-saudação aos participantes da escola de verão do PCF
-o PT mantém ótimas relações com o PCF, recentemente recebemos uma
delegação do Partido, encabeçada por Pierre Laurent, que esteve com a direção
nacional do Partido, com o ex-presidente Lula e com a presidenta Dilma
-por conta destas ótimas relações, gostaríamos muito de participar
presencialmente da escola de verão
-infelizmente, por razões de nossa agenda aqui no Brasil, não foi
possível participar presencialmente
-construímos então esta alternativa, gravar um vídeo sobre o tema que
nos foi proposto pelos organizadores da escola: “Brasil, a esquerda frente à
contestação popular”
-como se trata de uma escola, é importante iniciar com algumas
informações preliminares sobre o Brasil
-o Brasil é um país capitalista, mas o capitalismo se desenvolveu
tardiamente no Brasil, basicamente a partir dos anos 1930.
-Desde então e até o final da década de 1970, foram 50 anos de intenso
desenvolvimento capitalista.
-Ao longo destas cinco décadas, o tipo de desenvolvimento que vivemos
foi baseado em três fatores:
1.uma intensa articulação entre Estado, capital estrangeiro e capital
privado nacional;
2.uma exploração intensiva e extensiva da força de trabalho, inclusive
lançando mão de formas de exploração pré-capitalistas, como o trabalho escravo
e a subordinação do trabalhador camponês ao latifundiário;
3. o uso recorrente de ditaduras ou democracias restritas, sem o que não
teria sido possível o nível de exploração a que nossa classe trabalhadora foi
submetida.
No final dos anos 70, estes três fatores entraram em crise: a ditadura militar iniciada em 1964 estava
sob forte questionamento, as classes trabalhadoras estavam em rebelião aberta e
o modelo econômico estava esgotado por razões internas e externas.
Os anos 1980 foram de intensa disputa de rumos no Brasil. Um sinal desta disputa foi a organização do PT,
da CUT, do MST e a reorganização da UNE. Outro sinal foi a convocação de uma
Constituinte restrita, em 1987-1988. E, um terceiro sinal, foi a disputa
presidencial de 1989, em que tivemos mais de 10 candidaturas presidenciais, das
quais foram ao segundo turno duas, exatamente as que representavam as posições
extremas: Collor e Lula.
O segundo turno das eleições de 1989 foi uma novidade na história do
Brasil. A novidade não estava na disputa entre dois blocos políticos. Esta
disputa já tinha ocorrido diversas vezes ao longo de nossa história,
contrapondo setores democráticos a conservadores, setores populares a
oligarquias, setores nacionalistas a entreguistas.
A novidade é que pela primeira vez os setores democráticos, populares,
nacionalistas, foram liderados pela esquerda.
Entretanto, fomos derrotados em 1989 e seguiu-se uma década sob
hegemonia neoliberal. Na maior parte desta década neoliberal, estivemos sob a
presidência de FHC, do PSDB.
O resultado prático da década neoliberal foi retrocesso democrático,
retrocesso social, retrocesso econômico.
Foi neste ambiente de retrocesso, que incluía um refluxo das lutas
sociais, que vencemos as eleições de 2002. É importante destacar isto: nossa
vitória em 2002 não se deu num ambiente de ascenso das lutas de massas.
Vencemos, principalmente devido ao desgaste do lado de lá.
Claro que não teríamos vencido não houvesse acúmulo de forças do lado de
cá. Lula disputou e perdeu as eleições de 1994 e 1998, antes de vencer em 2002.
Mas o fator decisivo foi o desgaste do lado de lá.
É importante ter isto claro, pois o refluxo das lutas sociais é um dos
elementos que explica, mesmo que não
justifique, a relativa moderação dos nossos 10 anos de governo.
Entre 2003 e 2013, o Brasil está sob presidência de um petista: primeiro
Lula, até 2010, e em seguida Dilma, a partir de 2011 e até agora.
Mas o governo Lula, assim como o governo Dilma, não são petistas. São
governos de coalizão, integrados por partidos de esquerda, centro e até
direita.
São, também, governos de coalizão social, entre setores da classe
trabalhadora, setores médios e setores do grande empresariado.
Vale lembrar que o sistema político brasileiro é presidencialista, não
parlamentarista. Mas o Congresso tem muita força. E a esquerda não tem maioria,
nem na Câmara dos Deputados, nem entre os senadores.
Isto posto, qual o balanço que podemos fazer destes 10 anos? Que o povo
vive melhor do que vivia na época do governo FHC, assim como estamos melhor do
que estaríamos caso os candidatos do PSDB tivessem vencido as eleições
presidenciais de 2002, 2006 e 2010.
Este viver melhor significa mais empregos, mais salários, mais
capacidade de consumo. Significou, também, avanços muito relevantes em algumas
áreas, como o acesso a energia elétrica, as cotas para afrodescendentes etc.
Mas não houve, ao longo destes dez anos, mudanças estruturais na oferta
de serviços públicos, nem nos padrões de propriedade e riqueza. Embora o povo
viva melhor, a desigualdade ainda é brutal no Brasil.
Tampouco houve mudanças estruturais no funcionamento do Estado, da
política e da comunicação social no Brasil.
O Estado brasileiro é o desenhado pela Constituição de 1987-1988, que
preservou muito do estado ditatorial. Posteriormente, no período neoliberal,
este Estado foi alterado parcialmente, para pior.
O sistema político brasileiro é baseado no financiamento privado
empresarial das campanhas eleitorais, no voto nominal (e não no voto em listas
partidárias), além de outras distorções importantes que agridem o conceito
básico da democracia: a igualdade entre todos.
E a comunicação social é oligopolizada, controlada por um grupo de
empresas familiares, todas vinculadas aos interesses da direita e do grande
capital.
Ou seja: entre 2003 e 2013 a vida do povo brasileiro melhorou, mas
ficaram pendentes importantes mudanças estruturais. E, a partir de 2011, estas
mudanças estruturais tornaram-se mais difíceis de fazer, devido aos impactos da
crise internacional sobre a sociedade brasileira.
Entre os muitos impactos e efeitos colaterais da crise, está uma mudança
na atitude de setores importantes do grande capital frente ao nosso governo. No
ambiente de crise, o grande capital pressiona nosso governo para que adote
medidas que reduzam o “custo da força de trabalho”.
Evidentemente, nos negamos a isto. Como disse a presidenta Dilma, ela
não foi eleita para reduzir o emprego, os salários e os serviços sociais à
disposição do povo brasileiro.
Em decorrência, apesar dos subsídios e das concessões feitas pelo
governo, o grande capital não aposta na ampliação dos investimentos e do
crescimento econômico.
É esta a queda de braço que estava em curso no Brasil, até maio de 2013:
por um lado, o grande capital pressionando o governo a cortar, por outro lado o
governo pressionando o grande capital a investir.
Era este o contexto, quando explodiram as manifestações de junho de
2013.
Aqui vale a pena recapitular, de maneira esquemática, os quatro momentos
da onda de manifestações:
1-as primeiras manifestações, encabeçadas por um Movimento Passe Livre. Vale explicar que este Movimento
existe há muitos anos, que seus dirigentes em geral são próximos ao PT,
especialmente na cidade de São Paulo. As manifestações mais expressivas,
realizadas em SP, foram brutalmente reprimidas pela polícia, que no Brasil são
vinculadas ao governo estadual. No caso, ao governo Alckmin, que é do PSDB.
2- a segunda onda de manifestações, de solidariedade aos que foram
reprimidos e de denúncia da brutalidade policial. Novamente, nestas
manifestações predominou a esquerda. O crescimento das manifestações levou as
prefeituras e governos estaduais a, um atrás do outro, cancelar os aumentos das
tarifas de transporte coletivo.
3-a terceira onda de manifestações, para comemorar o resultado. Nestas
manifestações, há dois componentes novos.
Ao lado dos jovens trabalhadores e filhos de trabalhadores, começam a
participar setores que aqui no Brasil chamamos de classe média alta. E a grande
mídia, que originalmente se opusera aos movimentos, começa a apoiar a mobilização,
ao mesmo tempo que busca direcioná-la contra o governo Dilma e contra o PT.
4-finalmente, há uma quarta onda de manifestações, com dimensões mais
reduzidas e com diferentes propósitos. Os sindicalistas, os médicos etc.
Qual foi a atitude das esquerdas?
A esquerda que faz oposição ao governo Dilma (refiro-me ao PSOL, ao PSTU
e a outros grupos) tinha a expectativa de que estes movimentos fossem colocar o
governo contra a parede e que a esquerda seria a maior beneficiada disto. Ledo
engano.
A esquerda que apoia o governo Dilma (especialmente PT e PCdoB) adotaram
outra postura. No caso do PT, de Lula e de Dilma:
1-reconhecer a legitimidade
2-reconhecer a importância
3-mostrar a coincidência de propósitos
4-salientar a diferença com o quadro de outras regiões do mundo
5-apontar medidas concretas (saúde, educação)
6-propor um plebiscito, constituinte, reforma política
A direita reagiu mal. Nega-se a fazer reformas.
Ensinamentos:
1-há uma nova geração
2-há uma nova classe trabalhadora
3-há um envelhecimento e uma burocratização e uma institucionalização
4-a direita aproveita e disputa as ruas
5-sem democratizar comunicação, riscos crescentes
6-abriu-se um novo momento da luta de classes no país
7-disputa de 2014 será duríssima
Espero que este resumo ajude no debate que voces estão fazendo na Escola
de Verão do PCF.
Bom debate e obrigado por vosso convite e por vossa atenção.
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