segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Sobre a 13 de Maio

O texto abaixo foi encaminhado, no dia 18 de abril de 2005, para a Comissão Executiva Municipal do PT Campinas.

Hoje, 18 de abril de 2005, comparecerei à Comissão Especial de Inquérito (CEI), instalada pela Câmara Municipal de Campinas para analisar o “caso” da Rua 13 de Maio.

Considerando as implicações para o Partido dos Trabalhadores, achei por bem encaminhar, para esta Comissão Executiva Municipal (CEM), uma síntese das afirmações feitas durante a CEI, tanto pelos depoentes quanto pelos vereadores; bem como um resumo do que pretendo falar a respeito.

Para poder fazer isto, pedi ao vereador Paulo Búfalo que solicitasse à CEI cópia dos depoimentos. O vereador teve dificuldade em obter rapidamente tal cópia, que só lhe foi entregue depois dele ter recorrido ao plenário da Câmara.

Dos depoimentos realizados até agora, tive acesso aos seguintes: Carlos Henrique Pinto, atual secretário de Assuntos jurídicos; Osmar Costa, atual secretário de Obras; Edmilson José Marchessoti, engenheiro da empresa responsável pelo projeto de infra-estrutura e pelo gerenciamento; Vicente Andreu Guillo, ex-presidente da Sanasa; Edvaldo de Souza Pinto, presidente da CDL; Carlos Francisco Simões, vice-presidente da Acic; Horácio Basile, Ênio Figueiró Garcia e Fernando Rubio, empresas que atuaram na obra; Wilson Maldonado Júnior e Marcos Libório, da CPFL; Carlos Henrique Coutinho do Amaral, procurador municipal; José Luís Pio Romera, ex-secretário de Finanças; Maristela Lopez, diretora da High Tec, empresa responsável pelo projeto urbanístico e arquitetônico; Emílio Font, ex-diretor administrativo da secretaria de Cultura; Marília Borges, ex-secretária de Assuntos Jurídicos; Marco Antonio dos Santos e Carlos Eduardo Gomes, funcionários da Sanasa; Willian Scatena, da Varca Scatena; José Veríssimo Nery, diretor da Sondosolo, responsável por sondagens no solo da 13 de Maio.

Não tive acesso aos depoimentos realizados depois de 4 de abril e até esta data.

A primeira questão a destacar, da leitura das transcrições dos depoimentos supracitados, é que em nenhuma delas é esclarecido, para os depoentes, quais os objetivos precisos da Comissão Especial de Inquérito.

Em compensação, em vários dos depoimentos supracitados, as “testemunhas” são informadas que a “Lei 1579 de 18 de março de 1952 coloca Comissões Especiais de Inquérito com o mesmo poder das CPIs (....) Por isso, os senhores não podem mentir. Se o fizerem é crime, inclusive com pena de reclusão.”

Se estiver correto o que foi noticiado pela imprensa local, a CEI teria como “objeto” determinar os motivos da paralisação das obras da Rua 13 de Maio e os motivos pelos quais coube à Secretaria de Cultura, Esportes e Turismo (Smcet) o papel de órgão gestor.

Para estas duas questões, há respostas óbvias: a Smcet foi o órgão gestor, porque a Prefeita Izalene Tiene assim o decidiu; e a obra foi paralisada por ato unilateral da empresa Varca Scatena.

Como as respostas são óbvias, há duas hipóteses: ou a CEI foi proposta para atingir outros objetivos, que não o de responder aquelas duas questões; ou a CEI está sendo manipulada para atingir outros objetivos, que não o de responder aquelas duas questões.

A leitura dos depoimentos supracitados deixa claro que, sejam ou não estes os propósitos dos vereadores, os depoimentos têm servido para questionar os procedimentos do governo petista; para encobrir o fato de, 108 dias depois do início do novo governo, a obra estar – na melhor das hipóteses — como estava no dia 15 de dezembro de 2004; e para que a empresa Varca Scatena reúna elementos para sustentar sua ação contra o poder público municipal.

Esta última conseqüência, aliás, foi reconhecida explicitamente por um dirigente da empreiteira, no curso dos depoimentos prestados em 11 de abril.

Não nos surpreende que o governo Hélio e o PSDB, por motivos distintos, queiram atacar o PT e a administração anterior. O mesmo está ocorrendo em muitas cidades, como São Paulo, Porto Alegre, Goiânia, Chapecó e Imperatriz, e sempre com as mesmas táticas: denunciar a existência de uma terrível “herança” financeira e administrativa, inclusive “obras malfeitas”; tentar desmoralizar os dirigentes da administração como incompetentes; e, desta forma, fazer uma cortina de fumaça que oculte a, na melhor das hipóteses, inoperância dos governos que sucederam as administrações petistas.

O que causa espécie é que vereadores (alguns ligados ao governo Hélio, outros ao PSDB), para fazer isso, estejam cometendo dois atos que prejudicam profundamente, não o PT, mas a população de Campinas: adiando desnecessariamente a conclusão das obras da Rua 13 de Maio; e auxiliando, mesmo que inadvertidamente, uma empreiteira a reunir elementos para a causa judicial que mantém contra a Prefeitura.

A obra poderia estar concluída

A reurbanização da Rua 13 de Maio vem sendo reclamada, por diferentes setores da sociedade de Campinas, desde 1986. Apenas em abril de 2004, entretanto, a obra teve início.

De abril a dezembro de 2004, concluímos 85% da obra. Durante grande parte deste período, o governo petista foi duramente atacado tanto pelo PSDB quanto pelo PFL, que indicou o então candidato e hoje vice-prefeito de Campinas.

Em 15 de dezembro de 2004, a empresa Varca Scatena abandonou unilateralmente a obra. O governo petista tomou as providências iniciais para a ruptura do contrato, mas coube ao governo Hélio decidir.

Neste novo quadro, é compreensível que o PSDB aproveitasse a situação para continuar fazendo oposição ao PT e, de lambuja, criar dificuldades para o governo Hélio. Mas é difícil compreender as atitudes tomadas pelo governo que tomou posse em 1 de janeiro de 2005, especialmente se levarmos em conta a pelo menos aparente harmonia que o novo governo deveria ter com os empresários integrantes da Acic/CDL, para quem é fundamental concluir logo a Rua 13 de Maio.

O governo Hélio poderia ter decidido continuar a obra com a empresa Varca Scatena? Sim, poderia. Mas optou por romper o contrato.

O governo Hélio poderia ter realizado uma contratação emergencial para prosseguir a obra? Sim, poderia. Mas optou por ou não conseguiu fazer isso em tempo hábil.

O governo Hélio poderia ter realizado uma perícia imediata na obra, que retratasse a situação no momento da ruptura do contrato? Poderia, mas deixou para fazer esta perícia depois, abrindo terreno para que a empreiteira obtivesse uma liminar da Justiça, dispondo a paralisação das obras enquanto a perícia não fosse feita.


O governo Hélio poderia ter realizado gestões junto à Justiça, tanto para tentar evitar a liminar, quando para acelerar a perícia que esta determinou. Mas não temos notícia de que tenha feito isso.

O governo Hélio poderia ter orientado sua base de governo a monitorar a CEI, para evitar que a Varca Scatena fosse favorecida. Mas tampouco parece ter feito isso.

Vejamos caso a caso, com base nos depoimentos.

O governo Hélio poderia ter decidido continuar a obra com a empresa Varca Scatena?
A reurbanização da Rua 13 de Maio envolveu quatro licitações: projeto arquitetônico, projeto de infra-estrutura, gerenciamento e obra.

Todas estas licitações foram feitas pela Secretaria de Administração, a quem compete a última palavra sobre os editais e demais procedimentos, inclusive a observância da legislação pertinente.

O depoimento do atual secretário de Assuntos Jurídicos, realizado em 21 de fevereiro, deixa claro que, do ponto de vista da administração Hélio, não há questionamento jurídico aos procedimentos adotados pelo governo petista no caso dos editais da Rua 13 de Maio.

A licitação referente a obra foi vencida pela empresa Varca Scatena, sem que houvesse uma segunda colocada, pois as demais empresas desistiram ou foram desabilitadas.

Assim, na hipótese da empresa vencedora descumprir as condições contratuais, levando o órgão gestor a solicitar a ruptura de contrato, estaríamos diante da seguinte situação: paralisação das obras, seja por questionamento judicial, seja à espera de uma nova licitação, ou até por ambos os motivos.

Por isso mesmo, a atitude do órgão gestor (a Smcet) foi pressionar ao máximo a Varca Scatena, mas sempre evitando levar os conflitos ao ponto da ruptura contratual. Graças a isso, a obra chegou a 85% de conclusão, com destaque para a parte subterrânea das obras e o fechamento das valas.

É importante dizer que esta foi a nossa atitude, antes do primeiro turno, entre o primeiro e o segundo turnos e depois do segundo turno.

Quando a empreiteira decidiu abandonar a obra, em 15 de dezembro de 2004, achamos que era nossa obrigação deixar, para o futuro governo, os meios para decidir se continuaria ou não com a Varca Scatena, cujas dificuldades para realizar a obra se tornaram públicas e notórias.

Foi por isso que demos início ao processo de ruptura de contrato, mas deixamos a conclusão do processo a cargo do governo que tomaria posse em 1 de janeiro de 2005. Este poderia, com base nos meios legais que deixamos e auxiliado pela força que caracteriza todo início de gestão, tanto decidir pela ruptura, quanto decidir pela continuidade dos trabalhos da Varca Scatena.

O governo, segundo o secretário de Assuntos jurídicos da atual gestão, decidiu acolher os motivos apresentados pelo governo petista para dar início à ruptura de contrato. Mas poderia ter decidido diferente.

Aliás, o depoimento do dono da empreiteira dá a entender que o prefeito Hélio estava inclinado a renegociar com a Varca Scatena, talvez nos termos sugeridos pelo engenheiro Edmilson José Marchessotti.

Só o prefeito Hélio pode explicar os motivos de sua decisão. Mas ao tomá-la, ela trazia implícita o risco de um embargo judicial. Portanto, a decisão de romper o contrato com a Varca Scatena deveria ter sido acompanhada da realização de uma perícia, de contatos com a Justiça e da contratação emergencial de uma nova empresa. Mas a julgar pelo que é dito nos depoimentos, nada disso foi feito.

Tendo em vista a natureza da obra, os transtornos à população, o abandono praticado pela Varca Scatena, o pequeno percentual faltante (15%) e a notoriedade do caso, o governo Hélio tinha bases legais para realizar a contratação emergencial de uma empresa para concluir a Rua 13 de Maio.

Isso fica claro nos depoimentos de Carlos Henrique Pinto e de Osmar Costa, respectivamente secretários de Assuntos Jurídicos e de Obras.

Mas isso não foi feito. Paradoxalmente, parece ser no curso do depoimento que prestou à CEI, no dia 21 de fevereiro, que o secretário de Assuntos Jurídicos fica sabendo que a Varca Scatena solicitou ao juiz uma “medida cautelar de produção antecipada de provas”.

É importante destacar que o secretário de Assuntos Jurídicos se vangloria da “celeridade” com que sua secretaria deu conta dos procedimentos necessários a aplicar a penalidade à Varca Scatena. Chega a citar: “acho que de 28 dias, salvo engano meu”. Supondo que eles tenham começado a trabalhar no assunto dia 3 de janeiro de 2005, isso significa que no dia 1º de fevereiro de 2005 poderiam estar iniciando a contratação emergencial de uma empresa para concluir a obra.

Bastaria para isso, segundo o secretário de Assuntos Jurídicos, que a secretaria de Obras “provocasse”, pois “o município reúne, já coleciona fatos que autorizariam um parecer de contratação emergencial”, parecer esse que seria também “célere”.

Dois dias depois, em 23 de fevereiro, o secretário de Obras fala que em 30 dias seria possível estar com a obra “retomando uma execução (...) a pleno vapor”. Sendo que destes 30 dias, 15 seriam necessários para elaborar os quantitativos da obra.

Noutras palavras, se o novo governo tivesse, no dia 3 de janeiro de 2005, realizado uma perícia completa da obra (digamos, em 5 dias), poderia ter começado a solicitar das empreiteiras orçamentos a partir de 10 de janeiro e lá pelo dia 25 de janeiro poderia estar começando a obra.

Ou, se quisesse esperar a conclusão da ruptura contratual com a Varca, sempre tomando como base os prazos dados pelos secretários em seus depoimentos à Câmara, o novo governo poderia ter solicitado os orçamentos no dia 1º de fevereiro e ter iniciado a obra no dia 15 de fevereiro.

Novamente, nada disto foi feito. Vejamos agora o caso da perícia.
O governo Hélio poderia ter realizado uma perícia imediata na obra, que retratasse a situação no momento da ruptura do contrato?
O caso da perícia é o de mais difícil entendimento, pois afinal estamos tratando com um governo que tem, sem sombra de dúvida, um engenheiro experiente à frente da sua secretaria de Obras.

Pois bem: no dia 23 de fevereiro, o vereador Petterson Prado lê a solicitação feita pela Varca Scatena à Justiça: “comandar as requeridas que se abstenham de alterar, danificar e fazer acréscimos ou quaisquer modificações nas obras da 13 de Maio, enquanto não for realizada a perícia ora solicitada”.

Embora isto seja apenas um pedido feito ao Juiz, e não ainda a liminar do Juiz, a resposta do secretário é a seguinte: “Isso aí, eu devo estar sendo comunicado pelo jurídico de que devo parar nossas ações”.

O Secretário prossegue: “Nós estávamos imaginando já fazer ações de reconstrução no próximo domingo, agora, isso aí já está suspenso. Eu gostaria de poder continuar verificando o serviço. Eu acho que isso aí eu não estou alterando o status, eu estou verificando o que está acontecendo. É muito pouco o que está se fazendo”.

Neste ponto, o vereador Petterson Prado tem que esclarecer ao secretário que “o Juiz ainda não deu a liminar. Então, ainda não está impedido de se fazer nenhuma modificação lá. Talvez, por uma questão até para não atrasar qualquer tipo de procedimento da Treze de Maio, que o Executivo Municipal pudesse requerer essa perícia, porque aí feita a perícia está assegurado pode-se fazer as modificações”.

Mais adiante, o mesmo vereador diz que “se nós esperarmos para fazer a perícia só quando ele der uma liminar, não sabemos quando vai ser isso, vai atrasando uma futura realização da obra”.

Lembrado pelo vereador Valdir Terrazan que a perícia determinada pelo juiz não seria aquela feita pela prefeitura, o vereador Petterson insiste que sua “proposta é para que a municipalidade faça essa perícia, para que possa assegurar, qualquer liminar já ela não fica válida, se acontecer, para que a gente entre num processo de recurso aqui, recurso no Tribunal e isso vai se estendendo. Talvez seja mais fácil, se fazer essa perícia”.

Tudo isto foi dito, lembramos, no dia 23 de fevereiro, quando o Juiz ainda não havia concedido a liminar solicitada pela Varca Scatena. Ou seja, 54 dias depois do início da atual administração e muitos dias depois da ruptura do contrato com a Varca Scatena, a atual administração não havia concluído uma perícia sobre o estado da obra.

Esta perícia, é bom que se diga, não seria necessária apenas para enfrentar as demandas judiciais feitas pela Varca Scatena. Seria importante, também, para determinar de quem é a responsabilidade pela situação atual das obras, das tubulações, dos equipamentos que estão visíveis e invisíveis, bem como de episódios como o “refluxo” que é acusado por alguns lojistas.

Uma perícia concluída no dia 4 de abril, como todos sabemos, não reflete mais o “estado da arte” no dia 3 de janeiro.
O governo Hélio e a Justiça

Uma das causas do atraso na obra da Rua 13 de Maio foi a decisão do Juiz Brasílio Penteado Castro, da 7ª Vara, que impediu o trabalho noturno.

Evidente que há uma legislação que embasa esta decisão. A questão é saber se esta legislação é aplicável “ao pé da letra”, sem mediações, quando está em jogo o interesse público.

Por exemplo: se houvesse uma ruptura nas redes de esgoto e água daquela região, caberia aplicar a Lei e exigir que a obra reparadora fosse feita apenas em horário diurno?
O governo Hélio poderia ter realizado uma contratação emergencial para prosseguir a obra?

Outro exemplo: é possível tratar uma obra pública, voltada ao bem coletivo, com o mesmo rigor que se deve tratar uma obra privada, cujos benefícios serão também privados? Finalmente, aplicada ao pé da letra, esta Lei não impediria todas as obras na área central da cidade, região cheia de pessoas durante o dia, portanto inadequada para obras com maquinário pesado?

Os integrantes do governo Hélio certamente acompanharam esta polêmica, ocorrida a partir de setembro de 2004, por coincidência próximo ao momento em que a população decidiu seu voto no primeiro turno das eleições de 2004.

Era de se esperar, portanto, que o governo Hélio esperasse atitudes semelhantes da parte da Justiça, especialmente vindas do Juiz Brasílio Penteado Castro. Mas, salvo engano de nossa parte, não parecem ter sido feitas gestões para tentar evitar a decisão judicial, nem para acelerar a perícia que esta determinou.

No caso da perícia, a imprensa noticiou que o perito só retirou a documentação necessária 41 dias depois da liminar, no dia 5 de abril, o que indica que a paralisação deve se estender!

E, o que é pior, enquanto a perícia não vem, a própria CEI está servindo para a “produção antecipada de provas”, em favor da Varca Scatena.
Evitar o favorecimento da Varca Scatena

O PT se notabilizou pelo bom uso das comissões parlamentares de inquérito, haja vista o desempenho de nossos parlamentares em episódios como o impeachment de Collor e o caso dos “anões do Orçamento”.

Posteriormente, parlamentares de outros partidos começaram a manipular as comissões parlamentares de inquérito, com dois objetivos: destruir reputações e achacar depoentes.

Esta conduta é, hoje, de conhecimento público, tendo motivado investigações no âmbito da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro e na Câmara dos Deputados.

Esta péssima conduta não levou o PT a recusar as comissões parlamentares de inquérito. Aqui em Campinas, por exemplo, fomos favoráveis à CEI da 13 de Maio, inclusive por entender que constitui uma oportunidade de esclarecer à população o ocorrido durante as obras.

A leitura dos depoimentos citados no início deste texto, entretanto, demonstra que no afã de atacar os procedimentos adotados pela administração anterior, alguns parlamentares (mas também alguns depoentes) estão colaborando, conscientemente ou não, com os interesses da empreiteira Varca Scatena.

Sem entrar (ainda) no mérito, é evidente que alguns questionamentos feitos contra o governo anterior e contra a gerenciadora funcionam, por tabela, como defesas em favor da Varca Scatena. Mais grave ainda, quando tais questionamentos não se justificam.

Seria, a nosso ver, de interesse do atual governo e da municipalidade, impedir que isto ocorra. A não ser que o objetivo seja, e achamos que não é o caso, passar a impressão de que a empreiteira foi mais uma “vítima” dos procedimentos do governo anterior, criando assim o ambiente para um “acordo” com a Varca Scatena, acordo que liberaria a empresa da multa contratual, em troca da permissão para a continuidade das obras.

A favor desta hipótese, que novamente esclarecemos não ser nossa, há a estimativa orçamentária divulgada pelo atual governo para a conclusão das obras: um valor praticamente igual ao do custo inicial das obras. Esta super-estimativa pode ser conveniente politicamente (para passar a impressão de que nada foi feito), mas prejudica o município e pode estimular, na imprensa local, que sempre foi tão vigilante com o PT, a conclusão de que o novo governo estaria preparando o terreno para o superfaturamento em uma de suas obras.

Para evitar o favorecimento da Varca Scatena, vários integrantes do último governo têm reiterado, para a Comissão Especial de Inquérito, que alguns assuntos estão sendo tratados na Justiça e que a esta caberá decidir. Qualquer especulação nossa a respeito, fora do ambiente judicial, poderia servir para a produção antecipada de provas em prejuízo do poder público. Infelizmente, alguns vereadores, no afã de se demonstrarem implacáveis oposicionistas ao PT, não medem suas declarações e contribuem no sentido oposto.
Alguns questionamentos que precisam ser respondidos

Nas últimas semanas, parte da base do governo Hélio e o PSDB confluíram num discurso comum: o de que teriam recebido uma “herança maldita” do governo petista. Dessa herança, fariam parte o concurso público, a obra da Rua 13 de Maio, a situação financeira da Ima, o Plano de Cargos etc.

Por enquanto, o caso da Rua 13 de Maio tem tido mais destaque, por ser objeto da Comissão Especial de Inquérito.

Durante os depoimentos a que tive acesso, há uma série de acusações mais recorrentes, que podem ser agrupadas em quatro grandes “teses”, sustentadas com ênfase por alguns vereadores.

Estas “teses” são as seguintes:

Que a Secretaria de Obras deveria ter sido o órgão gestor do processo. Alguns vão além e questionam inclusive a contratação do projeto, da gerenciadora e da empreiteira;

Que a licitação foi “direcionada” para que a Varca Scatena vencesse;

Que o órgão gestor foi relapso ou conivente com os procedimentos incorretos da empreiteira;

Que o órgão gestor cometeu diversas ilegalidades, como realizar pagamentos sem aditamento de prazo ou acima do que as medições indicavam.

Responderemos a seguir cada uma destas “teses”.
“A secretaria de Obras deveria ter sido a gestora”
Um certo corporativismo é inevitável, numa sociedade como a nossa, onde a divisão técnica do trabalho avançou tanto que os “especialistas” se julgam os únicos ou os mais capazes de enfrentar determinados problemas. Mas a complexidade social exige algo mais que “especialidades”, exige transversalidade.

É por isso que o governo petista nunca encarou o “Projeto Centro” como assunto de “engenheiros, arquitetos e urbanistas”, mas sim como um assunto de toda a cidade. E o projeto centro foi concebido não como uma lista de obras, mas sim como um conjunto de ações que visavam mudar a vida na área central da cidade, possuindo portanto uma forte dimensão cultural.
É por isto que a comissão encarregada do Projeto Centro era multidisciplinar. É por isso, também, que para coordenar esta comissão, inclusive as intervenções na 13 de Maio, foi indicado o então secretário de Cultura.
Concluída a gestão, não concluída a obra, o corporativismo volta à cena: técnicos da Sanasa ou da secretaria de Obras afirmam, com toda a segurança, que “se” tivesse cabido a eles a gestão, o desfecho seria outro. Alguns vereadores e muitos cidadãos, motivados pelo senso comum conhecido como “engenharia de obra feita” (no caso, “engenharia de obra não-concluída”), reforçam esta conclusão, quase com a certeza de um dogma religioso. Um ou outro transforma esta verdade religiosa em inquisição e já afirma, como fez um vereador cujo nome não é citado nas transcrições a que tive acesso, “que nós tenhamos aqui uma confissão da falta de competência do senhor Valter Pomar para administrar”.

Adiante, mostraremos que o comportamento do órgão gestor da obra da 13 de Maio foi correto. Mas falando ainda em tese, é totalmente normal que outras secretarias conduzam obras. A de Saúde, a de Educação e a de Cultura fizeram várias, no governo anterior, algumas de grande valor e complexidade. É provável que no atual governo esteja ocorrendo o mesmo.

No caso específico da Cultura, na administração anterior gerenciamos muitas obras decididas pelo Orçamento Participativo, além de uma série de intervenções de natureza patrimonial. Desconhecemos a existência de questionamentos técnicos acerca de nosso trabalho, tanto no que diz respeito às obras, quanto no que diz respeito ao conjunto da ação da Secretaria.

Mutatis mutandis, o fato da secretaria de Obras estar à frente não impede que ocorram problemas gravíssimos. Por exemplo, de quem foi a responsabilidade de gerenciar a obra inacabada (túnel) que passa por debaixo da hoje Estação Cultura?

Portanto, é um equívoco – salvo se a intenção for estritamente política — gastar tempo discutindo se a Prefeita agiu corretamente ou não, quando encarregou o secretário de Cultura de tocar a obra. Como disse o atual secretário de Assuntos Jurídicos, trata-se de um “critério” adotado pela administração anterior, não há nada de ilegal e “na nossa atual estrutura, existe na Secretaria de Cultura um departamento de obras”, onde existiam pessoas capacitadas tecnicamente para conduzir o processo.

Tampouco vale a pena gastar tempo com as opiniões que afirmam que poderíamos ter dispensado a contratação do projeto, da gerenciadora e até mesmo da obra. Equiparar o projeto de reurbanização da Rua 13 de Maio ao projeto da Praça Arautos da Paz é, isto assim, uma atitude de leigo. Quanto ao restante, os depoimentos do atual secretário de Obras, do ex-presidente e dos técnicos da Sanasa, deixam claro que a equipe da Prefeitura não possui condições para tocar, simultaneamente, o pesado dia-a-dia da administração e uma obra da complexidade da Rua 13 de Maio.

Finalmente, a experiência que tivemos em 2004 ajuda a entender por qual motivo a obra da Rua 13 de Maio sempre foi reclamada, mas nunca era iniciada. Os problemas técnicos e políticos envolvidos são tamanhos, que no final prevalecia o tergiversar e adiar. O governo anterior teve a vontade política de realizar a obra. Assumiu um alto custo por isto. O atual governo não precisa de tanta vontade política para concluí-la. Terá todos os bônus e nenhum dos ônus. Por isso, nos espanta que também esteja tergiversando, ao contrário do que prometeram os secretários de Assuntos Jurídicos e de Obras.
“Direcionamento da licitação”
Durante vários depoimentos, o vereador Petterson Prado argumentou que a licitação da obra foi direcionada, graças à inclusão, no respectivo edital, de uma exigência de qualificação técnica, que teria resultado na inabilitação da Construtora Roy Ltda.

A opinião do vereador foi contraditada, “em tese”, tanto pelo atual quanto pela anterior titular da secretaria de Assuntos Jurídicos. Também foi contraditada, “em tese”, por Carlos Henrique Coutinho do Amaral, procurador municipal e ex-presidente da Comissão de Licitação.

Posteriormente, a “tese” do vereador foi reforçada por uma decisão do Tribunal de Contas, que no dia 15 de março de 2005 considerou “irregulares a concorrência pública e o contrato”.

Curiosamente, nos depoimentos a que tive acesso, esta decisão do TCE não é comentada. Talvez tenha sido nos depoimentos posteriores a 4 de abril. De toda forma, o assunto foi tratado na imprensa, onde a ex-secretária de Administração, Maria Tereza Domingues reafirmou a correção do edital, na mesma linha adotada pelo depoimento de Carlos Henrique Coutinho do Amaral.

Infelizmente, a CEI até o momento não convocou a ex-secretária, exatamente quem mais tem condições de esclarecer estes aspectos do edital e fornecer os elementos (inclusive do TCU) que fundamentaram as decisões adotadas pelo corpo técnico da secretaria municipal de Administração.

De toda forma, o vereador parte de uma premissa equivocada: a Construtora Roy não foi desqualificada apenas por este motivo. Como foi assinalado genericamente pelo depoimento de Carlos Henrique Coutinho do Amaral e pode ser conferido no julgamento da habilitação, a Roy não apresentou atestado de obra com respectiva certidão de acervo técnico emitida pelo CREA, comprovando a execução de serviços similares.

Ademais, cabe insistir no seguinte: por que não houve recurso?

Afinal, concordemos ou não com a exigência de comprovação de 10 anos de experiência por parte dos profissionais, nada impediria que a empresa prejudicada entrasse com recurso. E, como é sabido, não houve recurso, nem sobre a exigência técnica, nem sobre a exigência financeira, esta muito mais leonina e também questionada pelo TCE.

De toda forma, esta é uma polêmica que deve ser travada nos órgãos competentes, entre a administração municipal (que tem a obrigação de fazer recurso contra a decisão do TCE) e o Tribunal de Contas.
“O órgão gestor foi relapso ou conivente”

A fiscalização foi feita pela gerenciadora. Tanto a gerenciadora quanto o órgão gestor pressionaram duramente a empreiteira. A prova de que esta pressão ocorreu e surtiu efeitos é que chegamos, em 15 de dezembro de 2004, com 85% da obra concluída.

É importante ressaltar que a velocidade da obra foi crescendo ao longo do tempo, mais uma prova de que a fiscalização e a pressão do órgão gestor surtiram efeito.

Importante, também, dizer que todas as exigências técnicas foram observadas. Inclusive aquelas que não foram apresentadas no momento adequado, como é o caso da exigência feita pela CPFL e relatada nos depoimentos.

Durante os depoimentos, alguns vereadores desconsideram que as notificações encaminhadas pela Estática constituem advertências. E argumentam como se fiscalizar fosse aplicar penalidades pecuniárias, ato que é facultativo e que deve levar em conta as contra-notificações e demais procedimentos adotados pela empreiteira, quando notificada.

O importante a ressaltar é que o órgão gestor atuou com o objetivo de concluir a obra, em particular o trecho subterrâneo, respeitadas todas as exigências técnicas.

Para atingir este objetivo, não nos interessava levar a relação com a empreiteira ao ponto da ruptura. Isto porque, como já dissemos, não havia uma segunda empresa classificada. Por isso, a ruptura produziria a paralisia das obras, seja por embargo judicial, seja por necessidade de uma nova licitação.

Para quem atuava com o objetivo oposto --impedir ou atrasar ao máximo as obras—a atitude que tomamos é, por óbvio, inadequada. Ocorre que foi esta atitude que viabilizou 85% das obras. A atitude oposta, 123 dias decorridos desde a ruptura unilateral praticada pela Varca Scatena, produziu o quê?

Ademais, é bom recordar que a obra não foi aceita ou recebida, nem provisória, nem definitivamente. Estes procedimentos existem justamente para que o poder público tenha como aferir e cobrar a execução e re-execução dos serviços faltantes e/ou defeituosos.

“O órgão gestor cometeu diversas ilegalidades”

A administração municipal não cometeu nenhuma ilegalidade, nem no processo de licitação, nem na fase do projeto, nem na fase da obra.

Quanto à licitação, sugerimos a leitura do depoimento do atual secretário de Assuntos Jurídicos. O questionamento feito pelo TCE será objeto de contestação e julgamento e, como disse a ex-secretária de Administração, Maria Tereza Domingues, o próprio TCU fornece os elementos para sustentar a posição do poder público municipal.

Quanto aos projetos, obedecem a todos os parâmetros. Os questionamentos existentes dizem respeito ao “partido” (no sentido utilizado pelos arquitetos e urbanistas) da obra e não constituem caso de “legalidade”.

Quanto à obra, há três tipos de questionamento: um diz respeito ao aditamento de prazo, outro diz respeito ao aditamento de valor e outro diz respeito ao convênio realizado com a CPFL.

Sobre o primeiro questionamento, sugerimos a leitura do depoimento da ex-secretária de Assuntos Jurídicos, que esclareceu –falando em tese— que o contrato de uma obra se encerra quando a obra é concluída.

Sobre o segundo questionamento, sugerimos a leitura do depoimento do atual secretário de Assuntos Jurídicos, que esclareceu que os procedimentos de aditamento são normais, no curso de uma obra, dentro dos parâmetros previstos em Lei.

Acerca
de ambos os casos, optamos por não tratar dos questionamentos concretos, pelos motivos expostos antes: não queremos fornecer elementos que, mal interpretados ou distorcidos, possam servir ao pleito que a empreiteira mantém contra o poder público municipal.

Mas estamos seguros de que só pagamos aquilo que foi feito. E que tudo que foi feito, foi feito dentro da legalidade e do interesse público.

Quanto ao terceiro questionamento, estamos diante de uma situação kafkiana: um dos vereadores acusa a prefeitura de ter induzido a CPFL a cometer um ato ilegal!!! Ora, o que tem acontecido é exatamente o contrário: a CPFL exige da Prefeitura que pague antecipadamente por seus serviços, criando dificuldades enormes para o poder público.

Mas há males que vêm para o bem: o convênio que tanta polêmica causou, realizado provavelmente para adequar-se a esta exigência absurda que a CPFL faz ao poder público municipal, embora este seja provavelmente seu maior cliente, trouxe à luz esta prática lamentável da concessionária. Prática que levou a empresa a apropriar-se, já há vários meses, de um valor expressivo, sem ter realizado o serviço correspondente.
Esperamos que a CEI recomende mais do que a devolução do dinheiro aos cofres públicos. Cabe exigir uma mudança de procedimentos por parte da concessionária.

Quanto à legalidade do convênio, já foi indicado pela ex-secretária de Assuntos Jurídicos a necessidade da CEI requisitar o protocolo referente ao caso, para que os vereadores tomem ciência dos pareceres jurídicos que embasaram o ato. Novamente, recomenda-se ouvir a ex-secretária de Administração, Maria Tereza Domingues, responsável pela interface entre a Prefeitura e a CPFL.

Como dissemos no início: ou a CEI foi proposta para atingir outros objetivos; ou a CEI está sendo manipulada para atingir outros objetivos, que não o de responder aquelas duas questões indicadas pela imprensa.

O que se viu até agora foi uma tentativa de questionar os procedimentos do governo petista (questionamentos vindos inclusive de vereadores que participaram ativamente das decisões do governo anterior); de encobrir o fato de, 108 dias depois do início do novo governo, a obra estar –na melhor das hipóteses— como estava no dia 15 de dezembro de 2004; e de fornecer elementos para que a empresa Varca Scatena sustente sua ação contra o poder público municipal.

O elemento mais recente desta tentativa é o “diagnóstico” elaborado pela atual administração, divulgado pela imprensa e mencionado no depoimento realizado em 11 de abril (a cuja transcrição não tivemos acesso).

Aguardamos que este diagnóstico nos seja entregue oficialmente, para que sobre ele possamos nos pronunciar.
Conclusão parcial

Entretanto, nos causa espécie a notícia de que seriam necessários 3 milhões e 541 mil reais para concluir a obra da Rua 13 de Maio. Comparando este valor com os 3 milhões e 976 mil reais do contrato firmado com a Varca Scatena, chega-se a conclusão de que o “diagnóstico” elaborado pela atual administração pretende  que quase tudo resta a ser feito, refeito ou pago!!!

Provavelmente, trata-se de um orçamento preliminar, que terá de ser completamente refeito quando for encaminhado para licitação.

Provavelmente, também, parta-se de um objeto diferente daquele utilizado quando da licitação da obra da Rua 13 de Maio, incorporando áreas novas e serviços novos, o que torna impossível comparar diretamente os valores. Mas gerando, nos leigos, todo tipo de especulação.

Provavelmente, para chegar a este valor, se está considerando a necessidade de fazer ou refazer completamente serviços já feitos. Só como exemplo, o contrapiso da Rua 13 de Maio foi orçado, no início de 2004, em aproximadamente 375 mil reais para 10.800m2. Caso proceda a informação fornecida pela imprensa, o “diagnóstico” do governo fala de gastar 500 mil reais com 10.500m2. Ou seja, o diagnóstico trabalha com um custo mais alto e com a pretensão de refazer praticamente todo o contra-piso, o que é um total contra-senso.

Provavelmente, o valor total indicado no “diagnóstico” elaborado pela atual administração indica que os técnicos foram levados a aceitar, ao contrário do que ocorreu na administração anterior, as exigências abusivas das concessionárias, que transferem para o poder público gastos que cabem a elas, empresas privadas.

Provavelmente, o orçamento proposto pelo diagnóstico adota um “partido” distinto do adotado pela administração anterior. Por exemplo: se consideramos que o contrapiso da Rua 13 de Maio precisa ser de “alto tráfego” (equívoco natural para um engenheiro acostumado a construir estradas de rodagem), isto encarece tudo, a começar pelos tampões de esgoto e águas pluviais.

Em resumo, o tal diagnóstico –que aguardamos nos seja entregue pela CEI ou pela administração—foi transformado em mais uma peça do jogo de desvirtuamento dos propósitos originais da CEI, ao menos como foram divulgados pela imprensa.

Caso este jogo não seja interrompido, não há porque ter dúvidas sobre qual será o parecer da CEI. De toda forma, enquanto o PSDB e o governo Hélio tentam desgastar o PT, não devemos nos esquecer de cobrar que façam aquilo que se comprometeram a fazer, em benefício da sociedade: que concluam rápido a Rua 13 de Maio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário