Projeto de resolução para debate e
deliberação no Segundo Congresso da tendência petista Articulação de Esquerda.
O segundo congresso da tendência
petista Articulação de Esquerda será realizado no Instituto Cajamar (SP), de 2
a 4 de abril de 2015. Simultaneamente, ocorrerá a Conferência sindical da
tendência.
A pauta do segundo congresso da AE inclui os seguintes pontos: 1) balanço das eleições 2014; 2) desafios e propostas para o segundo mandato Dilma Rousseff, para a luta social, para a comunicação e cultura, para os governos/parlamentos estaduais e municipais, para as eleições 2016 e 2018; 3) nossas propostas de reforma programática, estratégica e organizativa do Partido dos Trabalhadores; 4) atuação e organização da Articulação de Esquerda; 5) eleição da nova Direção Nacional da Articulação de Esquerda e da Comissão de Ética Nacional
O ponto denominado “atuação e organização da Articulação de Esquerda”, inclui os seguintes itens: 1) A construção do Partido dos Trabalhadores, onde apresentamos nossa visão sobre como enfrentar os desafios postos atualmente para o PT; 2) A tendência petista Articulação de Esquerda, onde apresentamos as posições fundamentais que definem nossa tendência; ; 3) A trajetória da tendência petista Articulação de Esquerda, onde apresentamos nossa versão sobre a história da AE; 4) Regimento da tendência petista Articulação de Esquerda, que define nossas normas de funcionamento;
O presente texto versa sobre a A construção do Partido dos Trabalhadores.
A
construção do Partido dos Trabalhadores
1.A experiência histórica, tanto
nacional quanto internacional, vem demonstrando que a continuidade do
capitalismo implica em sofrimentos cada vez mais intensos e em crises cada vez
mais perigosas para a imensa maioria da população de nosso planeta.
2.Por outro lado, este mesmo
capitalismo criou as bases para a construção de outro tipo de sociedade, uma
sociedade comunista, ou seja, baseada na produção coletiva e na propriedade
social dos meios de produção, uma sociedade onde os trabalhadores e as
trabalhadoras decidam democraticamente o quê produzir, como produzir e como
distribuir as riquezas, superando a opressão e a exploração presentes onde
existe a divisão da sociedade em classes, bem como criando as condições sociais
indispensáveis à superação de outras formas de opressão e exploração.
3.A experiência histórica também
demonstrou as imensas dificuldades e riscos que se colocam para aqueles que
pretendem superar o capitalismo e realizar a transição socialista em direção a
uma sociedade comunista. Por isto, devemos combinar de forma permanente a luta
contra o capitalismo com o estudo do capitalismo, a luta pelo socialismo com o
estudo das tentativas de construção do socialismo.
4.Deste estudo, há três ideias que se
destacam. A primeira delas é que a superação do capitalismo depende da luta das
classes trabalhadoras. A segunda delas é que, existindo as necessárias condições
objetivas, o êxito desta luta depende fundamentalmente do grau de consciência,
organização e mobilização da classe trabalhadora assalariada – ou seja, daquela
classe que é diretamente explorada pelos capitalistas. A terceira é que a luta
socialista supõe diferentes formas de organização, de luta e de mobilização,
bem como diferentes estratégias, táticas e políticas de aliança; mas sempre
exige a presença do partido político.
5.A experiência demonstra, ainda, que
em diferentes épocas e contextos históricos, houve diferentes tipos de partidos
políticos. Desde as revoluções burguesas até a época da Associação
Internacional dos Trabalhadores, desde a Comuna de Paris até a chamada Segunda
Internacional, desde a Revolução Russa de 1917 até a Chinesa de 1949, desde a
vitória da Revolução Cubana de 1959 até a derrota das guerrilhas
latino-americanas, passando pelas guerras de libertação em África e Ásia, pelas
experiências anarquistas, nacionalistas, populistas, social-democratas e
comunistas, a classe trabalhadora construiu variados tipos de partidos, que algumas
vezes entraram em confronto, mas também fizeram alianças entre si.
6.Desta larga experiência, que também
deve ser objeto de permanente reflexão, extraímos duas grandes lições. A
primeira, já referida: o sucesso da luta contra o capitalismo e pelo socialismo
exige que a classe trabalhadora se organize de diversas formas, entre as quais
o partido político. A segunda: é a prática concreta que define o papel que um
partido joga em cada circunstância histórica. Entendemos por “prática concreta”
a ideologia, a teoria, a estratégia, as táticas, as formas organizativas e
principalmente o vínculo com a classe trabalhadora realmente existente.
7.Nenhum partido nasce pronto e
acabado, nenhum partido tem o monopólio da classe, nenhum partido é eterno. Mas
sem partido, a luta da classe trabalhadora será claudicante, mais facilmente
sujeita à derrotas táticas e de antemão derrotada estrategicamente.
8.A história dos partidos da classe
trabalhadora brasileira possui cerca de 100 anos. Inclui os anarquistas, os
socialistas, assim como setores vinculados à tradição democrático-radical,
nacionalista, cristã e sindicalista. Nesta história, destacam-se o trabalhismo,
o comunismo e o petismo.
9.Desde o final da ditadura militar até
os dias atuais, o Partido dos Trabalhadores é o partido com maior influência
nas classes trabalhadoras brasileiras, com mais força política social e
institucional, com mais destaque internacional.
10.Os demais partidos vinculados à
classe trabalhadora são aliados, adversários ou inimigos do PT, mas o fato de
sua ação política girar em torno do PT confirma que na atual fase da história
brasileira o petismo mantém hegemonia sobre a esquerda brasileira, hegemonia
que decorre de sua influência de massa e também das condições sob as quais se
trava, hoje, a luta política no Brasil.
11.O Partido dos Trabalhadores foi
criado em 1980. Sofreu diversas transformações ao longo de sua trajetória de 35
anos. Estas transformações responderam em parte às mudanças objetivas ocorridas
na sociedade brasileira, na luta entre as classes sociais. Por outra parte, as
mudanças sofridas pelo PT são produto da luta entre as diversas correntes
existentes no interior do Partido, correntes que expressam de maneira mais ou
menos consciente o ponto de vista de diferentes setores da classe trabalhadora.
12.Existem no PT quatro grandes
correntes ideológicas: o social-liberalismo, o desenvolvimentismo, a
social-democracia e o socialismo.
13.Os socialistas são aqueles
que defendem superar o capitalismo brasileiro, através da combinação entre as
reformas estruturais democrático-populares e um cada vez mais intenso controle
social da produção, da riqueza e do poder. Defensores desta posição
encontram-se espalhados na base partidária e em diversas tendências,
especialmente na chamada esquerda petista.
14.Os social-democratas são
aqueles que acreditam ser possível transformar o capitalismo brasileiro, ao
ponto dele ser compatível com a ampliação sustentada da democracia, da
soberania nacional e do bem-estar social, tendo como horizonte histórico o chamado
estado de bem-estar social, existente por algum tempo na Europa após a Segunda
Guerra Mundial. As expressões mais conhecidas desta corrente militam nas
tendências Mensagem ao Partido e Construindo um Novo Brasil.
15.Os desenvolvimentistas são
aqueles que defendem que o Partido assuma como seu programa máximo o
desenvolvimento do capitalismo no Brasil. Vitoriosa esta tese, o PT deixaria de
ser o partido dos trabalhadores e se converteria num partido dos “setores
médios”. Dilma Rousseff é sua expressão mais conhecida.
16.Os social-liberais são
aqueles que buscam conciliar as politicas sociais distributivas com a lógica
econômica neoliberal. Antonio Pallocci é sua expressão mais conhecida.
17.Entre 1995 e 2015, a maior parte das
direções do PT e de seus representantes sociais, institucionais e ideológicos,
foi e é proveniente das correntes social-democrata, desenvolvimentista e
social-liberal.
18.Desde 1995, mas especialmente desde
2005, os socialistas vêm perdendo influência no Partido dos Trabalhadores.
19.A maior parte dos petistas
socialistas sofreu uma metamorfose, aderindo em maior ou menor grau às ideias
das demais correntes ideológicas.
20.Outra parte desistiu de construir o
PT, optando por investir suas energias na militância dita “social” ou
explicitamente em outros projetos partidários.
21.Um grande número escolheu manter-se
filiado ao PT, mas sem acreditar na possibilidade de reconstruir uma hegemonia
socialista no seu interior.
22.Nestas condições, cabe responder por
quais motivos a Articulação de Esquerda continua petista e continua disputando
os rumos do PT.
23.Nossa resposta é no fundamental a
seguinte: os dilemas do PT são os dilemas da classe trabalhadora brasileira.
Nas atuais condições históricas, a derrota do PT será a derrota do conjunto da
classe trabalhadora brasileira.
24.Os que acreditam que esta derrota é
inevitável e investem na construção de uma alternativa partidária, geralmente
acreditam que esta alternativa sobreviverá à derrota do PT e assumirá o papel
atualmente ocupado pelo PT. Consideramos que esta crença é, simultaneamente,
uma ilusão e uma tragédia. É uma ilusão porque caso o PT fosse derrotado
historicamente, o mais provável seria ocorrer algo similar ao que se passou em
1964-1980. É uma tragédia, porque não temos nunca o direito de agir como se
fosse inevitável a derrota da nossa classe.
25.Noutros termos, continuamos petistas
e continuamos disputando os rumos do PT, porque consideramos necessário e
possível impedir a derrota da atual experiência política da classe trabalhadora
brasileira. E isto passa por impedir a derrota do PT. E impedir a derrota do PT
exige, fundamentalmente, mudar a atual estratégia partidária.
26.A política adotada pelo PT em sua
primeira década de existência, especialmente a partir do 5º Encontro Nacional
(1986), foi baseada no programa democrático-popular e socialista e numa estratégia
que articulava luta social, luta institucional, disputa politico-cultural e
organização partidária.
27.Entretanto, depois da derrota
sofrida nas eleições de 1989, um setor importante do Partido entendeu que era
necessário mudar de programa e de estratégia.
28.Houve resistências e uma intensa
luta interna entre 1990 e 1995. A partir de então e até 2005, houve uma
expressiva maioria no Diretório Nacional e nos diretórios estaduais a favor de
um novo programa e de uma nova estratégia.
29.A partir de 1995, o objetivo
programático do Partido, que até então era derrotar o capitalismo e construir o
socialismo, foi colocado (de fato) em segundo plano. O objetivo programático do Partido passou a
ser (de fato) derrotar o neoliberalismo, o que implicava não mais iniciar uma
transição socialista mas sim administrar um capitalismo não-neoliberal.
30.Isso significou, na prática, que embora
o socialismo tenha continuado de direito nosso objetivo programático,
foi convertido num “horizonte”, que como já se disse, se afasta na exata
proporção em que dele nos aproximamos. E como o caminho é longo e cheio de
pedras, ao perseguir este horizonte inatingível alguns começaram a dizer que o
socialismo na verdade seria democracia + bem estar social + economia de
mercado.
31.À medida que o objetivo programático
passou a ser derrotar o neoliberalismo, setores do grande capital passaram a
ser considerados aliados estratégicos. Em função disto, passamos a realizar
cada vez mais alianças com partidos de centro e direita, que expressavam
exatamente os interesses daqueles setores da burguesia.
32.Como o grande capital brasileiro é
hegemonizado pelo setor financeiro e monopolista, setores do Partido passaram a
defender e a praticar alianças com estes setores, ou seja, exatamente com os
setores beneficiários e interessados no neoliberalismo que supostamente se
pretendia derrotar. E, em consequência disto, começaram a propor e a realizar
alianças inclusive com o PSDB.
33.A mudança no objetivo programático e
nas alianças foi acompanhada por mudanças na política de acúmulo de forças e de
conquista/construção do poder.
34.Até 1995, nosso caminho para o poder
incluía participar das eleições e exercer mandatos. Mas a luta institucional
era um dos meios, não o único meio e nunca o fim. A luta institucional era
considerada parte de uma estratégia que incluía também a luta e organização
social, a construção de uma aliança orgânica entre as forças
democrático-populares, a disputa ideológica, cultural, de visões de mundo, bem
como a organização do próprio PT como partido de massas.
35.Mas ao longo dos anos 1990,
especialmente a partir de 1995, a luta institucional foi progressivamente se
tornando "a" estratégia, que subordinava e na prática às vezes
substituía os demais aspectos.
36.A mudança no objetivo programático,
na política de alianças, na política de acúmulo de forças, na via de
conquista/construção do poder não impediram a nossa vitória nas eleições
presidenciais de 2002. Aquelas mudanças estratégicas tampouco impediram que
nossos governos federais, estaduais e municipais melhorassem a vida do povo.
37.Mas com o passar do tempo foi
ficando cada vez mais claro que a estratégia adotada entre 1995 e 2005, além de
não conduzir ao socialismo, possuía também "defeitos de fabricação"
que impediam atingir seus próprios objetivos.
38.Afinal, para continuar melhorando a
vida do povo, ampliando a democracia e a soberania nacional, é preciso fazer
reformas estruturais. Na ausência de reformas estruturais, a tendência é o
retrocesso nas condições de vida do povo e a retomada de uma hegemonia de tipo
neoliberal.
39. E para fazer reformas estruturais,
necessitamos de força política e social, já que tais reformas de caráter
democrático-popular contrariarão os interesses das classes dominantes no plano
nacional e internacional.
40.Por outro lado, chegamos ao governo,
mas não conquistamos o poder. E aqueles setores políticos e sociais que detêm o
poder estão cada vez mais ameaçando nossa continuidade no governo, como fica
claro ao compararmos os resultados das eleições presidenciais desde 2002 até
2014.
41.Acontece que a estratégia adotada
pelo PT desde 1995 visava e visa conquistar o governo e mudar as ações de
governo. Não é e nunca foi uma estratégia de poder, de disputa de hegemonia e
ampliação do apoio político e social para o Partido, de reformas estruturais.
Por isto, seguir adotando esta estratégia nos levará, na prática,
inapelavelmente, a administrar o retrocesso do que fizemos desde 2002 e ajudar
em nossa própria derrota, nas eleições e/ou fora delas.
42.Noutra palavras: a estratégia
majoritária no PT entre 1995 e 2005 nos trouxe até certo ponto. Talvez
pudéssemos ter chegado até aqui com outra estratégia, talvez não. Independentemente
disto, para seguir adiante o Partido precisa de outra estratégia.
43.Uma estratégia que reconheça que só
é possível continuar melhorando a vida do povo se fizermos reformas
estruturais. Que construa as condições políticas para fazer reformas
estruturais. Que recoloque o socialismo como objetivo estratégico. Que constate
que o grande capital é nosso inimigo estratégico. Que não acredite nos partidos
de centro-direita como aliados. Que seja baseada na articulação entre luta
social, luta institucional, luta cultural e organização partidária. Que retome
a necessidade do partido dirigente e da organização do campo
democrático-popular.
44.Em 2005 já havia ficado clara a
necessidade desta nova estratégia. Naquele momento, a crise política criou as
condições para eleger uma nova direção para o Partido, entendendo direção no
duplo sentido da palavra: no sentido de núcleo dirigente e no sentido de rumo
estratégico.
45.Entretanto, entre o primeiro e o
segundo turno das eleições partidárias de 2005, um importante setor da esquerda
petista desistiu de disputar o PT e resolver aderir ao PSOL.
46.Em parte por isto, em parte por
limitações dos demais setores da esquerda petista, em parte pela força dos
demais setores do PT, o resultado foi a eleição de uma nova direção partidária
comprometida com algumas mudanças na implementação da estratégia, mas não
comprometida com a adoção de uma nova estratégia.
47.Embora limitadas, as mudanças
realizadas entre 2006 e 2010 melhoraram o ambiente no Partido, contribuíram
para que o governo Lula fizesse uma inflexão à esquerda e nos permitiram vencer
as eleições presidenciais de 2006 e 2010. Mas a estratégia continuou a mesma.
Aliás, alguns setores (inclusive da esquerda petista) interpretaram os
resultados positivos da inflexão iniciada em 2005 como demonstração de que não
era necessário mudar de estratégia.
48.As consequências deste erro ficaram
claras em junho de 2013, nas eleições de 2014 e neste início do segundo mandato
de Dilma. Ao não mudar a estratégia, enfrentamos seus efeitos colaterais. Ao
não mudar a estratégia no momento adequado, somos obrigados a tentar a alteração
quando é mais difícil fazê-lo.
49.Portanto, embora o estilo
predominante no atual governo possa agravar as coisas, os impasses estratégicos
atuais não decorrem principalmente das ações (e inações) da presidenta Dilma.
As escolhas estratégicas feitas pelos grupos atualmente majoritários no PT são
anteriores ao ingresso de Dilma no Partido. E as opções feitas pelo governo
neste primeiro bimestre de 2015 têm a mesma genética das opções feitas por Lula
no biênio 2003-2004.
50.A diferença é que as condições da
luta de classe mudaram completamente. O cenário internacional foi alterado, o
grande capital mudou de atitude, os setores médios e parcelas crescentes da
classe trabalhadora também mudaram sua atitude frente ao nosso PT e aos
governos que encabeçamos. Ou seja: se é verdade que a atual estratégia oferecia
seus ônus e seus bônus, agora os bônus estão desaparecendo e os ônus
agigantaram-se.
51.A Articulação de Esquerda não tem a
pretensão de construir sozinha uma saída para a situação. Não temos influência
interna e externa, quadros e capacidade para isto. Mas nossa trajetória e
nossas reflexões nos autorizam a contribuir na busca desta saída, até porque a
leitura de nossas resoluções desde 1993 demonstra que percebemos e tentamos
construir alternativas para os problemas que estavam se avolumando.
52.A saída passa por convencer a
maioria da classe trabalhadora brasileira, especialmente a maioria dos
petistas, da necessidade de sair da situação atual, em que buscamos melhorar as
condições de vida do povo nos marcos do capitalismo, para uma nova situação, em
que melhoraremos as condições de vida do povo
através de reformas estruturais democrático-populares e de medidas de
tipo socialista.
53.A saída passa, igualmente, por convencer
a maioria da classe e do Partido de que só retomaremos a condição de partido
hegemônico no governo, se nos dispusermos a conquistar/construir as condições
para sermos partido hegemônico no poder de Estado.
54.Quando defendemos a necessidade de
radicalizar, é comum sermos contestados da seguinte forma: a correlação de
forças é pior hoje do que em 2003. Se então não radicalizamos, como fazê-lo com
êxito nas condições atuais?
55.Nossa resposta é: não desconhecemos
as condições difíceis, sabemos os riscos envolvidos e ninguém pode garantir
êxito. Mas estamos naquela clássica situação em que uma política recuada é mais
arriscada do que uma política ousada. Dito de outra forma: quando nossos
inimigos estão recuados, temem a nossa força e estão dispostos a fazer acordos,
os acordos podem até trazer alguns benefícios. Mas quando os inimigos estão em
plena ofensiva, buscando efetivamente nos liquidar, os acordos e recuos
geralmente têm como resultado fortalecê-los ainda mais e facilitar esse
objetivo, ao tempo que confundem e desmoralizam nosso lado.
56.Evidentemente, uma política ousada
só terá êxito se basear-se nas condições
potenciais de mobilização, organização e consciência das classes trabalhadoras.
O segundo turno das eleições de 2014 mostrou que é perfeitamente possível sair
de armadilhas políticas, convocando a imensa energia social que temos
acumulada. E o início do segundo mandato demonstra que desconhecer esta energia
acumulada e adotar como regra fazer concessões aos inimigos tem como resultado
perder apoios e reforçar ódios (como demonstram recentes pesquisas).
57.Para ter êxito numa política de
reformas estruturais e empoderamento político, o PT precisa “fazer o dever de
casa”, ou seja, reiterar incansavelmente seu caráter de classe, a necessidade
de manter uma relação estreita com os movimentos e lutas sociais, e jamais
abandonar ou distorcer seus mecanismos de democracia interna.
58.Estas atitudes são fundamentais para
a sobrevivência do PT, seja frente às correntes de ultra-esquerda, que tentam
liquidá-lo a pretexto de que o partido abandonou seus ideais, seja frente aos
constantes ataques da direita, que procuram liquidá-lo porque tem clareza de
que o PT é o principal instrumento que as classes trabalhadoras têm disponível
hoje, para a conquista do poder e para a mudança das relações sociais.
59. O PT é um partido de massas, o que
significa dizer que em maior ou menor medida ele deve conter em seu interior a
diversidade de posições políticas que existe na classe trabalhadora. Isto significa
que o PT deve ser aberto à participação de correntes desenvolvimentistas,
social-democratas e inclusive social-liberais. Entretanto, devemos travar uma
luta constante para que estes setores evoluam para posições
democrático-populares e socialistas.
60.Embora praticando táticas eleitorais
de alianças com diversos setores sociais e políticos, visando ao enfrentamento
contra partidos e representantes da direita neoliberal, o PT precisa combater as
atitudes daqueles petistas que procuram utilizar os mesmos métodos e hábitos
burgueses desses eventuais aliados.
61.Por isto mesmo, o PT não deve temer
fazer autocrítica de seus erros publicamente, nem vacilar em punir
exemplarmente aqueles dirigentes e militantes que fizeram uso de métodos
burgueses de atuação e, com isso, abriram flancos aos ataques inimigos,
causaram prejuízo ao Partido e colocaram sua sobrevivência em risco.
62.Vale dizer que a Articulação de
Esquerda, sem cair na demagogia nem nas ilusões republicanas de alguns setores
do petismo, sempre defendeu a necessidade do Partido ter autonomia financeira,
combatemos a dependência frente às contribuições de empresas privadas,
propusemos a criação de uma corregedoria interna (que se antecipasse na
descoberta de corruptos infiltrados no Partido), exigimos medidas de auditoria
e punição contra a corrupção praticada nos governos tucanos, bem como comissão
de ética e as punições cabíveis para os envolvidos na crise de 2005. A maioria
partidária fez outras opções e hoje pagamos caro por isto.
63.O processo de construção de um
partido dos trabalhadores exige uma constante correção de rumos, através da
reafirmação de sua estratégia, da atualização das políticas e táticas, e do
aprofundamento da democracia interna, tendo em vista preservar o partido daqueles
métodos, hábitos e costumes que ameaçam destruí-lo ou deformá-lo totalmente.
64.Em vista disso, o PT deve redobrar
sua capacidade de formulação política, atualizando sua análise de classes da
sociedade brasileira, com atenção especial aos deslocamentos ocorridos no
interior da classe trabalhadora, a partir da elevação dos padrões de consumo de
milhões de pessoas, nos últimos anos. Será necessário um esforço mais efetivo
de análise do processo de desenvolvimento capitalista no Brasil, da formação e
transformação histórica das classes sociais e da luta entre elas. E de
reelaboração e discussão do programa estratégico para o Brasil, incluindo a
questão do poder, do papel das diferentes formas de luta que a burguesia pode
impor ao povo brasileiro e dos diferentes instrumentos organizativos das
classes trabalhadoras.
65.Para preparar-se e tornar-se
efetivamente capaz de ser força política hegemônica na sociedade brasileira e
conquistar a direção do poder político como um todo, o PT precisa de uma clara
hegemonia interna, em torno do programa e da estratégia democrático-popular e
socialista, reiterando seu caráter de classe, de massas, de luta e internamente
democrático. Deve, ainda, ampliar sua presença institucional e social e
revigorar sua vida partidária, com atenção primordial a suas bases
organizativas. E superar a prolongada subestimação da formação política de
dirigentes e militantes, utilizando tal formação inclusive como primeiro passo
para o ingresso no partido e a ocupação de cargos de direção.
66.O PT deve, também, formular e
executar uma política de cultura, educação e comunicação de massas, tendo em
vista construir uma hegemonia das ideias democráticas, populares e socialistas
no meio do povo, hoje vítima de uma violenta ofensiva do ideário conservador.
67.No caso específico da comunicação,
trata-se de 1) democratizar a comunicação social; 2) ampliar a rede de meios de
comunicação (televisões, rádios, internet e imprensa) dirigidos pelo campo
democrático-popular; 3) construir os instrumentos do próprio Partido, com
destaque para um jornal diário de massas, que seja o núcleo central de produção
do conteúdo que será repercutido através dos demais meios, especialmente das
redes sociais.
68.Esta é, portanto, a conduta geral
que nós da Articulação de Esquerda adotamos na disputa de rumos do Partido dos
Trabalhadores: continuamos trabalhando para que ele assuma um papel de
vanguarda, não apenas na luta pelo governo, mas também na luta pelo poder; não
apenas na luta pelo desenvolvimento, mas também na luta por reformas
estruturais e pelo socialismo.
69.Evidentemente, a disputa pelos rumos
do PT se trava em condições muito mais difíceis hoje do que em 1993. Em parte
por erros e insuficiências de nossa parte; em parte por erros e insuficiências
de outras tendências da antiga esquerda petista; em parte devido a atitudes de
outros setores do PT; em parte devido às circunstâncias em que atuamos; é
preciso dizer claramente que se torna cada vez mais difícil mudar a estratégia
atualmente hegemônica no PT – ainda que, contraditoriamente, a necessidade
desta mudança torne-se cada vez mais evidente para muitos segmentos do Partido.
70.Isto gera, em alguns setores da
esquerda petista, três atitudes que consideramos totalmente condenáveis.
71.A primeira delas é capitular ao modus operandi dos setores de centro e direita do
Partido. A segunda delas é desistir do Partido dos Trabalhadores. A terceira
delas é assumir uma atitude de seita, substituindo a disputa política pela
reafirmação de posições minoritárias, que não pretendem nunca se tornar
majoritárias.
72.A Articulação de Esquerda recusa
estas três condutas. Continuamos na disputa do PT, não abrimos mão de nossas
posições programáticas e estratégicas, mantemos a flexibilidade tática
indispensável para manter posições conquistadas e acumular forças. Mas para que
tenhamos alguma chance de êxito, será necessária maior criatividade e
consistência ideológica e teórica; maior capacidade de elaboração política;
maior força social, especialmente junto às classes trabalhadoras; mais
disciplina e centralismo militante por parte da nossa tendência.
73.O segundo congresso da AE retoma a
proposta de um Congresso Nacional da Esquerda Socialista do PT, com o objetivo
de dar o máximo de visibilidade, coesão política e organicidade para o petismo
socialista e revolucionário.
74.Como dissemos antes, não
consideramos que a AE seja capaz de dar conta sozinha das imensas tarefas
postas diante do PT. Acreditamos que em todas as tendências petistas haja
militantes comprometidos com as ideias que defendemos. Estamos dispostos a
cooperar com todos e todas neste sentido. Ao mesmo tempo, aprendemos desde 1993
que a existência de uma tendência como a nossa, com todas as suas limitações, é
essencial. Por isto, ao mesmo tempo que reafirmamos nossa disposição de marchar
juntos com todos aqueles que desejam construir o Partido dos Trabalhadores,
reafirmamos também nossa decisão de continuar construindo a tendência petista
Articulação de Esquerda.
Nenhum comentário:
Postar um comentário