segunda-feira, 8 de novembro de 2021

"Se o Lula quer, quem sou eu para questioná-lo?"

Comecei a militar no PT em 1982 e me filiei em 1985.

Era uma época de grandes lutas e de grandes debates.

Um dos temas em debate era o socialismo.

Pudera.

Foi quando aconteceu a "queda do Muro de Berlim", o "massacre da Praça da Paz Celestial" e a desaparição da União Soviética.

Uma das questões que apareciam naquele debate era a crítica ao modelo de Estado e de partido que existiam nos chamados países socialistas.

E um dos alvos da crítica era o chamado "culto à personalidade".

O que se combinava com a crítica feita pelo PT ao caciquismo, ao coronelismo e ao cupulismo existentes na política brasileira, inclusive em partidos de esquerda.

Para citar um texto do início dos anos 1990: "A democracia é a vida do PT. Sem esta seiva, nosso projeto se exaure, fenece. Ninguém, nenhum parlamentar, nenhum prefeito, nenhuma liderança, nem mesmo o Lula, pode se sobrepor às maiorias e às decisões democráticas legitimamente firmadas no interior do PT".

Várias décadas depois, muita coisa mudou no mundo, no Brasil e no PT.

Um exemplo de mudança é a frase citada no título deste texto: "Se o Lula quer, quem sou eu para questioná-lo?"

Antes que me perguntem, a frase é real e foi escrita hoje, 8 de novembro de 2021.

De fato, se o Lula quer almoçar salada de chuchu, é um problema dele.

Mas a candidatura a vice-presidente da República é um problema nosso, é um problema de toda a esquerda, a começar pelos petistas.

Lula tem influência suficiente para convencer ou até para derrotar quem pensa diferente. 

Mas quem pensa diferente tem o dever de lutar pelo que acredita.

A não ser, é claro, para quem aderiu ao "culto à personalidade".

Ou ao culto dos que tentam falar em nome da tal "personalidade", mesmo que a própria tenha outra opinião ou não tenha se pronunciado a respeito.

Isto posto, vamos ao artigo do Celso Rocha de Barros, publicado na Folha de S. Paulo de 8 de novembro, falando da "Chapa Lula/Alckmin".

Barros diz ter "dúvidas se é possível", mas acha que a chapa Lula e Alckmin seria uma "boa ideia", porque permitiria "juntar o ajuste macroeconômico do PSDB com a redistribuição de renda do PT".

Lindo, né?

Infelizmente, a realidade conspira contra.

Acontece que o "ajuste macroeconômico" do PSDB resultou em privatização, desnacionalização, desindustrialização, financeirização, desemprego e - portanto - gerou uma "redistribuição" de riqueza e renda em favor dos ricos.

Temer e Bolsonaro deram continuidade ao mesmo "ajuste macroeconômico" neoliberal implementado pelos tucanos. E o resultado é ainda mais "redistribuição" em favor dos ricos.

É por isso  -e não por falta de criatividade - que não existem "acordos possíveis" entre o programa macroeconômico do PT e o do PSDB.

Claro que um governo de esquerda pode não ter força suficiente para aplicar seu programa de conjunto. Mas isto é diferente de assumir como se fosse seu o programa do inimigo.

Um exemplo deste desacordo de fundo entre PT e PSDB está na seguinte frase de Celso de Barros: "no longo prazo, a sindicalização é a melhor maneira de tornar a regulamentação estatal desnecessária".

Barros acha que isto poderia ser um ponto de acordo entre PT e PSDB: mais sindicatos e menos Estado.

Da minha parte, tenho dificuldade de escolher as palavras certas para falar de alguém que - em pleno século 21 e no meio de uma pandemia - defende tornar "desnecessária" a regulamentação estatal.

Precisamos de "mais sindicatos" e de "mais Estado"!

Vou pular as pessoas citadas por Barros (Marina Silva, Bernard Appy, Tabata Amaral, Nelson Barbosa, Guedes - não sei por qual motivo ele não cita Palocci) e passo direto à conclusão. 

Segundo Barros, "transformações profundas podem ser negociadas. Mesmo se a chapa não sair, é de uma solução com esse espírito que o Brasil precisa para voltar, não ao que era, mas ao caminho para o que queremos que seja".

Barros sabe muito bem que esta aliança não vai acontecer.

Se não fosse por outro motivo, pela bizarrice. Vamos combinar: depois de Temer, querer Alckmin é sadomasoquismo.

O que interessa a Barros é que o PT aceite o "espírito" da coisa, ou seja, incorpore no seu programa o ajuste neoliberal tucano.

Se o PT caísse nessa armadilha, estaria se suicidando como alternativa.

Como já disse o poeta: "mundo mundo vasto mundo, se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não seria uma solução".

 

15 comentários:

  1. Vc tem razão. E o artigo obviamente foi acolhido pela FSP que lutou, luta e lutará sempre contra as propostas do PT qualquer que ela seja.

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  2. O PT tem que definir o programa de governo, antes de pensar em alianças. Este programa tem que determinar o caminho para construção do socialismo, uma vez que, o capitalismo destruiu não só o povo como o planeta. Não existe alternativa fora do socialismo.

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    1. https://fpabramo.org.br/publicacoes/estante/plano-de-reconstrucao-e-transformacao-do-brasil/

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  3. "Se o Lula quer, quem sou eu para questioná-lo?"

    sua pergunta é importante

    "Mais importante que saber a resposta,
    é compreender a pergunta." (sábio chinês)

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  4. Eles vão tentar esaa via, porque é a única que poderá levar o PSDB ao governo, através de um impeachment

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  5. Impeachment Já é que interessa. É ABAIXO O PSDB E SEU CUMPLICE BOLSONARO. VAMOS A LUTA COMPANHEIROS. Não podemos seguir a rima do retrocesso e de acabar com a classe trabalhadora e sua organização. Quero saber quem fará campanha pra essa chapa?

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  6. Se o Lula quer, é responsabilidade dele. Porém, ele terá que arcar com as consequências. Eu comecei a militar no PT antes dele ser PT, pró-pt. Com muito orgulho fui um dos fundadores do partido. Continuo na construção de uma sociedade mais igualitária. Não podemos perder nossa dignidade, nossa utopia. Agora, Essa" possível união" é jogar por terra todo o nosso sonho. Eu, particularmente, não terei coragem de pedir apoio para quem, lá na frente, poderá me apunhalar. Nós não podemos perder a dignidade, muito menos para quem nunca esteve ao lado da classe trabalhadora. É hora de avançar, não de retroceder.

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  7. Quem sou eu para questionar Lula? Sou uma militante do Partido dos Trabalhador@s filiada em 84! Sou eu que muitos anos coloquei a estrela no peito e a bandeira nas costas para defender esse projeto. Sou eu que por 4 eleições lutei para eleger Lula. Sou eu que tenho o direito de dizer ao Lula que não dá pra fazer m.....e deixar para a militância jusrificar e tentar explicar. Sou militante do PT e não aceito essa coligação absurda com tucanos.

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  8. Lamentavel, ter que discutir isso sem discutir o que a militância pensa dessa proposta. Tem muitas coisas que precisam mudar, uma delas é o fim da perpetuidade do mandato parlamentar, chega de parlamentares parafusados na cadeira parlamentar. Outra coisa importante é levar ao conhecimento da militância, e da população o programa de governo. E por último tem que existir desde agora uma campanha para abolir às emendas parlamentares, que além de irregulares, o mandato é legislativo e não executivo, além disso é inmoral. O orçamento hoje destinado aos parlamentares deveria pasar diretamente ao fundo de participação dos municípios.

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  9. Fui um dos sindicalistas que ajudou a fundar o PT. Em 2001 já considerava uma demasia aliança com o PL de Alencar. Fomos só 7% na Convenção. 84% apoiaram aquilo que veio a dar em outros issos. Não se põe abaixo o edifício da exploração vom as ferramentas do inimigo era o título de um breve texto meu que adivinhava o que se seguiria. Vencer eleições tem substituído o projeto. E, como se verificou, mão tem sido suficiente. Bastante oportuna tua reflexão Valter.

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  10. Valmar tem muita razão. Temos que saber escolher o vice para não acontecer como Dilma, ter um canalha traidor.

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  11. O Alkmin é inimigo dos trabalhadores, da escola pública e dos professores ,das lutas sociais por moradia . Um patife capitalista. Essa aliança com a burguesia e esse discurso conciliador do PT é traição de classe.

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  12. Infelizmente será a maior traição aos trabalhadores deste país. E lastimável se essa junção acontecer ,não existe palavras que descreva o horror que será se esse traste for o vice. 1

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