Primeiro, uma preliminar: devemos trabalhar para que os governos do Brasil e da Venezuela voltem a ter boas relações.
Boas relações não é concordar em tudo. Nunca foi e nunca será isso.
Boas relações é, por exemplo, não trocar ataques pelos meios de comunicação, não aprovar resoluções mutuamente condenatórias, não convocar os respectivos embaixadores para esclarecimentos, não questionar o funcionamento das respectivas instituições, não vetar a participação em organismos internacionais etc.
Trabalhar por boas relações é essencial, ao menos para quem defende a integração regional latinoamericana e caribenha.
Hoje, a integração passa por dificuldades. E um dos motivos disto é que a esquerda regional passa por dificuldades e, além disso, está atravessada por crescentes conflitos entre suas lideranças e seus partidos.
No passado, a sinergia entre os governos de esquerda e progressistas foi fundamental para o sucesso da integração regional. Assim como foi fundamental a sinergia entre os partidos governantes, especialmente no terreno do Foro de São Paulo.
Hoje, esta sinergia é menor que antes.
Há muitas ações que podem ser feitas para mudar esta situação. Uma delas é melhorar as relações entre Brasil e Venezuela. E para que isso seja possível, um bom ponto de partida é parar de achar que só uma das partes comete erros.
Nesse sentido, não concordo com a embocadura de Marcelo Zero no artigo Alguns esclarecimentos sobre a Venezuela | Brasil 247.
Assim como não fiquei satisfeito com o depoimento de Celso Amorim na Câmara do Deputados (embora nesse caso se deva dar os descontos devidos ao ambiente onde o depoimento foi feito).
Sobre Celso, ler aqui:
Seja como for, a postura correta, na minha opinião, é admitir que erros foram cometidos por todas as partes envolvidas e discutir, não sobre esses erros, mas sobre como fazer para recompor.
Se estou falando em erros, por óbvio estou tratando de relações entre amigos. Amigos também fazem merda.
Este é um dos motivos pelos quais acho, pior que um crime, um erro, adotar teorias conspiratórias. Foi isso que disse no artigo Venezuela: tirem as crianças e a política da sala | Brasil 247
Este artigo foi criticado - surprise!!! - pelo Diário da Causa Operária aqui: Não é 'teoria', imperialismo está conspirando contra a Venezuela - Diário Causa Operária
Segundo está escrito neste artigo, "o problema não é a colocação do procurador, ainda que ela possa ser exagerada ou errada", "a discussão mais importante não é se o acidente foi ou não real", pois " seja lá qual foi o acidente de Lula", "objetivamente a ausência de Lula nos BRICS revela a política covarde do governo".
Pergunto: se alguém acusa alguém de agente da Gestapo, não importa se isto é verdade ou não?
Óbvio que algumas aparências ganham vida própria, conspirações existem, o imperialismo e a CIA operam pesadamente, atacar a Venezuela objetivamente ajuda os Estados Unidos etc.
Mas nada disto torna irrelevante saber se algo foi ou não real, se alguma coisa aconteceu ou não, sob pena de fazermos raciocínios absurdos tais como está na frase "objetivamente a ausência de Lula nos BRICS revela a política covarde do governo".
"Objetivamente" a ausência de Lula "revela" que ele sofreu um acidente e não podia viajar.
A ausência teve efeitos ruins? Sim! Como disse no artigo citado acima, a ausência de Lula "causou prejuízos para o Brasil, que teria podido ter maior protagonismo na reunião de Kazan. Além disso, a ausência de Lula pode ter contribuído para o incorreto tratamento dado à Venezuela".
A política do governo na reunião de Kazan foi, na minha opinião, errada. Foi errado vetar a inclusão da Venezuela na lista. Isso ajudou os EUA? Sim. Mas nem todo mundo que objetivamente ajuda os EUA é agente da CIA.
Por exemplo, neste momento o discurso conspiratório contribui para escalar um conflito que precisamos superar. Mas, como já disse, as vezes até os amigos fazem merda. Nem por isso deixam de ser amigos. Por isso, como disse no início, se queremos derrotar o imperialismo, devemos trabalhar para que os governos do Brasil e da Venezuela voltem a ter boas relações.
O resto é o resto.
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