Ao
presidente Rui Falcão
Reafirmando os termos da resposta ao convite para participar
do Conselho Consultivo da Presidência Nacional do PT, apresento a seguir minha
opinião sobre a situação política e as tarefas do Partido.
Para não repetir o que argumentei em vários textos
recentes*, organizei os argumentos deste com base no debate travado na recente
reunião do conselho curador da FPA.
1. Estamos sendo vítimas de uma operação de “cerco e aniquilamento”. Não estamos “apenas” diante do risco de perder o governo, agora ou em 2018. Nem “apenas” de levar uma sova nas municipais de 2016, apesar da ótima decisão do STF acerca do financiamento empresarial. Nem “apenas” diante da tragédia de ver nosso governo implementar, em crescente medida, o programa dos derrotados em 2014. Muito mais grave do que isto, estamos ameaçados de assistir a um retrocesso geral nas liberdades democráticas, nas condições de vida da classe trabalhadora e na política externa. Em particular, nosso Partido dos Trabalhadores e sua principal liderança estão sob ameaça de desmoralização e interdição.
2. Estamos sob ataque múltiplo. Não existe
uma única operação conduzida por uma única direita. O grande capital, o oligopólio
da mídia, a oposição de direita e inclusive setores da base do governo parecem cada
vez mais unificados quanto aos objetivos finais (realinhar o país com os EUA,
desfazer as conquistas populares, interditar a esquerda). Mas eles ainda estão
divididos quanto ao que fazer de imediato. Moro, Cunha, Renan, Temer, Aécio,
Serra, Alckmin etc. jogam papéis e expressam interesses diferentes, motivo pelo
qual apostam em roteiros diferenciados. Mas isto, que poderia ser um fator
positivo a nosso favor, converte-se na prática numa dificuldade adicional, uma
vez que não existe de nossa parte uma política coordenada e centralizada de
defesa. O que fica particularmente claro na nossa atitude (ou falta de)
frente a berlusconiana Operação Lava Jato.
3. A
manutenção da atual política econômica sabota o apoio popular ao governo. É muito
difícil termos êxito na defesa do governo e das liberdades democráticas, contra
as diferentes alternativas golpistas (impeachment, novas eleições, posse do
vice, parlamentarismo), sem que ocorra uma alteração imediata na política econômica.
É muito difícil engajar amplos setores populares em nossa defesa, se as ações
do governo contribuem para a recessão e o desemprego. É praticamente impossível
reavivar o apoio entusiasmado dos setores democráticos, quando os fatos apontam
no sentido de que o governo desrespeitou o voto popular, aplica o programa dos
derrotados, comete “estelionato eleitoral” como se diz cada vez mais. Lutaremos
contra o golpismo em qualquer caso, mas a política econômica reduz as chances
de êxito, tanto agora quanto depois.
4.Nosso
problema não é de “narrativa”. Ganhamos quatro eleições
presidenciais seguidas, não apenas devido aos nossos feitos, mas também devido
à narrativa
que contamos a respeito. Acontece que ganhamos a eleição em 2014 falando uma
coisa e iniciamos o governo fazendo exatamente o contrário. Quais as causas disto? Não basta falar da crise
internacional, da oposição de direita, dos erros do PT e da presidenta Dilma.
Há outro aspecto fundamental: o esgotamento da estratégia de conciliação. Por
isto, o que teria dado certo em 2003 não dará certo em 2015. Sem mudar de estratégia,
sem abandonar a conciliação e as ilusões nos inimigos, a política de “apoiar e
empurrar o governo” (para citar palavras ditas em recente reunião da FPA) vai
resultar apenas e tão somente em patinar.
5. Não
basta mudar a política econômica, é preciso mudar o conjunto da política. Mas insistir
na atual política econômica, convertendo o ministro Joaquim Levy (e os setores
do grande Capital que ele representa) em fiador de nossa continuidade no
governo, arrasta o governo, o PT e Lula para o fundo do poço. Os fatos já demonstraram que o ajuste não
resolve a questão fiscal nem contém a inflação, pelo contrário. Além disto, o ajuste derruba o crescimento,
provoca desemprego, reduz políticas sociais e salários. Cria um ambiente hostil
para o governo e também hostil para uma possível candidatura Lula em 2018. A
popularidade da principal liderança popular do país terá muita dificuldade de
resistir aos efeitos combinadas da atual política econômica, dos ataques da
mídia e da Operação Lava Jato.
6.É
preciso “romper o cerco”. Para usar uma analogia militar: se
ficarmos onde estamos, seremos destruídos. É preciso mudar de posição. Isto
parece arriscado e é. Mas muito mais arriscado é o imobilismo. Romper o cerco exige
escolher o ponto por onde vamos tentar escapar. Em minha opinião, o
ponto onde podemos romper o cerco com mais chances de êxito –tanto imediato quanto
posterior-- é a política econômica. É preciso mudar imediata e radicalmente a
política econômica. Mudar a política envolve alto risco, mas a alternativa em curso é
muitas vezes pior. Sem outra política econômica, tão cedo não haverá
reversão do quadro de recessão e desemprego. Quem acha errado dar “cavalo de pau” na
política econômica precisa lembrar que isto significa apenas e tão somente desfazer
o cavalo de pau dado após a eleição, na contramão da opinião majoritária
no eleitorado. Por outro lado, é preciso lembrar os efeitos positivos – tanto
econômicos quanto políticos—da inflexão que fizemos depois de 2005 e da reação
que tivemos frente a crise de 2008. Lá foi necessária uma inflexão. Agora será
preciso algo mais. Por fim: sem mudar a política, não há como mudar o discurso
atual, que piora o que já é ruim, que joga para baixo nosso ânimo.
7.É
possível fazer diferente. Embora vá ser muito difícil, não é verdade
que não tenhamos força para fazer diferente. Muito menos é verdade que não
saibamos o que fazer. Sem prejuízo de discutir a proposta econômica debatida
pela CUT e a que vem sendo debatida com a participação da FPA, no curto prazo o
que necessitamos é – em grande medida-- retomar, aprofundar e principalmente atualizar
um caminho que já começamos a trilhar antes e ideias que foram apresentadas
durante a campanha de 2014. Do ponto de vista emergencial, trata-se de reduzir
a taxa de juros, alongar o pagamento da dívida pública, estabelecer controle de
câmbio, lançar mão das reservas internacionais, tributar fortemente as grandes
fortunas, cumprir o orçamento, retomar o papel da Petrobrás e do Minha Casa
Minha Vida. Numa palavra, parar o ajuste e colocar o Estado à serviço
do crescimento com e através da distribuição de renda. Quanto ao
desenho geral de nossa alternativa: a) sem indústria forte e tecnologicamente
avançada, não há como implementar nosso programa e estratégia; b) sem um setor
financeiro poderoso e público, não teremos capital para fazê-lo; c) sem
resolver a questão agrária e universalizar as políticas sociais, será
impossível conciliar desenvolvimento econômico com elevação do bem-estar social;
d) sem fazer tudo isto junto e misturado, será impossível no médio prazo
derrotar a direita e sua ofensiva contra as liberdades democráticas conquistadas
pela classe trabalhadora, nem tampouco sustentar uma política externa soberana
e de integração regional.
8.Ao
mesmo tempo que buscamos convencer o governo a mudar de política, o Partido
precisa subir muito o tom contra o golpismo. Para além do que se
faça no Congresso Nacional para garantir uma minoria de parlamentares que
impeça a aprovação do impeachment;
para além das mobilizações que a Frente Brasil Popular está convocando; é
preciso que o PT deixe claro para nossa base social e militante que estamos sob
risco
iminente. Temos que desencadear esta semana uma vigília permanente em defesa das
liberdades democráticas e contra o golpismo. Ao mesmo tempo, precisamos
fazer a direita perceber que haverá muita resistência. Gestos simbólicos
– como esvaziar os “pixulecos” -- devem ser estimulados publicamente. Nossos parlamentares
precisam mudar de postura e dar exemplo de combatividade. Não podemos deixar
nenhum ataque sem resposta. E basta de ilusões acerca do que está em jogo, não
apenas em relação ao governo, mas também em relação ao PT e Lula. É verdade que
não estamos em 1947 nem em 1964; mas também é verdade que nas duas ocasiões a maior
parte da esquerda demorou muito a perceber qual a real disposição da direita, o
que contribuiu para o desfecho.
9.Do
ponto de vista institucional, a resistência inclui mudar a postura política e pública
do governo. Um exemplo: a presidenta não apenas precisa
vetar o financiamento empresarial, mas ir a público deixar claro os motivos. E
devemos nos preparar para a reação de Cunha et
caterva à decisão do STF, reação que será muito dura e envolverá chantagem
política. Outro exemplo: ou o ministro
da Justiça muda ou muda o ministro da Justiça. Não é possível aceitar impassível
o comportamento predominante em setores da Justiça, do MP e da Polícia Federal,
em conluio com determinados meios de comunicação, a começar por conhecida
empresa criminosa que se fantasia de revista semanal. A atitude do Ministro da
Justiça não é republicana, nem democrática, nem imparcial: se fosse, deveria
garantir o acesso público a todas as informações, não assistir impassível o
vazamento seletivo para as Veja da
vida, nem o comportamento partidarizado de setores da PF, do MP e da
Justiça.
10. O
PT precisa reocupar espaço, tomar partido nos grandes debates, opinar e
inclusive disputar o governo. Entre as muitas coisas que
devem ser feitas, cito uma: construir imediatamente uma “agência de notícias”,
articulada com as várias iniciativas de comunicação da Frente Brasil Popular,
com a Rede Brasil Atual, com a imprensa sindical e popular. Basta de reclamar
que o PIG não divulga o nosso ponto de vista, façamos nós por nossas mãos o que
pode, deve e precisa ser feito. Mas para isto a política de comunicação do
Partido precisa ser outra, completamente diferente da atual. Vale
dizer, contudo, que o principal problema de comunicação do PT está na linha
política (ou na falta de linha) adotada.
11.Aos
inimigos nada, mas aos nossos amigos devemos desculpas e explicações. A
direita nos ataca por nossos acertos e deles não temos que fazer autocrítica.
Mas amplos setores democráticos e populares estão decepcionados conosco devido
aos nossos erros, ao que fizemos e deixamos de fazer. É para estes setores democráticos
e populares que estamos devendo uma autocrítica, principalmente devido à
promiscuidade com a direita e suas práticas; bem como devido à insistência na
já citada estratégia de conciliação. O
PT não deve temer autocrítica. O que não faremos – ao contrário do que a
direita pede e alguns ensaiam-- é pedir desculpas pelo que fizemos de certo,
pedir desculpas pelo que somos, pedir desculpas por nossa história.
12.Temos
que ampliar a presença do PT na construção da Frente Brasil Popular. Parte
do êxito da Frente Brasil Popular dependerá de ampliarmos o engajamento da CUT,
da UNE, do MST, do PT e do PCdoB. De imediato devemos jogar muito peso na
mobilização do dia 3 de outubro, relacionada à defesa da Petrobrás. Na
mesma linha, devemos dar toda atenção para o próximo Congresso nacional da CUT,
cuja posição frente à conjuntura tem sido globalmente correta e continuará
sendo extremamente importante.
13.Resumidamente:
para derrotar a direita, é preciso derrotar a inação e a alienação. A alienação dos que minimizam os riscos e a
inação dos que acham que a situação estaria tão ruim, que seria melhor não se mexer.
É fato que a situação mudou para pior, desde o início do ano. Nosso partido
deve reconhecer esta mudança e convocar um encontro nacional extraordinário: com
outra linha e outro comportamento, temos como vencer mais uma vez.
Saudações petistas
Campinas, 20 de setembro
Valter Pomar
*suponho que você já conheça os textos “O que não fazer” (http://www.valterpomar.blogspot.com.br/2015/08/contribuicao-ao-seminario-de.html); “O
Partido dos Trabalhadores precisa defender outro caminho” (http://www.valterpomar.blogspot.com.br/2015/09/o-partido-dos-trabalhadores-precisa.html); e
“Contribuição à discussão” (http://www.valterpomar.blogspot.com.br/2015/09/contribuicao-discussao.html).
Neles desenvolvo melhor as questões tratadas nesta contribuição ao conselho
consultivo da presidência do Partido.
Bravo Valter. É assim que se faz!
ResponderExcluirBravo Valter. É assim que se faz!
ResponderExcluirNão basta desfazer o Cavalo de Pau. É preciso deixar claro não só o "novo" caminho, como as razões que fazem do antigo caminho, um erro enorme.
ResponderExcluirPrecisamos de uma nova visão de país. De uma nova utopia (Lula que disse isso, não?).
A lei de responsabilidade fiscal não permite essa alternativa de parar os cortes. Iria todo mundo em cana
ResponderExcluirPerfeito o item 4
ResponderExcluirNem uma palavra de apoio a Vaccari ? Ingratos.
ResponderExcluirBando de ladrões. Roubam a Petrobrás e depois hipocritamente falam em defendê-la.
ResponderExcluirQuem quebrou a Petrobrás se não foi o PT? Quem roubou a Petrobrás se não foi o PT?
ResponderExcluirQuem é golpista? O PT agitou o Fora Sarney, Fora FHC e Fora Collor. Sempre perseguiu o poder de qualquer forma, como as últimas eleições fraudadas. Golpistas são vocês, stalinistas de merda, primos dos nazistas.