segunda-feira, 14 de março de 2016

Nassif: as peças que faltam no seu xadrez

(não revisado)

Recomendo a leitura do texto de Luis Nassif, intitulado O xadrez da política no dia D.

O texto está reproduzido abaixo e disponível no endereço http://jornalggn.com.br/noticia/o-xadrez-da-politica-no-dia-d#comment-869131

Não recomendo por concordar com o que ele fala.

Pelo contrário.

Recomendo por discordar.

A começar pelo título. 

Fazer referência ao Dia D faria sentido, na minha opinião, apenas caso considerássemos "o jogo jogado"; caso em que o máximo que os derrotados podem tentar fazer é negociar os termos da rendição. 

Na minha opinião, os fatos não indicam isto.

Para antecipar meu ponto de vista: para nos derrotar, a direita precisou apelar às ruas. E ao fazer isto, diferente de 1964, introduziu no cenário dois elementos que conspiram contra uma saída "estável". 

Por um lado, o “efeito Moro” (uma saída populista de extrema direita), que começa a atropelar as lideranças tradicionais da direita.

Por outro lado, aceitar a mobilização das ruas como fiel da democracia, precedente perigosíssimo para a estabilidade da democracia eleitoral burguesa.

Em consequência disto, mesmo que tenham êxito imediato na operação golpista, é muito pouco provável que a crise se encerre aqui.  

Motivo pelo qual os setores de esquerda que estimulam um acordo para superar a crise,  cometem erro similar ao cometido pelos que apoiaram o parlamentarismo em 1961.

Quando Nassif diz que "qualquer solução de conflito mergulha o país em uma crise imprevisível", ele deduz daí que a única saída estável é um acordo.

Mas não percebe que o tamanho da crise torna instável qualquer acordo. Ou seja: fugir da "crise imprevisível" através de um acordo é tentar empurrar o problema mais para a frente. 

Nassif diz que "grosso modo, há dois grupos trabalhando em saídas mais articuladas para a crise": os "parlamentaristas" e os "lulistas".

Notem que, neste raciocínio, Nassif deixa de perguntar o seguinte: caso Lula virasse "primeiro-ministro de fato", ele teria maioria parlamentar? Ou seu poder "de fato" dependeria apenas da presidenta Dilma abrir mão do que, segundo Nassif, ela não tem mais?

Esta, digamos, omissão no raciocínio não é um detalhe. Na verdade, serve para tornar comparáveis duas situações totalmente diferentes. Uma seria um golpe parlamentarista; outra seria fortalecer o governo legítimo.

Sou totalmente contra a ida de Lula para o ministério. Mas considero um deserviço equiparar esta possibilidade com uma variante golpista conduzida por Serra et caterva.

Pode ser, é claro, que Nassif seja apenas vítima de um pecado tradicional em algumas de nossas penas: escolher certos termos apenas por soarem bonito e terem aparência de profundidade. 

Por exemplo, chamar de "jacobinos"o grupo do impeachment, com Aécio Neves na ponta. 

Sinceramente, Robespierre não merecia isto.

Mas sigamos adiante.

Para Nassif os "protagonistas" do jogo são "os Parlamentaristas, os Lulistas e o Alto Comando". 

Já os "Jacobinos" e a "mídia" são "agentes acessórios". 

Ele chega a dizer que a mídia é "fundamental para o sucesso da operação, mas vindo a reboque, sem papel na formulação estratégica".

Registre-se a ausência de qualquer reflexão sobre o papel jogado pelos partidos de esquerda e movimentos sociais, especialmente os articulados na Frente Brasil Popular. Na visão de mundo de Nassif, este tipo de protagonistas não merece menção destacada, sendo subsumidos no "lulismo".

Um dos pontos mais interessantes do texto de Nassif está em considerar "o grupo do Ministério Público Federal diretamente liderado pelo Procurador Geral Rodrigo Janot" como o "Alto Comando". 

Embora ache que ele subestime o papel de Moro, considero que está no rumo certo quanto ao papel jogado por Janot (e por grande parte do STF). E faz uma pergunta interessante: "Como foi possível, no entanto, cooptar quase toda a corporação?"

A resposta me parece simples. Há uma crise profunda no país. E a institucionalidade político-eleitoral não é capaz de solucionar a crise. Num resumo esquemático: a esquerda venceu eleições presidenciais, sem ter maioria congressual. A direita venceu eleições congressuais, mas não consegue vitória presidencial. Neste contexto, as forças sociais dominantes buscam mecanismos e caminhos extra-eleitorais para reestabelecer a "ordem natural das coisas". E o instrumento mais adequado para isto demonstrou ser o consórcio entre setores do MPF, da Justiça e da PF.

Não é preciso grande esforço para deduzir onde vai dar esta "judicialização da política". 

Ao não perceber as raízes estruturais do papel jogado pelo consórcio MP/J/PF, Nassif alimenta ilusões quanto a estabilidade de uma saída negociada. 

Pelo contrário, ele afirma que "qualquer decisão de força, sem consenso, tenderá ao fracasso". 

Os argumentos que ele usa para justificar isto beiram o "divertido".

Reproduzo: "qualquer decisão de força, sem consenso, tenderá ao fracasso. Sem um núcleo de poder, qualquer governo que assuma um país dividido ficará refém das forças que o elegeram. Será um ataque ao butim que inviabilizará qualquer tentativa de normalização econômica. Haverá agitação, repressão aos movimentos sociais, caça às bruxas".

Pensava eu que numa democracia os governos devem mesmo obediência às forças que o elegeram. Nassif acha que isto é ser "refém".

Também pensava que este nosso país viveu vários golpes, que envolveram "agitação, repressão aos movimentos sociais, caça às bruxas", muito "ataque ao butim", e não necessariamente isto impediu "qualquer tentativa de normalização econômica"

Talvez o raciocínio ganhasse mais credibilidade se fosse apresentado assim: do ponto de vista das classes dominantes, seria melhor propor ao PT e Lula um acordo, pois isto permitirá fazer o que deve ser feito sem que o lado de lá cause muita confusão. Claro que ao aceitar este acordo, Lula e o PT e a esquerda praticariam uma capitulação que seria mais danosa, politicamente falando, do que uma derrota. Claro, também, que isto não impediria (como em 1961) que mais adiante acontecesse uma inflexão à direita ainda pior. Quando a esquerda já não teria nenhuma condição de reagir, devido a capitulação anterior.

No fundo, é um acordo deste tipo que Nassif (e outros) defende. 

Ele embrulha o pacote assim: "um pacto entre os Parlamentaristas e os Lulistas é o único sinal visível de um polo racional na política. Com Lula à frente, poderiam ser viabilizados acordos, através de uma coordenação dele, como primeiro-ministro de fato, ou em uma transição com um primeiro-ministro negociado entre ambos as partes".

O detalhamento que ele faz acerca dos personagens da crise é uma tentativa, as vezes pueril, de mostrar como se pode tecer um acordo. Mas cada frase que ele escreve mostra que a solidez deste acordo depende de variáveis muito frágeis, frágeis demais frente a profundidade da crise. Basta dizer que depende dos mais probos entre os probos do PMDB...

Em resumo: o que Nassif defende é uma capitulação vergonhosa.

Uma capitulação totalmente contraproducente, inclusive do ponto de vista dos que sinceramente acreditam num acordo.

Contraproducente porque se o conflito for entre o "Alto Comando apostando tudo no confronto; de outro, forças moderadoras percebendo a possibilidade de uma guerra selvagem", o resultado intermediário a que se chegará não será um péssimo acordo, será uma terrível capitulação.

Até para os que desejam um acordo decente, o melhor seria polarizar o país entre o "Alto Comando" deles e a mobilização do campo popular. 

Acerca disto, sugiro ler o texto disponível no endereço: ler: http://valterpomar.blogspot.com.br/2016/03/leonardo-boff-e-jeferson-miola-outro.html

O resumo é: com luvas de pelica (e com "acordos") não derrotaremos, nem ao menos faremos recuar, a extrema-direita.





O xadrez da política no dia D
DOM, 13/03/2016 - 00:03
ATUALIZADO EM 13/03/2016 - 09:09
Luis Nassif

Vamos ao novo xadrez da crise.

Peça 1 – a crise ficou grande demais para Dilma

É a única certeza nesse oceano de imprevisibilidades que caracteriza a crise atual. Dilma não tem fôlego político nem para lançar planos mais audaciosos nem para recompor sua base política. Mantido o quadro atual, se não cair por impeachment, cai pela crise.

Peça 2 – qualquer solução de conflito mergulha o país em uma crise imprevisível.

Essa premissa é central para todo o raciocínio posterior. Não significa que, automaticamente, conduzirá as discussões para a racionalidade. Mas será um fator relevante a estimular algumas lideranças mais responsáveis na busca do entendimento.

Grosso modo, há dois grupos trabalhando em saídas mais articuladas para a crise.

No Senado, o grupo formado por Renan Calheiros, José Serra e Romero Jucá, articulando alguma forma de semiparlamentarismo que mantenha Dilma Rousseff na presidência, mas sem governar. Vamos trata-lo de os Parlamentaristas para facilitar a leitura.

Ao largo, o grupo que cerca Lula, insistindo para que assuma um cargo de coordenação no Palácio, mesmo sem ser formal, mas que o transforme em um primeiro-ministro de fato. Chamemos de Lulistas.

Correndo por fora, o grupo do impeachment, com Aécio Neves na ponta. Seriam os Jacobinos.

Finalmente, o grupo do Ministério Público Federal diretamente liderado pelo Procurador Geral Rodrigo Janot. Vamos batizar de Alto Comando, para fugir da confusão corriqueira, de considerar que o comando e a estratégia da Lava Jato estão em Curitiba.

São esses personagens que jogam o jogo atual, cujo ápice serão as manifestações deste domingo.

As formas de jogo político
Para acompanhar o jogo é preciso entender melhor sua natureza.

Não se trata de uma conspiração palaciana, com um comando organizando todas as ações.

Movimentos de opinião pública são operações muito mais fluidas, mais amplas, nas quais se escolhe o momento adequado – o mal-estar econômico – e, se deflagra um conjunto de ações visando estimular as reações populares. A denúncia da corrupção é o mote mais eficaz.

Aberta a porteira, provoca-se o estouro da boiada e abre-se a caixa de Pandora. Há uma sucessão de eventos, alguns aleatórios, outros planejados. A arte da conspiração consiste em controlar os bois guias, os que vão na frente da boiada conduzindo-a. Mas o final sempre é imprevisível, daí a preocupação de Fernando Henrique Cardoso e de quadros do PSDB, recuando na radicalização.

O estouro da boiada foi possível com a parceria montada pelo Alto Comando com a mídia, a entrada dos novos grupos que se apossaram das manifestações (Movimento Brasil Livre, Revoltados Online, provavelmente bancados de fora), e um investigação capaz de gerar fatos jornalísticos diários.

Hoje em dia, quem controla os bois guias é o Alto Comando, através da usina de geração de fatos da Lava Jato, sincronizando com os movimentos da oposição.

Os protagonistas a serem acompanhados são, portanto, os Parlamentaristas, os Lulistas e o Alto Comando. Os Jacobinos de Aécio e a mídia são agentes acessórios – no caso da mídia, fundamental para o sucesso da operação, mas vindo a reboque, sem papel na formulação estratégica,

A dificuldade de definição de estratégias se deve à extrema habilidade de um jogador essencial, o Alto Comando, que conseguiu jogar xadrez escondendo o rei. É uma velha gíria do xadrez: como a vitória consiste no xeque-mate ao rei, se você esconde o seu no tabuleiro, não tem como levar xeque.

Quando os demais personagens entenderem adequadamente o papel do Alto Comando, os erros de estratégia serão minimizados.

Como se organiza o jogo
Se consumado o impeachment de Dilma Rousseff, será um case mundial, provavelmente a mais bem-sucedida estratégia de golpe político das últimas décadas.

Não é o caso de voltar ao tema da geopolítica norte-americana na quadra atual. Maiores dados vocês poderão ler aqui (http://migre.me/tdbtp). A estratégia de desmonte dos grandes grupos nacionais que poderiam se habilitar a algum protagonismo externo pode ser lida aqui (http://migre.me/tdbAZ).

Há duas vertentes para dobrar a espinha do país.

A primeira, que dá o start, é a política de depreciação continuada de tudo que possa despertar o orgulho nacional. Esse trabalho ficou nítido na Copa do Mundo, um exercício tão funesto de derrubar a autoestima que conseguiu espantar das ruas até o orgulho de vestir camisa da Seleção. E isso antes do 7 x 1 e pouco tempo depois do país ter atingido o momento mais alto do seu orgulho, respeitado mundialmente pelos avanços sociais registrados e pela forma como superou a crise de 2008.

A segunda vertente foi o papel do Alto Comando como estrategista central da Lava Jato.

Do lado jurídico, a maneira como a Lava Jato foi montada foi bem explicada pelo advogado Juarez Cirino dos Santos no site Jota (http://migre.me/td3XB).

4. Além de constrangimentos e humilhações aos adversários políticos, a Operação Lava Jato apresenta inúmeras vantagens (...):

- primeiro, os procedimentos investigatórios e os processos criminais são seletivos e sigilosos: seletivos, porque dirigidos contra líderes do PT ou pessoas/empresas relacionadas ao Governo do PT – por motivos ideológicos ou não; sigilosos, porque não permitem conhecer a natureza real ou hipotética dos fatos imputados, fazendo prevalecer a versão oficial desses fatos, verdadeiros ou não;

- segundo, os nomes dos investigados são revelados ao público externo, como autores ou partícipes (por ação ou omissão) das hipóteses criminais imputadas, mediante programados vazamentos de informações (sigilosas) aos meios de comunicação de massa, com efeitos sociais e eleitorais devastadores sobre os adversários políticos dos grupos conservadores;

- terceiro, o espetáculo de buscas e apreensões violentas e de condução coercitiva ilegal de investigados (o ex-Presidente Lula, por exemplo), ou as ilegais quebras de sigilo (telefônico, bancário e fiscal) seguidas de espalhafatosas prisões preventivas (Zé Dirceu ou João Vaccari Neto, por exemplo), geram convenientes presunções de veracidade e de legitimidade da ação repressiva oficial perante a opinião pública.

5. Nesse contexto, a contribuição objetiva da Operação Lava Jato– voluntária ou não, mas essencial para os fins político-eleitorais das classes hegemônicas organizadas no PSDB, no PPS, no DEM e outras siglas – ocorre na forma de contínua violação do devido processo legal, com o espetacular cancelamento dos princípios do contraditório, da ampla defesa, da proteção contra a autoincriminação, da presunção de inocência e outras conquistas históricas da civilização – apesar da reconhecida competência técnico-jurídica de seus protagonistas. A justiça criminal no âmbito da Operação Lava Jato produz a sensação perturbadora de que o processo penal brasileiro não é o que diz a lei processual, nem o que afirmam os Tribunais, menos ainda o que ensina a teoria jurídica, mas apenas e somente o que os dignos Procuradores da República e o ilustre Juiz Sérgio Moro imaginam que deve ser o processo penal. A insegurança jurídica e a falta de transparência dominante na justiça criminal da Operação Lava Jato levou o Ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, a reproduzir antigo conceito de Rui Barbosa: “a pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário”.

6. Então, entra em ação o grande parceiro da Operação Lava Jato: os meios de comunicação de massa (TV, jornais e rádios),  com informações baseadas nas evidências processuais ou no material probatório obtido nas condições referidas, produzem um espetáculo midiático para consumo popular – e comícios diários de imagens virtuais audiovisuais, impressas e sonoras tomam conta do País, com efeitos psicossociais coletivos avassaladores. As versões, interpretações e hipóteses da justiça criminal da Operação Lava Jato, difundidas pela ação repressiva da Polícia Federal, pelas manifestações acusatórias dos Procuradores da República e pelas decisões punitivas do Juiz Sérgio Moro, produzem efeitos de lavagem cerebral e de condicionamento progressivo da opinião pública, submetida ao processo de inculcação diuturna de um discurso jurídico populista, com evidente significado político-partidário, mas apresentado sob aparência ilusória de uma impossível neutralidade política.

Quando os procuradores paulistas tentaram atropelar a agenda, coube ao Procurador Geral da República Rodrigo Janot articular pessoalmente a estratégia da Lava Jato em relação às trapalhadas cometidas (http://migre.me/tdeQT). E a toda imprensa vocalizar as críticas contra quem poderia comprometer o script inicial, cuidadosamente planejado para chegar a bom termo respeitando as aparências jurídicas.

Do lado político, o Alto Comando opera a partir de Brasília visando criar toda a blindagem jurídica necessária, não apenas junto ao STF, como ao próprio governo e nas redes sociais.

No Twitter, por exemplo, os principais lugares-tenentes de Janot, através de seus perfis pessoais, conduzem uma ampla campanha de esclarecimento e de defesa da Lava Jato. Antes da constatação de que foi um desastre, até as trapalhadas dos procuradores paulistas mereceram esboços de defesa, por parte dos procuradores de Janot.

No STF e no TSE Janot não convalidou nenhuma tentativa de golpe branco.  Consolidou a imagem de legalista junto ao STF e à presidente da República e, com isso, o espaço político para bancar a estratégia central, a Lava Jato. Nenhuma outra iniciativa roubou-lhe o protagonismo. Escondeu o rei e iludiu a rainha quanto aos propósitos republicanos da Lava Jato.

A Lava Jato foi apenas o aríete, atrás do qual montou-se um trabalho sistemático de destruição de todos os símbolos de país.

Nas ruas, movimentos conduzidos pelo MBL e outros vocalizando críticas às políticas sociais.

Na Lava Jato, um trabalho sistemático de destruição das maiores empresas nacionais, não apenas com inquéritos, mas com escracho. Recorreram ao escracho, ao boicote a qualquer acordo de leniência, à perseguição diuturna, com operações seguidas de invasão de sede, exposição de mensagens – até pessoais. A ideia não é punir: é destruir.

O ápice tem sido a tentativa de destruição do símbolo Lula. Qualquer compêndio futuro sobre a infâmia na vida nacional contemplará o que foi feito, até acusações de furto de obras no Palácio.

O Ministério Público Federal é composto por procuradores preparados. Não será necessário muito tempo para que, caindo a ficha do que fizeram, venham à tona os bastidores da operação.

Como foi possível, no entanto, cooptar quase toda a corporação?

A campanha antinacional da Copa e, principalmente, a revelação da enorme rede de corrupção da Petrobras, facilitaram a venda da ideia da destruição da velha ordem, por uma nova ordem, liderada pelo trabalho redentor do Ministério Público.

A velha ordem passou a se resumir a empreiteiras corruptas, cooptando o sistema político e judiciário, e um governo populista que cooptou a população com políticas sociais paternalistas. E não a lenta reconstrução democrática, os avanços civilizatórios (dos quais o próprio MPF foi agente importante), os avanços tecnológicos nas áreas do pré-sal e da defesa, o feito histórico de tirar milhões de pessoas da miséria e reduzir graus históricos de desigualdade. A corrupção foi o álibi para apagar a história recente do país, até a luta pela redemocratização.

Principalmente pesou a visão redentorista de um novo poder se sobrepondo aos demais e salvando o país.

Para avaliar os resultados do jogo, é fundamental esse entendimento sobre a posição do Alto Comando.

As próximas jogadas
Sabendo-se disso, fica mais claro o jogo, embora ainda seja difícil antecipar o resultado final.

Há duas saídas negociadas possíveis, nenhuma tendo Dilma como protagonista.

Saída 1 – O semiparlamentarismo com o PMDB, que tem várias nuances. No regime parlamentarista, cabe ao presidente indicar o primeiro ministro e o gabinete. E ao Congresso aceitar ou rejeitar. Pode-se tentar um parlamentarismo goela abaixo, mas seria regimentalmente complicado.

Saída 2 – semiparlamentarismo com Lula assumindo o papel de coordenador de governo, um primeiro-ministro de fato.

Impasse – qualquer decisão de força, sem consenso, tenderá ao fracasso. Sem um núcleo de poder, qualquer governo que assuma um país dividido ficará refém das forças que o elegeram. Será um ataque ao butim que inviabilizará qualquer tentativa de normalização econômica. Haverá agitação, repressão aos movimentos sociais, caça às bruxas.

Independentemente de pecadilhos ou grandes pecados, um pacto entre os Parlamentaristas e os Lulistas é o único sinal visível de um polo racional na política.

Com Lula à frente, poderiam ser viabilizados acordos, através de uma coordenação dele, como primeiro-ministro de fato, ou em uma transição com um primeiro-ministro negociado entre ambos as partes.

Aí entram as jogadas do xadrez.

Antevendo essa possibilidade, o Alto Comando deflagrou novas operações simultâneas: a ofensiva total contra Lula, o alarido em torno dos presentes recebidos por Lula no exercício do poder; mais uma denúncia contra Renan Calheiros; mais detalhes da delação do senador Delcídio do Amaral, cujo conteúdo era conhecido apenas do Alto Comando e do STF (Supremo Tribunal Federal).

Tem-se, então, duas forças conflitantes. De um lado o Alto Comando apostando tudo no confronto; de outro, forças moderadoras percebendo a possibilidade de uma guerra selvagem, se não se chegar a um entendimento.

A tentativa de acordo passa por ambientes confusos, mas depende fundamentalmente de Renan Calheiros e Lula.

Fator 1 – o STF e o fator Renan.

Os Ministros tendem a privilegiar a responsabilidade institucional. E na vitrine do Supremo, Janot tende a ter bom senso.

Nessa hipótese, Renan poderia ser poupado de atropelos imediatos, em nome da estabilidade política. Aparentemente o foro privilegiado o blindaria contra novas surpresas da Lava Jato. Mas não se descartam vazamentos de delações visando comprometer sua atuação.

Além da nova investida de Janot contra Renan, na próxima 4a feira a oposição tentará pressionar o Ministro Luís Roberto Barroso a rever seu voto em relação ao ritual do impeachment.

Desde que sua esposa foi alvo de ataques baixos, Barroso inibiu-se. As loucuras dos três procuradores paulistas estão diretamente ligadas ao seu recuo na questão da Terceira Instância. Como explicou o promotor Ricardo Blat, o pedido de prisão de Lula visou criar uma "inovação jurisprudencial" depois que os garantistas do Supremo abriram a guarda com a eliminação da terceira instância.

Espera-se que Barroso e demais garantistas se sintam mais fortalecidos. Mas ainda são uma incógnita.

Barroso terá um papel essencial. Se flexibiliza o impeachment, consolida a parceria PSDB-PMDB para derrubar a Dilma, pois nesse caso Michel Temer seria poupado. Se resiste, obriga a um pacto mais amplo e à busca de entendimento.

Fator 2 – O fator PSDB-PMDB.

O acordo semiparlamentarista prejudica Aécio e Alckmin para 2018

No momento, os Parlamentaristas confiam no indiciamento de Aécio Neves para avançar nas tratativas.

Obviamente não levaram em conta o Alto Comando. Se o nome de Aécio não aparecer nas delações de executivos da Andrade Gutierrez, aliás, consolidará a opinião geral sobre a proteção recebida. Mas há a possibilidade de que a abundância de indícios obrigue Janot a mudar de posição.

Alckmin se aproximou de Sérgio Moro através de seu candidato João Doria Jr. Essa aproximação pode ser debitada na conta dos eventos aleatórios, fora do script original. A própria truculência do Secretário de Segurança de São Paulo, Alexandre Moraes, colocando a PM para reprimir uma assembleia do Sindicato dos Metalúrgicos, é significativa dessa reação a qualquer acordo.

Fator 3 - O fator Lula

Depois de sua fase classe média ascendente – aceitando favores descabidos de empreiteiras – Lula vacila entre encarar a luta ou entrar para a história, como um novo Mandela, preso pela direita. Ótimo! Salva sua biografia à custa do comprometimento de todas as bandeiras que representa.

Se Lula não assumir um protagonismo total no governo Dilma, sua queda será questão de semanas.

Fator 4 - O Alto Comando.

O Alto Comando é integrado por procuradores probos, bem intencionados e iludidos pela visão redentorista. Nâo se descarte a possibilidade de um chamamento ao mundo real, quando avaliarem friamente os desdobramentos da crise atual.

Por enquanto, o cenário mais provável será o do pacto PMDB-PSDB visando apoiar ao impeachment.

Caso fracassarem as saídas políticas, a primeira fase do golpe de1964 será café pequeno. Juízes e procuradores serão liberados para acabar com a raça de tudo que cheire a esquerda.

O país será envolvido em uma guerra fratricida, com um novo governo previamente enfraquecido pela falta de consenso e exposto a ataques ao butim de todos os “vencedores”, de grupos jornalísticos a líderes empresariais e a impolutos de ordem geral que ajudaram a consumar o golpe.

Neste domingo, joga-se o último lance da guerra do impeachment. Se o governo resistir por mais algum tempo e Lula entrar na linha de frente, é possível alguma esperança de normalização democrática.

3 comentários:

  1. não acho nem um pouco vergonhosa a "capitulação" proposta pelo Nassif, acho sim que é a única solução "equilibrada".. o governo dilma já acabou.. um novo pacto pode dar tempo para a travessia dos mares revoltos da economia, lembrando que fora do discurso, as esquerdas não tem o povo na mão..

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  2. Não é possível um pacto entre "santos" e "demônios". No caso, a esquerda que é detentora do poder central estaria se ajoelhando e jogando suas bandeiras no lixo. Acho que Dilma já fez todos os favores aos neoliberais com essa política econômica suicida. Um eventual acordo, que considero um golpe, seria descumprido pelos "demônios" ao primeiro sinal de estabilidade política, afinal, eles têm maioria e, pra essa turma, golpe dentro do golpe pode ser dado em qualquer momento.

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