domingo, 13 de outubro de 2024

Eleições 2024: a “teoria” Pędłowski

Quem venceu as eleições de 2024? Depende do resultado do segundo turno.

Quem venceu o primeiro turno? Quem teve mais votos, conquistou mais prefeituras e mandatos de vereança, ou seja, o campo político que vai da centro-direita até a extrema-direita.

Entre os que admitem isso, há quem acrescente três complementos:

-que o PT não teria vencido, mas também não teria sido derrotado;

-que a vitória teria sido da “democracia”;

-que o governo Lula teria saído vitorioso.

O primeiro complemento não encontra amparo nos dados divulgados pelo Grupo de Trabalho Eleitoral do PT (GTE).

Segundo o GTE, "em 2020, o PT estava presente em 1.584 municípios, elegendo 183 prefeitos e prefeitas, 206 vices em coligação com aliados, e 2.663 vereadores e vereadoras. Agora, elegendo 248 prefeitos(as), 222 vices e 3.118 vereadores(as), além dos 13 municípios em que vai disputar o segundo turno. O PT estará presente em 1.742 municípios". 

Também segundo o GTE, o PT recebeu 6.909.779 votos em 2020 e 8.884.677 votos em 2024. 

Mesmo considerando que o eleitorado total de 2024 é maior do que o de 2020,  o PT cresceu. Isto é verdade. E se o PT fosse uma pessoa buscando superar seus próprios problemas, o resultado da eleição de 2024 teria sido, sem dúvida, um progresso em relação a 2024.

Mas o PT não é uma pessoa buscando superar suas próprias metas, o PT é um partido em luta contra outros. E o problema é que estes outros partidos cresceram muito mais do que nós. 

Em números absolutos de votos válidos, o PT ficou em sexto lugar, atrás do PL, do PSD, do MDB, do União e do PP. E se considerarmos apenas estes 6 partidos, o PT ficou em quinto lugar em taxa de crescimento. O PT cresceu 25% em relação a 2020. Já o PL cresceu 233%, o PSD cresceu 33%, o MDB cresceu 30% e o PP cresceu 29%.

Além disso, o PT conquistou 183 prefeituras em 2020. Acontece que muitos prefeitos se filiaram ao PT, antes da eleição de 2024. Quando a campanha de 2024 começou, tínhamos 265 prefeituras. E na eleição de 2024, conquistamos 248 prefeituras. Logo, se for para ser rigoroso, não teríamos crescido 82, teríamos diminuído 17 prefeituras...

Além disso, 188 destas prefeituras são em cidades com menos de 20 mil habitantes. E só 2 ficam em cidades com mais de 200 mil habitantes. Claro, isto pode mudar drasticamente a depender do que ocorra no segundo turno. Mas os números realmente existentes não autorizam falar em vitória ou crescimento do PT.

Já a ideia de que a vitória teria sido da “democracia” parte do pressuposto de que golpistas seriam os do 8 de janeiro, a turma do cavernícola e do boçal. Já os demais setores da direita seriam democratas.

Aceito este pressuposto, restaria verificar qual foi o desempenho - no primeiro turno - das candidaturas ligadas explicitamente à extrema-direita. 

O Partido Liberal, por exemplo, foi o que recebeu maior número de votos entre todos os partidos. Ademais, o PL cresceu 233% em relação ao resultado obtido nas eleições de 2020. Se a isso acrescentarmos resultados como os obtidos pelo boçal na eleição de São Paulo capital, a conclusão é que é a extrema-direita cresceu, mesmo estando fora do governo. 

Por outro lado, cabe questionar o pressuposto apontado anteriormente. Em muitas cidades do país, houve alianças de primeiro turno entre direita e extrema-direita. Em São Paulo capital, por exemplo, Nunes foi apoiado por Bolsonaro. O mesmo vale para Melo, em Porto Alegre. A lista é imensa. Ou seja: a direita "democrática" no Brasil não é tão democrática assim.

Claro, há quem pense o contrário, como é o caso do ex-deputado federal João Paulo Cunha, que já está defendendo que Lira entre no governo Lula. 

A entrevista de Cunha está aqui: Estadão 🗞 | ENTREVISTA | Integrante da “velha guarda” do PT, o ex-presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha atua cada vez mais nos bastidores… | Instagram

Sobre o governo Lula, há quem lembre que as eleições são municipais: não estavam diretamente em jogo nem o governo, nem Lula. 

Além disso, há quem diga que como o governo de Lula é de “frente ampla”, ele só poderia ser considerado derrotado se candidaturas explicitamente oposicionistas tivessem sido vitoriosas.

Finalmente e paradoxalmente, há quem argumente que mesmo um resultado final problemático poderia ser revigorante para uma candidatura de Lula à reeleição, em 2026.

Os resultados do segundo turno vão responder se estes argumentos e outros similares procedem ou não. Mas não é preciso esperar o dia 27/10 para discutir a procedência da “teoria Pedlowski”.

A tal “teoria” está exposta aqui: 

https://blogdopedlowski.com/2024/10/12/apesar-das-aparencias-lula-foi-o-grande-vencedor-do-1o-turno-das-eleicoes-municipais/

Reproduzo abaixo dois trechos representativos desta teoria: 

-“avalio que a estratégia eleitoral determinada por Lula e pela cúpula dirigente do PT era algo que ia no sentido de “entrar em campo para jogar, fingindo que se quer ganhar, mas  fazendo uma força danada para perder”;

-“discordo de quem diz que a política da “Frente Ampla” de Lula foi derrotada no primeiro turno das eleições municipais de 2024. Na verdade, essa política ficou fortalecida ao apontar para um cenário em 2026 em que novamente será o PT (e seus aliados) contra o conveniente fantasma da extrema-direita”.

Segundo a “teoria” acima, queríamos perder. Logo, os erros cometidos pelo PT e pelo governo Lula teriam sido propositais; e as derrotas teriam sido autoinflingidas.

O incrível nesta “teoria” não é sua semelhança com as narrativas conspiratórias que se escutam, por exemplo, na Jovem Pan. 

O incrível é que seu autor não perceba que, a depender dos resultados dos dois turnos de 2024, o que poderemos enfrentar em 2026 é uma “frente ampla” sem o PT e contra o PT.





3 comentários:

  1. Teorias conspiratórias aparecem quando não há uma explicação satisfatória e racional.
    "Os olhos são as janelas da alma. Se o que vê são trevas, que trevas hão em ti?" - disse um cara na Palestina romana.
    Os dados ainda estão rolando.
    Desculpa, mas o ponto é que Lula precisa entregar a tabela de IR que prometeu para virar a ZL.
    POA é mais difícil de entender e cientificamente só Freud explica.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. O artigo de Marcos Pędłowski parece-me uma provocação que combina desencanto, ironia com pitadas de sarcasmo e, sobretudo, realismo.
    Olhando daqui e lançando mão de uma metáfora ecológica, minha hipótese é a de que o Partido do Trabalhadores, a agremiação eleitoral comandada por Luiz Inácio, atingiu, ideológica e politicamente, o ponto de não retorno.
    Na devastação da outrora bem nutrida floresta do PT, o que restou de comunistas é feito o bugio-ruivo e o sagüi-da-serra[Sou pela volta do trema.], espécies em grande risco de extinção em Pindorama.
    Entende-se que os primatas supracitados não consigam se adaptar e, portanto, não tenham para onde correr. O que me intriga é a aparente incapacidade de homines sapientes comunas de procurar outros rumos e construir novo ambiente.
    Questões afetivas? Perde de prestígio e espaço?
    Saberás...
    Do artigo de Marcos Pędłowski, destaco dois parágrafos.
    Seguem abaixo.
    ...
    Alguém pode me perguntar como é que eu possa estar fazendo este tipo de análise contra um presidente tão com cara de esquerda como Lula. O problema é que tanto Lula quanto a direção do PT já abandonaram o campo da esquerda faz algum tempo (eu diria que desde a Carta aos Brasileiros de 2002). O que restou do velho PT foi um simulacro de partido de esquerda que em alguns aspectos está mais à direita do que o Partido Democrata está nos EUA.
    (...)
    O fato é que a primeira tarefa de quem realmente deseja mudar o cenário político brasileiro e movê-lo para a esquerda é superar toda e qualquer ilusão em Lula. Com isso será possível liberar as forças populares da paralisia que lhes é imposta por Lula e pelo PT. Essa, convenhamos, não será uma tarefa fácil, pois basta ver o que foi feito para desmoralizar quadros emergentes da esquerda como era o caso de Marcelo Freixo e Guilherme Boulos, ou para abandonar e deixar à mercê da direita uma liderança ascendente como Glauber Braga.
    ...
    E, por minha conta, acrescento trecho de um artigo de Paulo Kliass, escrito em 2022.
    Eis:
    “Tendo em vista a imensa assimetria de forças que se verifica entre o candidato e seu partido, ocorre que o ex-presidente acumula para si a capacidade de decisão sobre questões essenciais de sua campanha e mesmo da estratégia eleitoral. Esse foi o caso, por exemplo, da escolha de seu vice-presidente e da definição das orientações para a concretização das alianças políticas e eleitorais nos Estados da federação. O candidato conta com um grande grau de liberdade para tomar as decisões e, caso necessário, depois o Partido dos Trabalhadores (PT) monta um jogo de cena para referendar as opções, já implementadas por Lula, em suas próprias instâncias internas de decisão.”
    Bem me lembro.
    Quando a vice para Geraldo “Picolé de Chuchu” Alckmin era, pra qualquer um com algum ouvido para captar como a banda toca, Valter Pomar e Breno Altman insistiam em dizer que nada estava decidido, que o Diretório Nacional(ou coisa que o valha) teria a última palavra.
    (Jucemir Rodrigues da Silva)

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