Não tememos o debate sobre a desigualdade.
Nem historicamente: cada avanço da igualdade é produto da luta da classe trabalhadora.
Nem nos últimos 12 anos: os setores populares vivem melhor (social e politicamente) nos governos Lula e Dilma, do que viveram nos governos tucanos.
Nem nos últimos quatro anos, em que nadamos contra a corrente da crise internacional.
Nem tememos os resultados do PNAD (ver matéria abaixo, publicada no Valor).
O fato é muito simples: todos sabíamos que, nos marcos do modelo, há um limite para a redução da desigualdade.
Este limite não é físico.
O limite é político, social e econômico.
Aumentar os empregos, aumentar os salários, aumentar o consumo, aumentar as políticas sociais... num primeiro momento reduz a desigualdade (mesmo que basicamente entre os que vivem de salário).
Mas, num segundo momento, a reação conservadora dos que detêm a riqueza, a propriedade e o poder tira com uma mão (juros, inflação, redução no crescimento) o que eles foram forçados a dar com a outra.
Por isto é que dissemos, sempre: continuar reduzindo a desigualdade exige "mudar de modelo".
Ou seja, fazer reformas estruturais que democratizem a riqueza, a renda e o poder.
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Tem razão a ministra do Desenvolvimento Social, Tereza Campello, quando diz que a avaliação das políticas públicas deve se focar em tendências e não se apegar a microvariações de 0,001 ponto para cima ou para baixo, ao comentar o episódio do erro do IBGE na elaboração da Pnad de 2013.
(...) No entanto, olhando-se os números por um período mais longo, a conclusão continua a mesma: o progresso na redução da desigualdade estagnou no governo de Dilma Rousseff, com o índice de Gini do rendimento médio mensal de todas as fontes passando de 0,506 em 2011, o primeiro ano, a 0,501 em 2013. Nos três anos anteriores, o índice de Gini de todas fontes de renda diminuiu 0,020 ponto, saindo de 0,526 em 2008. Ao longo dos oito anos de Lula, o avanço foi de 0,055 ponto.
Já o índice de Gini do rendimento médio mensal de todos os trabalhadores avançou 0,053 ponto ao longo do governo Lula, a uma velocidade média anual superior à verificada no governo de Dilma, quando recuou de 0,500 no primeiro ano, 2011, a 0,495 no ano passado.
Os números indicam que a estratégia do governo de combater a desigualdade por meio dos programas de transferência de renda, aumento do salário mínimo e mercado de trabalho está perdendo gás, apesar de o Brasil ainda estar bem distante dos índices de 0,482 do México e de 0,412 da Turquia, de acordo com a OCDE.
O bem-sucedido Bolsa Família, por exemplo, que beneficiava 3,6 milhões de famílias em 2003, cresceu nos anos seguintes até chegar a 12,8 milhões de famílias no fim do 2º mandato de Lula. No ano passado, atingiu 14,1 milhões de famílias, cerca de 50 milhões de pessoas, ao custo de R$ 26,1 bilhões.
Mas o Bolsa Família já não cresce à mesma velocidade pela redução do número de famílias elegíveis para o benefício, que são aquelas com renda per capita mensal inferior a R$ 77. Seu impacto poderia ser ampliado com o aumento do benefício, o que está fora de questão pelas restrições fiscais do governo. E há uma pressão crescente pela criação de mecanismos de saída dos beneficiários do programa.
O mercado de trabalho é um importante motor da redução da desigualdade. Mas, nesse front, a Pnad 2013 trouxe uma novidade desanimadora: o aumento da taxa de desocupação para 6,5% em comparação com 6,1% em 2012. Foi a primeira elevação desde a crise internacional de 2008.
Apesar disso, a renda da população manteve o crescimento real. Em 2013, o rendimento médio do trabalho cresceu 3,8%; e o de todas as fontes, 3,4%. Mas foi um avanço inferior ao de 2012, que havia sido de 5,6% e 5,5%, respectivamente. Nesse campo, também joga contra a inflação, que corrói o valor de salários e benefícios.
O governo mantém o otimismo com a preservação de índices baixos de desemprego em contraste com o cenário internacional e faz disso um ponto de destaque na campanha eleitoral. As perspectivas para o mercado de trabalho, porém, são pessimistas dado o enfraquecimento da economia. O próprio governo reduziu nesta semana a expectativa de crescimento do PIB para 0,9%, taxa três vezes maior do que a estimada pelo mercado.
Na batalha pela redução da desigualdade resta a educação, campo em que o governo vem tentando avançar com o ensino técnico e a ampliação dos investimentos vinculados à receita do pré-sal. Mas os resultados do Ideb, mostrando um desempenho aquém do desejável nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio e a própria Pnad indicam que há muito por fazer. Segundo a Pnad, há cerca de 13 milhões de analfabetos no país, 8,5% da população com 15 anos ou mais.
A Pnad revelou também um quadro positivo de maior acesso da população a bens de consumo como geladeiras, automóveis e computadores, em contraste com o pouco acesso a abastecimento de água e coleta de esgoto. Reduzir o descompasso pode fazer o país avançar mais na redução da desigualdade.
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