sábado, 21 de novembro de 2020

Balanço preliminar do segundo turno: versão para o poudicasti

 (sem revisão)

Olá Patrick

Olá ouvintes do poudicasti comandado pelo Patrick Araújo.

*

Os fatos são esses:

-O Diretório Nacional (DN) do Partido dos Trabalhadores reuniu-se no dia 16 de novembro de 2020

-A Comissão Executiva Nacional (CEN) do PT reuniu-se no dia 17 de novembro de 2020

-Mas nem o DN, nem a CEN, aprovaram documentos de balanço do primeiro turno

-A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda também reuniu-se, no dia 17 de novembro de 2020

-Nós achamos que era necessário elaborar e divulgar um balanço dos resultados do primeiro turno das eleições municipais de 2020

-Primeiro, porque já está sendo debatido o balanço das eleições

-Aliás, antes mesmo da eleição terminar, já havia balanços sendo elaborados

-Existe, por exemplo, quem tente naturalizar a ideia de que o PT foi ferido de morte

-E que o grande vitorioso desta eleição foi um tal de “centro” (sim, Patrick e  ouvintes do poudicasti do Patrick Araújo, nesse santo ano de 2020 existe quem ache que o DEM é centro!!!!, que o PP é centro, que o PSD é centro, que o MDB e o PSDB seriam de “centro”)

-Portanto, ou o PT participa organizadamente deste balanço, ou ele será “balançado” pelos outros

-Claro que um balanço feito agora tem seus limites

-Um primeiro limite: a eleição não terminou. O balanço será um ou será outro, a depender do que ocorra no segundo turno

-Um segundo limite: há coisas que pensamos sobre o que ocorreu, que nós preferimos dizer por extenso somente depois do segundo turno

-Por exemplo, sobre o ocorrido nas eleições da cidade de SP. Nossa tarefa agora é vencer, é eleger Boulos prefeito. E não achamos que caiba ficar fazendo balanços detalhados, pois num balanço detalhado será necessário dizer coisas que podem nos atrapalhar na meta que, como já dissemos, é eleger Boulos prefeito de São Paulo

*

Não é fácil fazer um balanço do processo eleitoral brasileiro de 2020.

Foram eleições para escolher quem dirigirá as prefeituras e quem comporá as câmaras municipais.

E o Brasil possui 5.568 municípios.

E cada um destes municípios tem características próprias, que um balanço precisa levar em conta.

Por exemplo: a composição social, a história política regional, tamanhos de população e eleitorado muito diferentes etc.

Para dar um exemplo: em Roraima, não houve uma única candidatura do PT. A nada. O PT local se anulou. Uma pergunta é: como votaram aquelas pessoas que, no passado recente, votaram nas candidaturas do PT?

Questões como essas precisam ser levadas em conta, para um balanço completo do processo eleitoral.

E por isso estamos incentivando nossa militância a fazer balanços locais, detalhados, que possam ir contribuindo para termos um quadro mais completo do processo.

Isso é particularmente importante no caso dos 95 municípios que possuem mais de 200 mil eleitores.

Desses, em 57 haverá segundo turno.

Dada a importância política destas cidades, é muito importante entender por quais motivos a fatura foi liquidada no primeiro turno em 38 municípios.

Gostaríamos de saber, por exemplo, porque não houve segundo turno em BH.

E também queremos saber porque não houve segundo turno em Salvador.

Fica a pergunta para o Rui Costa nos ajudar a responder.

*

O balanço preliminar aprovado pela direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda lembra que o PT “participou do processo eleitoral em 2.902 cidades com chapas proporcionais”.

Portanto, de cara fica a questão: o que ocorreu nas outras 2.666 cidades? Porque em tantas cidades o PT não conseguiu lançar nem mesmo um candidato a vereador???

Isso, evidentemente, não é um problema eleitoral.

O problema é organizativo.

O PT não está organizado nessas cidades.

Nas 2902 cidades em que lançamos chapas proporcionais, se somarmos todo mundo que foi lançado, foram 28.900 candidaturas à vereança.

O PT também lançou 1.256 candidaturas às prefeituras.

E aí de novo fica a pergunta: por qual motivo não conseguimos ter candidatura a prefeito em 4.312 municípios do país?

Claro, há casos como Belém e Porto Alegre, onde decidimos apoiar ótimas candidaturas a prefeito, o Edmilson do PSOL e a Manuela do PCdoB.

Aliás, assim como Boulos em SP, estamos na batalha para eleger o Edmilson e a Manu.

Ao todo, lançamos candidaturas a vice prefeitura em 1.292 cidades. Logo, se somarmos 1292 vices de outros partidos com 1.256 candidaturas a prefeito, a conclusão é que dá 2548.

E se subtrairmos este número do total de 5568 municipios que existem no país, sobram 3.020 cidades onde o PT não lançou uma candidatura a prefeito.

Novamente: não se trata apenas de um problema eleitoral.

Temos um problema organizativo.

Uma cidade onde o PT não existe. Há trabalhadores, tem luta de classes, mas não existe nosso partido para participar desta luta.

Uma curiosidade: segundo estes dados, que foram fornecidos pela secretaria nacional de organização do PT, teríamos 2666 cidades sem candidaturas a vereador e 3.020 cidades sem candidatura a prefeito.

Mistérios.

Seja como for, o documento de balanço elaborado e divulgado pela direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda destaca que “em mais da metade dos municípios brasileiros tivemos militantes e simpatizantes na defesa do voto petista, com passeatas, carreatas, visitas nas casas da população, banquinhas nas feiras e centros das cidades, comícios, organização de comitês nos bairros, entre outras ações nas ruas de grande parte de um país que se encontra sob comando de uma coalizão golpista, genocida e executora de um programa ultraneoliberal”.

“Saudamos toda a militância que se engajou nas campanhas de esquerda. Saudamos todas as nossas candidaturas a prefeituras e câmaras municipais, tanto aquelas que foram vitoriosas, quanto aquelas que foram eleitoralmente derrotadas. E saudamos os milhões de brasileiros e de brasileiras que foram votar e deram seu apoio à esquerda, especialmente ao Partido dos Trabalhadores”.

A partir daí, o documento começa a analisar o resultado do primeiro turno. E o primeiro ponto a ser analisado é o das abstenções, brancos e nulos.

Segundo o documento, “Um grande número de brasileiros e brasileiras não compareceu para votar, votou branco ou votou nulo. De um total de 147.403.074 eleitores aptos, 34.121.874 não compareceram para votar. Dos que compareceram para votar, 10.983.466 votaram branco ou nulo. Ou seja, 45.105.340 eleitores não votaram em nenhuma das candidaturas. O mais alto percentual de abstenção, brancos e nulos da história eleitoral recente do Brasil: 30,6% (contra 27,8% em 2016). Em alguns casos, como SP e RJ, o percentual chegou a 37,22% e 29,16%, respectivamente. Qualquer análise do resultado nessas duas cidades e no país como um todo precisa levar isso em consideração”.

Pois é, Patrick e ouvintes do poudicasti comandado pelo Patrick Araújo: parte das análises simplesmente desconsidera este eleitorado.

É como se ele não existisse, como se fossem invisíveis.

Sendo importante lembrar, como diz o documento de balanço da direção nacional da AE, que “com o recadastramento e a biometria, o número de abstenções, brancos e nulos de 2020 é mais próximo da realidade do que o de 2018. Na prática, isto quer dizer que parte expressiva da população escolheu não participar politicamente, instituindo uma espécie de voto facultativo de fato (ainda que não de direito). Um partido de esquerda não pode desconhecer ou subestimar estes fatos, que afetam sobremaneira trabalhadores e trabalhadoras pobres. Claro que parte desta abstenção pode decorrer do fato do artigo 14, parágrafo 1º da Constituição não considerar o voto obrigatório para maiores de 16 e menores de 18 anos, analfabetos e os maiores de 70 anos. Em 2016, por exemplo, 11.352.863 tinham 70 anos ou mais, 2.311.120 tinham 16 ou 17 anos, e 6.981.111 declararam ser analfabetos. Portanto, 20.645.094 pessoas. Mas o número de abstenções excede muito o número dos que podem exercer facultativamente o voto”.

“Na abstenção de 2020, é preciso considerar a pandemia e o estímulo que o TSE deu ao não comparecimento, ao facilitar a justificativa de voto”.

Entretanto, o documento da AE diz que precisamos “levar em conta também outros fatores, entre os quais a decepção com a participação política eleitoral, especialmente entre eleitores que em 2018 votaram em Bolsonaro, e que em eleições anteriores apoiaram as candidaturas de Lula e Dilma”.

Pois é Patrick e ouvintes do poudicasti comandado pelo Patrick Araújo: para quem olha o eleitorado como uma massa homogênea, ou apenas dividida por opções políticas, isso não faz muita diferença.

Mas para nós, que consideramos obrigatório levar em conta a classe social dos eleitores, que buscamos descobrir como votaram os diferentes segmentos sociais, é chave compreender as motivações dessas massas populares que se abstiveram, votaram branco e nulo.

Até porque, como bem diz o documento, uma implicação prática desta abstenção tão alta (37% em SP capital) é que “o voto dos setores médios cresceu de importância relativa, elitizando o eleitorado, com implicações inclusive na distribuição de votos entre os partidos de esquerda”.

Mais não direi, respeitando a diretriz de só falar de determinados assuntos depois do segundo turno.

Aproveito para chamar a atenção para  uma crítica feita ao documento, pelo Vladimir Milton: o de que falta uma análise do fenômeno da compra de votos. Fica aqui a sugestão, Patrick: convide o Vladimir Milton para falar a respeito.

Voltando ao documento da AE, ele traz também uma análise da distribuição dos votos pelos partidos.

Vejamos o que ele diz, textualmente:

“Os partidos de esquerda com legenda eleitoral (PT, PSOL, PCdoB, PSTU, UP, PCO, PCB) tiveram pouco mais de 10.433.119 votos. Ou seja, de um total de 102.297.734 votos válidos, cerca de 10% votou em candidaturas lançadas pelo núcleo duro da esquerda”.

Aqui, vale esclarecer algo que o documento não esclarece, mas que me foi revelado pelo autor da versão original: os números acima citados são para prefeito. Poderia ter sido feita uma análise também do voto para vereadores, os números seriam um pouco diferentes, mas o sentido global não mudaria. Mas, claro, partimos do princípio de que o voto majoritário tende a ser mais programático do que o voto proporcional. Daí a escolha.

Isto esclarecido, voltemos então à leitura do texto da AE:

“Os partidos que, não fazendo parte do núcleo duro da esquerda, assinaram coletivamente pedidos de impeachment contra o presidente Bolsonaro (PSB, PDT, PROS, Rede, Partido Verde), lançaram candidaturas que obtiveram 13.020.163 votos”.

“Portanto, somando esquerda com centro, alcançamos cerca de 23,4 milhões de votos. Ou seja, algo como 23% dos votos válidos”.

“Em números aproximados, portanto, 77 milhões de pessoas (ou 77% dos votos válidos) optaram por candidaturas patrocinadas por partidos que estão à direita do centro. Se não quisermos enganar a nós mesmos, a análise política do resultado eleitoral deve levar isso em conta”.

Isso aqui, Patrick e ouvintes do poudicasti comandado pelo Patrick Araújo, é essencial.

Pois, como dissemos no início, tem gente vendendo a falsa ideia de que os extremos, Bolsonaro e o PT, foram derrotados, e que o centro foi vitorioso.

Mas na verdade, quem foi eleitoralmente majoritário no primeiro turno do processo eleitoral não foi o centro.

O centro teve 13 milhões de votos.

Quem foi majoritário foi a direita, com 77% dos votos.

E dentro da direita, as candidaturas da direita não bolsonarista se saíram melhor do que as candidaturas da direita que explicitaram seu bolsonarismo.

Por isto chega a ser engraçada a atitude de setores da esquerda que dizem que no segundo turno precisamos derrotar o bolsonarismo – o que como linha geral não é errado – mas não se dão conta de que, em muitos casos, isso é uma escolha de Sofia.

Felizmente, na maioria dos casos, o Partido sabe que o eleitor é inteligente e limita-se a dizer quem está na disputa, sem comprometer-se a chamar voto e sem passar o pano em candidaturas ultraliberais e autoritárias, só porque não são explicitamente bolsonaristas.

Sobre o bolsonarismo, o documento divulgado pela direção nacional da AE diz o seguinte:

Há candidaturas vinculadas e defensoras do bolsonarismo em vários partidos políticos. Até porque o bolsonarismo é força política recente e seu líder anunciou não tratar as eleições municipais com prioridade, o que de fato quer dizer que ele não conseguiu ter uma tática nacional clara. Por outro lado, muitos prefeitos e vereadores eleitos não fizeram campanha vinculando-se de forma explícita ao bolsonarismo, mas o apoiam e estão sintonizados ideologicamente com a extrema-direita. Isto torna difícil fazer um balanço preciso. Mas, nas médias e grandes cidades, as pesquisas de opinião primeiro e os resultados eleitorais depois, indicam que as candidaturas explicitamente vinculadas ao bolsonarismo não tiveram bom resultado”.

E nesse ponto, o documento da AE chama a atenção para algo muito grave:

“Infelizmente, na maioria das cidades, as candidaturas de esquerda não utilizaram as campanhas eleitorais para nacionalizar a disputa. O que, para além de ser um erro político, foi também um equívoco eleitoral, uma vez que em muitas cidades o governo Bolsonaro atinge enormes rejeições. Isto significa que o desgaste do bolsonarismo não foi – ao menos principalmente – resultado de uma crítica política proveniente da esquerda. O segundo turno é uma oportunidade decisiva para que se trave esta disputa aberta contra o bolsonarismo”.

Perguntem se todas as candidaturas petistas e de esquerda que estão no segundo turno estão travando esta disputa aberta contra o bolsonarismo?

Hehe. Pois, é vida dura.

Seja como for, o documento da AE fala claramente que “os números do primeiro turno são claros: os partidos de direita tradicionais (MDB, DEM, PSDB, o PSD, o PP e similares) elegeram o maior número de prefeitos e prefeitas, de vereadores e de vereadoras, e obtiveram o maior número de votos. Sendo que o MDB e o PSDB perderam grande número de votos, enquanto o DEM, o PP e o PSD cresceram”.

Isto, Patrick e ouvintes do poudicasti comandado pelo Patrick Araújo, é parte do movimento que a direita não bolsonarista está fazendo para chegar na próxima eleição presidencial com uma candidatura competitiva.

Claro, como alerta o documento da AE, “que a relação entre 2020 e a próxima eleição presidencial não é direta, nem automática. Claro, também, que o resultado do segundo turno pode acentuar ou atenuar estas tendências, tanto do ponto de vista eleitoral quanto político. Mas, a preços de hoje, foram estes partidos de direita que se destacaram no primeiro turno das eleições municipais de 2020”.

Notem que eu falei: nas próximas eleições presidenciais. Não se descarte que elas ocorram antes de 2022. E não se descarte que Bolsonaro seja afastado antes disso. Como não se descarte que ele vença em 2022. Inclusive com o apoio desta mesma direita não bolsonarista que hoje muita gente apoia, com o pretexto de derrotar o bolsonarismo raiz.

Muita água vai passar por debaixo desta ponte.

Mas sigamos adiante. O próximo item que foi analisado pelo documento da AE é o desempenho da esquerda.

Sobre isso, o documento diz o seguinte:

“As candidaturas lançadas pelos partidos de esquerda (PT, PSOL e PCdoB) obtiveram cerca de 10.433.119 votos. Deste total, o PT obteve 6.971.136 votos, ou seja, 66% dos votos da esquerda foram dados ao PT; o PSOL teve 2.236.273 votos, ou seja, 21%; e o PCdoB teve 1.184.609, ou seja, 11%. Os demais partidos de esquerda, somados, conquistaram cerca de 3% dos votos”.

“Quanto ao número de prefeituras, o PT elegeu no primeiro turno 175 prefeitas/os, o PSOL elegeu 4 e o PCdoB elegeu 45. Das 57 disputas de segundo turno, o PT encabeça 15, o PCdoB 1 (Porto Alegre) e o PSOL 2 (Belém e São Paulo)”.

“Quanto ao número de vereadores, o PT elegeu 2609, o PSOL 88 e o PCdoB 678”.

Portanto, gente, se levarmos em conta apenas o primeiro turno, o PT segue muito mais forte do que os demais partidos da esquerda.

Evidente que, como deixa claro o documento da AE, “o resultado do segundo turno ganha grande significado na correlação de forças entre os partidos de esquerda, no que toca a presença em governos municipais”.

Se Boulos for eleito prefeito de São Paulo, por exemplo, o PSOL estará no comando da maior cidade do país. E embora ele tenha uma presença institucional muito pequena no restante do Brasil, isto dará a Boulos e ao PSOL uma relevância política muito maior.

Claro, aqui precisaríamos falar de questões que, como dissemos e repetimos, não cabe tratar no meio do segundo turno.

Boulos prefeito!

Um tema que, sim, poderia ser tratado, mas não tivemos tempo para fazer uma análise detalhada, diz respeito a composição das bancadas de vereadores.

Como dissemos, os três principais partidos de esquerda elegeram, somados, 3.375 vereadores e vereadoras.

Um gota dágua num oceano de direita.

Mas uma avaliação qualitativa desta gota dágua depende de confirmar, como indica corretamente o documento da AE, “o perfil das candidaturas eleitas, quantas mulheres, quantos negros e negras, quantos indígenas, quantos lgbti+, quantos são trabalhadores que estavam no processo de produção e de que categorias, quantos são reeleições etc”.

Aliás, este é um tema interessante. Houve renovação em geral? Houve renovação, pelo menos nas bancadas de esquerda? Ou prossegue o processo de oligarquização, em que os detentores de mandatos se perpetuam, depois sobem de posto e elegem um parente para o posto deixado vago e assim sucessivamente?

Há várias questões em aberto, portanto, para uma análise detalhada.

Seja como for, o documento aprovado pela direção nacional da AE afirma, enfaticamente, que “a avaliação (verbalizada por setores da direita, como o ex-ministro Sérgio Moro, pela grande mídia e também por analistas de esquerda) acerca da ascensão de uma esquerda alternativa ao PT não encontra respaldo nos números do primeiro turno. O que não quer dizer que o PT não enfrente graves problemas”.

“Mas a ênfase nos problemas do PT não pode desviar nossa atenção para um problema muito maior: a redução dos votos dados para a esquerda em geral. Em 2012 o PT+PSOL+PCdoB conquistaram 21.688.830 votos; em 2016, os três partidos conquistaram 10.883.557 votos; em 2020, os três partidos conquistaram 10.392.018 votos. Estes números indicam, portanto, que o fenômeno principal, em 2020, não é o de uma transferência de votos do PT para outros partidos de esquerda, mas sim o da transferência de votos do PT para fora da esquerda (outros partidos, abstenção, brancos, nulos)”.

“Neste sentido, a afirmação feita pelo presidente nacional do PSOL, na edição de 17 de novembro do jornal Correio Braziliense, de que seu partido “sem dúvida, cresceu muito e saiu credenciado para liderar um processo de renovação da esquerda no Brasil” é não apenas inapropriada –considerando a importância do PT no processo eleitoral em Belém e São Paulo; mais importante que isso, a declaração do presidente do PSOL incorre no mesmo equívoco em que tropeça um amplo setor do PT: o de acreditar que a “renovação da esquerda” resultará de movimentações eleitorais, e não das lutas sociais e da reconquista ideológica e orgânica da classe trabalhadora”.

Eu queria, Patrick e ouvintes do poudicasti, martelar muito nessa questão.

É no mínimo irônico que o PT tenha sido acusado de eleitoralismo, de institucionalismo, de desprezar o trabalho de base, por pessoas que agora desejam liderar um “processo de renovação da esquerda” baseados no desempenho eleitoral.

E, destaco, baseados num desempenho eleitoral que depende da vitória em São Paulo.

Vitória que depende, em parte, do engajamento do petismo.

Que, segundo disse o presidente do PSOL, deveria se engajar em algo que supostamente vai contribuir para a superação do próprio PT...

Repito: estamos com Boulos. Queremos Boulos prefeito de São Paulo. O que o presidente do PSOL disse é uma imensa besteira, salto alto e má sociologia.

E a renovação da esquerda não depende de vitórias eleitorais. Até porque, como nós do PT sabemos muito bem, nada melhor do que governar para mostrar que existem mais contradições entre o céu e a Terra do que a nossa vão filosofia pode supor.

Voltemos ao PT. O documento da AE fala do desempenho do Partido e aponta vários graves problemas.

Nesse sentido, o documento da AE não compartilha do clima de “grande vitória” que transparece em algumas avaliações feitas por alguns integrantes do Diretório Nacional.

Segundo o documento da AE, “em 2020, o PT conquistou menos prefeituras do que em 2016: 175 contra 276. A queda ocorreu em todas as categorias de cidades (pequenas, médias etc.). A novidade pode vir do segundo turno, através do qual podemos vir a governar um número maior de grandes cidades e capitais”.

Ou seja, se ganharmos todas as cidades em que estamos disputando o segundo turno, ou um número expressivo delas, podemos sim dizer que foi uma vitória, apesar dos problemas.

Continuemos a leitura.

“Também em 2020, o PT conquistou menos mandatos de vereadores do que em 2016: 2609 contra 2808”.

Aqui há um ponto que o companheiro Vladimir Milton também criticou, como uma falha do documento.

Não destacamos que algo mudou entre 2016 e 2020: deixaram de existir coligações proporcionais.

Portanto, a comparação entre 2016 e 2020 precisa ser ponderada. Se já houvesse a vedação de coligações proporcionais em 2016, será que teríamos eleito 2808 vereadores e vereadoras? Será que seria menos ou mais?

Por outro lado, diz o documento da AE, “tivemos um crescimento no número de eleitores: de 6.843.575 em 2016 para 6.971.136 votos em 2020. Este crescimento poderia ser considerado vegetativo, pois nesses quatro anos cresceu o eleitorado como um todo. Mas é preciso lembrar que ENQUANTO O ELEITORADO CRESCEU, NO SENTIDO OPOSTO caiu o número de votos válidos, portanto o crescimento em números absolutos DE NOSSOS VOTOS se deu na contramão do movimento do eleitorado (EM QUE HOUVE UMA redução do número de votos válidos e TAMBÉM UMA redução no universo TOTAL de eleitores de esquerda). Por outro lado, a conjuntura de 2016 era muito pior do que a de 2020. Portanto, DIZ O DOCUMENTO DA AE, TERIA SIDO perfeitamente possível um crescimento ainda maior do nosso eleitorado. Cabe no nosso balanço debater por quais motivos não crescemos tanto quando poderíamos”.

Aqui, Patrick e ouvintes do poudicasti do Patrick Araújo, há um detalhe adicional, que nos foi apontado pelo companheiro Rui Falcão: o número total de candidaturas lançadas pelo PT em 2020 foi maior do que o de 2016. Portanto, tínhamos um ambiente político melhor e um número maior de candidaturas. Logo, teria sido perfeitamente possível um resultado maior. E porque não tivemos este resultado maior?

Entre os motivos, o documento da AE destaca os seguintes:

1/a tática de municipalização das campanhas

2/a tática adotada pelos governadores e por muitos dos parlamentares federais e estaduais

3/a tática adotada em São Paulo capital (e também em Belo Horizonte).

A respeito do primeiro ponto, a municipalização das campanhas, a recusa em nacionalizar a disputa, este e outros documento da AE já falaram bastante.

A respeito do segundo ponto, o documento da AE diz que “O desempenho do partido em vários dos estados governados pelo PT revela, mais uma vez, que a mal denominada política de governabilidade gera desacumulo no desempenho eleitoral do Partido. O caso do Ceará (em que o governador fez campanha para a candidatura do PDT); e o caso da Bahia (em que o governador articulou uma tática desastrosa em Salvador) são particularmente escandalosos”.

Aqui é importante lembrar: foi Camilo que vazou a conversa de Lula com Ciro, foi Camilo que contribuiu, por ação e por omissão, para que a candidatura do PT não fosse ao segundo turno.

Camilo está no PT, mas tenho certeza de que no seu ombro está tatuado um coração e as palavras FERREIRA GOMES.

Também é importante dizer que, ao menos nos casos da Bahia, do Piauí, do Ceará e do nosso aliado governador do Maranhão, será muito importante analisar o que ocorreu nas eleições.

Como pode, depois de tantos governos petistas na Bahia, que o PSD e o DEM nos superem?

Se o partido nesses estados não debater a sério o ocorrido, se não houver uma mudança de tática, a próxima eleição presidencial e para governadores e senadores vai nos provocar fortes dissabores.

O documento da AE chama a atenção, também, para o seguinte: “O resultado da campanha eleitoral confirmou que o companheiro Fernando Haddad deveria ter sido candidato a prefeito. Mas o Diretório Nacional do PT decidiu, pelo voto da maioria de seus integrantes, que não convocaria o companheiro Haddad para esta tarefa. Ao agir assim, o DN aceitou que os interesses individuais se sobrepusessem às necessidades coletivas; não é de admirar que o desfecho disso tenha sido que muita gente achasse ser natural desrespeitar a posição do Partido”.

Cá entre nós: se o PSOL e Boulos conseguiram ir ao segundo turno, Haddad muito provavelmente também conseguiria.

Assim como Freixo conseguiria, muito provavelmente, ir ao segundo turno no Rio.

Como disse um jornalista da grande imprensa, mesmo não tendo participado do processo, Freixo e Haddad estão entre os derrotados desta eleição.

Seja como for, repetimos mais uma vez, lendo o que está no documento da AE: “no segundo turno, somos todos Boulos, motivo pelo qual deixaremos para outro momento o balanço detalhado do que ocorreu em São Paulo”. Mas, TAMBÉM DIZ O DOCUMENTO, podemos adiantar, desde já, que a existência de várias candidaturas de esquerda (tanto em SP quanto em outras capitais) não impediu uma delas de ir ao segundo turno, como quis fazer-se crer em muitas análises e operações políticas, inclusive na esquerda e centro-esquerda. Aliás, a existência de mais de uma candidatura majoritária da esquerda foi um fator importante, em muitas cidades, para viabilizar o segundo turno, para disputar votos com a direita, para manter ou ampliar as bancadas de esquerda”.

A esse respeito, no caso de São Paulo, eu acrescento: depois do segundo turno, espero que depois de comemorar a eleição de Boulos prefeito, reservemos um tempinho para estudar os números e poderemos confirmar o que foi dito acima.

Também será preciso, diz o documento da AE, analisar com mais detalhes, as “importantes vitórias nos legislativos em muitas capitais e grandes cidades QUE sinalizam para uma renovação na representação da esquerda, com maior participação de mulheres, negros, LGBTI+ e jovens”.

Já chegando ao final, o documento da AE lembra que o PT fez campanha, no fundamental, com recursos públicos, enquanto a direita usou e abusou de recursos privados; por isso, era tão importante acertar na distribuição dos recursos. Mas foram cometidos erros de todo tipo, que precisam ser avaliados com muito detalhe”.

Para que não digam que não falamos de flores, houve um acerto importante, que foi reservar recursos para gastar no segundo turno, onde estamos disputando diretamente, com candidaturas do PT ou apoiadas desde o primeiro turno pelo PT, em 17 cidades.

O documento da AE lembra que o “PT deliberou lançar candidaturas próprias no maior número possível de cidades, deliberou não fazer alianças com partidos bolsonaristas e ultraliberais, deliberou fazer campanhas nacionalizadas. Mas, na prática, a teoria foi outra. Na maioria das cidades, as campanhas foram municipalizadas. E em muitas cidades, como é o caso emblemático de Belford Roxo, o próprio Diretório Nacional aprovou uma coligação com o bolsonarismo – dando carta branca para que se fizesse o mesmo em inúmeras outras cidades país afora. Cabe analisar, por fim, o que poderia ter sido feito em termos de alianças na largada com outras forças de esquerda; assim como cabe analisar a desastrosa condução dada à eleição em João Pessoa (PB) e a ausência total de candidaturas do PT no estado de Roraima”.

 

O documento diz ainda que “O PT tem uma tradição de disciplina partidária. Mas em 2020 podemos dizer que nunca antes na nossa história tivemos tantos casos de parlamentares e figuras públicas apoiando candidaturas de outros partidos, em cidades em que havia candidaturas petistas. Por conta disso, a AE solicitou comissão disciplinar contra 1 senador e alguns deputados federais. Mas nos parece que estamos diante de um problema sistêmico, que precisa ser enfrentado de conjunto. Inclusive no tocante a situação em Fortaleza (CE) e de outras importantes cidades”.

O documento conclui apontando para alguns problemas estratégicos.

Diz que “Até o dia 29 de novembro, temos a disputa de segundo turno.  Neste segundo turno, vamos consolidar a vitória nas cidades em que fomos ao segundo turno, fortalecer o campo de oposição democrático e popular e causar a derrota de Bolsonaro e dos neoliberais. Neste sentido, vamos trabalhar pela vitória nas 17 cidades em que estamos disputando com candidaturas a prefeito(a) e vice; apoiar com firmeza os candidatos do campo democrático e popular nas cidades em que estes partidos estão na disputa; derrotar as candidaturas de Bolsonaro e seus aliados neoliberais. E negar qualquer apoio do PT a candidaturas bolsonaristas e neoliberais”.

E fala que, “Qualquer que seja o resultado do segundo turno, o Governo Bolsonaro enfrenta novo momento de crise após relativa estabilidade e até certo fortalecimento nos últimos meses. Frise-se que as ilusões na constituição de uma Frente Ampla, a demora em adotar a consigna Fora Bolsonaro e a concentração na oposição parlamentar constituíram erros graves que contribuíram para a relativa estabilidade e fortalecimento do presidente”.

“Apesar da pandemia, a massa da classe trabalhadora deu continuidade à dura luta pela sobrevivência. Mas parte importante da vanguarda se resguardou. Iniciado o calendário eleitoral, mesmo sem ter sido superada a crise pandêmica, parte importante da vanguarda foi às ruas. É preciso dar continuidade ao contato com as massas. O anúncio presidencial de desprezo pela vacina contra o COVID-19 e manutenção da agenda neoliberal indicam que manter e aumentar a mobilização trata-se, literalmente, de questão de vida ou morte”.

Aqui vale dizer: não podemos repetir, frente a segunda onda do Covid, o erro cometido na primeira onda. Medidas sanitárias sim, mas não perder vínculo com a classe trabalhadora é a maior medida sanitária.

Por isso, diz o documento, “é preciso combinar a luta eleitoral no segundo turno, onde houver, com a manutenção da mobilização militante nas ruas, no resto do país, pelo Fora Bolsonaro e por um Brasil Democrático, Popular e Socialista.  Sem mobilização social, finalizaremos o fatídico ano de 2020 com, mais uma vez, a perda de outra “janela histórica”, no mesmo ano, para a derrubada do governo Bolsonaro e abertura de um novo ciclo no país”.

O documento afirma, ainda, que “O resultado eleitoral confirma a necessidade do PT alterar sua estratégia e alterar seu padrão de funcionamento. Qualquer que seja o resultado do segundo turno, 2021 tem que ser o ano do reposicionamento estratégico do PT. A direção eleita em 2019 precisa ser renovada. E a linha política precisa ser profundamente alterada. Nesta perspectiva, defendemos a realização, ainda este ano, de um encontro nacional aberto das esquerdas petistas, para travar um debate livre, sem compromissos prévios, acerca do balanço eleitoral e dos desafios do próximo período”.

Aliás, já fica aqui o convite: já está sendo articulada, para o dia 12 de dezembro, uma reunião de balanço das eleições e de discussão sobre os desafios futuros do PT. Fica aqui a sugestão, para o Patrick Araújo, de que entreviste no POUDICASTI. o companheiro José Genoíno e o companheiro Rui Falcão, sobre esta reunião do dia 12 de dezembro.

Já no âmbito da tendência petista AE, convocamos, para o dia 06 de dezembro, domingo, das 10h00 às 18h00, uma plenária virtual de todas as nossas candidaturas (eleitas ou não), com a participação das direções estaduais e municipais, para concluir o balanço do processo eleitoral.

Nesta reunião, pretendemos tratar explicitamente de tudo o que não podia ser tratado neste balanço preliminar, assim como das questões apontadas pelo Vladimir Milton e pelo Rui Falcão, entre outras, questões que citei anteriormente na minha exposição.

Vamos tratar, também, do tema da eleição do presidente da Câmara e do Senado; do tema da ajuda emergencial; do cenário internacional; do balanço dos segundos turnos; da situação dos partidos de esquerda e de centro; da necessidade de construir uma frente de esquerda; e dos desafios do PT.

O documento da direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda finaliza assim: “Como disse o camarada Clóves de Castro, em uma de suas últimas falas, só a mobilização de rua pode derrotar os canalhas. Ao camarada Clóves de Castro, militante comunista, revolucionário, petista, fundador da tendência petista Articulação de Esquerda, um proletário combatente, dedicamos esta resolução”.

 (sem revisão)

Um comentário:

  1. Penso que o PT erra grotescamente ao não elaborar sua política tendo como centro a questão do golpe de estado. Tudo na vida se entende: a ala direita do partido, muito empenhada em atirar Lula aos leões para integrar-se alegremente ao regime golpista tem peso na direção nacional e nas regionais.

    O problema é que, uma vez vez que o golpe de estado é uma realidade, e não uma mera ideia, o PT começa a correr sérios riscos por conta da política de sua ala direita. Por exemplo, até o presente momento a direção do PT mantém a política de chegar aos postos de governo da forma mais artificial possível. Mas o artificialismo, aqui, garante a vitória não da esquerda, e sim do zoológico do "centro" - codinome da direita tradicional, vinda do regime MDB-ARENA.

    Por conta disso, o partido teve uma perda inacreditável de votos de 2012 para 2016, e não avançou (antes, retrocedeu em número de prefeituras) nessa eleição de 2020. O resultado eleitoral mostra que os ratos pulam do navio. Saem aqueles candidatos de direita que concorrem sob a sigla do PT, que não têm absolutamente nada a contribuir com a luta dos trabalhadores (antes o contrário), ficam os "petistas orgânicos". Com o andar da carruagem, o PT volta lentamente aos tempos heroicos, em que vencer uma eleição é uma verdadeira batalha, sem nenhuma concessão da burguesia. No entanto, não dá para se dizer que haja algo de "heroico" na política geral apresentada pelo partido.

    Com o avanço do golpe de estado continental, que rifou a esquerda nacionalista em todo o continente, o PT se viu hostilizado pelo imperialismo e pela burguesia nacional. Pudera: se alguém achava que o PT era a esquerda mais "direitista" e "conciliadora" do continente, hoje se vê que o ponto de vista da realidade concreta, o PT dirige a mais importante base operária das américas, em especial na CUT. E justamente por esse fato, e não outro, o PT é inimigo do golpe de estado. A maior liderança dessa base, Lula, torna-se assim um embaraço para os planos de destruição da economia nacional e a volta à barbárie dos "civilizatórios" tempos de FHC. Não há dúvidas: o PT é ogrande inimigo da direita e do imperialismo.

    Porém, por sua composição social, o PT entra em uma quase convulsão: de um ponto de vista marxista, o partido tem uma composição pequeno-burguesa sobre uma base operária. Temos grandes direitistas bem-pensantes, como Fernando Haddad, Tarso Genro, et al., trabalhando para a alegria dos golpistas. A fascinação com a campanha de festinha infantil de Guilherme Boulos mostra a fragilidade do PT do ponto de vista classista. Boulos em São Paulo é o pivô da manobra de destruição do PT, promovido como "novo grande líder da esquerda" pela Folha de São Paulo, Globo, Veja, Sérgio Moro, belzebu e satanás. E o PT apóia entusiasticamente sua própria destruição.

    No fim das contas, a política é a política de classe, o partido é o partido de classe. Quanto menos o PT for dos trabalhadores, operários, do povão, e quanto mais for da pequena burguesia bem-pensante, menos condições terá de "mobilizar as ruas para derrotar os canalhas". Basta recordar: qual foi a última vez que o PT mobilizou as ruas? Quem não usa os músculos, perde massa muscular. Essa questão crucial de classe provoca uma hemorragia terrível no partido mais importante do Brasil. E se não houver uma dura batalha interna (dura mesmo, com as polêmicas mais duras possíveis), pode levar o partido à morte. Se não como organização, certamente como Partido DOS TRABALHADORES, capaz de fazer frente ao terrível imperialismo sanguinário e seus sócios nacionais.

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