terça-feira, 31 de agosto de 2021

Maringoni, Bolsonaro e o 7 de setembro

O blog Outras Palavras publicou um debate entre Gilberto Maringoni e Valério Arcary, sobre ir ou não às ruas no dia 7 de setembro.

O debate está disponível aqui: https://outraspalavras.net/crise-brasileira/7-de-setembro-o-campo-popular-deve-sair-as-ruas/

Tanto Maringoni quanto Arcary são dirigentes do PSOL. O primeiro foi candidato a governador de São Paulo.

O artigo de Arcary é previsível, no bom sentido da palavra. Já o de Maringoni é, digamos, divertido.

Maringoni começa afirmando que “Bolsonaro está criando um clima de terror para o 7 de setembro”.

Isto é verdade? Sim. Mas qual seria o objetivo de Bolsonaro?

Segundo Maringoni, “diante do isolamento crescente e – tudo indica – irreversível, Bolsonaro busca dar a volta por cima tentando embaralhar novamente a agenda nacional”.

Verdade? Não exatamente, pelos motivos que explico a seguir.

Quem acha que Bolsonaro está “isolado”, toma como parâmetro: a) as pesquisas de opinião, especialmente aquelas que dizem respeito às eleições presidenciais de outubro de 2022; b) declarações, notas e manifestações públicas de diferentes setores da direita, centro e esquerda.

Se a política brasileira estivesse no "modo normal", isto que citei antes seria suficiente para confirmar que Bolsonaro estaria “diante do isolamento crescente”.

Mas a política brasileira não está no "modo normal".

Tanto não está que o voto impresso obteve maioria de votos na Câmara dos Deputados; as forças armadas e as polícias militares estão hiperagitadas; o presidente da República fala em golpe 3x ao dia e nada acontece com ele etc.

Maringoni no fundo sabe disto, tanto é que não considera que o isolamento “crescente” de Bolsonaro seja “irreversível”.

E como Bolsonaro pretende “reverter”? Simples: combinando formas de luta.

Por um lado segue operando na política institucional tradicional, mobilizando as instituições que lhe são favoráveis (parlamentares, governadores, prefeitos, militares, algumas igrejas, setores do empresariado, o próprio governo federal e seus aliados); por outro, mobilizando sua base social, inclusive para demonstrar que tem força, que não está isolado.

Isto seria “embaralhar a agenda nacional”, só do ponto de vista de quem segue acreditando que a “agenda nacional” é um conjunto de "temas" que se disputa pacíficamente, prioritariamente nas próximas eleições presidenciais.

Faz muito tempo que a “agenda” não é essa.

Faz muito tempo que a extrema direita vem operando exitosamente a tal “disputa de agenda”, arrastando o debate “para um terreno favorável a uma das partes”.

E como a esquerda age diante disso?

De diferentes formas.

Uma destas formas pode ser resumida assim: “vamos deixar ele falando sozinho”.

Orientados por "lógica" parecida com essa, parte da esquerda decidiu no final de 2019, início de 2020, que não deveríamos cair na suposta "armadilha" de defender o Fora Bolsonaro, por achar que isso seria "fazer o jogo" do cavernícola, que a “agenda do país” seria a pandemia.

Um cidadão muito conhecido e que segue muito importante chegou a dizer que o país “não suportaria 100 mil mortos”. O que ocorreu todos sabemos.

Agora, Maringoni diz que “diante da hecatombe social e econômica e da derrota quase certa ano que vem”, Bolsonaro “literalmente muda de assunto. Ao fazer isso, busca definir as prioridades do país”.

Um ponto importante do raciocínio de Maringoni é o da “derrota quase certa”. 

Já o raciocíno de Bolsonaro visa “evitar a derrota”, através não de uma “mudança de agenda” (termo importado que nos conduz a pensar em elegantes debates), mas sim através do movimento de tropas (no caso de Bolsonaro, isto não é uma imagem).

E a nossa questão é: vamos deixar o inimigo se movimentar livremente pelo terreno, sem oposição?

Maringoni apresenta assim a questão: “a falta de voto impresso, a CPI do genocídio e a suprema corte. Esse é o tabuleiro de disputa que busca impor. Entrar nessa vibe pode ser fatal aos setores progressistas e democráticos”.

Penso que a questão pode ser colocada de outra forma: desde 2013 a direita vem disputando as ruas com a esquerda.

Obviamente a pauta que leva a direita às ruas é a pauta... da direita. 

Podemos achar a pauta ridícula, mas o que tem relevância política é quantos se mobilizam em favor desta pauta.

E, por outro lado, quantos se mobilizam a favor da nossa pauta. 

A não ser, é claro, que consideremos que só tem relevância o processo eleitoral do final do ano de 2022, processo que alguns pensam que será decidido a partir de movimentações e articulações fundamentalmente eleitorais, sem que a mobilização de rua tenha qualquer influência significativa no resultado.

A respeito do dia 7 de setembro, Maringoni apresenta os fatos de maneira assaz curiosa, quase como se a esquerda estivesse querendo comparecer a uma festa para a qual não foi convidada, só para causar confusão.

Os fatos são outros. 

Vamos lembrar que há desde 1995 acontece o Grito dos Excluídos, do qual participam todas as forças de esquerda que querem contribuir, levando suas bandeiras.

Portanto, a questão real é saber se - frente as ameaças e proibições – vamos deixar de fazer o Grito dos Excluídos e se vamos abrir mão de defender o Fora Bolsonaro neste dia.

Maringoni acha que mobilizar no dia 7 seria “se render” à agenda de Bolsonaro, “aceitar seus termos e o seu terreno de combate". E agrega que "subordinar-se à lógica do inimigo, qualquer manual bélico ensina, coloca de saída o oponente em desvantagem”.

A questão é: se aceitarmos a premissa de que a ameaça de violência é motivo para sairmos das ruas no dia 7 de setembro, o que impedirá Bolsonaro de voltar a usar este expediente se e quando isto lhe for útil? 

A esse respeito, aliás, chamo a atenção para o seguinte: se a direita conseguir nos expulsar das ruas no dia 7 de setembro, estará dada a fórmula para eles limitarem nossa atuação na campanha eleitoral. 

E as eleições de 2020 já demonstram a falta que faz, para a esquerda, o contato direto com o eleitorado.

Maringoni não sabe se Bolsonaro lotará ruas e praças de São Paulo e Brasília. Diz que “pode dar certo, como pode dar chabú”. Ou seja: ele não sabe o que vai acontecer, só sabe que haverá “ele montará ali sua provocação armada, sequioso de sangue e caos. Ou seja, o cenário ideal para embaralhar o jogo democrático”.

O jogo democrático já está embaralhado faz tempos, embora tenha gente que insiste em não perceber isto.

Ademais, é certo que outros atos de provocação (como a sugerida invasão ao STF, ou agressões contra militantes da esquerda etc.) podem ou não ocorrer, mas a rigor a “provocação” é o ato em si mesmo, a começar por sua convocação.

A rigor, se tivéssemos força, o ato de Bolsonaro deveria ser impedido, pois trata-se de assumida incitação ao golpe. 

Mas como não temos, o que nos resta é a disjuntiva: ou cancelar os atos (dando a vitória por WO a Bolsonaro) ou mobilizar (com todas as precauções organizativas).

Precauções que valem para o dia 7 e que valerão daqui para frente cada vez mais, inclusive na campanha eleitoral, que não será normal.

Maringoni é favor de cancelar os atos. Segundo entendi, cancelar em Brasília, cancelar em São Paulo. O que obviamente geraria um efeito dominó em todo o país.

Alguns aspectos da posição de Maringoni me lembram a que foi defendida, em passado recente, por Luiz Eduardo Soares, comentada por mim aqui:

https://www.pagina13.org.br/a-caldeira/

O que dizia Luiz Eduardo Soares? Que só “faz sentido ir para o confronto se a correlação de forças permitir, ou poderemos sofrer uma derrota histórica, um banho de sangue e um golpe”.

Já Maringoni diz: “A decisão de recuar no dia 7 deve ser uma operação casada com o planejamento de fortes mobilizações logo em seguida”.

Qual o problema: Bolsonaro está escolhendo um caminho que não se limita ao dia 7. Portanto, se quisermos fazer “fortes mobilizações logo em seguida”, precisamos nos adaptar desde já às novas condições que estão postas pela “agenda” do inimigo.

Maringoni termina seu texto afirmando que “Bolsonaro é um mau militar. Não conhece tática e estratégia. Assim agem também os desocupados fantasiados de generais que compõem sua pandilha. Não avança, provoca. Não conquista terreno, grita e faz espalhafato para ocultar o beco em que se meteu”.

De todo o artigo de Maringoni, este parágrafo acima é – na minha opinião – o pior de todos. 

Bolsonaro é um cavernícola, mas o fato é que ele tem criado as condições para fazer a boiada passar. E na base do grito, tem conseguido impor o medo em parte importante da sociedade brasileira, esquerda inclusa. 

Graças a isto, aliás, vem conseguindo obter vitórias sem desembainhar toda a espada. Como acontecerá neste 7 de setembro, se a opinião de Maringoni prevalecer em amplos setores da esquerda.

Vale muito a pena ir às ruas em 7 de setembro!


7 comentários:

  1. Eu acho que nem deveríamos discutir uma não ida às ruas non7 de setembro. É uma data histórica de mobilização da esquerda e nunca nos deixamos pautar pelo tamanho dela. R mais, deixar de ir, aí sim, seria ser pautado pela agenda do bolso.narismo.

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  2. Devíamos chamar a primavera popular

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  3. Primavera popular e ir a rua no dia 24 e deixar o povo dele fazer as badernas se desgastar com as badernas

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  4. 07 de setembro não é um símbolo da esquerda nunca foi é uma data militarizada

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  5. A intelectualidade de esquerda está caindo nas armadilhas intelectuais somos pautados todas as semanas, a esquerda está nos Claustros, acadêmicos, para além. Não temos intelectuais de esquerda de relevância que tem representatividade nacional.

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  6. Sendo pautados pelo governo a esquerda academica gosto de debates conceitual de análise

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  7. a marca de um novo governo de esquerda se ocorrer não pode ser uma forma melhorista social democráta de direita estimulando o consumo keynesianismo de esquerda criando o milagre brasileiro o esquema Lulinha paz e amor para justificar uma aceitação pelas elites das áreas na cultura também têmos que ser radicais e demarcadores democracia como valor universal da radicalidade de ações

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