quinta-feira, 18 de abril de 2024

Aventuras do PT na China (parte 10)

 

A comitiva do PT que está em visita a China está agora em Shangai. Como em todas as outras cidades, fomos hospedados num hotel de primeira categoria. O que só está sendo possível porque a parte chinesa está pagando, assim como pagaram as passagens de avião, os deslocamentos internos e as refeições. 

O hotel de Shangai fica na parte da cidade outrora ocupada pelos franceses. Quem não lembra, aqui vai: desde a Guerra do Ópio (1840), os chineses foram militarmente derrotados por diversas vezes. E, ao final de cada guerra, uma das imposições dos vencedores era ocupar – com direitos de extraterritorialidade – cidades, pedaços de cidade, portos etc. Na prática, era como se uma parte do território da China fosse considerado território francês, ou britânico, ou russo, ou austro-hungaro, ou germânico, ou estadounidense, ou japonês. Não uma embaixada, mas quarteirões e quarteirões.

No caso de Shangai, na denominada “concessão” francesa, ficou famosa uma placa posta na entrada de um parque público: não são admitidos cachorros e chineses. Hoje, no mesmo lugar onde estava a escandalosa placa, está um impressionante museu da história da cidade.

E por falar em coisas impressionantes, a China é o paraíso dos trem bala, das gruas em operação, dos viadutos floridos, dos museus e show-rooms. 



Em todas as cidades e em todas as empresas que fomos, há um amplo espaço onde se conta a história da respectiva instituição, entremeada sempre com a história do país. E com direito a generoso espaço para as decisões do Partido Comunista e – no caso das cidades que visitamos – para o pensamento de Xi Jinping. Por exemplo: os investimentos se fazem em todos os países, mas os empresário tem nacionalidade e precisam ser patriotas.

Tanto museus quanto showrooms usam técnicas “da hora”. E isto está ligado, como é óbvio, ao esforço que os chineses seguem fazendo no sentido de modernizar e desenvolver o país.

Curiosamente, uma pesquisa nas redes geralmente atribui esta iniciativa ao camarada Xi ou ao camarada Deng, mas na verdade desde pelo menos 1964 o PCCh vem perseguindo as "quatro modernizações": da agricultura, da indústria, da defesa, da ciência e tecnologia. 

A rigor, o que a China segue fazendo – em 2024 – é implementar o programa da Nova Democracia, formulado no início dos anos 1940 por Mao e aprovado pelo Partido. Que tenham havido zigue-zagues e delays imenso não altera a existência de um fio de continuidade. A China moderna não é obra de Confúcio, mas sim da revolução e da tradição marxista. Fato que os chineses reiteram o tempo todo, aliás.

O desenvolvimento das forças produtivas é apresentado, sempre, em combinação com a planificação. No Museu da Cidade de Xangai, por exemplo, há planos urbanos que vão até 2050 e além...

Vale dizer que nos apresentaram Shangai como uma cidade “jovem”, com “apenas” 600 anos, mais ou menos. Jovem, mas fundamental na história chinesa. Foi em Shangai que o PCCh foi fundado, exatamente dentro de uma “concessão”. Foi também em Shangai que nasceu Li Peng, que saiu do comando da cidade para o primeiro posto do Partido Comunista da China, logo depois do Incidente de Tianamen (ou, na versão dos críticos, o “massacre da praça da paz celestial”.

Em 2004, a delegação do PT foi levada a conhecer Pu Dong, uma antiga vila de pescadores, convertida em pólo de desenvolvimento científico-tecnólogico. Em 2024, a delegação foi levada a conhecer Yangshan, um novo distrito industrial, também construído a partir do zero e hoje convertido numa cidade com 450 mil residentes e 150 mil trabalhadores. 

Não tem nada que ver com os distritos industriais existentes no Brasil. Trata-se de uma cidade, com todas as comodidades e, também, com muitas belezas paisagísticas e arquitetônicas,

A maior parte da construção de Yangshan transcorreu nos últimos 5 anos, entre 2019 e 2024; hoje há cerca de 400 empresas atuando lá.  É em Yangshan (cuja tradução seria “pingo dágua”, devido a um imenso lago artificial construído no local) que fica o talvez maior porto de águas profundas do mundo. Lá visitamos uma fábrica de chips (Versilicon) e uma fábrica de robôs (Siasun). Também por lá fica uma fábrica da Tesla, com 28 mil trabalhadores.

Sim ladys and gentleman, a Tesla está na China, com direito a presença do sindicato e de uma célula do PCCh. Elon Musk, pelo visto, tem critérios mais elásticos do que se depreende, quando se observa sua campanha pela “liberdade irrestrita” do X no Brasil.

O PCCh tem, no distrito de Yangshan, 4.300 militantes. Cerca de 10% daqueles 4.300 são o que chamaríamos, no Brasil, de “profissionalizados”. Mas a maioria desses profissionalizados tem tarefas públicas, não apenas internas e organizativas. O chefe do Partido no distrito, por exemplo, responde pelo desenvolvimento global do distrito.

O chefe local do Partido, que nos recebeu, tem 58 anos, entrou no Partido em 1990. Quase desistiu, porque o processo de seleção é muito rigoroso, as vezes dura 5 anos. Ele acrescentou o seguinte: é muito difícil entrar no Partido e é muito difícil voltar ao Partido, caso a pessoa tenha saído por vontade própria ou se sido expulsa.

Como se pode constatar, é uma situação "quase igual" a como funciona um certo partido latino-americano. Pano rápido, voltaremos depois com mais um relato.

ps. este texto foi postado duas vezes. Na primeira vez, com o título errado. Foi um ato falho. Aventuras de um chinês na China é um texto do Júlio Verne, publicado em 1879 e, no meu caso, lido nos anos 1970.

ps2. nos anos 1970, Pedro Pomar esteve na China, para um encontro com Chu Enlai (ver foto abaixo), com o objetivo de informar sobre a Guerrilha do Araguaia. O tradutor deste encontro, um cidadão chamado Guo, também contribuiu na tradução de duas outras visitas - feitas por Wladimir e Rachel Pomar - no início dos anos 1980, sendo uma delas a primeira visita oficial do PT à China. Pois bem: Guo -que aparece na foto abaixo - está com seus oitenta e tantos anos e manda lembranças para os amigos brasileiros.









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