(texto em construção, sem revisão, agradecemos críticas)
A Nação Petista está preocupada. Preocupada com o que está acontecendo no mundo, no continente e no Brasil, preocupada com o governo Lula e, acima de tudo, preocupada com o rumo do próprio Partido dos Trabalhadores.
O PT venceu 5 das 9 eleições presidenciais realizadas desde 1989; ficou em segundo lugar nas outras quatro. Sem dúvida alguma, na história do Brasil, nunca um partido de esquerda foi tão influente. O PT conseguirá usar esta força para mudar os rumos do Brasil?
Até hoje, as tentativas de mudar os rumos do Brasil sempre terminaram em derrotas relativas. Nossa independência política frente a Portugal foi acompanhada da dependência frente a Inglaterra e, depois, aos Estados Unidos. A escravidão foi “abolida”, mas as marcas da escravidão seguem entre nós. A República nasceu atravessada pelos militares e controlada pelo latifúndio. A industrialização não foi acompanhada de reforma agrária, nem tampouco de um “estado de bem-estar social”. A redemocratização foi contemporânea do neoliberalismo. E os governos de esquerda não implementaram, até agora, reformas estruturais.
Se depender da classe dominante, especialmente de suas frações financeira, do agronegócio, da mineração e transnacional, nosso país continuará como sempre foi: dependência profunda, desigualdade abissal, democracia limitada, desenvolvimento parcial.
A classe dominante não apenas lucra com o status quo, como perderia muito caso nosso país superasse a dependência e a desigualdade, caso se tornasse realmente democrático e desenvolvido.
Por isto, uma transformação estrutural do Brasil depende da classe trabalhadora. Somente por ação da classe trabalhadora, será possível construirmos um Brasil soberano, com altos níveis de bem-estar social, de liberdades democráticas e de desenvolvimento.
A classe trabalhadora só conseguirá fazer isto, se ela se tornar classe dominante. Ou seja, se tiver poder suficiente para mudar as estruturas da sociedade brasileira. Acontece que uma sociedade onde a classe trabalhadora detenha tal quantidade de poder, terá se transformado em uma sociedade socialista.
Noutras palavras: um Brasil soberano, democrático, com altos níveis de bem-estar e desenvolvimento, será também um país socialista.
Não era esse o ponto de vista da maior parte da esquerda brasileira, entre 1922 e 1980.
Especialmente no Partido Comunista, mas não só, prevalecia a ideia de que, antes do Brasil iniciar uma transição socialista, seria necessário construir um país soberano, democrático e desenvolvido.
Uma das grandes novidades do PT, nos anos 1980, foi derrubar esta “muralha da China” que separava o socialismo dos objetivos democráticos e nacionais.
Nos anos 1990, entretanto, aconteceu uma tripla mudança: o socialismo soviético veio abaixo; o neoliberalismo tornou-se hegemônico na economia, na sociedade e na política brasileira; e o PT mudou de estratégia.
Hoje, o Brasil retrocedeu ao que ele já foi nos anos 1920, ou seja, uma nação primário-exportadora. O retrocesso do Brasil contribuiu para que o PT também retrocedesse, no caso em direção à concepções parecidas com aquelas defendidas pelo velho Partido Comunista. Entre essas concepções, o “etapismo”, a saber: primeiro as transformações democráticas e só depois as transformações socialistas.
Paradoxalmente, esta mudança na posição do PT foi e segue sendo contemporânea de uma brutal crise sistêmica mundial, nos planos ambiental, militar, política, social e econômico. Tal crise sistêmica confirma duas coisas: a continuidade do capitalismo ameaça a sobrevivência da humanidade e, por isso mesmo, o socialismo está na ordem-do-dia.
A mudança na posição do PT coincide, também, com um momento histórico em que estão dadas algumas das condições necessárias para que o Brasil se liberte da condição de subpotência primário-exportadora e estufa do capital financeiro.
Como aconteceu no passado, é nos momentos de crise mundial que países como o Brasil podem mudar o seu lugar no mundo. A atual crise sistêmica, em particular a disputa entre EUA e China, abre uma “janela” que o Brasil pode e deve aproveitar para mudar sua sociedade e seu lugar no mundo.
Esta “janela” não estará aberta para sempre. Se não aproveitarmos a oportunidade, não importa quem hegemonizará o mundo: seguiremos dependentes. E nossa dependência causará desigualdade, a desigualdade reduzirá as liberdades democráticas. E o conjunto da obra limitará nosso desenvolvimento.
Por outro lado, caso tenhamos êxito na luta em favor dos objetivos históricos da classe trabalhadora, caso o Brasil se torne um país socialista, isto dará uma contribuição imensa para a luta mundial pelo socialismo. Afinal, se um país com a potência do Brasil se tornar socialista, isto alterará significativamente a correlação de forças mundial entre socialismo e capitalismo.
Mas para que isso aconteça, é preciso que a classe trabalhadora brasileira detenha o poder. Alguns setores da esquerda brasileira acham que “poder” é igual a “governo”. Mas a experiência que tivemos em 2016 e nossa situação em 2025 demonstraram, a quem tinha dúvida, que governos têm poder, mas não concentram todo o poder.
Em 2016, depois de termos vencido quatro eleições presidenciais, fomos derrubados por um golpe parlamentar, midiático e judicial. Em 2025, apesar de termos a presidência de República, a “correlação de forças” nos impõe imensos limites. Como dissemos: governo tem poder, mas não concentra todo o poder.
Acontece que poder, assim como o capital, não é uma “coisa”, mas sim uma relação. Portanto, para que a classe trabalhadora detenha o poder, é preciso que a classe capitalista deixe de ser dominante, ou seja, deixe de ter a maior parte do poder de que dispõe hoje.
Este poder da classe dominante advém, em primeiro lugar, do controle dos meios de produção. Enquanto a classe dos capitalistas controlar a maior parte das empresas e dos recursos financeiros, ela terá os meios para decidir ou pelo menos influenciar fortemente os rumos da sociedade brasileira.
O poder dos capitalistas advém, em segundo lugar, do controle das instituições de Estado. Embora sejam minoria numérica na população brasileira, os capitalistas controlam, direta ou indiretamente, a maior parte do Congresso Nacional, dos governos estaduais e dos governos municipais. Além disso, os capitalistas têm enorme presença no atual governo federal e no Banco Central. As forças armadas, as polícias e o sistema judiciário são ideologicamente alinhados com os valores capitalistas, sem falar dos vínculos familiares que existem entre os juízes, o oficialato e o empresariado.
O poder dos capitalistas advém, em terceiro lugar, do controle de uma rede de instituições privadas que estão, direta ou indiretamente, comprometidas com a manutenção da ordem baseada na exploração do trabalho pelo capital. Entre estas instituições, destaca-se grande parte dos meios de comunicação, cultura, esportes, educação e igrejas. Vale dizer que o crime organizado também faz parte desta rede de instituições privadas comprometidas com a exploração do trabalho pelo capital.
O poder dos capitalistas advém, em quarto lugar, do apoio internacional, particularmente decisivo quando há governos de esquerda, que precisam ser sabotados e/ou derrubados pela ingerência externa.
Finalmente, há a força da inércia, do “sempre foi assim e sempre será”.
Para que a classe trabalhadora venha a deter o poder, faz-se necessário enfraquecer ao extremo o poder dos capitalistas e, de forma mais ou menos simétrica, fortalecer no limite o poder da classe trabalhadora.
É preciso, em primeiro lugar, ampliar a propriedade coletiva, estatal, pública dos meios de produção. Impor limites ao poder dos capitalistas sobre suas empresas e, também, sobre seus recursos financeiros. O sistema financeiro, em particular, precisa estar sob controle do Estado, não de um oligopólio privado. Só desta forma poderemos industrializar o país, uma industrialização de novo tipo, que nos converta em uma das grandes "oficinas e laboratórios" do mundo.
É preciso, em segundo lugar, ampliar a presença da classe trabalhadora nas instituições de Estado. Mas esta ampliação esbarra nos mecanismos de eleição e de seleção vigentes hoje e desde há muito tempo. Por isso, com base nas regras atuais, não há como ampliar suficientemente nossa presença na chamada institucionalidade; para isso é preciso construir uma nova institucionalidade, um Estado de novo tipo. Sem isso, os trabalhadores nunca terão o controle dos parlamentos, dos executivos, do judiciário, das forças armadas e das polícias, muito menos de agências como o Banco Central.
É preciso, em terceiro lugar, construir uma rede de instituições privadas comprometidas com o Trabalho na sua luta contra o Capital: meios de comunicação, cultura, esportes e educação a serviço da humanidade, não a serviço dos capitalistas. Mas, acima de tudo, é preciso fortalecer as organizações típicas da própria classe trabalhadora: os sindicatos, os movimentos, os partidos de esquerda. Sem auto-organização da classe trabalhadora, não se conquistará o espaço devido na atual institucionalidade, nem se manterá sob controle a nova institucionalidade que precisa ser criada.
É preciso, em quarto lugar, construir uma rede de apoio internacional, particularmente na América Latina e Caribe. Quanto mais ocupado estiver o imperialismo, mais difícil será ele concentrar toda a sua energia contra uma determinada sociedade.
Finalmente, é preciso contrapor, à inércia do “sempre foi assim e sempre será”, uma cultura estruturada em torno da ideia de que outro mundo é possível, urgente e necessário: um mundo socialista. Não haverá socialismo, nem transformação estrutural, sem que haja um élan revolucionário em uma parte importante da classe trabalhadora. Isso implica em difundir valores democráticos, populares, nacionais, integracionistas, internacionalistas, feministas, contrários a todo tipo de racismo, intolerância e preconceito, laicos. Criar uma cultura cívica socialista é a melhor maneira de combater a ideologia fascista e as teologias neoliberais.
No mundo ideal, cabe ao Partido organizar este conjunto de ações em um plano coerente, incluindo nisto enfrentar e derrotar os contra-ataques dos capitalistas. Entretanto, para que este “plano coerente”, para que esta estratégia possa ser implementada, é preciso criticar e superar as posições atualmente hegemônicas na esquerda brasileira, principalmente no PT. Assim como é preciso superar o déficit teórico que pesa sobre a esquerda brasileira.
A vitória do socialismo depende da luta prática, da mobilização de dezenas de milhões de pessoas. Mas uma das principais características do ser humano é pensar antes de agir, ou seja, prefigurar na sua mente os atos que vai realizar. Isto que vale para um ser humano individual, também vale para as organizações, ainda que o processo seja mais complexo e envolva outras variáveis. Em qualquer caso, quanto mais precisa for a definição dos objetivos que se pretende alcançar, a compreensão adequada da realidade sobre a que se vai agir, o conhecimento acerca de situações similares, maiores as chances de êxito.
E a verdade é que, ao menos no caso do Partido dos Trabalhadores, nosso conhecimento coletivo possui imensas lacunas. Isso acontece, em alguns casos, devido à nossa debilidade na formação política; noutros casos devido a mudanças na própria realidade, que não foram devidamente estudadas e compreendidas; mas também devido a redução da mobilização social.
A classe trabalhadora aprende principalmente na luta; é através da luta que milhões de pessoas se libertam da ideologia dominante; é através da luta que milhões de pessoas “pesquisam” e compreendem a realidade. Menos luta implica em maior influência da ideologia dominante, menos compreensão da realidade, menos formação política, menos militantes.
Em tempos de grande mobilização social a formação política organizada serve para aperfeiçoar a qualidade de quem está combatendo. Já em tempos de reduzida mobilização social, a formação política é essencialmente um paliativo, uma política compensatória, uma redução de danos.
Por isso mesmo, nestes momentos é preciso mais atenção para a qualidade e para a quantidade: necessitamos de uma formação política de alta qualidade e que abranja o maior número possível de pessoas.
A qualidade de nossa formação será tanto maior, quanto melhor for nossa compreensão da realidade brasileira. Evidente que precisamos compreender a dinâmica mundial do capitalismo, evidente que precisamos de um balanço atualizado da luta pelo socialismo no século passado e nesse, assim como também é evidente que precisamos conhecer a tradição marxista.
Mas nada disso é suficiente, caso não tenhamos uma leitura adequada da sociedade brasileira, especialmente das classes e da luta de classes no Brasil de 2025. E para dar conta desta tarefa, precisamos superar e derrotar as concepções atualmente hegemônicas na sociedade brasileira.
Nós não somos o partido de "todo o povo" brasileiro, somos o partido da classe trabalhadora brasileira. Nosso objetivo é hegemonizar a maior parte do povo brasileiro, para o que precisamos derrotar aquela minoria da população que integra a classe dominante. Mas mesmo quando nos tornarmos hegemônicos, devemos continuar sendo o partido da classe trabalhadora. Claro que podemos e devemos utilizar os termos povo e popular; mas é preciso entender qual o sentido de classe que damos a estas palavras.
A classe trabalhadora brasileira só existe na luta. Fora da luta, submetida à dominação política e ideológica da classe dominante, a classe trabalhadora se converte num aglomerado de setores, frações e interesses conflitantes entre si. Por isso, é importante compreender objetivamente a classe (os diferentes tipos de assalariados, os que trabalham por conta própria, os que possuem algum tipo de propriedade, os que assalariam outros trabalhadores, as diferenças de gênero, geracionais, étnicas, religiosas e regionais); mas mais importante ainda é colocar o conjunto da classe em movimento por seus interesses comuns. Sem isso, prevalecerá a fragmentação e os conflitos no seio do povo.
Nossa luta é contra a classe dos capitalistas, especialmente contra suas frações financeira, primário-exportadora, transnacional. Nesta classe há indivíduos que simpatizam com as causas da classe trabalhadora. Também há setores – especialmente os burgueses pequenos e médios – que podem e devem ser atraídos pela classe trabalhadora. Aliás, dada a centralidade que a industrialização tem em nosso programa, a burguesia média e pequena terá grande espaço para se desenvolver em uma sociedade controlada pela classe trabalhadora. Mas enquanto classe, o conjunto dos capitalistas, o conjunto da classe dominante, é nossa inimiga e deve ser derrotada. É possível e muitas vezes necessário fazer alianças táticas com inimigos. Mas com eles não cabe nenhuma aliança estratégica.
Para executar seu programa, a classe trabalhadora precisa conquistar o poder. Como já dissemos, a luta pelo poder não se resume a chamada luta institucional. Disputar eleições, exercer mandatos legislativos e executivos é parte da luta pelo poder. Mas o poder obtido por este caminho é totalmente insuficiente. O Estado que, ao longo de décadas e séculos, foi construído e controlado pela classe dominante não foi feito para a classe trabalhadora exercer o poder. É preciso, portanto, combinar a luta por ocupar espaços no aparelho de Estado, com a construção de um contrapoder da classe trabalhadora, fora do aparelho de Estado e voltado a construir outro tipo de Estado.
O PT, quando foi criado, compreendia instintivamente isto. Depois, buscou formular a respeito. Posteriormente, abandonou a reflexão a respeito. Como resultado disto, tudo que diz respeito à construção de um contrapoder da classe trabalhadora foi sendo secundarizado, esquecido ou terceirizado. Ao mesmo tempo, o Partido foi se especializando em uma única dimensão da luta: a eleitoral-institucional. Tivemos grande êxito nesse terreno. Mas hoje está cada vez mais evidente que a unilateralidade de nossa estratégia está prejudicando inclusive nosso desempenho eleitoral.
Uma das consequências desta unilateralidade consiste em deixar a extrema-direita se fantasiar de “antissistêmica”. A extrema-direita surge nos momentos de profunda crise do capitalismo, quando parte da classe trabalhadora está despertando para a necessidade de “virar o mundo de ponta cabeça”. Nesse ambiente, a extrema-direita busca se apropriar da raiva que nossa classe tem do “sistema” e direcionar esta raiva contra setores da própria classe (os migrantes, os negros e negras, as mulheres, os lgbt, a esquerda).
Vale dizer que esta operação da direita está na origem da confusa discussão acerca do chamado identitarismo. A direita joga uns setores da classe contra outros setores da classe, estigmatizando as principais vítimas. Uma parte da esquerda reage a isto, fazendo uma defesa a ultranza dos direitos dos setores estigmatizados pela direita. Outra parte da esquerda reage, fazendo uma defesa abstrata da classe, mesmo sob pena de largar a mão de muitas vítimas. O desafio, por óbvio, está em defender a classe realmente existente, que é predominante feminina e negra, que é profundamente diversa, que é concreta enquanto síntese de múltiplas determinações.
Se a esquerda não disputar a raiva que nossa classe tem do "sistema", se a esquerda não for a campeã da luta contra o status quo, se a esquerda abrir mão de defender a revolução, a ruptura, as reformas estruturais, estaremos abrindo caminho para o crescimento da extrema-direita. E não se trata, apenas, de uma questão circunscrita a batalha cultural, ideológica, de visões de mundo.
Um exemplo didático disto é o que ocorreu entre a campanha e a posse do governo Lula. Na campanha, falamos de “reconstrução e transformação”. Na posse, mudamos nosso slogan para “união e reconstrução”. Junto com a palavra transformação, foram também arquivadas ações práticas decisivas, como a reversão das contrarreformas, como o enfrentamento do capital financeiro, como a reforma agrária etc. O resultado é que mudamos a vida do povo numa velocidade muito lenta; e não conferimos sentido político geral à estas mudanças. E o sentido político geral não é dado por um slogan publicitário, mas sim por um projeto de sociedade que se contraponha ao dominante: o socialismo.
Outra das consequências de uma estratégia unilateral é a metamorfose que está em curso em nosso partido. Esta metamorfose produz várias deformações, entre as quais citamos: as filiações de pessoas que não são petistas; o não funcionamento das instâncias; a falta de controle coletivo e democrático sobre as finanças nacionais do Partido, inclusive o fundo eleitoral; o coronelismo de lideranças estaduais e municipais, bem como de alguns grupos que atuam como se fossem donas do Partido, inclusive dentro da bancada federal; a submissão do Partido aos governos e mandatos parlamentares; e o culto a personalidade (também conhecido popularmente como puxa-saquismo) que alguns dirigentes devotam a Lula, culto que tem como uma de suas vítimas o próprio Lula, que devido ao puxa-saquismo é privado de opiniões críticas essenciais para o seu bom desempenho como liderança partidária e como presidente da República.
De todas as deformações, há uma principal: tratar a classe trabalhadora como eleitorado. A classe trabalhadora é a grande protagonista da transformação do Brasil. A classe trabalhadora precisa educar a si mesma, organizar a si mesma e mobilizar a si mesma. O Partido é essencial nesse tríplice esforço e por isso precisa estar presente, de forma organizada, nos locais de trabalho, moradia, educação e lazer. E precisa abrir grande espaço, na agenda de suas direções em todos os níveis, para debater as questões e lutas do cotidiano da classe, para planejar como fará o famoso trabalho de base, como enfrentar a presença cada vez mais capilarizada e organizada da direita nos territórios, junto à classe trabalhadora.
Nada disso será feito, entretanto, se prevalecer a deformação estratégica que só tem olhos, tempo e dinheiro para as ações eleitorais e institucionais. E que, por isso, trata a classe trabalhadora de forma parecida a como agiam os populistas de antigamente: como eleitorado.
Como dissemos no início deste texto, a Nação Petista está preocupada. E tem muitos motivos para esta preocupada. Nosso desafio, no processo de eleição direta das direções partidárias, é transformar esta preocupação em mudança. Mudança que em parte significa reencontrar o fio vermelho das formulações presentes no Manifesto do PT, nas resoluções do IV e do V encontros nacionais, realizados em 1986 e 1987, bem como do Sexto Congresso, realizado em 2017. Mudar os rumos do PT, mudar a direção do PT, para que o PT possa contribuir na transformação profunda do Brasil, no sentido de um país verdadeiramente soberano, igualitário, democrático e desenvolvido. Portanto, um país socialista.
(texto em construção, sem revisão, agradecemos críticas)
Anexo 1 (capítulo sobre estratégia e programa da resolução do sexto congresso do PT)
RESOLUÇÃO SOBRE ESTRATÉGIA E PROGRAMA
1. O desenvolvimento do capitalismo brasileiro, ao longo de sua história, tem sido
alavancado por superexploração do trabalho, concentração de renda e riqueza, exclusão
social e subordinação aos centros imperialistas. O processo de formação das classes
dominantes locais, associado à sua inserção subalterna na ordem capitalista mundial,
somente ofereceu, aos trabalhadores e às demais camadas populares, a chibata do
escravismo, da desigualdade, da dependência e da pobreza.
2. Esses fenômenos, longe de constituírem deformações ou enfermidades do sistema,
representam sua própria lógica. Cruzam-se e sintetizam o processo permanente de
barateamento da mão de obra, apropriação dos recursos estatais por grupos monopolistas,
abertura indiscriminada aos fluxos internacionais de capital, desobrigação fiscal sobre o
lucro capitalista e exploração predatória dos recursos naturais. São esses os caminhos
pelos quais a burguesia brasileira historicamente se embrenhou para compensar
fragilidades estruturais e melhorar seu lugar na acumulação planetária de capitais.
3. A reprodução da miséria e da pobreza, acompanhada por opressão de raça e gênero,
sempre foi funcional para a manutenção de um gigantesco exército industrial de reserva,
além de refletir a situação de abandono provocada por modelos de desenvolvimento nos
quais o mercado interno se restringe às camadas médias e ricas da sociedade.
4. Ao longo dessa trajetória, ocorreram variações, de duas naturezas distintas. O primeiro
tipo refere-se a quando frações nacionalistas da burguesia, com forte base entre os
trabalhadores, ascenderam à direção do Estado, como foram os casos do segundo governo
de Getúlio Vargas e da administração de João Goulart. O segundo, durante os governos
Lula e Dilma, quando um partido orgânico da classe trabalhadora alcançou o comando do
poder público. Essas experiências tiveram em comum o redirecionamento do orçamento
nacional para a expansão do mercado interno de massas por meio do aumento de salários
e direitos, do fortalecimento do Estado como indutor e coordenador do desenvolvimento
econômico e da adoção de uma política internacional efetivamente soberana. Mais cedo
ou mais tarde, nesses capítulos de nossa história, os setores hegemônicos do empresariado
e seus aliados externos acabariam por comandar movimentos de caráter antinacional,
antipopular e antidemocrático, com o objetivo de trazer o capitalismo brasileiro de volta
ao seu leito histórico.
5. Até o final do governo Fernando Henrique Cardoso, marcado pela financeirização global,
essas características se exacerbaram: além de gerarem sofrimento e escassez de
oportunidades às amplas maiorias, levaram à perda de força propulsora, atolando o país
em baixas taxas de crescimento e investimento, ao mesmo tempo em que a rentabilidade
dos ativos financeiros impulsionava os lucros monopolistas.
6. A principal consequência desse processo, no mundo do trabalho, é bastante conhecida:
brutal precarização das relações laborais. O país foi empurrado à desindustrialização, à
ampliação do território dedicado à agricultura de commodities e ao extrativismo mineral,
à subordinação ao sistema financeiro internacional.
7. Esse cenário começou a ser alterado durante os governos liderados pelo PT, quando a
elevação geral dos salários, a expansão de direitos, a recuperação do Estado e a
reorientação do orçamento público impulsionaram o mercado interno, dinamizando o
conjunto da economia em conjunto com a expansão do comércio mundial de commodities.
A partir da crise capitalista de 2008, no entanto, paulatinamente emergiu forte reação
burguesa, buscando cortar profundamente custos salariais diretos e indiretos, além de
recuperar espaço nos gastos e fundos públicos, particularmente através da receita com
juros e subsídios diversos. Essa contraofensiva foi relativamente contida até 2013, pelo
sucesso das administrações petistas em preservar o consumo familiar, o investimento
estatal e o crescimento econômico geral. Mas adquiriu agressividade quando começaram
a declinar os fatores que serviam de compensação às elites frente ao aumento constante
da renda do trabalho. Trata-se, enfim, da prova mais recente de incompatibilidade entre
a via brasileira de desenvolvimento capitalista e os interesses nacionais-populares. O
golpe de Estado perpetrado em 2016 foi a expressão política dessa arremetida do grande
capital.
8. O velho sistema oligárquico-burguês revela-se, portanto, incapaz de garantir
desenvolvimento sustentável, justiça social, direitos civis e independência nacional.
Nessas circunstâncias, criar as condições políticas, materiais e culturais para o
nascimento de uma sociedade pós-capitalista, de natureza socialista e democrática,
constitui a tarefa histórica fundamental que norteia o Partido dos Trabalhadores, tal
como afirmam o Manifesto de Fundação e as resoluções sobre socialismo petista aprovadas
no 7º Encontro Nacional (1987), no 1º Congresso (1991) e no 3º Congresso (2007).
9. A emancipação dos trabalhadores, nesse sentido, somente será possível com a superação
do regime capitalista, incapaz de resolver os grandes problemas do país. Reformas que
arrefeçam sua natureza parasitária devem ser entendidas como potencialmente
antagônicas às características dominantes que o regulam, colocando sob tensão a
sobrevivência do próprio sistema e desmontando seus pilares de sustentação, ao mesmo
tempo em que favorecem a educação política e a mobilização de amplas massas.
10. O PT entende que a reconstrução do socialismo como ideal de amplos setores sociais é
um dos maiores desafios de nossa época.
11. Nosso partido se constituiu realizando uma profunda crítica aos limites e às contradições
da social-democracia e ao chamado socialismo real. Ao fazê-lo apontou a necessidade de
superação da gênese e dinâmicas da concentração capitalista, de ruptura dos monopólios
sobre a indústria, o comércio, a terra e as finanças, a necessidade de planificação
democrática da economia, de fortalecimento de empreendimentos não monopolistas e da
economia solidária e cooperativa, de grande desenvolvimento da ciência, da tecnologia,
das artes e da cultura em geral, bem como de sua democratização, de proteção e
sustentabilidade ambiental.
12. As transformações econômicas, sociais, políticas e culturais, na direção da superação da
dominação de seres humanos por outros seres humanos, envolverão processo continuado
de lutas e conquistas, rupturas e conflitos, criação e recriação de experiências em todos
os campos da vida humana. Como em outros períodos históricos as experiências de
transformação nada terão de linear.
13. O Partido dos Trabalhadores buscará, com maior audácia e rigor teórico, com vigor e
compromisso, intensificar o debate sobre os fundamentos de nossa concepção de
socialismo democrático em diálogo com as forças populares, intelectuais, artistas,
partidos de esquerda, alimentando-nos para isso também da interlocução com a esquerda
em diferentes partes do mundo. Mas o fazemos a partir da luta e da experiência concreta
da classe trabalhadora, cuja força e movimento alimentam a existência do PT. Temos a
convicção de que a sociedade capitalista, baseada na exploração e na opressão, está
longe de ser o fim da história e de que ela pode e deve ser superada, para que a
humanidade alcance novos patamares de dignidade e padrões de convívio social justos e
livres.
14. O socialismo pelo qual lutamos corresponde à mais profunda democratização. Isto
significa democracia social; pluralidade ideológica, cultural e religiosa; igualdade de
gênero, igualdade racial, liberdade de orientação sexual e identidade de gênero. A
igualdade entre homens e mulheres, o fim do racismo e a mais ampla liberdade de
expressão sexual serão traços distintivos e estruturantes da nova sociedade. O pluralismo
e a auto-organização, mais do que permitidos, deverão ser incentivados em todos os níveis
da vida social. Devemos ampliar as liberdades democráticas duramente conquistadas
pelos trabalhadores na sociedade capitalista. Liberdade de opinião, de manifestação, de
organização civil e político-partidária e a criação de novos mecanismos institucionais que
combinem democracia representativa e democracia direta. Instrumentos de democracia
direta, garantida a participação das massas nos vários níveis de direção do processo
político e da gestão econômica, deverão conjugar-se com os instrumentos da democracia
representativa e com mecanismos ágeis de consulta popular, libertos da coação do capital
e dotados de verdadeira capacidade de expressão dos interesses coletivos.
15. O socialismo petista é internacionalista. Somos todos seres humanos, habitantes de um
mesmo planeta, casa comum a que temos direito e de que todos devemos cuidar. O
capitalismo é um modo de produção que atua em escala internacional e, portanto, o
socialismo deve também propor alternativas mundiais de organização social. Apoiamos a
autodeterminação dos povos e valorizamos a ação internacionalista, no combate a todas
as formas de exploração e opressão. O internacionalismo democrático e socialista é nossa
inspiração permanente. Os Estados nacionais devem ter sua soberania respeitada e devem
cooperar para eliminar a desigualdade econômica e social, bem como todos os motivos
que levam à guerra e aos demais conflitos políticos e sociais. Os organismos multilaterais
criados após a Segunda Guerra Mundial deverão ser reformados e/ou substituídos, para
que sejam capazes de servir como superestrutura política de um mundo baseado na
cooperação, na igualdade, no desenvolvimento e na paz.
16. A economia socialista deverá ter como centro organizador o planejamento democrático e
ambientalmente orientado. Uma economia colocada a serviço, não da concentração de
riquezas, mas do atendimento às necessidades presentes e futuras do conjunto da
humanidade. Para tanto será necessário retirar o planejamento econômico das mãos de
quem o faz hoje: da anarquia do mercado capitalista, bem como de uma minoria de
tecnocratas estatais e de grandes empresários, a serviço da acumulação do capital e, por
isso mesmo, dominados pelo imediatismo, pelo consumismo e pelo sacrifício de nossos
recursos sociais e naturais.
17. O principal pilar desse novo modo de produção será a propriedade pública dos grandes
meios de produção. As riquezas da humanidade são uma criação coletiva, histórica e
social, de toda a humanidade. O socialismo que almejamos, só existirá com efetiva
democracia econômica. Deverá organizar-se, portanto, a partir da propriedade social dos
meios de produção. Propriedade social que não deve ser confundida com propriedade
estatal, e que deve assumir as formas (individual, cooperativa, estatal etc.) que a própria
sociedade, democraticamente, decidir. Democracia econômica que supere tanto a lógica
do mercado capitalista, quanto o planejamento autocrático estatal vigente em muitas
economias ditas socialistas. Queremos prioridades e metas produtivas que correspondam
à vontade social, e não a supostos interesses estratégicos de quem comanda o Estado.
Queremos conjugar o incremento da produtividade e a satisfação das necessidades
materiais, com uma nova organização do trabalho, capaz de superar a alienação
característica do capitalismo. Queremos uma democracia que vigore tanto para a gestão
de cada unidade produtiva, quanto para o sistema no conjunto, por meio de um
planejamento estratégico sob o controle social.
18. O progresso desse novo sistema depende, em grande medida, da integração latinoamericana e do fortalecimento de blocos que se contraponham ao controle dos Estados
imperialistas sobre as principais entidades creditícias, comerciais, reguladoras e militares
do planeta. A alternativa socialista não se circunscreve apenas às fronteiras nacionais,
pois sua viabilidade está parcialmente condicionada pela capacidade de criar gigantescos
ativos em infraestrutura, crédito, mercado de consumo, escala de produção, comércio
exterior, tecnologia e inovação, proteção do meio ambiente e autodefesa.
19. Os ideais e valores do socialismo democrático se constituem, para nós, nos referenciais
para formulação das bandeiras de luta, para resgatar o que está sendo destruído pelo
governo golpista e aprofundar a construção de nosso programa alternativo para o país,
que deve avançar nas reformas democrático-populares iniciadas nos governos Lula e
Dilma.
20. As profundas reformas de que nosso país necessita exigem a um só tempo mobilização
popular e construção social, elaboração intelectual e política. Nosso intuito é que sejam
defendidas pela maioria dos trabalhadores e trabalhadoras, pela juventude, pelos
intelectuais e cientistas, de todas as etnias, em todas as regiões.
21. O PT está desafiado a contribuir para a ampliação da organização e consciência crítica
das classes trabalhadoras na luta contra as orientações e as medidas ultraliberais impostas
por um governo sem voto e sem legitimidade. Nesse processo o partido deve seguir
atualizando seu programa em diálogo com os movimentos sociais, com as frentes Brasil
Popular e Povo Sem Medo, com todos os setores e personalidades comprometidos com a
transformação da sociedade brasileira no rumo da justiça social e da verdadeira
democracia. Trata-se de combinar, cada vez mais, mobilização social e ação institucional,
o que envolverá conflitos e rupturas, pois a natureza das classes dominantes brasileiras,
além de colonial e racista, é profundamente antidemocrática, refletindo mentalidade
política decorrente do caráter particularmente predador e excludente do capitalismo
tardio. Mesmo diante de reformas que beneficiem as classes populares sem afetar de
modo estrutural os interesses das elites, o grande capital não hesita em atropelar o Estado
de Direito.
22. A realização dessas tarefas históricas depende, a médio e longo prazos, da construção do
poder popular, de um Estado dirigido pelas classes trabalhadoras, condição indispensável
para impulsionar reformas que promovam a transformação profunda da vida nacional.
Esse é o caminho que materializa o destino traçado no manifesto de fundação do PT:
“conquistar a liberdade para que o povo possa construir uma sociedade igualitária, onde
não haja explorados nem exploradores”.
23. A edificação do Estado popular ultrapassa a disputa pelo comando das velhas instituições
oligárquicas: apenas a radicalização da democracia, no curso de uma revolução política
e constituinte, poderá sedimentar o processo de mudanças que almejamos. Novas
instituições e métodos, que combinem mecanismos representativos com instrumentos
plebiscitários, democracia direta e poder local, são indispensáveis para as reformas
estruturais e a transição ao socialismo, com a plena vigência, entre outros direitos
fundamentais, do voto universal e secreto, da liberdade de imprensa e manifestação, da
livre organização partidária e sindical.
24. A via de aproximação para as classes trabalhadoras poderem colocar na ordem do dia o
nascimento do Estado popular, nas condições históricas atuais, é a retomada da
Presidência da República e a formação de uma maioria parlamentar defensora das
reformas estruturais. Este é o desdobramento almejado de um processo que combine
lutas institucionais e sociais, política de alianças e construção partidária, elaboração
programática e reivindicações específicas, mobilização popular e batalha eleitoral,
gestão local e atuação parlamentar, educação de massas e batalha cultural.
25. A conquista do governo federal representa etapa essencial, mas não significa que o poder
político terá transitado para as classes trabalhadoras. No interior do Estado poderá ser
aberto, por período indeterminado, contraposição entre o Poder Executivo, recuperado
pelo bloco histórico progressista, e antigas instituições que servem aos desideratos das
oligarquias. Apenas com a intensificação da disputa por hegemonia essa situação poderá
ter solução favorável, a partir de medidas político-administrativas que ampliem o poder
popular, de pressão permanente e organizada das ruas, do desmonte dos monopólios de
comunicação, da elevação da consciência e cultura das massas, do reforço dos
movimentos populares e do desaparelhamento do sistema jurídico-policial.
26. As forças progressistas, inclusive ao reconquistarem o governo federal, deverão levar em
conta o aprendizado recente: se não estiverem preparadas para enfrentar ataques das
elites oligárquico-burguesas à democracia, como resposta previsível desses setores à
perda da direção do Estado, estarão fadadas a sucessivas derrotas estratégicas. As
medidas concernentes vão além de garantir maioria parlamentar: implicam democratizar
o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal, entre outras estruturas de
coerção, impedindo seu controle pela alta tecnocracia ou por nichos corporativos
vinculados aos interesses das classes dominantes.
27. Esse processo de democratização inclui o fortalecimento e a reformulação do papel das
Forças Armadas, com sua dedicação exclusiva à defesa nacional e a programas de
integração territorial. Também são imprescindíveis a aplicação das recomendações
prescritas pela Comissão Nacional da Verdade acerca dos direitos humanos e a alteração
dos currículos das escolas de oficiais, expurgando valores antinacionais e
antidemocráticos como o elogio ao golpe de 1964 e ao regime militar que então se
estabeleceu.
28. Igualmente deve ser estabelecido novo marco regulatório das comunicações, que acabe
com o oligopólio da mídia e assegure o direito à livre expressão, criando as bases jurídicomateriais para um modelo plural que incorpore os meios fundamentais de informação,
entretenimento e cultura.
29. Entretanto, as medidas adotadas pelo governo usurpador, de ruptura da ordem
democrática e das garantias constitucionais, colocam sob risco a estratégia proposta por
nosso partido desde 1987, particularmente se vier a bloquear, mesmo
momentaneamente, o caminho eleitoral ao comando do Estado. Somente poderemos
enfrentar cenário com essas características se fortalecermos nossas relações com
movimentos, frentes e partidos que tenham seu centro de gravidade na organização e
mobilização popular, para defendermos o processo democrático a partir da vigilância e
da fiscalização das instituições, recorrendo a métodos de intensa participação social. Para
tanto, o Partido dos Trabalhadores deve recombinar atuação nos parlamentos e
executivos com a intensificação da atuação de seus filiados nos núcleos, diretórios zonais,
municipais e estaduais, nos setoriais, de modo a fortalecer a participação nos sindicatos,
organizações estudantis, culturais e populares, nas entidades de bairro e movimentos
reivindicatórios, ajudando na revitalização da política e da confiança na participação
popular, como instrumento de libertação econômica, social e política das classes
trabalhadoras.
30. A formação de uma maioria social, política e eleitoral que sustente nossa estratégia deve
estar ancorada em um programa que responda às angústias do povo brasileiro e aos
entraves para o desenvolvimento nacional com reformas que desatem os nós impostos
pelo capitalismo monopolista e orientem políticas públicas a serem adotadas ao se
reconquistar o governo nacional.
31. As reformas estruturais – de cunho democrático, antimonopolista, antilatifundiário, antiimperialista e libertário – representam plataforma capaz de agregar amplas parcelas da
população, das classes trabalhadoras aos pequenos e médios empresários, o mundo da
cultura e a juventude, as mulheres e a população lgbtt, os negros e os índios, os pobres
da cidade e do campo. Trata-se, afinal, de tarefas inconclusas ou negadas pela hegemonia
burguesa no Brasil, cuja realização romperia o dique da superexploração do trabalho, da
exclusão social e da dependência nacional, da plutocracia política e do autoritarismo
estatal, ao mesmo tempo em que se avançaria no rumo de uma sociedade pós-capitalista.
32. Tais propostas buscam abrir a transição para outro sistema econômico-social, dotando o
país de um modelo que, sustentado pelo dinamismo do mercado interno e a centralidade
do consumo coletivo, na forma de obras de infraestrutura e serviços públicos universais,
promova a reindustrialização acelerada, o desenvolvimento regional, a autossuficiência
agrícola, a independência financeira, a soberania nacional e a integração continental.
33. A principal bandeira de nosso programa é a convocação de uma Assembleia Nacional
Constituinte livre, democrática e soberana, destinada a reorganizar estruturalmente o
Estado brasileiro e aprovar reformas que reorganizem suas bases socioeconômicas e
institucionais, dilaceradas pelo governo usurpador. A democratização das instituições
brasileiras é preâmbulo indispensável para as demais reformas estruturais.
34. Treze capítulos fundamentais sintetizam essas reformas:
Reforma política. Parlamento unicameral e proporcional ao número de eleitores em cada
estado. Adoção do voto em lista partidária. Proibição de coligações proporcionais.
Criação de federações partidárias. Financiamento público exclusivo das campanhas
eleitorais. Fortalecimento dos mecanismos de democracia direta e soberania popular,
subordinado a deliberações da Assembleia Nacional Constituinte, com ampliação da
prerrogativa de convocação dos plebiscitos também para o poder executivo e os eleitores,
entre outros instrumentos.
Democratização da mídia. Proibição de propriedade cruzada. Proibição de propriedade
de meios por parlamentares, governantes ou familiares até segundo grau. Criação de um
Fundo em Defesa da Liberdade de Imprensa, com um percentual da receita publicitária
das televisões aberta e fechada, além das rádios, para estimular novos meios de
comunicação. Cláusula de objeção por consciência em todas as redações. Criação de um
Conselho Social de Comunicação, que autorize e renove licenças para emissoras de rádio
e TV, retirando essa prerrogativa do parlamento. Criação do direito gratuito de antena
para televisão aberta e rádios.
Reforma do sistema de segurança pública. Instituição de mandatos limitados para
ministros da Suprema Corte, do STJ, do TST e desembargadores dos TRFs e TJs.
Desmilitarização das PMs estaduais e unificação com a polícia judiciária. Reformulação
do Sistema Nacional Penitenciário, com a incorporação de todas as prisões e casas de
detenção a um modelo único de gestão.
Reforma tributária. Tributação de juros sobre capital próprio. Tributação sobre lucros
e dividendos. Taxação sobre remessa de lucros e dividendos ao exterior. Extensão do
Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para barcos e aviões. Adoção
de Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF). Revisão da tabela do imposto de renda sobre
pessoas físicas, com aumento do piso de isenção e ampliação progressiva das faixas de
contribuição. Aumento do imposto sobre doações e grandes heranças, com repactuação
do valor arrecadado entre União, estados e municípios.
Reforma financeira. Lei antitruste do sistema financeiro. Separação entre bancos
comerciais e de investimento. Ampliação dos direitos operacionais de bancos municipais
e cooperativos. Reorganização do Banco Central como guardião da moeda, do emprego e
do desenvolvimento nacional. Fortalecimento dos bancos públicos. Criação de uma
agência de proteção aos direitos do consumidor de produtos financeiros.
Reforma agrária. Adoção de regime progressivo para o Imposto Territorial Rural para
propriedades improdutivas. Redefinição dos índices de produtividade para fins de
reforma agrária. Proibição da venda de terras para estrangeiros. Estabelecimento de
limites regionais para a propriedade agrária e o agronegócio. Fortalecimento da
agricultura familiar e das cooperativas agroindustriais como vertentes principais para a
conquista de autossuficiência alimentar. Defesa dos direitos e heranças dos povos
originários.
Empresas de energia. Recomposição do regime de partilha, com a participação
obrigatória da Petrobras nas explorações do Pré-Sal. Criação do Sistema Nacional de
Energia, com o controle estatal sobre todas as distintas empresas do setor.
Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável. Definição de metas e meios para o
crescimento da economia por meio de um plano decenal, que tenha como principal
objetivo a recuperação da indústria brasileira e a renovação da infraestrutura do país.
Regionalização do desenvolvimento a partir de planos para o norte e o nordeste do país.
Direitos sociais, trabalhistas e previdenciários. Restabelecimento da obrigação
constitucional mínima com saúde e educação. Revogação da PEC 55. Aprovação da
Consolidação de Leis Sociais, constitucionalizando o direito à renda mínima e outros
benefícios. Constitucionalização da lei de valorização do salario mínimo por vinte anos.
Redução da jornada máxima semanal de trabalho para 40 horas.
Reforma urbana. Combate à concentração de propriedades urbanas por meio de medidas
fiscais progressivas e limitação legal da especulação imobiliária. Políticas públicas que
eliminem o déficit habitacional, protejam as áreas verdes e de lazer, expandam os
terrenos destinados a fins públicos como esporte e cultura.
Acesso à saúde e educação. Fortalecimento do SUS, com aumento das verbas para saúde
pública até 10% da receita corrente bruta. Cumprimento das metas do Plano Nacional de
Educação, com investimentos de 10% do PIB nas redes públicas de ensino.
Direitos das mulheres. Descriminalização do aborto e regulamentação de sua prática no
serviço público de saúde. Garantia do direito ao pagamento de salário igual para trabalho
igual. Extensão da licença-maternidade de seis meses para todas as trabalhadoras.
Direitos humanos. Descriminalização progressiva do consumo de drogas.
Constitucionalização dos direitos de casais homoafetivos como entidade familiar plena.
Promoção de políticas públicas e educacionais de combate ao racismo, ao machismo, à
homofobia e a toda forma de preconceito.
35. A realização desse programa, a ser detalhado em intenso diálogo social, tem como ponto
de apoio fundamental uma coalizão de partidos e movimentos que represente os
operários, os trabalhadores do campo e os camponeses sem terra, os assalariados de
serviços e comércio, os micro e pequenos empreendedores, os trabalhadores domésticos,
os pequenos proprietários rurais e urbanos. Também deve agregar cientistas, intelectuais,
artistas e jovens que impulsionam movimentos progressistas no campo da cultura e na
sociedade; movimentos antirracistas que lutam por igualdade racial, de libertação das
mulheres que lutam por igualdade de gênero, os agrupamentos de defesa dos direitos de
gays, lésbicas e transexuais.
36. A Frente Brasil Popular, espaço fundamental de nossa estratégia, deve ser ampliada e
fortalecida como instrumento de mobilização e colaboração programática, preservando
sua autonomia em relação às coligações eleitorais ou governamentais. Ao representar os
agentes principais do projeto nacional que defendemos, deve atuar também para isolar
as vozes do grande capital, ao mesmo tempo em que busca dividir sua base de apoio,
atrair setores que se descolam de sua direção e estabelecer acordos táticos capazes de
contribuir para o fortalecimento do campo popular. O PT igualmente se empenhará em
manter o diálogo e estreitar relações políticas com a Frente Povo Sem Medo.
37. A Frente Brasil Popular tem o papel de aglutinar forças, alinhar o debate, encaminhar
ações conjuntas e forjar a unidade da esquerda. Não deve suplantar as entidades que a
compõem ou se sobrepor aos partidos, às centrais sindicais e movimentos sociais, aos
quais cabem o protagonismo das ações. À Frente Brasil Popular cabe a construção da
unidade na ação. Ao PT cabe o compromisso de priorizar a construção dos movimentos
sociais que compõem a FBP.
38. A política de alianças, incluindo as coalizões eleitorais, deve aglutinar quem partilhe de
uma perspectiva anti-imperialista, antimonopolista, antilatifundiária e radicalmente
democrática. Aponta para um governo encabeçado pelo PT, Lula presidente, com
partidos, correntes e personalidades que estabeleçam compromisso programático dessa
natureza. A consolidação de uma esquerda antissistema, com clara identidade de projeto,
constitui elemento central de nossa orientação política.
39. O Partido dos Trabalhadores dedicará suas melhores energias a esse projeto, engajando
sua capacidade de formulação, convocação e representação. Temos consciência de que
nosso desempenho poderá ter peso decisivo no sucesso dessa grande aliança, ampliando
suas fronteiras, aprofundando seu enraizamento e alargando seus horizontes.
40. Ao retomarmos o fio da meada da estratégia democrático-popular, estabelecida ao longo
da história de nosso partido, enriquecida pelas lições do período de governo e atualizada
aos novos problemas nacionais, o Partido dos Trabalhadores reafirma seu compromisso
com a construção do caminho brasileiro ao socialismo e com a luta do povo brasileiro por
sua plena emancipação.
Anexo 2 (extrato da resolução do quinto encontro nacional do PT, de 1987)
OBJETIVO ESTRATÉGICO DO PT: SOCIALISMO
26. A conquista do socialismo e a construção de uma sociedade socialista no
Brasil são os principais objetivos estratégicos do PT. Isso parece ser consenso, tanto
em vista das resoluções aprovadas nas convenções nacionais, quanto da crescente
pressão da militância para que definamos o tipo de socialismo que queremos e
estabeleçamos as relações correspondentes entre nossa luta do dia-a-dia e a luta
mais geral pelo socialismo.
27. Na luta pelo socialismo, é preciso distinguir dois momentos estratégicos
que, apesar de sua estreita relação de continuidade, são de natureza diferente. O
primeiro diz respeito à tomada do poder político. O segundo refere-se à construção
da sociedade socialista sobre as condições materiais, políticas etc. deixadas pelo
capitalismo.
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A CONQUISTA DO SOCIALISMO
28. Para extinguir o capitalismo e iniciar a construção da sociedade socialista,
é necessário, em primeiro lugar, realizar uma mudança política radical; os
trabalhadores precisam transformar-se em classe hegemônica e dominante no poder
de Estado, acabando com o domínio político exercido pela burguesia. Não há
qualquer exemplo histórico de uma classe que tenha transformado a sociedade sem
colocar o poder político – Estado – a seu serviço.
29. Evidentemente, a construção da sociedade socialista não é algo
totalmente novo e diferente em relação às formas de luta e de organização dos
trabalhadores no seu dia-a-dia atual. Quando falamos que o socialismo e o poder se
constroem na luta cotidiana, estamos nos referindo ao fato de que muitas das formas
econômicas, sociais e políticas da construção socialista surgirão, sem dúvida, da
experiência da luta de classe contra o capitalismo. Muitas dessas formas que hoje
não conseguem desenvolver-se em virtude da opressão capitalista, como as
pequenas cooperativas, as compras comunitárias, as comunidades locais, os
conselhos populares etc., provavelmente encontrarão um campo fértil para crescer
nas novas condições socialistas. Mas as formas de organização fundamentais que
surgem na luta cotidiana no interior da sociedade burguesa e que têm maior
importância para a luta socialista são as que nascem da auto-organização dos
trabalhadores, as formas de luta pelo controle operário nas fábricas (a partir da
generalização das comissões de fábrica e empresa) e de controle popular nos
bairros.
30. Essas formas embrionárias de poder proletário são escolas de autoorganização e participação política dos trabalhadores, que apontam no sentido da
construção de um socialismo efetivamente democrático, em que o poder seja
exercido pelos próprios trabalhadores e não em seu nome.
31. Entretanto, essas experiências, em si, não resolvem a contradição do
socialismo com o capitalismo. Mesmo porque, quanto mais amplas elas se tornam,
maior é a resistência da burguesia dominante à sua existência. Repressão e
concessões, em geral, se combinam para a burguesia continuar mantendo sob sua
influência ideológica e política as grandes massas de trabalhadores e evitar o
desenvolvimento das experiências populares e as mudanças. Para resolver as
contradições sociais e políticas do sistema capitalista é fundamental que todas essas
experiências de luta e de organização operárias, populares e democráticas sirvam
como eixo de preparação e organização das classes trabalhadoras para a conquista
do poder e a construção da nova sociedade.
32. Por isso, no enfrentamento cotidiano contra as táticas repressivas e/ou de
concessões da burguesia, os trabalhadores terão que empregar táticas que retirem
as massas da influência da burguesia e as levem a conquistar o poder. Nesse
sentido, é preciso distinguir as atividades que partem da situação existente em cada
momento e procuram fazer com que os trabalhadores tomem consciência da
necessidade de conquista do poder das atividades que se destinam à conquista
imediata do próprio poder.
33. Muitos companheiros não fazem essa distinção, não compreendem o
processo de mediação que deve existir entre o momento atual, por exemplo, em que
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as grandes massas da população ainda não se convenceram de que é preciso
acabar com o domínio político da burguesia, e o momento em que a situação se
inverte e se torna possível colocar na ordem do dia a conquista imediata do poder.
Dessa forma, seu discurso, pretensamente revolucionário, não é entendido pela
população e pelos trabalhadores e, em vez de contribuir para a organização e a luta
no sentido da conquista do poder e da construção socialista, a desorganizam e a
transformam na luta de pequenos grupos conscientes e vanguardistas.
34. Por outro lado, companheiros que consideram inevitável a adoção de uma
via revolucionária para a conquista do poder contrapõem essa escolha à tática dos
movimentos sociais que lutam por reformas. Reforma e revolução são consideradas
por eles como termos e práticas antagônicas. Entretanto, nenhum país que tenha
feito revolução deixou de combinar essas lutas, dando maior ênfase a uma ou outra
de acordo com a situação política concreta. A luta por reformas só se torna um erro
quando ela acaba em si mesma. No entanto, quando ela serve para a educação das
massas, através da própria experiência de luta, quando ela serve para demonstrar às
grandes massas do povo que a consolidação, mesmo das reformas conquistadas, só
é possível quando os trabalhadores estabelecem seu próprio poder, então ela serve
à luta pelas transformações sociais e deve ser combinada com esta.
35. Nesse sentido, para definir uma estratégia de luta pelo socialismo, não
basta definir a via principal de luta, nem as táticas para a conquista do poder. É
preciso, em especial, ter clareza sobre o inimigo ou inimigos principais contra quem
nossa luta se dirige, as alianças de classes (estratégicas) para derrotar tais inimigos
e o programa de transformações a ser implantado (que serve de base à mobilização
popular e às alianças).
36. Esclarecer tais problemas, na realidade, não é algo que possa ser decidido
arbitrariamente. Depende do conhecimento da estrutura social brasileira, das
contradições que existem nessa estrutura e do grau que tais contradições
alcançaram como resultado de todo um processo histórico de lutas. Isso inclui o
conhecimento do papel e da força do Estado burguês e do grau de desenvolvimento
da cultura política dos trabalhadores e, em particular, o conhecimento das tendências
do movimento de cada um desses aspectos e de sua resultante.
37. Existe um certo consenso, entre os militantes e filiados do PT, de que a
burguesia é a inimiga principal das mudanças sociais e dos trabalhadores. É uma
certeza intuitiva, que resulta da experiência concreta de enfrentamento com a
burguesia. O problema, porém, não é esse. O problema reside no fato de que, por
uma insuficiente análise das classes existentes na sociedade brasileira, muitos
companheiros colocam no campo da burguesia parcelas significativas de pequenos e
microempresários urbanos e rurais e mesmo as camadas assalariadas que não
trabalham diretamente na produção fabril ou agrícola. Com isso, não levam em conta
que tais camadas possuem profundas contradições com o capital e, por isso, podem
se incorporar à luta por transformações sociais no sentido socialista.
38. Por outro lado, ao tomar a classe burguesa como inimiga principal,
estratégica, muitos militantes são levados a se oporem a que se aproveitem as
contradições momentâneas entre os diversos setores da burguesia. Colocam-se
contra qualquer aliança política, tática ou pontual, com alguns desses setores. Mas o
que importa aqui é que tais posturas são reflexos também de um conhecimento
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insuficiente ou mesmo de um desconhecimento das contradições internas que
movem as classes em sua luta, e que muitas vezes podem colocar em oposição
diferentes setores da própria burguesia. Esse conhecimento insuficiente é uma das
razões principais que explicam por que o PT, como um todo, ainda não avançou
suficientemente nas definições estratégicas.
39. Para que o processo de definições estratégicas do PT conte com a
participação democrática dos militantes e filiados, é imprescindível que o Partido
organize o estudo e o debate sobre as classes e as contradições de classes da
sociedade brasileira; o papel da pequena burguesia urbana e rural; a definição dos
pontos programáticos que garantam a atração dos setores sociais que têm
contradições com a burguesia; a via principal de transformação social e as táticas a
serem empregadas para realizá-la; e a relação entre a estratégia do Partido e as
diversas táticas para implementá-la. Esses são problemas colocados pelo atual
avanço da luta de classes no Brasil, que devem ser tratados adequadamente. Tratálos não é uma tarefa de alguns intelectuais e dirigentes, ou mesmo de uma corrente
política dentro do Partido. Essa é uma tarefa que deve envolver o conjunto da
militância petista.
A CONSTRUÇÃO DO SOCIALISMO
40. O desenvolvimento desigual e desequilibrado do capitalismo no Brasil
coloca diante dos trabalhadores uma série de questões relacionadas com a
construção socialista após a conquista do poder. Questões que aparecem, desde já,
em função das propostas programáticas do PT e das alianças estratégicas que
devem ser realizadas para obter a hegemonia contra a burguesia. Evidentemente, o
desenvolvimento intenso do capitalismo nos últimos 30 anos colocou bases firmes
para o estabelecimento de um sólido setor socialista na economia. Nas grandes
cooperativas agroindustriais capitalistas, grandes empresas comerciais e de serviços
e bancos, a socialização com a apropriação privada dos resultados da produção
permite sua transformação imediata em empresas socialistas, estatais ou coletivas.
41. Por outro lado, subsiste no Brasil um vasto setor que, embora seja em
ampla medida subordinado ao grande capital, procura desenvolver-se com absorção
de mão-de-obra e com atendimento a uma série enorme de bens de serviços
considerados secundários e de baixa rentabilidade. Constituído por milhões de
pequenas empresas, pequenos negócios, serviços e autônomos, desempenha um
papel econômico de grande importância no atual sistema capitalista brasileiro, o que
obriga a um processo permanente de destruição e recriação desse setor – papel que
deve continuar desempenhando mesmo depois de iniciarmos a construção socialista
no Brasil. Desse modo, um dos aspectos-chave do processo de construção
socialista, mesmo tendo como a parte essencial da economia o seu setor socialista,
estatal ou coletivo, consiste em conhecer a capacidade do Estado em atender às
reais necessidades sociais e adaptar uma política econômica que complemente, de
forma integral, aquela capacidade para isso. O único caminho, até hoje, consiste em
permitir que a pequena economia mercantil ainda se desenvolva em uma certa
escala, e que seu próprio desenvolvimento natural e contraditório conduza à
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concentração e centralização econômica e sua transformação socialista por meios
administrativos.
42. A pequena produção serve para que a sociedade desenvolva suas forças
produtivas, contribua para que não haja escassez de bens e serviços e permita
incorporar ao trabalho o conjunto da população economicamente ativa, sem
prejudicar a eficiência das empresas socialistas nem a constante redução da jornada
de trabalho. Essa política de desenvolvimento da capacidade produtiva da
sociedade, utilizando todas as forças econômicas, é a base da aliança dos
trabalhadores assalariados com a pequena burguesia urbana e rural. Essa aliança é,
pois, uma questão estratégica, referente tanto à destruição do capitalismo quanto à
construção do socialismo.
43. Evidentemente, essa é uma contradição própria do desenvolvimento das
classes no Brasil, do mesmo modo que é impossível, dadas as atuais condições, que
o socialismo possa extinguir todas as classes de imediato. O processo de construção
socialista para alcançar a almejada sociedade igualitária, sem classes, sem opressão
e dominação, vai enfrentar, durante certo tempo, a exigência de diferentes
desigualdades, como herança do capitalismo. E vai obrigar a agir, não no sentido de
extinguir administrativamente as desigualdades, mas de evitar que elas se polarizem
e se tornem antagônicas em relação ao socialismo. Tais contradições no terreno
econômico e social da construção socialista geram diferentes contradições no
terreno da política. Isso nos remete, basicamente, para a relação do socialismo com
a democracia.
Socialismo e democracia
44. A permanência de diferentes classes e camadas sociais no processo de
construção socialista, por um tempo difícil de prever de antemão, coloca para nós a
necessidade de reconhecer a existência de diferentes expressões políticas na
sociedade socialista. É fundamental compreender que, mesmo que não se
concretizem ingerências externas à coexistência de diferentes partidos e
associações políticas, assim como de diferentes propostas para a construção
socialista, torna extremamente aguçada a disputa política, disputa que pode
polarizar-se e ter conseqüências graves, se não forem tratadas como merecem, ou
seja, disputas que, na sua maior parte, estão dentro de um mesmo campo socialista,
e não disputas entre inimigos.
45. O fato de que na Nicarágua, a partir do programa da Frente Sandinista de
Libertação Nacional (FSLN), apesar do cerco imperialista e da oposição militar dos
contras, existia liberdade sindical, de organização partidária, de comissões de
empresa, das milícias, dos comitês populares e que, inclusive, foram realizadas
eleições democráticas, indica a atualidade da relação entre a luta pelo socialismo e a
democracia. Longe de a democracia ser uma concessão, ela é parte componente de
uma revolução viva e fator de combate contra a burocratização.
46. A ausência de democracia, do direito à livre organização dos
trabalhadores, é contraditória com o socialismo pelo qual lutamos. Ainda mais
quando sabemos, a partir de várias experiências históricas, que essa ausência foi
alçada quase que a um princípio permanente, cujas conseqüências podem ser
vistas, hoje, num certo impasse que vivem vários países que fizeram a revolução e
que está na base, por exemplo, da luta dos trabalhadores poloneses em torno do
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Solidariedade, que o PT tem apoiado. Solidário com as lutas dos povos por sua
libertação, o PT defende o rompimento de relação com o regime racista da África do
Sul e com a ditadura do general Pinochet, do Chile.
47. Além disso, é preciso levar em conta que a sociedade brasileira já foi
capaz de desenvolver razoavelmente algumas organizações da sociedade civil, que
jogam determinado peso na determinação das políticas do Estado. E de que o
Estado brasileiro, embora tenha se reforçado muito, contando com modernos
aparelhos coercitivos (Forças Armadas, Serviços de Informação etc.) e de
concessões e participação (Legislativos, assistência social, centros comunitários etc.)
não tem condições de se fechar completamente à participação das classes
subalternas em seu interior. Ao contrário, a própria magnitude do Estado moderno
brasileiro só é viável se a burguesia for buscar, na massa das outras classes, os
funcionários do Estado. E se, para conseguir consenso e legitimidade para esse
mesmo Estado, for obrigada a abrir, pelo menos formalmente, o Estado à disputa das
diversas classes.
48. Na sociedade civil ocorre algo idêntico. A burguesia construiu
organizações sólidas (Fiesp, CNA, CNI etc.), que atuam tanto para manter a
hegemonia de sua classe sobre as outras quanto para manter o domínio do aparelho
do Estado. Em contraposição a isso, tanto os assalariados quanto as camadas
médias da população também criaram organizações de sociedade civil que
participam daquela disputa pela hegemonia e pelo poder. Em grande medida, o
movimento contraditório dessas diversas organizações da sociedade civil (e também
dentro delas) em relação ao Estado e a disputa no interior do próprio Estado causa
os avanços e recuos da democracia, sua ampliação e retração.
49. O PT rejeita a concepção burocrática do socialismo, a visão do partido
único, por considerar incorreta a idéia de que cada classe social é representada por
um único partido, e que outros partidos existentes na sociedade que emergir de uma
revolução serão necessariamente partidos que representarão interesses de classes
diferentes dos da classe trabalhadora.
50. Seria ingenuidade supor que, conquistado o poder pelos trabalhadores,
essa situação estaria resolvida. Embora a liquidação da burguesia, como classe,
compreenda também a liquidação de suas organizações civis e de seu Estado,
grande parte das organizações da sociedade civil hoje existentes continuarão
presentes na nova sociedade e não podem (nem devem) ser abolidas por decreto.
Isso significa que no processo de construção do socialismo deverão existir não só
diversos partidos e diversas organizações da sociedade civil, como também que as
relações de organizações com o poder socialista serão não só de colaboração e
participação, mas também de oposição.
51. Nessas condições, o Estado socialista terá de desenvolver esforços tanto
para estabelecer uma legalidade nova, democraticamente construída e válida para
todos, como manter e/ou criar mecanismos de participação e consulta popular nos
mais diferentes níveis e nas relações entre tais níveis. A participação operária e
popular na gestão das fábricas, das granjas e fazendas, dos bairros e conjuntos
residenciais, das comunidades, vilas e distritos é de suma importância para o
funcionamento de uma extensa democracia de base. Entretanto, talvez essa não
seja a questão-chave da democracia no socialismo. Os problemas mais sérios vão
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aparecer nas relações entre os mecanismos democráticos de participação e consulta
na base com os mecanismos de participação e consulta nos níveis intermediários e
superiores do poder.
52. O projeto socialista pelo qual lutamos, de outro lado, deve incorporar as
perspectivas colocadas pelos diferentes movimentos sociais que combatem
opressões específicas, como os das mulheres, dos negros, dos jovens e dos
homossexuais, e suas expressões ideológicas, em particular o feminismo,
indispensáveis para golpear importantes pilares da dominação exercida pela
burguesia e engajar, em profundidade, a maioria da população brasileira num
processo de transformação revolucionária. Deve, também, integrar movimentos de
âmbitos culturais nacionais ou ambientais, que procuram responder às agressões
que o capitalismo realiza contra a população e o meio ambiente, movimentos
anticapitalistas e progressistas, que sensibilizam parcelas crescentes do povo. Deve,
ainda, incorporar o questionamento de outros mecanismos vitais para a reprodução
da dominação de classe. A incorporação dessas lutas no projeto político proletário,
desde hoje, permite barrar o avanço da burguesia, que procura esvaziá-las do seu
conteúdo crítico e questionador de instituições e valores da ordem burguesa.
53. Sem um tratamento correto dessas questões, no sentido de manter
abertos os canais de participação das massas trabalhadoras no poder de Estado e a
observância dos direitos individuais dos membros da sociedade e, ao mesmo tempo,
garantir a existência do Estado socialista como instrumento fundamental para a
construção socialista, será impossível transformar as liberdades políticas e a
democracia formais, próprias do capitalismo, nas liberdades e na democracia real
que deve ser própria do socialismo.
AS TÁTICAS DO PT
54. O capitalismo viveu no Brasil um período de acelerada expansão, nas
últimas décadas. Desenvolveu um parque industrial moderno, expandiu a rede de
serviços e criou as condições para que o capital financeiro e a economia mercantil
penetrassem nas áreas rurais. Esse crescimento, contudo, deu-se por meio da
ampliação da dependência do País em relação ao capitalismo internacional, bem
como da superexploração do trabalho e da prevalência do capital monopolista nos
segmentos econômicos mais importantes.
Além disso, acentuou algumas desigualdades históricas do País, tendo
concentrado grande parte de seu parque industrial e o seu setor mais dinâmico nas
regiões Sul e Centro-Sul. Nas demais regiões, a produção industrial se encontra
relativamente dispersa em pequenas e médias empresas; a centralização da
produção capitalista, aliás, não se realizou de maneira plena, nem mesmo nas
regiões mais desenvolvidas, onde sobrevive um grande número de pequenas
empresas voltadas para a produção de serviços e de bens industriais. Isto vale,
igualmente, para o campo no qual o latifúndio capitalista e a agroindústria convivem
com milhões de pequenos produtores rurais.
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AS CLASSES SOCIAIS
55. Esse modelo de expansão produziu uma massa de assalariados
heterogênea, integrada por um setor operário industrial e agrícola* relativamente
numeroso e concentrado; por um extenso e numeroso setor ligado às áreas de
serviços, comércio e sistema financeiro; por novos segmentos assalariados,
empregados públicos e privados, alguns muito qualificados e com rendimentos
consideráveis; bem como por um contingente de trabalhadores sujeitos ao
desemprego e ao subemprego estruturais na cidade e no campo.
56. Paralelamente, a expansão capitalista no Brasil deu origem a um vasto
setor de pequenos proprietários e produtores, que são, ao mesmo tempo, proprietários de meios de produção e trabalhadores. Normalmente designado pelos nomes
de pequena burguesia ou de setores médios, este setor possui grande importância
política e social, incluindo o pequeno produtor agrícola, o trabalhador autônomo, o
pequeno proprietário, o profissional liberal qualificado etc.
57. Finalmente, a burguesia, grande beneficiária do crescimento econômico,
fortaleceu-se nas últimas décadas. Isso se deu, em particular, com seu setor
monopolista, vinculado à indústria de exportação e ao capital financeiro. Ao aumento
de poder econômico e da consistência da burguesia como classe correspondeu o
avanço de sua organização e a expansão de seus mecanismos de controle
ideológico e político da sociedade.
* Texto conforme publicado originalmente. O grifo é desta edição
58. O Estado brasileiro também se modernizou e se fortaleceu, tanto como
produtor de bens e serviços quanto como aparelho coercitivo/repressor.
59. Apesar da força que tem, a burguesia brasileira enfrenta conflitos internos
que, em certos momentos, chegam a comprometer – ou, no mínimo, atrasar sua
unificação em torno de um projeto político de gestão do País. São disputas deste tipo
que produzem, hoje, divergências entre os vários lobbies burgueses que agem sobre
a Constituinte; ou iniciativas como o Pensamento Nacional das Bases Empresariais,
uma ação de empresários à margem da Fiesp [Federação das Indústrias do Estado
de São Paulo] e de outras entidades tradicionais do patronato. O maior problema da
burguesia brasileira, contudo, decorre da própria história da formação do capitalismo
no Brasil.
60. Ao contrário de outros países, entre nós o capitalismo tem-se desenvolvido
respeitando o monopólio da propriedade da terra, recorrendo constantemente à força
repressiva do Estado para mediar as relações entre o trabalho e o capital e
integrando-se de modo subordinado ao mercado e ao sistema financeiro do
imperialismo. A incapacidade do capitalismo brasileiro incorporar, ainda que
minimamente, milhões de pessoas aos frutos do desenvolvimento limita a
possibilidade da burguesia exercer a hegemonia política na sociedade, o que está na
raiz das freqüentes intervenções militares na vida do País.
61. Quanto aos trabalhadores do campo e da cidade, o aumento de sua força
social e política foi notável nos últimos anos. Construiu-se a CUT, expandiu-se o
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sindicalismo rural e os trabalhadores passaram a jogar um peso decisivo na vida
política nacional.
O PT e seu Programa
62. Contudo, a organização dos trabalhadores não se estendeu à maior parte
da classe. Nos setores em que é melhor organizado, o movimento dos trabalhadores
ainda está dividido sindicalmente entre CUT e CGT. No nível partidário, uma parcela
considerável desses setores continua sob a influência do PMDB, principal partido de
sustentação da Nova República.
63. Se é verdade que a burguesia, por meio de seus partidos, enfrenta
dificuldades para legitimar o projeto de dominação que é a Nova República, é
também verdadeiro que no campo das classes trabalhadoras ainda não se construiu
um projeto alternativo a essa dominação, apesar da existência do PT. Essa é a
principal tarefa do PT no período histórico em que vivemos. Dizendo com todas as
letras: a disputa da hegemonia na sociedade brasileira, com base num programa
democrático-popular, capaz de unificar politicamente os trabalhadores e conquistar a
adesão dos setores médios das cidades e do campo. Tal programa deve sintetizar
tanto a nossa oposição à Nova República e à transição conservadora quanto apontar
no sentido da reorganização socialista de nossa sociedade.
64. Partido de caráter nacional, independente, com amplas bases sociais,
principalmente entre os trabalhadores, o PT precisa realizar sua tarefa histórica,
organizando e dirigindo sua base social e política na luta pela conquista do poder.
Daí a necessidade de apresentar-se, urgentemente, como uma alternativa, tanto na
luta sindical quanto na luta política. Só o crescimento sindical e popular e,
principalmente, a mudança de qualidade da atuação política do PT pode criar essa
alternativa.
65. A alternativa que o PT deve apresentar não pode se limitar a ser uma
alternativa à Nova República. Ao contrário, trata-se de uma alternativa estratégica à
dominação burguesa neste País, com o objetivo de realizar as transformações
econômicas, sociais e políticas exigidas pelos trabalhadores e demais camadas
sociais exploradas pelos monopólios.
Uma política de acúmulo de forças
66. A luta por uma alternativa democrática e popular exige uma política de
acúmulo de forças, que parte do reconhecimento de que não estão colocadas na
ordem do dia, para as mais amplas massas de trabalhadores, nem a luta pela
tomada do poder, nem a luta direta pelo socialismo. Essa política de acúmulo de
forças pressupõe que o PT realize três atividades centrais:
a) sua organização como força política socialista, independente e de massas;
b) a construção da CUT, por meio de um movimento sindical classista, de massas e
combativo, e a organização do movimento popular independente;
c) a ocupação dos espaços institucionais nas eleições, como a eleição de deputados,
vereadores e representantes nossos para os cargos executivos.
67. Embora a questão da tomada do poder não esteja colocada na ordem do
dia, é fundamental que o PT não apenas se construa como um partido que tem por
objetivo a construção do socialismo, mas que se apresenta para toda a sociedade
como um partido socialista. Isso significa que uma das nossas tarefas fundamentais
é a luta pela constituição do movimento dos trabalhadores como um movimento
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claramente socialista, de generalização de uma consciência socialista entre os
trabalhadores. Isso implica não apenas as tarefas de educação e formação política
de massa, mas, principalmente, abordar as tarefas de conjuntura do ponto de vista
da luta pelo socialismo, introduzindo, sempre, um componente de denúncia e crítica
anticapitalista na atividade de massa do PT.
68. O PT deve apresentar-se como uma opção real de governo, com um plano
econômico de emergência, capaz de tirar o Brasil da crise em que está afundando e
de melhorar a situação dos trabalhadores e da maioria do povo, bem como com
propostas de real democratização do País, que se expressarão na luta por uma
Constituição progressista, nas lutas por autonomia e liberdade sindical, por DiretasJá etc.
69. O PT deve, igualmente, adotar táticas que permitam aumentar sua força
eleitoral em 88. No atual quadro do País, considerando as expectativas que parte
significativa da população deposita no PT como alternativa à Nova República e ao
PMDB, o crescimento e as eventuais vitórias eleitorais do Partido são componentes
importantes do processo de acumulação de forças.
A ALTERNATIVA DEMOCRÁTICA E POPULAR E O SOCIALISMO
70. A alternativa que apresentamos à Nova República e à dominação
burguesa no País é democrática e popular, e está articulada com nossa luta pelo
socialismo.
71. Um governo e um programa democráticos e populares – os dois
componentes de nossa alternativa – são o reconhecimento de que só uma aliança de
classes, dos trabalhadores assalariados com as camadas médias e com o campo,
tem condições de se contrapor à dominação burguesa no Brasil.
72. É por isso que o PT rejeita a formulação de uma alternativa nacional e
democrática, que o PCB defendeu durante décadas, e coloca claramente a questão
do socialismo. Porque o uso do termo nacional, nessa formulação, indica a
participação da burguesia nessa aliança de classes – burguesia que é uma classe
que não tem nada a oferecer ao nosso povo.
73. As propostas que proclamam a necessidade e a possibilidade imediata de
um governo dos trabalhadores evitam a discussão sobre qual a tática, qual a política
para alcançar esse objetivo. Na prática, separam a luta reivindicatória da luta política,
por não compreenderem a necessidade da acumulação de forças. A retórica
aparentemente esquerdista recobre a ausência de perspectivas políticas e uma
concepção limitada, atrasada, das lutas reivindicatórias.
74. Na situação política caracterizada pela existência de um governo que
execute um programa democrático, popular e antiimperialista, caberá ao PT e aos
seus aliados criarem as condições para as transformações socialistas.
75. Nas condições do Brasil, um governo capaz de realizar as tarefas
democráticas e populares, de caráter antiimperialista, antilatifundiário e
antimonopólio – tarefas não efetivadas pela burguesia – tem um duplo significado:
em primeiro lugar, é um governo de forças sociais em choque com o capitalismo e a
ordem burguesa, portanto, um governo hegemonizado pelo proletariado, e que só
poderá viabilizar-se com uma ruptura revolucionária; em segundo lugar, a realização
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das tarefas a que se propõe exige a adoção concomitante de medidas de caráter
socia-lista em setores essenciais da economia e com o enfrentamento da resistência
capitalista. Por essas condições, um governo dessa natureza não representa a
formulação de uma nova teoria das etapas, imaginando uma etapa democráticopopular, e, o que é mais grave, criando ilusões, em amplos setores, na possibilidade
de uma nova fase do capitalismo, uma fase democrática e popular