quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Se Leonardo Boff é um “bosta”, Ciro Gomes é o quê?

O jornal Folha de S. Paulo publicou, no dia 31 de outubro de 2018, uma entrevista com Ciro Gomes, terceiro colocado no primeiro turno da eleição presidencial de 2018.

Lembrado pela Folha de que teria dito que “choraria e deixaria a política se Bolsonaro ganhasse”, Ciro comete a resposta mais reveladora – do ponto de vista psicológico -- de toda a entrevista, por três motivos.

O primeiro motivo: Ciro diz que “um país que elege o Bolsonaro eu não compreendo tanto mais, o que me recomenda não querer ser seu intérprete”. 

Apesar disso, mais adiante na entrevista, ele não terá dúvida em responsabilizar o PT. Acusar o PT é no fundamental uma obsessão, não uma análise ou "interpretação".

O segundo motivo: Ciro não quer apenas ser presidente da República, ele tem a pretensão de ser “intérprete” do Brasil. 

Talvez esteja aí parte da explicação para o ziguezague político de Ciro: uma tentativa eternamente frustrada de abarcar, no discurso e na prática de um indivíduo, os imensos conflitos e contradições que atravessam nossa sociedade.

O terceiro motivo: Ciro diz que “o país ficou órfão”. 

Até onde eu consigo entender, ele deve estar querendo dizer “órfão de pai”. Ciro parece pretender, através de sua “luta”, ocupar o lugar desta figura paterna, que ele curiosamente não diz quem é.

Perguntado se “tomou uma decisão se será candidato em 2022”, Ciro responde que não. Diz que isto seria um mero exercício de especulação, “porque a adrenalina não pacificou”. E como prova disto, disfere o primeiro ataque contra seu inimigo principal: “Só essa cúpula exacerbada do PT é que já começou a campanha de agressão. Eu não. Tenho sobriedade e modéstia. Acho que o país precisa se renovar”.

Portanto, para Ciro Gomes a definição sobre uma candidatura presidencial não envolve estratégia, tática e programa, envolve níveis de adrenalina. E seja qual for sua decisão a respeito, já há um inimigo a derrotar: o Partido dos Trabalhadores, que teria começado uma campanha de agressão.

Contra quem? Onde? Quando? 

Evidentemente, os fatos são outros: o PT foi vítima de uma sistemática campanha de agressão física e verbal por parte da campanha de Bolsonaro, campanha que matou pelo menos 2 pessoas e que prosseguiu depois de domingo 28 de outubro.

A quem interessa acusar o PT de promotor de uma campanha de agressão?

Perguntado se deixou de confiar no povo brasileiro, Ciro explica que não e apresenta sua viagem à três países da Europa como um “distanciamento” que permitiu a ele “entender o que aconteceu”: “uma reação impensada, espécie de histeria coletiva a um conjunto muito grave de fatores que dão razão a uma fração importante dessa maioria que votou no Bolsonaro”.

E qual seria este “conjunto muito grave de fatores”?

Teria algo que ver com a operação política, iniciada logo após o segundo turno de 2014, operação que envolveu amplos setores da classe dominante e dos setores médios tradicionais, do aparelho de Estado, dos meios de comunicação, das forças armadas e das polícias militares, com apoio da comunidade de inteligência de pelo menos dois países?

Não!!!!

Num movimento de prestidigitação mental típico do jeito de pensar nas redes sociais, Ciro reduz o “conjunto muito grave de fatores” ao seguinte: “o lulopetismo virou um caudilhismo corrupto e corruptor que criou uma força antagônica que é a maior força política no Brasil hoje. E o Bolsonaro estava no lugar certo, na hora certa. Só o petismo fanático vai chamar os 60% do povo brasileiro de fascista. Eu não, de forma nenhuma”.

Um comentário lateral: tenho dúvidas se Ciro foi mesmo para a Europa. Afinal, a frase “o lulopetismo virou um caudilhismo corrupto e corruptor” parece ter saído da boca de um importante intelectual brasileiro que mora nos Estados Unidos.

Mas vamos ao que interessa: não foi 60% do povo brasileiro que votou em Bolsonaro. Aliás, não foi nem mesmo 60% do eleitorado. Foi menos de 60% dos que votaram em algum candidato no segundo turno. E o PT nunca chamou todos estes eleitores de fascistas.

Em segundo lugar, não foi por acaso que Bolsonaro “estava no lugar certo, na hora certa”. Todo mundo sabia que que as mesmas pesquisas que davam Lula em primeiro lugar, davam Bolsonaro em segundo lugar. Portanto, quem decidiu tirar Lula da disputa, sabia exatamente quem estava “no lugar certo, na hora certa”. Moro que o diga.

Em terceiro lugar: o lulopetismo, seja lá o que for isto, disputou 8 eleições presidenciais desde 1989. Em 6 destas eleições, disputou contra o PSDB, ganhando 4 e perdendo duas. Nas outras duas eleições, perdeu para a extrema direita: Collor e Bolsonaro.

Considerando estas estatísticas, então o lógico seria atribuir ao PT a criação não só de Bolsonaro, mas também e antes disso, a criação do PSDB, que foi sua "força antagônica" por mais tempo. Mas, é claro, adotar esta lógica e fazer este tipo de interpretação não interessa a Ciro, pois seu objetivo não é fazer uma análise séria; o que ele pretende, ao acusar o PT de ter criado Bolsonaro, é o equivalente a acusar uma vítima de ser a culpada pelo estupro.

Não foi o PT, nem Lula, quem criou seu “antagonista”. Quem pariu Mateus, que o embale: quem criou o bolsonarismo, quem alimentou a extrema-direita, foi a coalizão golpista.

Acusar o PT serve, também, para anistiar Ciro de qualquer responsabilidade pelo resultado. 

Perguntado pela Folha se “uma viagem à Europa não passou uma impressão de descaso”, Ciro responde: “Descaso não, rapaz, é de impotência. De absoluta impotência. Se tem um brasileiro que lutou, fui eu. Passei três anos lutando”.

Tirante a sobriedade e modéstia da resposta acima, o fato é que Ciro não quis declarar publicamente, nem muito menos convocar seu eleitorado a votar em Haddad. Aliás, mesmo agora ele segue sem explicitar em quem votou. Mas fornece uma resposta ao enigma de seu vídeo na véspera da eleição: “o que estava dizendo, por uma razão prática, não iria com eles se fossem vitoriosos, já estaria na oposição. Mas estava flagrante que já estava perdida a eleição”.

Ou seja: se entendi direito, a razão prática citada no vídeo divulgado na véspera da votação de segundo turno, vídeo em que Ciro fez sua não-declaração de voto, é que a eleição já estava perdida.

Suponhamos que isso fosse verdade, no dia 27 de outubro. Isto também seria verdade no dia 8 de outubro? Ou o engajamento de Ciro na campanha de Haddad poderia ter produzido outro resultado?

Não há como responder esta questão. Mas é ela que realmente importa, e não a falta de uma declaração na véspera. Ciro não faltou no dia 28 de outubro, ele faltou no dia 8 de outubro. Ciro sabe disso e tenta providenciar uma vacina, como fica claro na sequência seguinte da entrevista.

A Folha pergunta: “por não ter declarado voto, não teme ser visto como um traidor pelos eleitores de esquerda?”

Ciro responde: “A gente trai quando dá a palavra e faz o oposto. Quem tiver prestado a atenção no que falei, está muito clara a minha posição de que com o PT eu não iria.”

A Folha insiste: “Não se aliará mais ao PT?”

Ciro responde: “Não, se eu puder, não quero mais fazer campanha para o PT”.

Quem acusa o PT de sectarismo, favor tomar nota destas frases. Mesmo diante de um Bolsonaro, Ciro se recusou a fazer campanha.

E por qual motivo esta postura? A resposta já foi dada antes e volta agora, no momento em que Ciro fala que Leonardo Boff é um “bosta”: “Qual a opinião do Boff sobre o mensalão e petrolão? Ou ele achava que o Lula também não sabia da roubalheira da Petrobras? O Lula sabia porque eu disse a ele que, na Transpetro, Sérgio Machado estava roubando para Renan Calheiros. O Lula se corrompeu por isso, porque hoje está cercado de bajulador, com todo tipo de condescendências”.

Ou seja: a “narrativa” de Ciro, a aparente justificativa para ele não ter feito campanha, o motivo para não ter declarado voto em Haddad, concentra-se no tema corrupção.

Como ele já tinha dito antes, na mesma entrevista: “o lulopetismo virou um caudilhismo corrupto e corruptor”.

Duvido que Ciro afirmaria isto, se Lula e o PT tivessem decidido apoiar a candidatura dele a presidente da República. Pois, falemos claro, sua irritação não é com a corrupção, mas com a tática que o PT adotou nas eleições 2018. Tática que Ciro apresenta como “fraudar a opinião pública do país, mentindo que [Lula] era candidato”.

Mentindo?

Alguém duvida que o PT realmente queria que Lula fosse o candidato?

Alguém duvida que o PT tinha certeza de que, se Lula fosse candidato, ela venceria as eleições?

Alguém duvida que o PT está convicto de que Lula tinha direito de ser candidato?

Aliás, o CIDH da ONU também estava “mentindo” quando afirmou que este direito deveria ser garantido?

Ciro tem todo o direito de discordar da tática adotada pelo PT, mas reduzir isto a uma mentira é, para ser gentil, algo meio pueril. 

Ciro pode chamar os petistas de “fanáticos” e pode dizer que Haddad cumpriu um “papelão”; mas o fato é que a tática do PT foi implementada à luz do dia. 

Não houve fraude, não houve engano. 

Haddad virou vice de Lula dia 5 de agosto e substituiu Lula dia 11 de setembro. E foi ao segundo turno.

Ciro diz que foi convidado e não quis estar no lugar de Haddad: “não aceitei. Me considerei insultado”. Insultado? 

Qual o "insulto" que poderia haver em ser vice de Lula, depois substituir Lula, ir ao segundo turno e lutar contra a extrema direita??

Consciente da dificuldade em sustentar seu ponto de vista, Ciro acusa o “petismo ululante” de ser “igual o bolsominion, rigorosamente a mesma coisa”. 

Rigorosamente???

Dizer algo assim é que constitui um insulto à memória dos petistas e eleitores em geral que foram vítimas, inclusive fatais, da violência da extrema-direita.

A Folha pergunta “quais foram os erros cometidos pelos pedetistas?” 

Pessoa autodeclarada sóbria e modesta, Ciro responde que “devemos ter cometido algum (!!!) erro e merecemos a crítica. Mas, nesse contexto, simplesmente multiplicamos por um milhão as energias que nos restaram para trabalhar. Fomos miseravelmente traídos. Aí, é traição, traição mesmo. Palavra dada e não cumprida, clandestinidade, acertos espúrios, grana”.

Traição?

Recordo a frase anterior de Ciro: “A gente trai quando dá a palavra e faz o oposto”.

O PT por acaso deu a palavra a Ciro?

Ao invés de cobrar satisfação de quem prometeu algo para ele e não cumpriu, Ciro ofende a lógica derramando acusações sobre o PT: “Você imagina conseguir do PSB neutralidade trocando o governo de Pernambuco e de Minas? Em nome de que foi feito isso? De qual espírito público, razão nacional, interesse popular? Projeto de poder miúdo. De poder e de ladroeira”.

Mesmo que isso tudo acima fosse verdade, ainda assim não faz o menor sentido acusar o PT de “traição”. Se houve alguma, não foi cometida pelo PT.

Mas Ciro não parece muito preocupado com a lógica, nem com os fatos. 

Seu objetivo é acusar o PT. E é nesse ponto da entrevista que ele chega ao extremo de dizer o seguinte: “O PT elegeu Bolsonaro. Todas as pesquisas, não sou eu quem estou dizendo, dizem isso”.

Tudo bem que vivemos na era das fake news, mas falta de lógica tem limite. Quem elegeu Bolsonaro foi quem votou nele. Com ajuda de quem lavou as mãos.

A frase tosca (“O PT elegeu Bolsonaro”) é a síntese descabelada de uma “teoria” segundo a qual, se o PT não existisse, se o PT não tivesse a força que tem, se o PT tivesse decidido abrir mão de Lula, se o PT tivesse pedido voto para Ciro Gomes, se, se, se, se tudo isso fosse de um jeito diferente do que é, quem sabe Ciro não teria sido eleito presidente da República?

Esta teoria nunca será provada, assim como nunca provaremos que Haddad poderia ter sido eleito "se" Ciro tivesse feito campanha para ele desde o dia 8 de outubro.

O que está provado é que Ciro não teve voto suficiente para ir ao segundo turno, que só teria estes votos aliado com o PT, mas como do PT ele só queria submissão e como o PT sabia de sua força, a aliança não saiu, o candidato do PT foi ao segundo turno da eleição e teve 47 milhões de votos, enquanto Ciro foi curtir sua “absoluta impotência” na Europa.

A postura de Ciro acerca do PT não é um ato impensado. Ele mesmo confirma não querer “participar dessa aglutinação de esquerda. Isso sempre foi sinônimo oportunista de hegemonia petista. Quero fundar um novo campo, onde para ser de esquerda não tem de tapar o nariz com ladroeira, corrupção, falta de escrúpulo, oportunismo. Isso não é esquerda. É o velho caudilhismo populista sul-americano”.

Claro, o personagem não combina com o discurso, mas este tipo de discurso contra o “velho caudilhismo populista sul-americano” tem duas fontes. Uma é gringa e outra é europeia. É nesse “campo” que Ciro quer plantar. E para isto o PT não pode existir. Neste sentido, sua política é absolutamente coerente e não tem nada de emocional.

Mas como fazer o PT deixar de existir?

Aqui vem a parte sinistra da operação que Ciro está promovendo: deixar a tarefa para Bolsonaro.

Exagero?

Não acho. Vejam a sequência final da entrevista.

- A liberdade de imprensa está ameaçada?
- É muito epidérmica a nossa sensibilidade. Não acho que tem havido nenhuma ameaça à liberdade de imprensa até aqui. Por isso que digo que uma das centralidades do mundo político brasileiro deveria ser um entendimento amplo o suficiente para cumprir a guarda da institucionalidade democrática. E um dos elementos centrais disso é a liberdade de imprensa. A imprensa brasileira nepotista e plutocrata como é parte responsável também por essa tragédia.
- A imprensa ajudou a eleger Bolsonaro?
- A arrogância do [William] Bonner achando que podia tutelar a nação brasileira, falar pela nação brasileira. A Folha que repercute uma calúnia contra uma cidade inteira que é reconhecida mundialmente como um elemento de referência de educação para me alcançar [Ele se refere a reportagem sobre relatos de estudantes de fraudes em avaliações nas escolas de Sobral, no Ceará].
- E os ataques feitos pelo Bolsonaro à Folha? É uma ameaça? Não considero, não.
- A Folha tem capacidade de reagir a isso e precisa ter também um pouco de humildade, de respeitar a crítica dos outros.

Vejam: se Ciro não é capaz de ter simpatia pela Folha, terá alguma simpatia pelo PT, se e quando este for atacado brutalmente pelo governo Bolsonaro?

Ou dirá que o PT precisa de “um pouco de humildade, de respeitar a crítica dos outros”?

Ah, antes que me esqueça: Boff não é um “bosta”. E paro por aqui.

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SEGUE A ÍNTEGRA DA ENTREVISTA PUBLICADA PELA FOLHA DE S.PAULO DIA 31/11/2018

”Fomos miseravelmente traídos por Lula, não farei mais campanha para o PT, diz Ciro”* - Terceiro colocado na eleição presidencial, Ciro Gomes (PDT) afirmou, em entrevista à Folha, que foi "miseravelmente traído" pelo ex-presidente Lula e seus "asseclas". Em seu apartamento, onde concedeu nesta terça-feira (30) sua primeira entrevista desde a eleição de Jair Bolsonaro (PSL), Ciro nega ter lavado as mãos ao ter viajado para a Europa depois do primeiro turno. "A gente trai quando dá a palavra e faz o oposto". "Não declarei voto ao Haddad porque não quero mais fazer campanha com o PT", disse. O pedetista critica a atuação do PT para impedir o apoio do PSB à sua candidatura e diz que considerou um insulto convite de Lula para assumir o papel de seu vice no lugar Fernando Haddad (PT).
- No primeiro turno, o senhor afirmou que choraria e deixaria a política se Bolsonaro ganhasse. Deixará a vida pública?
- Eu disse isso comovidamente porque um país que elege o Bolsonaro eu não compreendo tanto mais, o que me recomenda não querer ser seu intérprete. Entretanto, do exato momento que disse isso até hoje, ouvi um milhão de apelos de gente muito querida. E, depois de tudo o que acabou acontecendo, a minha responsabilidade é muito grande. Não sei se serei mais candidato, mas não posso me afastar agora da luta. O país ficou órfão.
- E não tomou uma decisão se será candidato em 2022?
- Não. Quem conhece o Brasil sabe que você afirmar uma candidatura a 2022 é um mero exercício de especulação, porque a adrenalina não pacificou. Só essa cúpula exacerbada do PT é que já começou a campanha de agressão. Eu não. Tenho sobriedade e modéstia. Acho que o país precisa se renovar.
- O senhor disse que deixaria a vida pública porque a razão de estar na política é confiar no povo brasileiro. Deixou de confiar?
- Não, procurei entender o que aconteceu. Esse distanciamento me permitiu isso. O que aconteceu foi uma reação impensada, espécie de histeria coletiva a um conjunto muito grave de fatores que dão razão a uma fração importante dessa maioria que votou no Bolsonaro. O lulopetismo virou um caudilhismo corrupto e corruptor que criou uma força antagônica que é a maior força política no Brasil hoje. E o Bolsonaro estava no lugar certo, na hora certa. Só o petismo fanático vai chamar os 60% do povo brasileiro de fascista. Eu não, de forma nenhuma.
- Naquele momento do país, uma viagem à Europa não passou uma impressão de descaso? [Ciro viajou para Portugal, Itália e França após o 1º turno]
- Descaso não, rapaz, é de impotência. De absoluta impotência. Se tem um brasileiro que lutou, fui eu. Passei três anos lutando.

- Com a sua postura de neutralidade, não lavou as mãos em um momento importante para o país?
- Não foi neutralidade. Quem declara o que eu declarei não está neutro. Agora, o que estava dizendo, por uma razão prática, não iria com eles se fossem vitoriosos, já estaria na oposição. Mas estava flagrante que já estava perdida a eleição.
- Por não ter declarado voto, não teme ser visto como um traidor pelos eleitores de esquerda? A gente trai quando dá a palavra e faz o oposto. Quem tiver prestado a atenção no que falei, está muito clara a minha posição de que com o PT eu não iria.
- Não se aliará mais ao PT? Não, se eu puder, não quero mais fazer campanha para o PT. Evidente, você acha que eu votei em quem?
- No Haddad?
- Vou continuar calado, mas você acha que votei em quem com a minha história? Eles podem inventar o que quiserem. Pega um bosta como esse Leonardo Boff [que criticou Ciro por não declarar voto a Haddad]. Estou com texto dele aqui. Aí porque não atendo o apelo dele, vai pelo lado inverso. Qual a opinião do Boff sobre o mensalão e petrolão? Ou ele achava que o Lula também não sabia da roubalheira da Petrobras? O Lula sabia porque eu disse a ele que, na Transpetro, Sérgio Machado estava roubando para Renan Calheiros. O Lula se corrompeu por isso, porque hoje está cercado de bajulador, com todo tipo de condescendências.
- Quem são os bajuladores?
- É tudo. Gleisi Hoffmann, Leonardo Boff, Frei Betto. Só a turma dele. Cadê os críticos? Quem disse a ele que não pode fazer o que ele fez? Que não pode fraudar a opinião pública do país, mentindo que era candidato?
- Por que o senhor não aceitou ser candidato a vice-presidente de Lula?
- Porque isso é uma fraude. Para essa fraude, fui convidado a praticá-la. Esses fanáticos do PT não sabem, mas o Lula, em momento de vacilação, me chamou para cumprir esse papelão que o Haddad cumpriu. E não aceitei. Me considerei insultado.
- Por que não declarou voto em Haddad?
- Aquilo era trivial. O meu irmão foi a um ato de apoio a Haddad, depois de tudo o que viu acontecendo de mesquinho, pusilânime e inescrupuloso. É muito engraçado o petismo ululante. É igual o bolsominion, rigorosamente a mesma coisa. O Cid está lá tentando elaborar uma fórmula de subverter o quadro e é vaiado. Estou devendo o que ao PT?
- Não declarou voto no Haddad por causa do Lula?
- Não declarei voto ao Haddad porque não quero mais fazer campanha com o PT. Agora, em uma eleição que tem só dois candidatos, na noite do primeiro turno, disse à imprensa: "Ele não". O que ele quer mais agora?
- Cid Gomes cobrou uma autocrítica dos petistas. E quais foram os erros cometidos pelos pedetistas?
- Devemos ter cometido algum erro e merecemos a crítica. Mas, nesse contexto, simplesmente multiplicamos por um milhão as energias que nos restaram para trabalhar. Fomos miseravelmente traídos. Aí, é traição, traição mesmo. Palavra dada e não cumprida, clandestinidade, acertos espúrios, grana.
- Isso por Lula?
- Pelo ex-presidente Lula e seus asseclas. Você imagina conseguir do PSB neutralidade trocando o governo de Pernambuco e de Minas? Em nome de que foi feito isso? De qual espírito público, razão nacional, interesse popular? Projeto de poder miúdo. De poder e de ladroeira. O PT elegeu Bolsonaro. Todas as pesquisas, não sou eu quem estou dizendo, dizem isso. O Haddad é uma boa pessoa, mas ele, jamais, se fosse uma pessoa que tivesse mais fibra, deveria ter aceito esse papelão. Toda segunda ir lá [visitar Lula], rapaz. Quem acha que o povo vai eleger pessoa assim? Lula nunca permitiu nascer ninguém perto dele. E eles empurram para a direita, que é o querem fazer comigo.
- A postura do senhor não inviabiliza uma reaglutinação das siglas de esquerda?
- Não quero participar dessa aglutinação de esquerda. Isso sempre foi sinônimo oportunista de hegemonia petista. Quero fundar um novo campo, onde para ser de esquerda não tem de tapar o nariz com ladroeira, corrupção, falta de escrúpulo, oportunismo. Isso não é esquerda. É o velho caudilhismo populista sul-americano.
- A liberdade de imprensa está ameaçada?
- É muito epidérmica a nossa sensibilidade. Não acho que tem havido nenhuma ameaça à liberdade de imprensa até aqui. Por isso que digo que uma das centralidades do mundo político brasileiro deveria ser um entendimento amplo o suficiente para cumprir a guarda da institucionalidade democrática. E um dos elementos centrais disso é a liberdade de imprensa. A imprensa brasileira nepotista e plutocrata como é parte responsável também por essa tragédia.
- A imprensa ajudou a eleger Bolsonaro?
- A arrogância do [William] Bonner achando que podia tutelar a nação brasileira, falar pela nação brasileira. A Folha que repercute uma calúnia contra uma cidade inteira que é reconhecida mundialmente como um elemento de referência de educação para me alcançar [Ele se refere a reportagem sobre relatos de estudantes de fraudes em avaliações nas escolas de Sobral, no Ceará].
- E os ataques feitos pelo Bolsonaro à Folha? É uma ameaça? Não considero, não.
- A Folha tem capacidade de reagir a isso e precisa ter também um pouco de humildade, de respeitar a crítica dos outros.

5 comentários:

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  3. Ótimo texto, Valter. Depois peça ao jornal Brasil de Fato para listar o seu vídeo sobre o governo bolsonaro, infelizmente não está listado na busca e estou com dificuldade de encontra-lo. Abraço

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  4. Valter, sou militante na juventude da articulação de esquerda e, nestes tempos eleitorais, tomei contato com o fronte cibernético, trincheras culturais em grupos de whatsapp, modelo de atuação de robôs do fascista (e alguns, poucos, nossos também), etc. Digo isto para sugerir uma atualização no modelo: O blog é ótimo como arquivo, todos os seus textos ficam categorizados cronologicamente ao longo dos anos, mas não seria uma boa ter um perfil no facebook para realizar o debate público? Tal qual o Darlan Montenegro, da consulta popular, e o Capelli, do PC do B? Muitos jovens (e alguns mais velhos também, pelo que percebo, ehehe) são influenciados por ambos por conta da publicação de ambos no facebook. Fica a dica!

    Outra importante sugestão: O Breno Altman recorrentemente posta videos com aulas sobre algum assunto específico no facebook. O youtuber Felipe Neto é, hoje, uma das vozes de maior alcance contra o escola sem partido. Onde quero chegar com isso? Gostaria de sugerir para que pense em ter um canal no youtube para realizar comentários sobre a conjuntura, tal qual no vídeo citado àcima. Não precisaria ser algo com o compromisso de ser atualizando de maneira regular, mas um canal com as suas posições que a bolha da nossa militancia conhece, mas mesmo entre os petistas, muitas dos debates colocados por você não chegam. Então ficam ambas as sugestões.

    Parabéns pela análise, já repassei a diversos colegas que estão aflitos com o atual momento e não entendem o que representa ciro gomes. um abraço vermelho.

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