Acabo de ler a entrevista concedida por Gilberto Carvalho à revista Veja.
Não sei se o que está publicado é fiel ao que ele disse.
Espero que não.
Mas confesso minha perplexidade com o fato em si.
Afinal, na relação custo benefício envolvida em qualquer entrevista à grande mídia, a Veja oferece benefícios mínimos e custos máximos.
Por exemplo: suponho que o tema da corrupção tenha sido um tema menor na entrevista concedida.
Mas a edição de Veja transformou este tema no centro da entrevista publicada, algo bastante útil para quem pretenda neutralizar, mesmo que parcialmente, o efeito político das recentes decisões do STF em favor de Lula e do PT.
Quanto ao conteúdo – supondo que o publicado seja fiel ao que foi dito – confesso que há coisas que me surpreendem.
Começo pelo tema da corrupção.
Se Gilberto disse mesmo que “a imensa maioria dos petistas, a imensa maioria dos ministros do PT” segue “lutando para sobreviver e não acumulou riqueza”, então a pergunta é: esta minoria que se corrompeu e “acumulou riqueza” segue sendo petista ou foi devidamente punida e expulsa do Partido?
Pois convenhamos: a questão politicamente importante não é se “houve petistas que se corromperam”, nem tampouco se houve corrupção em nossos governos.
A questão politicamente relevante é saber como agimos, que medidas tomamos.
Mas sobre isso a entrevista publicada nada diz, exceto que estaríamos buscando alianças com gente de partidos que foram e seguem corruptos.
Ou seja: se foi mesmo isso que Gilberto disse, trata-se de uma linha de argumentação muito infeliz, para ser gentil.
Haveria mais a ser dito sobre o que Gilberto diz acerca da corrupção, mas por enquanto passemos para o segundo ponto: o bolsonarismo.
Gilberto – na versão que Veja publica da entrevista, versão que, repito, não sei se confere com o que ele disse – critica o bolsonarismo como defensor da “guerra”, do “exterminar o outro para sobreviver”.
A Veja percebeu o flanco aberto e perguntou assim: “O senhor critica a estratégia do confronto, mas o PT sempre estimulou o discurso do ‘nós contra eles’.”
Ou seja: Veja, bem ao estilo Ciro Gomes, quer colocar petistas e bolsonaristas num mesmo balaio.
O surpreendente é que Gilberto teria respondido – se a Veja não deturpou suas palavras – que “de alguma forma, alguma radicalização nossa abriu caminho para isso”.
Isto é fato?
Não, não é fato.
Basta pensar no seguinte:
a) desde 1980 ou desde 2016, quantos militantes da esquerda foram demitidos, perseguidos, reprimidos e até assassinados? E da direita, alguém sabe??
b) desde 1980 ou desde 2016, quantas pessoas pioraram de vida, em função do radicalismo da esquerda? E quantas pioraram de vida, em função do radicalismo da direita?
Seja na forma, seja no conteúdo, não há comparação possível entre a radicalização da direita e a radicalização da esquerda.
Aceitar alguma procedência neste tipo de comparação, especialmente num momento em que o lado de lá pratica genocídio, é simplesmente bizarro.
Passemos para o terceiro ponto: os militares.
Segundo Gilberto – supondo que ele de fato tenha dito aquilo que Veja publicou – “nossa decepção é enorme com a decisão do comando do Exército em não punir o general” Eduardo Pazuello. “Esse episódio botou o Exército de joelhos. Hoje a gente já não tem mais dúvida dos riscos. Ficamos perplexos”.
Eu também fico perplexo.
Afinal, com tudo o que aconteceu antes da absolvição de Pazuello, e mesmo depois da absolvição do dito cujo, ainda tem gente que acredita que o Exército estaria “de joelhos”.
Está não.
O Exército não está de joelhos.
O Exército foi essencial para o golpe de 2016.
Foi essencial para a condenação, prisão e interdição de Lula.
Foi essencial para a vitória de Bolsonaro em 2018.
É a espinha dorsal de governo cavernícola.
Contribuiu diretamente para o genocídio.
Não está de joelhos.
A não ser que a frase tenha sido editada e Gilberto tenha dito que está de joelhos... no nosso pescoço.
Um último "detalhe".
Veja deu à entrevista de Gilberto Carvalho o seguinte título: "Uma (quase) autocrítica".
E entre outras coisas, a revista diz o seguinte: "O PT não inventou a corrupção, mas, ao chegar ao poder, descobriu quanto ela tornava as coisas mais fáceis para todos os interesssados. Em nome de um projeto, não hesitou em firmar parcerias com criminosos, fragilizou a democracia ao substituir a legítima negociação parlamentar pelo suborno, usou e abusou do dinheiro público para atingir seus objetivos eleitorais e teve seus principais dirigentes condenados e presos por corrupção, mas sempre se negou a assumir a culpa. Por isso, a autocrítica de Gilberto Carvalho pode ser considerada como um marco, embora ainda parcial".
Da minha parte, espero que Veja tenha deturpado as declarações de Gilberto.
Entre outros motivos, porque o que foi publicado não é uma autocrítica.
Autocrítica a gente faz dos erros que cometemos no enfrentamento dos nossos inimigos.
E de fato cometemos muitos erros no combate aos nossos inimigos, acerca dos quais há resoluções partidárias a respeito.
Foi o que defendemos aqui, por exemplo: https://pt.org.br/valter-pomar-o-pt-e-a-luta-contra-a-corrupcao/
Se as resoluções partidárias não são corretas ou precisam ser atualizadas, vamos debater e aprovar outras.
Mas nunca aquilo que nossos inimigos querem ouvir, para assim poderem nos combater melhor.
Desconfio que essa entrevista de GC é o início da capitulação do PT para eleger Lula. Tristeza, decepção. Depois de um agigantamento diante do sistema judicial corrompido se entregar ao que há de pior nas classes dominantes brasileiras.
ResponderExcluirHá de se ter uma tática para superar o antioetismo e chegar vitorioso no 22.Acrefito que GC inicia bem
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