A direção nacional da tendência petista Articulação de Esquerda, reunida no dia 25 de abril, aprovou a seguinte resolução sobre conjuntura e tática.
1/No final do mês de abril, o Brasil já terá mais de 400 mil
compatriotas mortos pela Covid 19 grande parte dos quais poderia ter sobrevivido,
se as políticas do governo Bolsonaro e de seus aliados fossem outras. Não
apenas a política sanitária, mas também a política econômica e social, que jogou
dezenas de milhões na fome e no desemprego, resiste à concessão de um auxílio
emergencial adequado e capaz de salvar vidas enquanto durar a pandemia. Esta
política também ajuda o Covid 19: o negacionismo e o austericídio resultam no
genocídio.
2/Nos próximos dias, semanas e meses, a crise deve se aprofundar.
O governo Bolsonaro estimula isto, propositalmente. A pandemia facilita ao governo
“passar a boiada”, inclusive no Congresso, onde medidas neoliberais são aprovadas
uma atrás da outra. A pandemia dificulta a mobilização de quem é contra Bolsonaro,
além de criar imensas dificuldades administrativas e políticas para os
governadores e prefeitos que têm um mínimo de preocupação com a sobrevivência
do povo brasileiro. Ao mesmo tempo, a pandemia joga no desespero aqueles setores
sociais que – na ausência de um auxílio emergencial adequado – não têm como
sobreviver e, por isso, conflitam com as medidas de isolamento social
indispensáveis para conter a pandemia enquanto a vacinação não garantir a
imunização. Vacinação que, devido as ações e inações de Bolsonaro, caminha
lentamente.
3/É neste contexto que, de 8 de março a 22 de abril de 2021, o
Supremo Tribunal Federal tomou decisões que devolveram os direitos políticos ao
ex-presidente Lula. Ao reconhecer que Lula não poderia ter sido julgado pela
vara de Curitiba e que Moro era suspeito, o STF na prática confirmou que a
eleição de Bolsonaro foi resultado de uma fraude. Se Lula tivesse sido
candidato a presidente em 2018, o resultado da eleição teria sido outro. E todo
o desastre que veio depois poderia ter sido evitado. Inclusive por isto, a
decisão do STF não foi uma “vitória da lei e do direito”, muito menos uma
demonstração de que “ainda existem juízes em Brasília”.
4/Todo o mundo jurídico, inclusive
os lavajatistas, sabiam que estavam “no limite” ou mesmo “fora-da-lei”. Mas é a
luta quem faz e interpreta a lei. Foi a correlação de forças criada a partir de
2015 que criou as condições para a condenação, prisão e interdição da
candidatura de Lula. E foi a alteração na correlação de forças, criada a partir
da crise sanitária, econômica e social gestada pelo governo Bolsonaro e por
seus aliados, que criou as condições para que o mesmo Supremo que ontem
avalizou a condenação de Lula, hoje a tenha revertido (aliás, um Supremo em
certo sentido pior, pois inclui ministros nomeados por Temer e Bolsonaro, que só
puderam fazê-lo graças ao golpismo). Ademais, é importante lembrar que a
correlação de forças não é um fenômeno natural, é produto da ação das forças
políticas e sociais. Foi a disputa entre as diferentes facções da quadrilha
golpista, por um lado, e a pressão dos setores democráticos e populares, de outro
lado, que criaram as condições para as várias decisões adotadas pelo STF desde
8 de março de 2021. Por isso, sigamos vigilantes, para que não nos tirem com
uma mão o que foram forçados a nos devolver com a outra.
5/Até porque decisão do STF não significa o fim do lawfare
lavajatista, que continua através dos inúmeros processos judiciais que seguem
em curso contra Lula e, também, continua através dos processos contra outras
lideranças da esquerda (por exemplo, José Gabrielli, ex-presidente da
Petrobrás). Vale lembrar, ainda, das prisões e condenações contra militantes,
assim como vale recordar que estão em curso mudanças legislativas negativas
para a democracia, como a prisão em segunda instância e a aprovação de uma Lei
de defesa do estado democrático de direito que preserva inúmeros dispositivos da
execrável Lei de Segurança Nacional.
6/Seja como for, a devolução dos direitos políticos de Lula amplia
em muito a possibilidade de a esquerda vencer as próximas eleições
presidenciais. Nesse sentido, fizeram muito bem os integrantes da Campanha Lula
Livre e todos aqueles que em nenhum momento aceitaram “virar a página”. Mas
atenção: como é óbvio, as forças políticas e sociais que articularam o golpe de
2016, a condenação/prisão/interdição de Lula e a fraude de 2018 não assistirão
passivas a esta situação. A primeira destas forças golpistas é o governo dos Estados
Unidos. Cabe lembrar que o golpe de 2016 contou com a cumplicidade dos EUA, que
depois da crise de 2008 precisava recuperar o controle do Brasil e de outras
regiões da América Latina e Caribe. Aliás, o vice de Obama na época do golpe
contra Dilma é o atual presidente dos EUA. Pouco importa se Biden está sendo ou
não “progressista” dentro dos Estados Unidos; o que importa é que, por razões
geopolíticas, o governo Biden já está operando contra a volta do PT ao governo,
para impedir que haja no Brasil um governo aliado com a China e a Rússia, com
Cuba e Venezuela. Similar ao que fizeram na fase final da ditadura militar
brasileira, quando os EUA apostaram numa saída “liberal” (hoje se diria: “progressista”),
em 2021 os EUA estão estimulando uma “terceira via” (nem Bolsonaro, nem Lula). Inclusive
por estes motivos, nossa luta para derrotar Bolsonaro, seu governo e suas
políticas, bem como nossa luta para fazer a esquerda voltar a governar o Brasil
não deve se iludir com nenhum tipo de “ajuda” ou “neutralidade” dos EUA. Pelo
contrário, o imperialismo seguirá... imperialista.
7/Em 2002, contribuiu para a nossa vitória o fato de os EUA
estarem envolvidos em responder aos “ataques terroristas”, sendo a América
Latina um território secundário. Hoje os EUA dão maior importância para o
controle da região. Por outro lado, em 2002 contribuiu muito para a nossa
vitória o imenso desgaste acumulado pelos governos tucanos; e o acúmulo de
forças prévio da esquerda brasileira, desde os anos 1980, com destaque para a
influência organizada do petismo e de Lula. Em 2021, o governo Bolsonaro
enfrenta um grande desgaste. Mas isto ainda não foi suficiente para interromper
o governo genocida, nem o impede de seguir praticando genocídio e ameaçando as
liberdades democráticas, inclusive lançado mão de mensagens milicianas (como o fez
no caso do “cpf cancelado”). Se as eleições presidenciais fossem hoje, as
pesquisas indicam que Bolsonaro teria condições de chegar ao segundo turno. Até
porque ele mantém a mobilização, nas redes e nas ruas, de seus apoiadores de
extrema direita; enquanto a esquerda está, na maioria das vezes, ausente das
ruas.
8/Por estes e outros motivos, se queremos derrotar Bolsonaro,
agora ou nas próximas eleições; e se queremos derrotar não apenas Bolsonaro,
mas também o bolsonarismo e a direita neoliberal, é necessário ampliar muito a
luta política e ideológica. E para isso é preciso que também haja mobilização
popular orientada por uma linha política adequada. Acontece que desde 2011 o
campo democrático e popular vem desacumulando forças (diferente do ocorrido
entre 1998 e 2002). Para que esta situação se altere, é imprescindível que 2021
e 2022 sejam anos de muita luta política e social, com muita mobilização. O que
– por diversos motivos – não está ocorrendo.
9/As lutas de várias categorias (por exemplo, reivindicando vacina),
as campanhas de solidariedade, a evolução da opinião pública nas redes sociais
etc. certamente contribuem para acumular forças. Mas não acumulam forças na
quantidade e na qualidade necessárias para vencermos as próximas eleições
presidenciais (e principalmente para governar depois).
10/Parte da esquerda não percebe isso, ou pelo menos não dá a importância
devida para estes fatos, porque se dá por satisfeita com as pesquisas que
apontam a vitória de Lula sobre Bolsonaro nas próximas eleições presidenciais.
Estas pesquisas são reais: se as eleições fossem hoje, Lula venceria de
Bolsonaro. Mas as eleições não são hoje. A situação pode melhorar para
Bolsonaro, especialmente se a pandemia refluir, se a economia melhorar, se
Bolsonaro continuar mantendo mobilizado seu núcleo duro de extrema direita,
além de continuar pagando o aluguel do “centrão”. Além disso, pode vir a ser constituída uma
candidatura forte da direita neoliberal. E pode haver uma nova “operação
especial” para tirar Lula da disputa. Vale sempre lembrar que a classe
dominante já demonstrou do que é capaz para nos derrotar. Por tudo isso, não
devemos subestimar Bolsonaro e a extrema-direita; nem devemos subestimar a
direita neoliberal. Aliás, a sensação de que Lula pode vencer a próxima eleição
leva a direita neoliberal a considerar inclusive dar seu apoio ao “coronel que
foi para Paris”. Neste sentido, a recente contratação de João Santana para “marqueteiro”
de Ciro Gomes não deve ser subestimada.
11/Tampouco devemos superestimar as nossas forças. Devemos seguir lutando
por vacina, por auxílio emergencial, por emprego, por democracia, e devemos
sempre combinar estas e outras lutas com a agitação pelo Fora Bolsonaro, com
ações concretas pelo impeachment do cavernícola. Em primeiro lugar, porque cada
dia de Bolsonaro na presidência contribui para a morte e a dor de nosso povo.
Em segundo lugar, porque o tempo pode ser útil para que as direitas construam
suas alternativas. A melhor hora de enfrentar e derrotar Bolsonaro pode ser
agora. Um motivo a mais pelo qual é urgente construir um comando unificado do
campo democrático-popular e de esquerda, que tenha disposição real de mobilizar
agora pelo fim imediato do governo Bolsonaro e de suas políticas.
12/Parte da esquerda opera com outro calendário e com outra
política. Age como se preferisse enfrentar Bolsonaro em 2022. E atua como se
nosso caminho para voltar ao governo dependesse de darmos alguns passos em
direção ao centro. Acontece que 2022 está muito distante e em nenhum caso será
como foi 2002; além disso, o “centro” de que falam não existe, existe isto sim duas
direitas, nenhuma das quais é ou pode vir a ser aliada nossa. Finalmente, num
quadro de polarização, não apenas para ganhar, mas principalmente para
governar, teremos que ir pela esquerda. O que inclui ampliar a disputa no
terreno parlamentar (chamamos a atenção para o que ocorreu na votação do
Orçamento, assim como na votação da “urgência” para a mal denominada Lei de
defesa do Estado democrático de direito, duas situações em que a atuação de
nossas bancadas deixou a desejar). Ir pela esquerda inclui, também, impedir que
no 1º de Maio ocorram concessões programáticas e simbólicas a alguns de nossos
inimigos de classe, como muito bem denunciou publicamente um documento assinado
por dirigentes da Central Única dos Trabalhadores. Ir pela esquerda inclui, por
fim, aproveitar cada oportunidade da CPI da Covid 19 para denunciar e buscar
abreviar o fim do governo Bolsonaro. Contra o genocídio, não há outra alternativa:
interdição já!
13/No limite, o que vai decidir o desfecho da crise nacional é a
atitude das grandes massas do povo. Por isso a esquerda deve estimular, de
todas as formas possíveis, a ampliação da luta política e social da classe
trabalhadora. Neste espírito, convocamos a militância a participar ativamente
da organização, dos atos e ações do 1° de Maio de 2021, atos organizados pela
CUT e entidades sindicais vinculadas a CUT. Sempre que possível, devemos
estimular a realização de atos presenciais, ações de solidariedade, agitação e
propaganda, com todas os cuidados sanitários. Não bastam ações virtuais é
preciso ocupar as ruas por vacinação já, emprego, auxílio emergencial de
R$600,00, defesa do SUS, dos serviços públicos e por Fora Bolsonaro!
Viva o 25 de abril, dia em que se
comemora a derrota do fascismo na Itália e a
vitória da Revolução dos Cravos em Portugal!
Outras vitórias virão!!
Brasília, 25 de abril de 2021
A direção nacional da tendência
petista Articulação de Esquerda
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