quinta-feira, 29 de maio de 2014

Proclamação e revolução

 Texto escrito em 2001.

O PT comemora seus 21 anos numa situação semelhante a experimentada pelos comunistas brasileiros, no início da década de 60: um momento de apogeu e de crise.
        O apogeu é evidente: nunca, na história do Brasil, um partido de esquerda conseguiu tanta representatividade social e espaço institucional. É como se o PT possuísse, hoje, a força combinada que trabalhistas e comunistas alcançaram no início dos anos 60.
        A crise é menos óbvia. E suas causas e manifestações são vistas de maneira diferente por cada uma das correntes do Partido.
        Momentos de apogeu e crise podem ser, também, momentos de declínio. Mas o declínio de um partido com raízes profundas na sociedade, na política e na história pode durar décadas.
        No caso do Partido Comunista, por exemplo, ocorreram grandes cisões nos anos 60. Mas só nos anos 90, a maioria do que restou daquele partido optou por transformar-se no atual Partido Popular Socialista (PPS).
Nenhuma das dissidências do antigo Partido Comunista conseguiu substituí-lo como partido hegemônico em nossa esquerda, lugar ocupado pelo Partido dos Trabalhadores depois de vinte anos de crise do comunismo brasileiro.
        O apogeu e a crise de um Partido podem constituir a ante-sala, não do declínio, mas sim de uma mudança qualitativa. É o que pensam aqueles para quem o PT transformou-se primeiro num partido social-democrata (defensor do Estado de bem-estar social); e, agora, num partido social-democrata "moderno" (defensor de uma versão "social" do neoliberalismo).
        Embora não compartilhemos desta opinião, achamos que o PT vive um momento de transformações profundas, que empurra cada um de seus militantes conscientes a rever suas concepções e seus vínculos com o próprio Partido.
Ao fazer esta revisão, muitos militantes comparam o PT de hoje com o de ontem; ou então com o partido dos seus sonhos. Nós propomos outro caminho: discutir quais são as tarefas atuais dos socialistas e qual Partido é necessário para realizá-las. Afinal, um partido é antes de mais nada um instrumento para realizar determinada política.
         Em 1996 nós já dizíamos que os principais problemas do PT, vistos de uma perspectiva socialista e revolucionária, são os seguintes: a)diminuiu a influência do socialismo no interior do Partido, crescendo no seu lugar concepções melhoristas; b)o partido não possui mais uma estratégia de poder, nem tampouco uma estratégia de governo, mas tão somente uma estratégia de “poder local”, que na prática nos conduz a sermos um partido de flácida oposição ao neoliberalismo; c)o partido vem perdendo bases sociais organizadas, substituídas por bases eleitorais difusas; d)o partido atrai cada vez menos jovens e renova cada vez menos seus quadros; e)crescem os interesses fisiológicos, diretamente ligados a possibilidade de construir, através do PT, uma carreira política tradicional; f)o partido subestima (na prática, ainda que não no discurso) a importância das lutas sociais e superestima a importância das eleições e da chamada institucionalidade; g)a democracia interna vive sob a ameaça dos notáveis e dos interesses menores, sendo cada vez mais distorcida pelas filiações em massa, devido às prévias para escolher candidatos a prefeito. Tomados no conjunto, estes problemas podem ser assim resumidos: o PT está sendo cooptado, está deixando de ser um partido socialista, está se transformando num partido da ordem. Corre o risco de se converter numa sub-social-democracia. Enquanto a social-democracia abandonou o socialismo e a revolução, no curso de um processo de elevação significativa das condições de vida do conjunto da classe trabalhadora; o PT está sendo cooptado no curso de um processo de queda do padrão de vida da classe, mas de assunção de vários de seus líderes à condição de integrantes da elite dirigente do país.
        De 1996 até hoje, vários dos "problemas" citados agravaram-se. Mas o PT segue sendo a alternativa hegemônica dos que se opõem ao neoliberalismo. Diante disso, o que fazer?

Três desfechos

Na maior parte da história brasileira, as classes populares ou subordinaram-se aos interesses de um setor da burguesia, ou não reuniram forças suficientes para consolidar-se como alternativa independente. Esse padrão começou a mudar nos anos 80, quando se afirma um pólo democrático-popular e socialista, cuja principal expressão foi --e achamos que ainda é-- o Partido dos Trabalhadores.

Disposto a lutar por bandeiras que a burguesia brasileira não foi capaz ou não necessitou realizar --superação da dependência ao imperialismo, liquidação do latifúndio, democratização da propriedade (principalmente da terra), democratização política e outras reformas populares realizadas onde o capitalismo seguiu uma via distinta da nossa-- aquele pólo explicitava que tais tarefas deveriam ser realizadas sob a direção dos trabalhadores, contra o capitalismo e na perspectiva da construção do socialismo.
        A conjuntura excepcional do final dos anos 80 quase materializou, também, uma possibilidade fantástica, que nunca havia sido posta para a esquerda pré-surgimento do PT: a eleição de um presidente socialista. Neste caso, o governo das forças democrático-populares e socialistas viveria uma situação estratégica muito peculiar: exercer o governo federal sem ter a hegemonia ideológica da sociedade, nem o domínio do Estado.
        A derrota em 1989 abriu um período de contra-ofensiva burguesa, que destruiu várias das conquistas sociais obtidas pelas classes trabalhadoras, ao mesmo tempo em que encurralou num beco eleitoral as organizações populares surgidas nos anos 80.
        A partir de meados dos 90, a contra-ofensiva burguesa perdeu seu fôlego. Perdeu o charme ideológico, na medida que o neoliberalismo aprofundou os problemas econômicos, sociais, políticos e militares da maior parte da humanidade. Quebrou-se a unidade burguesa, na medida em que a concorrência estrangeira, o processo de monopolização acelerada e a fuga de capitais eliminaram, para amplos setores da média burguesia, as vantagens relativas da “sociedade total” com as finanças mundiais.
        Isso abriu um novo período de disputa, que recoloca três alternativas básicas: o aprofundamento da integração à “nova ordem mundial” –nos termos atuais ou nos termos defendidos pela centro-esquerda; um ciclo capitalista-nacionalista, que só vingará se a “ordem mundial” entrar em colapso, “desengatando” a economia brasileira, mas sem que haja uma alternativa popular suficientemente forte; ou uma ruptura democrática, popular e socialista.
        Qual destas alternativas prevalecerá? Isso dependerá dos rumos da economia mundial, da intensidade da disputa interburguesa e do comportamento dos setores populares. Em qualquer caso, vivemos um momento de “equilíbrio instável”, que não deve durar muito.

Uma aposta arriscada

        Necessitamos de um partido capaz de enfrentar todos os desafios e de aproveitar todas as potencialidades desta situação. Um partido capaz de travar o debate programático, dirigir fortes mobilizações sociais, realizar uma dura oposição aos governos burgueses, construir um "bloco histórico" de forças políticas e sociais comprometidas com uma alternativa socialista, democrática e popular. Um partido capaz de disputar o governo e, no governo, capaz de implementar transformações estruturais na sociedade brasileira. Um partido capaz de defender os direitos democráticos, contra os golpes abertos ou velados da classe dominante. Um partido capaz de seguir atuando, inclusive em cenários completamente distintos do atual.
É este o partido que temos, hoje?
        Achamos que o PT está muito aquém do que precisamos para enfrentar o atual período histórico e seus possíveis desdobramentos. Temos conseguido inegáveis sucessos no terreno eleitoral. Mas fora deste terreno, temos visto o rebaixamento programático, a adoção de políticas neoliberais por alguns governos, a recusa do "Fora FHC", as dificuldades em construir uma imprensa e uma formação política partidárias etc.
Nossos programas de governo têm se tornado cada vez mais moderados. Temas como a reversão das privatizações, a estatização do sistema financeiro e a suspensão do pagamento da dívida externa tornaram-se posições minoritárias no PT. Isso para não falar da defesa do socialismo --que continua nas resoluções partidárias, mas que para muitos não passa de uma miragem, já que o que "interessa mesmo" é propor reformas "sob" o capitalismo.
Onde governamos, nosso partido tem conseguido muito pouco em termos de mudanças estruturais. Em geral temos conseguido deslocar mais recursos para as áreas sociais e democratizar minimamente o funcionamento do governo. Mas não se deve confundir tributação e re-alocação de recursos, com mudança na ordem social e econômica.
É em parte por isso, aliás, que tem se demonstrado tão fácil desmontar as realizações dos governos petistas: elas situam-se basicamente no terreno da superestrutura política, tendo ganho pouco enraizamento na base social.
        Acontece que, apesar disto tudo, o PT é também a referência e o espaço da maioria dos militantes da CUT, do MST, da CMP, de grande parte da juventude e de diversos outros movimentos. Além de ser a referência eleitoral, o PT é o depositário da lealdade de classe de milhões de trabalhadores. Lealdade que foi forjada em embates como as greves no final dos anos 70, início dos anos 80; na recusa em comparecer ao Colégio Eleitoral; nas grandes campanhas eleitorais etc.
        Caso o PT não seja reformável, caso ele se torne um instrumento da "terceira via", caso ele tenha apenas "um grande passado pela frente", estaremos diante de uma enorme tragédia, da frustração de vinte anos de esforços da melhor parte da classe trabalhadora brasileira.
        A esquerda do PT, portanto, está numa situação muito difícil: precisamos que nosso partido seja muito mais militante do que eleitoral, muito mais socialista do que social-democrata, muito mais democrático do que cupulista.
Apesar de nosso partido ter enormes problemas (e ainda pode piorar bastante), sabemos também como é difícil para outras organizações de esquerda concorrer com o PT.
O PCdoB pratica um oportunismo eleitoral que o leva a participar até mesmo do governo do PFL no Maranhão. As incursões eleitorais do PSTU têm demonstrado quanto é forte a lealdade ao PT, mesmo para os que têm a vontade de "votar no 16, porque o resto é burguês"...
        As outras tentativas de aglutinar de forma para-partidária os militantes dos movimentos sociais têm demonstrado suas limitações e também mantém uma relação ambígua com o PT.
A verdade é que, se o PT não for capaz de aproveitar as potencialidades do atual período histórico, nenhum outro partido o fará --coisa que nem sempre lembram os que pensam ser possível construir, no curto prazo, a tempo de incidir no atual período, um PT forte como este, mas sem seus defeitos.
Em 1999, realizou-se o II Congresso do PT. Num documento preparatório, afirmávamos o seguinte: "a crise (em todos os seus sentidos, nacional e internacional, estrutural e conjuntural) está longe de ser debelada. Nesse contexto, a disputa do PT resume o dilema do período: se prevalecer o PT moderado, poderemos ter um novo pacto das elites; se prevalecer o PT radical, poderemos ter uma alternativa democrática, popular e socialista para a crise brasileira.
O papel que o PT jogar nesta crise definirá sua natureza: ou um partido da ruptura, da contra-ordem, dos de baixo, ou o partido dos acordos, subalterno, que abandona não apenas o socialismo e a revolução, mas até mesmo a perspectiva de fazer reformas reais na sociedade brasileira. Caso prevaleça o segundo caminho, nosso Partido perderá cada vez seu caráter de classe, num processo que pode durar meses, anos ou até décadas, mas que terá o mesmo desfecho melancólico dos partidos  de esquerda que,  na Europa, viraram gestores do grande capital.
Portanto, nossa opção é por disputar os rumos do PT. E fazemos esta opção por acharmos que isto é uma maneira de disputar os rumos da luta de classes.
As organizações que disputam com e contra o PT, fazem o mesmo. Mas fazem isso a partir de fora, "denunciando" a postura do PT, "indicando" qual deveria ser a posição "justa" do partido e cooptando individualmente militantes do PT.
As organizações que disputam com e contra o PT, afirmam que o Partido já seria uma força integrada ao regime, sendo impossível alterar esta situação, devido a burocratização interna. Assim, os militantes socialistas e revolucionários que ainda estão no PT, deveriam sair e ajudar a construir "o" partido revolucionário.
        Segundo esta lógica, os socialistas e revolucionários que militam no PT estariam atrasando a constituição de um partido revolucionário no Brasil. Estariam, também, colaborando com uma força política "integrada ao regime". No limite e noutras palavras, estariam colaborando com a contra-revolução.
        De nossa parte, também acreditamos que a crise atual pode evoluir num sentido revolucionário. Achamos que a posição majoritária existente no PT não contribui neste sentido. Concordamos que, na hipótese de vivermos uma situação revolucionária no Brasil, grandes segmentos da cúpula do Partido vão –para utilizar palavras leves—se "comportar mal". Mas daí não concluímos que os petistas socialistas e revolucionários devam sair do Partido. Afinal, os que desejam uma situação revolucionária devem ajudar a criá-la a partir da intervenção na luta de classes real que está em curso.
Evidentemente, ninguém deve nem precisa pedir licença, seja para lutar, seja para organizar um partido. Mas as tentativas de construir um "partido revolucionário", fora e contra o PT, no atual período histórico, devem ser encaradas como o que são: iniciativas de vanguarda, semelhantes as tentativas de construir uma alternativa ao Partido Comunista, durante os anos 60.
A existência de um "partido revolucionário" --ou seja, um partido que assim se proclama, já que partido revolucionário de fato precisa ter passado pela prova de uma revolução— não é pré-condição para o surgimento de uma situação revolucionária e, portanto, para a luta pelo socialismo.
Enquanto vivermos um período estratégico em que a disputa eleitoral tenha grande importância; e enquanto o PT for um ponto de referência para a vanguarda da classe trabalhadora brasileira, as demais organizações e partidos de esquerda tenderão a gravitar ao redor do PT. Algumas fazendo luta de massa, que no final colaborarão direta ou indiretamente para o desempenho eleitoral do Partido. Outras, pressionando o PT para que adote o que consideram a "linha justa".
E se isto for verdade, a existência de uma forte esquerda no interior do PT pode ser mais útil para a radicalização da luta de classes, do que as tentativas de construir um agrupamento revolucionário "pronto para servir ao país", se e quando o PT fracassar.
Por isto defendemos que os petistas socialistas e revolucionários devem fazer aquilo que queremos que o PT todo faça, especialmente construir, na luta de classes, o bloco de forças que pode sustentar o projeto democrático-popular e socialista.
Por óbvio, isto inclui debater o rumo estratégico-programático e explorar ao máximo as possibilidades de ação prática comum entre os diversos setores que reivindicam uma estratégia socialista e revolucionária.
        Nesse sentido, nossa maior dificuldade reside em que o setor social mais numeroso e de maior impacto na vida política do país –os trabalhadores assalariados urbanos— não ocupa ainda o centro da luta. Trabalhar para isto talvez seja nossa principal tarefa estratégica.

O debate estratégico

Desde 1995, há uma retomada do debate sobre o capitalismo contemporâneo, sobre o balanço da luta pelo socialismo no século XX, sobre a luta pelo socialismo no século XXI e, no caso do Brasil, sobre o programa, a estratégia e o partido.
Na questão do programa, enfrentamos um adversário de várias faces: o nacional-desenvolvimentismo, que influencia tanto a esquerda quanto a direita do Partido, se expressando no abandono do socialismo como objetivo programático estratégico e se materializando ora no "programa da revolução democrática", ora na "inserção soberana na globalização", ora na "construção da Nação" etc.
Na questão da estratégia, nosso adversário é duplo: por um lado, a aliança estratégica com um setor da burguesia ("brasileira", "nacional", "produtiva"); por outro lado, a noção "processual" de revolução (seja na forma abastardada de Cristovam Buarque, para quem "revolução" é uma grande política compensatória; seja na forma sofismática dos que dizem que a revolução consiste nas pequenas "reformas dando certo"; seja na forma respeitável e de esquerda, mas que julgamos incorreta, da "reformismo revolucionário"). É preciso, em especial, aprofundar a crítica ao conceito de "revolução democrática", que mistura o "melhorismo" não-revolucionário da social-democracia com o etapismo aliancista tão tradicional no comunismo brasileiro.
Na questão do Partido, enfrentamos um adversário em dois flancos. Por um lado, aqueles que operam (ou permitem) a transformação do PT num partido sub-social-democrata; por outro lado, aqueles que consideram que o PT é uma experiência esgotada, irrecuperável ou até mesmo um sustentáculo da ordem burguesa.
Nestas polêmicas, cabe-nos defender o programa socialista, democrático e popular; a revolução e a exclusão da burguesia de nosso campo de alianças estratégicas. Não haverá "revolução democrática" sem revolução socialista; e não haverá revolução socialista vitoriosa, se não houver um movimento de massas, um partido e uma estratégia orientados pelo socialismo.
Mas estas definições genéricas são insuficientes: é preciso qualificar nosso programa, demostrando que para atender as reivindicações populares, radicalizar a democracia e defender a soberania, é necessário transformar profundamente a estrutura de propriedade existente no Brasil, num sentido socialista.
Por óbvio, nossa polêmica ideológica se dirige também aos que defendem um PT não-socialista. Paradoxalmente, estes setores têm a seu favor a virtude da clareza. Eles são não-socialistas porque defendem que a propriedade privada é um componente fundamental da democracia. Portanto, temos com eles uma forte identidade: localizamos na questão da propriedade coletiva dos meios de produção um componente fundamental do socialismo.
Dirige-se, também, aos que acreditam que o papel do PT é administrar o capitalismo, o que na situação dada implica em oferecer o melhor cardápio de políticas compensatórias que estiver disponível. Cristovam Buarque é o porta-voz informal de um amplo setor do PT, fortíssimo entre nossos executivos, que fogem das polêmicas ditas "ideológicas" e adoram programas "factíveis".
Dirige-se, ainda, aos que buscam construir uma "terceira via" entre as posições da maioria partidária e as posições da esquerda petista, condição intermediária que volta e meia seduz não apenas setores da intelectualidade socialista, como também importantes setores da esquerda petista. Esta condição "intermediária", e a busca de construir um novo centro hegemônico no partido, mas sem romper com o velho, vem se materializando em posições defendidas por quadros como Tarso Genro, José Dirceu e segmentos da "esquerda petista".

Análise das posições do PSTU

O PSTU tem feito seguidas propostas --públicas— a favor da criação de um "partido revolucionário", que reuniria o próprio PSTU, a esquerda petista e os militantes sociais que gravitam ao redor do MST. Mas quais seriam o programa, a estratégia e a concepção de socialismo deste "partido revolucionário"?
Segundo o livro Brasil: reforma ou revolução?, assinado por Eduardo Neto, um dos principais dirigentes do PSTU, "existem três grandes balizamentos para a formulação de uma estratégia revolucionária no país: como enfrentar a recolonização imperialista e seu modelo neoliberal?; como enfrentar o problema dos problemas, o Estado e o regime democrático-burguês?; que balanço fazemos sobre os acontecimentos no leste europeu e qual é a nossa concepção de socialismo?".
Não temos condições, neste pequeno texto, para abordar o conjunto das divergências que possuímos com as posições do PSTU. Assim, nos limitaremos a três delas: a visão sobre o socialismo; a questão do programa democrático-popular e da estratégia; e a questão do partido.
Comecemos pelo primeiro ponto, objeto do parte 6 do livro, páginas 95 a 111. Segundo Eduardo Neto, no Leste Europeu havia "Estados dirigidos por uma burocracia totalitária que defendia seus interesses de casta parasitária, que usurparam a direção de processos revolucionários vitoriosos. A derrubada destas ditaduras do Leste em 89-90 foi um processo revolucionário vitorioso, que teve um profundo significado a nível mundial por derrubar o aparato mundial do estalinismo, um aliado do imperialismo em todos os processos revolucionários desde a burocratização do Estado russo. Estes processos revolucionários vitoriosos não se desenvolveram a ponto de questionar o processo de restauração capitalista que já estava em curso. Ao contrário, setores das burocracias dirigentes puderam se relocalizar e avançar para a efetivação da restauração do capitalismo. Hoje, esse processo está concluído na totalidade destes Estados, o que significa uma derrota".
Continua Eduardo Neto: "a restauração do capitalismo nestes países está completada. Mas está em curso um outro processo, distinto da restauração, que é a colonização destes países pelo imperialismo, que inclui desde os maiores como a Rússia e da China, até os menores, com distintos graus".
Sobre China e Cuba, onde os "processos revolucionários (de 89-90) foram derrotados, Eduardo Neto diz que "a restauração (do capitalismo) ocorreu de maneira mais fácil e controlada".
Finalmente, Eduardo Neto apresenta os "eixos gerais" da concepção de socialismo defendida pelo PSTU: a rejeição da social-democracia e do estalinismo; a defesa da expropriação da burguesia e da planificação democrática; o internacionalismo; a destruição do Estado burguês e a construção da ditadura revolucionária do proletariado.
Como o próprio Neto adverte, trata-se de afirmações sintéticas e esquemáticas. Mas nos permitem, também de maneira sintética e esquemática, apontar pelo menos três grandes divergências com as posições expressas no livro e presentes no PSTU: )fazemos outro balanço da luta pelo socialismo no século XX; avaliamos de outra forma o processo ocorrido em 1989-90; compreendemos de outra maneira o processo em curso na China e em Cuba.
Para ficar clara nossa divergência, basta atentar para a seguinte frase de Eduardo Neto: "o proletariado chinês, ao contrário do russo, fez sua revolução com uma direção que sempre capitulou a burguesia" (p. 101). É de se perguntar como uma revolução proletária chega à vitória, se sua direção sempre capitulou à burguesia.
Esta afirmação non-sense decorre de um balanço histórico organizado a partir do contraponto entre "trotskismo" e "stalinismo" –sendo este último apresentado como um "aparato mundial aliado do imperialismo em todos os processos revolucionários desde a burocratização do Estado russo".
Nós, embora nunca tenhamos feito um debate conclusivo sobre estas questões, enxergarmos de maneira mais plural o movimento revolucionário deste século, não o considerando redutível a contraposição "estalinismo"/"trotskismo".
Os partidos comunistas jogaram um papel positivo em diversas revoluções, em diversos momentos históricos. Da mesma forma, o papel jogado pela União Soviética e pelas chamadas democracias populares do Leste Europeu não pode, em absoluto, ser reduzido a condição de "aliado do imperialismo em todos os processos revolucionários".
Tampouco achamos que as tentativas de construção do socialismo, inclusive a experiência soviética, possam ser "encaixadas" na camisa de força do "totalitarismo burocrático".
Por isso, aliás, temos uma posição de solidariedade com várias destas experiências revolucionárias e de respeito a tradição que delas emergiu, a começar por Cuba.
Quanto ao processo ocorrido em 1989-90, achamos que Neto tenta dar nó em pingo d'água. Primeiro, fala de "processo revolucionário vitorioso" contra a "burocracia totalitária" aliada do "imperialismo". Depois, afirma que este "processo revolucionário" não questionou o processo de "restauração capitalista que já estava em curso". Finalmente, diz que a restauração capitalista está concluída naqueles estados, o que significa uma "derrota".
        Adiante, referindo-se a China e Cuba, onde foi derrotado o "processo revolucionário" contra as "burocracias totalitárias", Neto diz que naqueles dois países a restauração capitalista foi mais "fácil e controlada".
Noutras palavras:
1)uma casta parasitária usurpou a direção de processos revolucionários vitoriosos (uma dúvida: na China, onde a direção "sempre capitulou à burguesia", a casta parasitária usurpou a direção capituladora?);
2)esta casta começou a restaurar o capitalismo;
3)uma revolução vitoriosa derrubou esta casta;
4)mas a revolução "vitoriosa" não chegou ao ponto de questionar a restauração capitalista;
5)com isso, setores da casta parasitária puderam se relocalizar e avançar na restauração do capitalismo;
6)sendo que onde não houve revolução vitoriosa, a casta parasitária restaurou o capitalismo de maneira ainda mais fácil e controlada.
O raciocínio tortuoso é derivado de uma das teses fundamentais do trotskismo, a da "revolução política". Não há espaço para contestar detalhadamente esta tese original, mas o fato é que ela não resistiu ao teste dos fatos, ou seja, não consegue explicar adequadamente o que ocorreu no final dos anos 80.
Ao contrário do que os trotskistas imaginavam, ao derrubar os Partidos Comunistas, as "revoluções vitoriosas" derrubaram também as bases da propriedade pública dos meios de produção. Nisso não vai nenhuma simpatia ou adesão ao tipo de socialismo que existia na URSS e no Leste Europeu, mas apenas o registro de um fato. Fato, aliás, que explica a insistência do capitalismo mundial para que –além das reformas econômicas— China e Cuba acabem com a hegemonia do Partido Comunista.
Quanto ao que ocorre na China e em Cuba, nos parece que Neto desconsidera, mais uma vez, os fatos. Ambos os países mantém enormes contradições com a hegemonia norte-americana e com o modelo econômico vigente no mundo. Pode-se e deve-se discutir qual o impacto das reformas capitalistas, mas não consideramos sustentável a conclusão de que se tratam de neo-colônias ou algo do gênero.

A segunda diferença entre nós e o PSTU está na questão do governo democrático e popular e da estratégia. Apesar de incorporarem a questão nacional com ênfase, apesar de defenderem alianças inclusive com os pequenos empresários urbanos, apesar de afirmarem que a luta pelo poder não está na ordem do dia, eles ainda assim atacam duramente a categoria "governo democrático e popular" e propõem o "governo dos trabalhadores".
Sua crítica ao governo democrático e popular repousa na crítica histórica do trotskismo à bandeira da "unidade popular", como se toda unidade popular incluísse, obrigatoriamente, a burguesia como aliada estratégica.
A disjuntiva governo dos trabalhadores versus governo democrático e popular esconde, na verdade, uma divergência sobre a composição social de um possível governo revolucionário.
Em nossa opinião, comporiam este governo os trabalhadores assalariados e os trabalhadores pequenos-proprietários, com a possibilidade de neutralizarmos setores do médio empresariado. A grande burguesia e a maioria do médio empresariado serão, em nossa opinião, inimigos de um governo revolucionário.
Estamos convencidos de que a denominação "democrático-popular" expressa melhor a composição social deste governo, bem como deixa claro que as tarefas dele não serão apenas "socialistas" (no sentido clássico, ou seja, as que dizem respeito à expropriação do capital, implantação da propriedade coletiva etc.); serão também "democráticas" (no sentido clássico, ou seja, democrático-burguesas, como a reforma agrária por exemplo).
Por óbvio, o que vale para um governo revolucionário, é triplamente válido quando buscamos denominar o conteúdo e as tarefas das administrações que o PT ganhou nas eleições.

No terreno da estratégia (ou seja, da luta pelo poder), há também uma diferença importante entre nós e o PSTU. Neto diz que "na conjuntura atual evidentemente não temos nenhuma condição de lutar pelo poder". Esta frase, é claro, só faz sentido num sentido clássico, que compreende a luta pelo poder como "a luta direta pelo controle do aparelho de Estado". Já na tradição petista, a luta pelo poder é também o acúmulo de forças, portanto lutamos pelo poder todo o tempo.
Mas estamos de acordo que, hoje, não está colocada a luta direta pelo controle do aparelho de Estado. Noutras palavras: acumulamos forças, na disputa de governos, mandatos parlamentares, disputa pelo controle dos "organismos das massas", mobilização social e disputa político ideológica.
Curiosamente, Neto diz que a "estratégia" do PSTU é "derrubar FHC pela via da ação das massas e não apostar no calendário eleitoral de 2002". Bom, derrubar FHC pela via da ação das massas pode significar: a)a inssureição revolucionária; b) a antecipação das eleições.
Como a primeira –segundo o próprio Neto—não está colocada na ordem do dia, resta a segunda. Mas, antecipada a eleição, o que teremos? Uma mudança no calendário eleitoral...
Noutras palavras, os companheiros não se apercebem que –nas condições do atual período histórico— uma estratégia revolucionária tem que integrar a disputa eleitoral, tanto no processo de acúmulo de forças quanto no processo de disputa direta pelo controle do aparelho de Estado.

A terceira diferença, sobre a qual queremos nos deter mais, está na maneira de encarar o PT. O texto de Neto ora critica a direção da CUT e do PT, ora critica suas direções majoritárias, mas sempre deixa claro que o PT é "parte do regime".
Tirando informações mal postas e raciocínios tortuosos, o centro da diferença está em como encaramos o ritmo da luta de clases, as possibilidades de construir um partido revolucionário de massas numa conjuntura como a atual, a existência ou não --e em que grau-- de descontentamento das bases e das massas frente ao PT, o grau de integração do PT à ordem etc. Numa palavra, eles maximizam todos os fenômenos de domesticação do partido. Claro que, como petistas, corremos o risco oposto, de minimizar.
O PSTU afirma que a revolução socialista no Brasil necessita de um partido revolucionário, "como uma das condições indispensáveis para chegar a vitória". Ocorre que se olharmos todas as revoluções ocorridas no século XX, tomando como metro o critério dos companheiros, todas estas revoluções --menos a russa-- foram conduzidas por partidos "aliados do imperialismo" ou portadores de defeitos gravíssimos, como o "stalinismo", a "burocratização" etc.
Mutatis mutandis, os partidos "revolucionários" --sempre segundo o figurino dos companheiros do PSTU-- não dirigiram nenhuma revolução, em lugar nenhum do mundo. O que se pode concluir daí é o seguinte: as classes sociais forjam seus instrumentos com o material que têm a mão.
O PSTU diz que "o reformismo da direção do PT é a válvula de segurança que a burguesia brasileira pode contar em caso de uma crise revolucionária no país".
Curiosamente, Trotsky entrou no Partido Bolchevique apenas em 1917. Antes disso, era um duro crítico da estratégia defendida por Lenin. Por sua vez, o Partido Bolchevique, entre a revolução de fevereiro e a conferência de abril de 1917, defendeu uma política de colaboração com o governo provisório. Foi travada uma imensa luta interna no Partido Operário Social Democrata Russo (bolchevique), que resultou na aprovação das Teses de Abril, nas quais Lenin defendia a revolução socialista e a tomada do poder pelos sovietes. E as posições de Lenin só foram vitoriosas graças ao apoio da militância operária, especialmente os novos militantes, surgidos da ebulição revolucionária de fevereiro de 1917.
É evidente que toda analogia é abusiva, mas a lembrança serve para ressaltar o quanto os critérios dos companheiros são a-históricos, doutrinários. Segundo estes critérios, até mesmo os bolcheviques seriam "válvula de segurança". Aliás, a esse respeito sugerimos a leitura do prefácio do próprio Trotski à A Revolução Russa.
Nas várias experiências revolucionárias ocorridas no século XX, vários partidos assumiram a condição de vanguarda.
No caso russo, o papel desempenhado pelos bolcheviques foi, por suposto, destacado. Mas, qual partido bolchevique? Em abril de 1917, Lenin aprova as "teses de abril" contra a posição dos "velhos bolqueviques". Em outubro de 1917, quem apóia Lenin com maior decisão são os recém-chegados ao Partido --inclusive os que vieram junto com Trotski.
No Congresso dos Sovietes e no governo revolucionário que dali nascerá, a maioria "bolchevique" só é possível porque, na verdade, existe uma coalizão mais ou menos informal com socialistas revolucionários de esquerda, com pequenos grupos mencheviques, com os anarquistas, com operários independentes etc.
O fato de Lenin --e os bolcheviques-- terem sido o centro político-organizativo, o pólo que agregou os diversos setores da revolução, não pode nos fazer esquecer a pluralidade da esquerda revolucionária na Rússia de 1917. E deve nos levar a enxergar de outra maneira a conveniência e a "necessidade" de termos "um" partido revolucionário no Brasil.
Nesse ponto, curiosamente, o PSTU defende a mesma tradição dos partidos comunistas ditos "estalinistas", segundo a qual só existe um único partido revolucionário da classe operária.
O documento supracitado do PSTU pergunta se o PT é "este partido revolucionário" e, depois, se "o PT é o partido estratégico". Acontece que as duas perguntas não são equivalentes.
O PT hoje é um partido social-democrata, no sentido clássico deste termo. Noutras palavras: tomado de conjunto, o PT não luta por uma revolução socialista; tampouco visa ajudar na instalação de uma situação revolucionária no país (o que não impede que setores do partido obrem nesse sentido).
Outra coisa é saber se ele virá ou não a cumprir um papel revolucionário, na hipótese de uma revolução no Brasil. Peço socorro, neste instante, ao próprio companheiro Neto, que fala que na China, a direção "sempre" capitulou à burguesia...
Novamente, é muito difícil que todo o Partido esteja na mesma trincheira. Mas onde estará a maioria?
Quanto a saber se o PT é estratégico ou não, isto implica em responder se é a partir dele, ou também a partir dele que, num momento de crise revolucionária, pode vir a se construir uma direção revolucionária.
O PSTU diz que o PT não é um partido estratégico, porque não se propõe a fazer a revolução (muito antes pelo contrário), e porque existe em seu interior um processo irreversível de burocratização, o que torna irreversível o caráter reformista de todo o partido.
Ambas as afirmativas contém enorme dose de verdade, mas não contém toda a verdade. Além disso, como apontamos, trata-se de uma resposta e de uma pergunta incompatíveis entre si.
O PT é a expressão político-partidária de um amplo segmento das classes trabalhadoras brasileiras. A pergunta não é, simplesmente, se o PT é estratégico ou se o PT é revolucionário. A pergunta é se este segmento que o PT representa é ou não revolucionário, se pode ou não vir a cumprir um papel revolucionário. Renunciar à disputa do PT é, de fato, renunciar à disputa deste setor da classe trabalhadora. Postura, que para ser coerente, deveria levar os que a defendem a sair da CUT e a não disputar eleições.
O PSTU reconhece que existe no PT uma esquerda revolucionária, embora "em processo de adaptacão". Valeria a pena destacar que, mesmo sem ser maioria no PT, essa esquerda é várias vezes maior que o PSTU. Maior eleitoralmente (só em São Paulo, nossos candidatos não-eleitos receberam mais votos que o PSTU em todo o país) e maior em número de militantes (basta dizer que uma única tendência da esquerda petista tinha mais delegados, no último Congresso da UNE, que o PSTU).
Quanto ao processo de burocratização, ele "parece" irreversível, de fato. Mas perguntamos: no caso de  haver uma crise aguda, no Brasil, no curto prazo, a quem a maior parte das massas populares se dirigirá? Ao PT ou ao PSTU? E onde a esquerda revolucionária que está no PT pode ser mais útil? No PT ou no PSTU?
A dolorosa experiência dos espartaquistas, durante a revolução alemã, revela que a política proposta pelo PSTU –assim como a política proposta por nós-- contém riscos. Mas nosso critério fundamental deve ser manter laços com a maioria da vanguarda da classe trabalhadora. Por isso não nos dispomos a sair do PT.
Os companheiros consideram que a derrota eleitoral do PSTU nas últimas eleições não é uma base sólida para supor o isolamento como consequência da ruptura com o PT. Curiosamente, os companheiros não utilizam o mesmo critério para discutir a derrota eleitoral da esquerda petista, no estado de São Paulo. De toda forma, o problema não está no risco do isolamento, mas sim em buscar o isolamento sem necessidade.
Segmentos majoritários da classe trabalhadora têm vínculos de lealdade com o PT. E --talvez os companheiros não compreendam isto-- nós nos sentimos, nós somos parte do PT. Nós não fizemos entrismo no PT, nós não estamos no PT de passagem. Os companheiros acham que o processo de "adaptação" do PT já se concluiu, nós enxergamos de maneira diferente este processo.
O PSTU considera que sofreu uma derrota eleitoral em 1998, mas obteve uma "vitória política". Já a esquerda petista em SP teria sofrido uma derrota eleitoral, além de não ter nenhuma vitória política, "por não ter tido condições de aparecer com suas próprias posições".
A esquerda petista foi derrotada nas eleições em São Paulo, porque não elegeu nenhum dos três deputados federais que possuia e ainda perdeu um dos dois deputados estaduais. A causa fundamental da derrota foi o divisionismo no interior da esquerda petista: excesso de candidaturas, que nos levaram em conjunto a ter mais de 200 mil votos (mais que o PSTU em todo o  país) e a não eleger nenhum federal. Creditar nossa derrota a força ou aos esquemas eleitorais da direita partidária é, portanto, meia verdade.
Em segundo lugar, ao contrário do que os companheiros dizem, a esquerda petista é bastante conhecida, no partido e nos movimentos sociais. Não fosse assim, o próprio PSTU não nos daria tanta atenção. O fato de não termos "legenda própria" não significa que não tenhamos aparecido com nossas próprias posições. Perguntamos aos companheiros: a velha Convergência Socialista não defendia suas posições quando estava no PT?
Os companheiros dizem que "com a melhor das intenções, a esquerda petista segue construindo um partido reformista. Os companheiros não existem como uma referência pública conhecida, são partes do PT". Tudo absolutamente correto, exceto por duas coisas: primeiro, a esquerda petista possui sim uma "referência pública conhecida". Não fosse assim, a mídia e a direita do partido não falariam volta e meia em nos expulsar do Partido. Segundo, nós construímos um partido reformista com "a melhor das intenções" de operar, nele e a partir dele, uma política que nos permita aproveitar ao máximo a conjuntura que --nós e o PSTU-- achamos que está se abrindo.
Curiosamente, os companheiros falam tudo isso do PT e da esquerda petista, mas propõem construir uma "frente única revolucionária", que demoraria talvez anos para se concretizar. Ou seja: admitem, implicitamente, conviver por anos com um bando de reformistas, incrustrados num partido adaptado ao regime.
        O diagnóstico que vincula os problemas vividos pelo PT a traição de direções burocratizadas, distantes do povo, alienadas de seus compromissos com a Nação ou coisa que o valha, gera qual conclusão? Trocar a direção? Trocar de partido?
        Achamos que o problema é de maior profundidade, dizendo respeito ao comportamento da base social principal do PT, qual seja, os assalariados (operários ou não). A não ser que acreditemos --como faziam parte dos que romperam com o Partido Comunista nos anos 60- que os camponeses serão os principais protagonistas de uma revolução socialista no Brasil, o principal problema da esquerda brasileira não é o PT estrito senso, mas sim a classe dos trabalhadores assalariados.
A pergunta é: como colocar esta classe em movimento? Como fazê-la reassumir o protagonismo do final dos anos 70 e dos anos 80? É mais fácil fazer isto atuando no PT ou fora dele?
Ao dizer tudo isso, não desconhecemos que o PT está vivendo a fase final de um ciclo, que pode desdobrar-se numa cisão, no definhamento ou na mudança de qualidade. Mas queremos enfrentar este desafio dentro do PT, até porque estamos convencidos de que a existência do PT é um fator positivo para a luta socialista no Brasil.

Até porque não nos agrada a situação daqueles que, tendo vaticinado o esgotamento do PT, constróem toda sua política em torno de uma preocupação central: o que o PT deveria fazer? Já que a pergunta é esta, preferimos respondê-la dentro do próprio Partido.

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