era apenas uma possibilidade.

Já vimos esta novela antes, principalmente em 2006 e em 2014. O mais chato é que os gênios da raça, inclusive aqueles que davam como liquidada a disputa no dia 2 de outubro, não dão um segundo de folga e já estão “interpretando” o resultado, com alguns chegando a dizer que “a chance de perder a eleição é igual a zero”.

Não tenho como não recordar a fantástica frase, dita em 2018 por um coordenador da campanha de Haddad: “de uma coisa tenho certeza, Bolsonaro nunca será eleito presidente”.

Subestimar o inimigo é meio caminho andado para ser derrotado. A votação de Bolsonaro, a eleição de governadores e senadores apoiados por ele, a votação da direita na eleição da Câmara e nas Assembleias Legislativas, tudo indica que o segundo turno será muito difícil e que o resultado está em aberto. Ou seja: embora o mais provável seja nossa vitória, não se pode descartar como impossível uma vitória do cavernícola.

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A seguir alguns números que podem ser úteis para quem estiver pensando em como vencer.

Lula teve 48,43% dos votos válidos. Em números absolutos 57.258.115 votos no 13.

O cavernícola teve 43,20% dos votos válidos. Em números absolutos 51.071.277 votos no 22.

Simone Tebet teve 4,16% dos votos válidos. Em números absolutos 4.915.306 votos no MDB 15.

O Coronel Gomes teve 3,04% dos votos válidos. Em números absolutos 3.599.201 votos no PDT 12.

As demais candidaturas ficaram assim: Soraya Tronicke (0,51% e 600.953 votos no União Brasil 44); Felipe D’Avila (0,47% e 559.680 votos no Velho 30); o padre de festa junina (0,07% e 81.127 votos no PTB 14); Leo Péricles (0,05% e 53.518 votos na UP 80); Sofia Manzando (0,04% e 45.615 votos no PCB 21); Vera Lúcia (0,02% e 25.623 votos no PSTU 16); e Eymael (0,01% e 16.603 votos na Democracia Cristão 27).

No plano nacional as candidaturas da autoproclamada esquerda da esquerda só causaram dano a elas mesmas. Mas no Rio Grande do Sul não foi assim: lá faltaram 2.441 votos para o Edegar Preto ir ao segundo turno. Pois bem: no mesmo RS o PSTU teve 6.252 votos para a candidata a governadora Rejane de Oliveira. E o candidato do PCB a governador, Carlos Messala, teve 4.003 votos. Ou seja: neste caso, foram a esquerda de que a direita gosta. Embora o troféu esteja sendo disputado por outras pessoas, inclusive pelas pessoas da direção nacional do PT que agiram contra a candidatura de Edegar.

Mas voltemos à disputa presidencial nacional. Lula 48,43% com 57.258.115 votos; o cavernícola 43,20% com 51.071.277 votos. Diferença de 6.186.838.

(Uma curiosidade: Lula teve 48,61% dos votos no primeiro turno de 2006, quando disputou contra Alckmin. Nessa campanha eu lembro como hoje: todo mundo no comitê, a maioria esperando dar vitória no primeiro turno, veio o resultado e a maioria de otimista vazou, a tal ponto que sobrou eu para falar com alguns desatinados da imprensa. Alckmin teria feito bem, ontem, se contasse o que ocorreu no segundo turno de 2006, quando Lula mudou a linha de campanha e conseguiu a proeza de deixar Alckmin com menos votos do que no primeiro turno!)

(Parenteses, para quem ficou alardeando o papel dos neoaliados, o desempenho do PT no primeiro turno foi o seguinte: 1989, 17,18%; 1994, 27,07%; 1998, 31,71%; 2002, 46,44%; 2006, 48,61%; 2010, 46,91%; 2014, 41,59%; 2018, 29,28%. Como se vê, quando disputávamos contra os tucanos, nossa votação oscilou entre 27 e 48%. A vinda de parte deles, agora, não trouxe o que alguns imaginavam. Aliás, o resultado do primeiro turno em São Paulo é a prova didática disto).

Seja como for, em tese, parece fácil vencer o segundo turno, dado que temos 6.186.838 votos de vantagem. Mesmo que os votos da Soraya e do Kelmon sigam todos para o cavernícola. E mesmo que os votos da Tebet e do Ciro se dividam meio a meio. Ainda assim seria possível vencer.

Aliás, nas eleições entre 2002 e 2018, quem passou em primeiro lugar ao segundo turno sempre venceu. Vejamos os dados:

2002, primeiro turno:

Lula 46,44%

Serra 23,19%

2002, segundo turno:

Lula 61,27%

Serra 38,72%

2006, primeiro turno:

Lula 48,61%

Alckmin 41,64%

2006, segundo turno:

Lula 60,83%

Alckmin 39,17%

2010, primeiro turno:

Dilma 46,91%

Serra 32,61%

2010, segundo turno:

Dilma 56,05%

Serra 43,95%

2014, primeiro turno:

Dilma 41,59%

Aécio 33,59%

2014, segundo turno:

Dilma 51,64%

Aécio 48,36%

2018, primeiro turno:

Haddad 29,28%

Bozo 46,03%

2018, segundo turno:

Haddad 44,87%

Bozo 55,13%

Repetindo, em todas estes eleições, o primeiro colocado no primeiro turno ganhou o segundo turno. Mas acontece que, sob muitos aspectos, estas eleições não são como as anteriores.

Ademais, existe uma “coisa” chamada luta política e ideológica, que pode incidir sobre os atuais eleitores e também sobre quem se absteve. No segundo turno de 2006 a luta política e ideológica de Lula contra Alckmin levou este último a perder eleitores. Além disso, há 32.766.498 de eleitores que se abstiveram, além dos que votaram em outras candidaturas.

A gangue do cavernícola vai disputar política e ideologicamente este pessoal, além de fazer “operações especiais” as mais diversas. Por tudo isso, não podemos cometer o erro de achar que a eleição está ganha.

Vale lembrar que Lula falou que o segundo turno é só uma “prorrogação”. Mas em prorrogação as vezes a gente perde. Por isso, repito, não vamos subestimar. O inimigo pode ser “feio, sujo e malvado”, como no filme do Ettore Scola: Brutti, sporchi e cattivi. E por isso mesmo ele pode nos vencer. E se não levarmos isso a sério, estaremos facilitando o trabalho dele.

Entre os argumentos políticos que o lado de lá vai usar, está o resultado obtido nas eleições para governos estaduais, senado federal e Câmara dos deputados. Vejamos rapidamente:

Governadores eleitos por partido
PT: CE, PI, RN
MDB: DF, PA
UNIÃO: GO, MT
PP: AC, RR
PL: RJ
NOVO: MG
PSD: PR
PSB: MA
SD: AP
REPU: TO

Partidos que disputam o segundo turno nos estados:

PT: BA, SC, SE, SP
PL: ES, RS, RO, SC
PSDB: MS, PB, PE, RS
UNIÃO: AL, AM, BA, RO
MDB: AL, AM
PSB: ES, PB
PSD: SE
REPU: SP
SD: PE
PRTB – MS

Senadores por partido

PL 13

União Brasil 12

MDB 10

PSD 10

PT 9

PP 7

PODEMOS 6

PSDB 4

Republicanos 3

PDT 2

Rede 1

Cidadania 1

Deputados e deputados por partido

PL 99

PT, PCdoB e PV: 79 (destes, parece que 68 do PT)

União Brasil 59

PP 47

Republicanos 42

MDB 42

PSD 42

PSDB 18

PDT 17

Segundo o DIAP, “19 partidos elegeram ao menos um representante na Câmara (...) Em 2018, 30 legendas haviam sido vitoriosas. (...)os partidos do núcleo duro do Centrão (PL, União, PP e Republicanos) elegeram 229 deputados federais, o que representa 48% da Câmara (...) As legendas da coligação de Lula elegeram ao todo 121 deputados (...) Para a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) (...)são necessários no mínimo 308 votos favoráveis na Casa em dois turnos de votação.”

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Para encerrar, alguns comentários:

-o resultado global foi pior do que o previsto

-prevaleceu a vontade da maior parte da classe dominante: um segundo turno.

-basta de subestimar o inimigo

-fazer luta ideológica também produz resultados eleitorais

-prioridade é disputar o voto da classe trabalhadora

-nada substitui o corpo a corpo

-é preciso apresentar mais propostas de futuro

-é preciso travar mais disputa cultural contra as posições da extrema direita, em favor das posições democráticas, populares e socialistas.

-só a militância salva

-concentrar todas as nossas energias em um único objetivo: derrotar a extrema-direita, eleger Lula presidente.


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