terça-feira, 26 de março de 2019

A reunião do DN

 A reunião do Diretório Nacional do PT, realizada nos dias 22 e 23 de março de 2019, aprovou várias resoluções políticas e organizativas.

A principal resolução (ver www.pt.org.br), aprovada por unanimidade, conclama a militância petista a “se somar ao conjunto das trabalhadoras e trabalhadores, aos sindicatos país a fora, aos movimentos sociais e populares, às Frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, bem como aos partidos políticos do campo democrático para empreenderem todos os esforços para debater e esclarecer junto a sociedade brasileira esta proposta danosa ao povo, dizendo NÃO à Reforma. É na mobilização da opinião pública nas redes e nas ruas que construiremos juntos a derrota desta Reforma e dos retrocessos que nos querem impor”. Defende uma “uma agenda de mobilização capaz de enfrentar e derrotar este projeto de privatização e consequente destruição da previdência pública”. Além disso, o PT “fecha questão e orienta suas bancadas na Câmara e no Senado para que não meçam esforços para derrotar os projetos do Governo representados na PEC 06/2019 e no PL 1645/2019 que amplia ainda mais as distorções entre os militares, resistindo aos retrocessos expressos na proposta e reafirmando nosso compromisso com uma Previdência Universal, pública, justa e solidária”.

O Diretório Nacional do PT aprovou, também, resoluções sobre a paz na Venezuela e sobre a defesa da soberania nacional.

Acerca da Venezuela, o PT “conclama todas as forças políticas, internas e externas, a que se empenhem na busca de uma solução pacífica, negociada e democrática para a crise na Venezuela”, afirmando “total discordância em relação à participação do Brasil na ilegal intervenção na Venezuela, liderada pelos EUA ao reconhecer como governante legitimo o autoproclamado Juan Guaidó”.

Na mesma linha, a direção do PT condenou todas as concessões feitas pelos governos Temer e Bolsonaro, em benefício dos Estados Unidos: a entrega do pré-sal e o desmonte da Petrobrás; a dispensa da exigência de vistos para entrada de cidadãos estadunidenses e de outros três países, sem a necessária reciprocidade para cidadãos brasileiros; as concessões feitas na importação de trigo e compra de suínos dos Estados Unidos; a abertura de direitos conquistados na OMC, a entrada na OCDE e na OTAN; a entrega da base de Alcântara; a irresponsável transferência da embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém; além da já citada cooperação com os EUA contra a Venezuela.

A Amazônia também mereceu uma resolução específica por parte da reunião da direção nacional do PT. O texto começa lembrando que “a Amazônia Legal se estende por nove Estados e ocupa 61% do território brasileiro – sua área equivale à metade do continente europeu e nela cabem 12 países, incluindo Alemanha e França. Ela seria, assim, o sexto maior país do mundo, com uma população de mais de 20 milhões de pessoas. A região faz fronteira de 11 mil quilômetros com Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela. O rio Amazonas possui em volume de água um quinto da água doce do planeta. Com seus 61% do território brasileiro, distribuído em mais de 700 municípios. Representa 67% das florestas tropicais do mundo. A região tem 20,3 milhões de moradores, sendo 68,9% residentes na área urbana e 31,1% na área rural. A Amazônia Legal abriga 12,3% da população brasileira, abriga 170 povos e 98% das terras indígenas, 357 comunidades remanescentes de quilombos e milhares de comunidades de seringueiros, castanheiros, ribeirinhos, quebradeiras de coco babaçu, assentados da reforma agrária e trabalhadoras e trabalhadores e trabalhadores urbanos. Na Região estão 77% das unidades de conservação que, somadas aos territórios indígenas e aos quilombolas, representam 32% da superfície do País, consolidando um território fundamental para a preservação da grande diversidade socioambiental do Brasil e para a captura de quantidades substanciais de carbono que, do contrário, se concentrariam na atmosfera, gerando aquecimento global. O Produto Interno Bruto (PIB) da Amazônia Legal é de R$ 82 bilhões (US$ 27,5 bilhões), corresponde a 6.1% do PIB nacional. A renda per capita da Amazônia Legal é igual a R$ 7,4 mil, ou US$ 2,1 mil; enquanto a média brasileira é de R$ 12,9 mil, ou US$ 3,65 mil”.

Em seguida a resolução sobre a Amazônia relaciona as ameaças que pairam sobre a região, especialmente depois da eleição de Bolsonaro: “a tentativa de abertura da RENCA em 2016, a suspensão dos processos de demarcação de terras de comunidades tradicionais, a saída do Brasil do acordo de Paris, a entrega da base de Alcântara no maranhão as forças armadas Norte Americanas, o desmonte da legislação ambiental, a entrega de terras a “investidores” estrangeiros, a privatização do aquífero guarani e o estímulo a cultura do ódio e da violência com a liberação do porte de armas, (ampliando os conflitos armados na Amazônia), compõem um dispositivo nocivo aos povos da Amazônia e a soberania nacional. Sob o olhar complacente do governo as atividades ilegais de madeireiras, grandes fazendeiros, mineradoras e de biopirataria, o atual regime opta pela perseguição a ONGs e organismos internacionais, a exemplo do Sínodo da Igreja católica, que propõem a preservação do meio-ambiente e dos povos locais. Ambientalistas e religiosos viraram sinônimo de inimigos.             Trata-se de posturas devastadoras e autoritárias, capitaneadas pelo ministério da economia e o gabinete de segurança institucional, já englobam outros ministérios do governo federal como os de Minas e Energia, de Agricultura e Pecuária, do Meio Ambiente, e os de infraestrutura e transportes. Nesse contexto, destacam-se a tentativa de liberar a mineração na Calha Norte do Pará e no Amapá em áreas protegidas e Terras indígenas; a proposta de interligar Roraima ao sistema nacional de energia, desrespeitando a legislação vigente; a defesa dos projetos do agronegócio e de infraestrutura na região colocando em risco novas demarcações de Terras Indígenas e, inclusive, aquelas já demarcadas; a extensão da BR 163 até a fronteira com o Suriname, cortando o maior corredor de áreas protegidas tropicais do planeta e o desmonte do aparato administrativo e os respectivos quadros técnicos, há anos treinadas nas áreas respectivas, com forte investimento do governo, como nos casos do IBAMA e FUNAI”. 

Ao término de um diagnóstico sobre as questões que afetam a região, a resolução aprovada pelo Diretório nacional apresenta uma “agenda de luta em defesa da Amazônia e da Soberania Nacional”. A agenda inclui, entre outras questões, a “construção de comitês de entidades em defesa da Amazônia”, a campanha “Amazônia é do Brasil”, a criação do “Observatório amazônico na FPA”, a “participação permanente de dirigentes no Acampamento terra Livre 2019”, o “diálogo e participação permanente dos parlamentares da Amazônia na frente ambientalista”, a “colaboração e participação nas agendas de mobilização do Sínodo da igreja católica”.

Além das resoluções citadas anteriormente, o Diretório Nacional aprovou uma nota em defesa do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e do Sistema de Seleção Unificada (SISU), ameaçados por uma decisão do Ministério da Educação de Bolsonaro, que constituiu uma “comissão, no âmbito do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC), composta por servidores que não são efetivos e por um suposto representante da sociedade civil, com a finalidade de interferir na montagem das provas do Exame Nacional do Ensino Médio”, colocando em risco o sigilo das provas, a segurança e a credibilidade do ENEM.

A direção do PT denuncia que, “sob o pretexto de verificar a pertinência das questões do ENEM e assegurar um perfil consensual do Exame, a Portaria nº 244, de 19 de março de 2019, do INEP, institui um instrumento de censura típico de regimes autoritários, com o objetivo de eliminar questões não alinhadas ao ideário do governo”.

O Diretório Nacional também aprovou uma moção de solidariedade aos afetados pela passagem do ciclone Idai: “segundo o Programa Mundial de Alimentos (PMA) da ONU, mais de 2,8 milhões de pessoas foram afetadas entre desabrigados, mortos e feridos”, especialmente em Moçambique, Zimbábue e Malauí.

Finalmente, o Diretório Nacional aprovou uma Resolução sobre o 7º Congresso do PT, Eleição das Direções Partidárias e Plebiscito (ver box). Além das questões tratadas nas resoluções já citadas, a reunião tratou de muitos outros assuntos, entre os quais a Campanha Lula Livre, as finanças e a juventude.

De maneira geral, foi uma reunião muito melhor do que a anterior, realizada nos dias 30 e 31 de novembro de 2018. Certamente contribuiu para isso o ambiente político, de crescentes conflitos no interior da coalizão golpista e de mobilização popular contra a reforma da previdência. No debate desta situação, manifestaram-se diferentes opiniões no Diretório Nacional do PT. Todos apontam para a possibilidade real desta reforma não ser aprovada pelo Congresso Nacional. Neste caso, a crise política vai se agudizar ainda mais.

Frente a isto, alguns integrantes do Diretório Nacional do PT pensam e agem como se nada de fundamental tivesse se modificado. A aceleração da disputa política, os conflitos na coalizão golpista e o desgaste do clã Bolsonaro, somados a mobilização popular, alimentam avaliações de que o governo estaria se desmanchando. Tais avaliações confundem o presidente com o governo, subestimam a força da coalizão golpista, supõem que a extrema direita poderia ser derrotada rapidamente, exclusiva ou principalmente por vias eleitorais e institucionais.

Alguns chegam a converter os conflitos do lado de lá em argumentos em favor da constituição de uma “ampla frente” para derrotar Bolsonaro, o que na prática implicaria em alianças com setores que apoiaram Bolsonaro (Rodrigo Maia, o PSDB de SP etc.), renovadas ilusões e até elogios aos militares (que seriam os “adultos na sala”, os “racionais” de um governo de “malucos”), esperanças que o empresariado se oponha ao ultraliberalismo, além de propostas que – se adotadas – nos fariam cerrar fileiras em defesa da “velha política”.

O otimismo analítico desemboca, portanto, numa tática moderada. Para perceber o absurdo desta tática moderada, basta pensar em suas implicações no tema da reforma da previdência. Além disso, as expectativas de reviravolta em curto prazo “justificam” a ausência de reflexão estratégica e, principalmente, ausência de ações práticas no sentido de mudar o “estilo de trabalho” das organizações populares e dos partidos de esquerda. Como se a estratégia e os métodos eleitorais, governamentais, parlamentares e partidários que predominaram até agora, fossem adequados ou suficientes para contribuir para uma mudança na correlação de forças.

Reiteramos nossa posição a respeito: desde 2005, mais notadamente depois do segundo turno de 2014 e seguramente depois do triplo golpe ocorrido entre 2016 e 2018 (mpeachment/prisão/eleição), houve uma alteração profunda nas condições estratégicas que nos permitiram vencer 4 eleições presidenciais seguidas e governar o país por 13 anos. Mudou a estratégia da classe dominante, mudaram as condições da luta de classes no Brasil. Neste ambiente, para derrotar a coalizão golpista, não basta uma tática que aproveite bem uma conjuntura favorável; é preciso combinar tática e conjuntura, com uma nova estratégia e outro nível de organização das classes trabalhadoras, da esquerda e particularmente do PT.

Até porque a tática adotada pelo governo Bolsonaro é ofensiva: atacar o movimento sindical, mobilizar contra a “velha política”, emitir sinais de que pode adotar novas medidas de exceção. Isso comprova que não estamos diante de um governo “normal”. Este governo pode sofrer muitas derrotas parciais e, inclusive, Bolsonaro pode não chegar ao final de seu mandato. Mas o exoesqueleto deste governo é composto por mais de 60 militares ocupando postos estratégicos no governo federal, inclusive a vice-presidência da República, que lá chegaram como parte de uma “frente ampla antidemocrática” apoiada pelo PIG, pelo partido do judiciário, pelo grande capital. Esta coalizão e este governo não serão derrotados do mesmo jeito que derrotamos os governos tucanos em 2002.

Política e organização são, mais do que nunca, inseparáveis. Radicalizar a retórica, mas manter o estilo parlamentar e institucional de funcionamento e trabalho, não passa de bravata. Em maior ou menor escala, todas as organizações do campo democrático, popular e socialista estão chamadas a mudar o estilo de trabalho, especialmente em quatro terrenos fundamentais: a) funcionamento e métodos de direção, b) organização de base e relação cotidiana com as classes trabalhadoras, c) métodos de mobilização e luta social de massa, e) práticas de comunicação de massa e de formação política.

No caso do Partido dos Trabalhadores, a aprovação de uma nova estratégia e de um novo estilo de trabalho dependem, ao menos em parte, dos resultados do 7º Congresso do Partido dos Trabalhadores.

O DN decidiu, em março de 2019, algo que deveria e poderia ter sido decidido em novembro de 2018. Ademais, ao decidir que poderão votar e ser votados, ao longo do processo descrito, todos os filiados e filiadas até o dia 8 de junho de 2019, a maioria do o Diretório Nacional desrespeitou o estatuto do PT. O estatuto define que para poder votar e ser votado é preciso ter no mínimo 1 ano de filiação. Alterações no estatuto só podem ser aprovadas por maioria qualificada, em reunião convocada explicitamente para este fim. Ademais, embora a decisão tenha sido adotada com a justificativa de incorporar ao Partido as pessoas que se engajaram nas lutas contra o golpe, contra a prisão de Lula e contra Bolsonaro, é óbvio que há o risco de filiações sem critério, que não servirão para fortalecer o partido. A Articulação de Esquerda e mais três membros do DN se abstiveram da votação deste ponto sobre o direito de voto das novas filiações e solicitaram o registro desta abstenção em ata, porque feria o estatuto do Partido, não admitindo a abertura do precedente.

A protelação, as resistências e os termos de convocação do 7º Congresso indicam que a aprovação do calendário foi apenas um primeiro passo. Teremos pela frente três outros desafios: impedir as fraudes, garantir o debate e combinar o processo congressual com as tarefas políticas da oposição ao governo Bolsonaro.

O processo de 7º Congresso, da campanha de filiação até a plenária final onde será eleita a nova direção nacional, coincidirá com um período político de intensa atividade. Nas próximas semanas, por exemplo, além da luta contra a reforma da previdência: nos dias 30 e 31 de março de 2019 acontecerá a conferência nacional da Frente Brasil Popular; de 7 a 10 de abril, a jornada de luta Lula Livre; neste mesmo período, tanto o STF quanto o STJ tomarão decisões cruciais relativas à prisão de Lula; depois teremos pela frente o Primeiro de Maio. Além disso, temos a mobilização das categorias, a atuação dos mandatos e dos governos, a preparação das futuras campanhas eleitorais, a vida sindical e associativa cotidiana. Concentraremos nossas energias em quatro prioridades: a defesa da paz e da Venezuela; a luta contra o pacote “anticrime”; a campanha Lula Livre; a luta contra a reforma da previdência.

Seja qual for o resultado do congresso e da eleição das direções, o PT continuará a enfrentar gravíssimos problemas organizativos e políticos. Hoje, nossa sobrevivência é ameaçada externamente pelos ataques da extrema direita e do cirismo; somos sabotados internamente por tendências suicidas, fisiológicas e social-democratas; e somos flanqueados por concorrentes no próprio campo de esquerda. Não parecem existir condições, neste ano de 2019, para impor uma derrota definitiva a nenhuma destas ameaças. Assim como parecem não existir condições para que nenhuma destas ameaças destrua o PT. Logo, não apenas na disputa política geral, mas também na disputa de rumos do próprio PT, devemos nos preparar para uma maratona, não para uma corrida de 100 metros. Maratona que deve durar o tempo necessário para que a esquerda consiga recuperar a influência perdida em amplos setores da classe trabalhadorae do povo. Recuperar isto em novas condições estratégicas e com novos métodos de trabalho. E o mais rápido que for possível. Cumpre papel importante neste sentido o congresso da tendência petista Articulação de Esquerda, nos dias 3 a 5 de maio de 2019. 

BOX

O Diretório Nacional decide:

1.            Convocar 7º Congresso Nacional do PT para os dias 22, 23 e 24 de novembro de 2019.

2.            A eleição das direções municipais e dos delegados e delegadas às etapas estaduais e nacional do 7º Congresso será realizada em todo o país no dia 8 de setembro de 2019, em votação direta pelos filiados e filiadas.

3.            A eleição do Diretório Nacional será feita, excepcionalmente, na etapa nacional do 7º Congresso pelos delegados e delegadas eleitos(as) nos municípios em 8 de setembro de 2019.

4.            As etapas estaduais do 7º Congresso serão realizadas simultaneamente nos dias 19 e 20 de outubro de 2019.

5.            As Direções Estaduais serão eleitas, excepcionalmente, nas etapas estaduais do 7º Congresso, pelos delegados e delegadas eleitos(as) nos municípios, em 8 de setembro de 2019.

6.            Poderão votar na eleição das direções municipais e dos delegados e delegadas às etapas estaduais e nacional do 7º Congresso todos os filiados e filiadas até o dia 8 de junho de 2019.

7.            O Plebiscito para decidir sobre o processo de eleição das direções partidárias será realizado em 2021 e entrará em vigor a partir da próxima eleição das direções após a sua realização.

8.            Fica prorrogado o mandato das atuais direções municipais, estaduais e nacional até o dia 31 de dezembro de 2019, sem prejuízo da posse política em data anterior.

9.            Fica delegada à Comissão Executiva Nacional a decisão sobre todas as demais questões referentes à eleição das direções e ao 7º Congresso do PT.

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