Recentemente participei de duas “lives” com Ricardo Berzoini, ex-presidente nacional do PT.
Berzoini criticou
diversas vezes aqueles que exaltam o número de filiados do PT, como se isso
fosse uma demonstração de força.
Afinal ter 2,5
milhão de filiados é um fato cartorial, não significa em si uma força
organizada.
Para quem quiser conferir as “live”, ela estão aqui:
Live do Manifesto Petista
https://www.youtube.com/watch?v=JwCicAf6uhE&feature=emb_imp_woyt
Live da Fundação Perseu Abramo
https://www.youtube.com/watch?v=H_RtbLuOPC4
O fato é: grande parte de nossos 2,5 milhão de filiados são na verdade eleitores que foram filiados.
Não são
militantes, com algum nível de vida política organizada, ativa, permanente.
Grande parte
deles não comparece nem mesmo para votar nos processos eleitorais internos do
PT.
Isso apesar
de não se exigir mais – desde 2015 – que para votar as pessoas tenham que pagar
sua contribuição para com o partido.
A decisão de
2015 – defendida entre outros por Jilmar Tatto – vai na contramão da lógica do autofinanciamento
militante.
Mas facilita
a vida dos grupos que tinham o hábito de pagar as contribuições dos filiados,
para que estes pudessem votar em suas chapas e candidaturas.
Estes grupos
saíram ganhando, mas o partido saiu perdendo, entre outros motivos porque isentar
da contribuição financeira não serviu nem mesmo para aumentar o número de
eleitores nos processos internos.
Esta lógica
de um partido eleitoral de filiados é – ou pelo menos deveria ser - contrabalançada
por quatro estruturas: as instâncias de direção, os núcleos, os setoriais e as
tendências.
Nessas
quatro estruturas deveria prevalecer a lógica de um partido militante. Deveria,
pois pouco a pouco a dinâmica de um partido de filiados, que comparecem no máximo
para votar, também vai se infiltrando dentro das direções, dos núcleos, dos setoriais
e até mesmo de certas tendências.
Um exemplo
disso é o que está ocorrendo em vários setoriais.
Tem muita
gente exaltando o crescimento da participação, em comparação com os encontros
passados.
Vejamos um
exemplo disso: “Tivemos 6 vezes o número de votantes da última eleição. Mesmo com a dificuldade das pessoas não
familiarizadas com a ferramenta digital, caso de muitas e muitas especialmente do
movimento popular, considero que foi expressivo o número de votantes, superou o
número de pessoas em todas as plenárias e superou o da plenária final. Acho que
começamos bem”.
Como no PED,
o número de votantes é várias vezes maior do que o número de pessoas que participam
dos debates. Ou seja, que votam sem necessariamente terem podido entrar em
contato com as diferentes posições a respeito. Ou seja: a ampliação quantitativa
ocorreu, sem que tenha ocorrido necessariamente uma ampliação da participação
qualitativa.
Assim como
no PED, o número de votantes é menor do que o número de pessoas que poderia ter
votado. Com um detalhe: no caso do PED, basta ser filiado. No caso dos
setoriais, foi geralmente necessário que o filiado se inscrevesse e se credenciasse,
uma operação que dava um certo trabalho. Apesar disso, nos encontros setoriais
ocorridos até agora, o número de votantes é menor (as vezes muito menor) do que
o número de pessoas credenciada.
Isso se deve
a dificuldade de votar? Ou será que calhou de muitas pessoas terem compromissos
que impossibilitavam gastar 1 minuto para votar, virtualmente, usando seu celular
ou computador? A pessoa gastou um tempo fazendo opção setorial e se credenciando
e depois desistiu? Ou será que existe um grande número de credenciados que não
se credenciou, foi credenciado por terceiros?
Segundo uma
avaliação que li, “entre os inscritos, efetivamente compareceram cerca de um
terço. São quebras normais e esperadas, ainda mais em se tratando de um evento
on-line, com processo que envolve segurança, embora desejássemos, claro, que
todos comparecessem. Mesmo assim a votação é recorde e temos que, isto sim,
comemorar o crescimento do setorial”.
Novamente, a
comemoração (“recorde”) exalta o crescimento quantitativo. E os problemas são
considerados “normais” e “esperados”. Que eles fossem esperados, é verdade. Mas
não se pode “normalizar” uma situação que – como o PED demonstra – é um
problema estrutural de nossa “democracia”: a grande abstenção.
Nas eleições
burguesas no Brasil, a abstenção vem girando em torno de 30%. Nos EUA, que
muitos liberais dizem ser a maior e melhor democracia do mundo, é comum que cerca
de 2/3 do eleitorado não compareça para votar em eleições presidenciais. Isto
pode ser “esperado”, mas “normal” não é não.
E se não é “normal”
na institucionalidade, menos normal ainda deve ser considerado num partido de
esquerda, que exalta a importância da militância.
Óbvio que
não se deve considerar negativo o crescimento. Precisamos que o PT tenha muito
mais filiados, que muito mais gente participe de todas as nossas atividades.
Mas não se deve
fazer do crescimento numérico um fetiche, desconsiderando outros aspectos do
problema.
Um deles,
que temos feito questão de lembrar sempre, é a distorção provocada por uma
única cidade (Maricá, RJ), que sozinha reúne 22% do total de credenciados no
setorial de Saúde.
É fato é que
– segundo as “leis da dialética” – quantidade se converte em qualidade. Mas a mudança
“qualitativa” não necessariamente é algo positivo. A esse respeito, basta
lembrar quanta coisa ingênua foi dita a respeito da “democratização” que
supostamente seria proporcionada pelas redes sociais e a triste realidade que
enfrentamos hoje.
Um partido às raias do esfacelamento do seu manifesto. Ladeira abaixo, sem apoio, rumo ao abismo
ResponderExcluirInteressante as suas observações, como sempre
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirReconheço dificuldade com ferramentas digitais mas me esforcei bastante e não consegui me inscrever em nenhum setorial. Gostaria de votar nas eleições internas. Contribuo com o partido mensalmente. Mas não participo de nada pq parece que dificultar é melhor do que facilitar. Para quem é idosa como eu é uma frustração..
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