quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Roteiro para vídeo enviado à escola de verão do PCF



-saudação aos participantes da escola de verão do PCF

-o PT mantém ótimas relações com o PCF, recentemente recebemos uma delegação do Partido, encabeçada por Pierre Laurent, que esteve com a direção nacional do Partido, com o ex-presidente Lula e com a presidenta Dilma

-por conta destas ótimas relações, gostaríamos muito de participar presencialmente da escola de verão

-infelizmente, por razões de nossa agenda aqui no Brasil, não foi possível participar presencialmente

-construímos então esta alternativa, gravar um vídeo sobre o tema que nos foi proposto pelos organizadores da escola: “Brasil, a esquerda frente à contestação popular”

-como se trata de uma escola, é importante iniciar com algumas informações preliminares sobre o Brasil

-o Brasil é um país capitalista, mas o capitalismo se desenvolveu tardiamente no Brasil, basicamente a partir dos anos 1930.

-Desde então e até o final da década de 1970, foram 50 anos de intenso desenvolvimento capitalista.

-Ao longo destas cinco décadas, o tipo de desenvolvimento que vivemos foi baseado em três fatores:

1.uma intensa articulação entre Estado, capital estrangeiro e capital privado nacional;

2.uma exploração intensiva e extensiva da força de trabalho, inclusive lançando mão de formas de exploração pré-capitalistas, como o trabalho escravo e a subordinação do trabalhador camponês ao latifundiário;

3. o uso recorrente de ditaduras ou democracias restritas, sem o que não teria sido possível o nível de exploração a que nossa classe trabalhadora foi submetida.

No final dos anos 70, estes três fatores entraram em crise:  a ditadura militar iniciada em 1964 estava sob forte questionamento, as classes trabalhadoras estavam em rebelião aberta e o modelo econômico estava esgotado por razões internas e externas.

Os anos 1980 foram de intensa disputa de rumos no Brasil. Um  sinal desta disputa foi a organização do PT, da CUT, do MST e a reorganização da UNE. Outro sinal foi a convocação de uma Constituinte restrita, em 1987-1988. E, um terceiro sinal, foi a disputa presidencial de 1989, em que tivemos mais de 10 candidaturas presidenciais, das quais foram ao segundo turno duas, exatamente as que representavam as posições extremas: Collor e Lula.

O segundo turno das eleições de 1989 foi uma novidade na história do Brasil. A novidade não estava na disputa entre dois blocos políticos. Esta disputa já tinha ocorrido diversas vezes ao longo de nossa história, contrapondo setores democráticos a conservadores, setores populares a oligarquias, setores nacionalistas a entreguistas.

A novidade é que pela primeira vez os setores democráticos, populares, nacionalistas, foram liderados pela esquerda.

Entretanto, fomos derrotados em 1989 e seguiu-se uma década sob hegemonia neoliberal. Na maior parte desta década neoliberal, estivemos sob a presidência de FHC, do PSDB.

O resultado prático da década neoliberal foi retrocesso democrático, retrocesso social, retrocesso econômico.

Foi neste ambiente de retrocesso, que incluía um refluxo das lutas sociais, que vencemos as eleições de 2002. É importante destacar isto: nossa vitória em 2002 não se deu num ambiente de ascenso das lutas de massas. Vencemos, principalmente devido ao desgaste do lado de lá.

Claro que não teríamos vencido não houvesse acúmulo de forças do lado de cá. Lula disputou e perdeu as eleições de 1994 e 1998, antes de vencer em 2002. Mas o fator decisivo foi o desgaste do lado de lá.

É importante ter isto claro, pois o refluxo das lutas sociais é um dos elementos que  explica, mesmo que não justifique, a relativa moderação dos nossos 10 anos de governo.

Entre 2003 e 2013, o Brasil está sob presidência de um petista: primeiro Lula, até 2010, e em seguida Dilma, a partir de 2011 e até agora.

Mas o governo Lula, assim como o governo Dilma, não são petistas. São governos de coalizão, integrados por partidos de esquerda, centro e até direita.

São, também, governos de coalizão social, entre setores da classe trabalhadora, setores médios e setores do grande empresariado.

Vale lembrar que o sistema político brasileiro é presidencialista, não parlamentarista. Mas o Congresso tem muita força. E a esquerda não tem maioria, nem na Câmara dos Deputados, nem entre os senadores.

Isto posto, qual o balanço que podemos fazer destes 10 anos? Que o povo vive melhor do que vivia na época do governo FHC, assim como estamos melhor do que estaríamos caso os candidatos do PSDB tivessem vencido as eleições presidenciais de 2002, 2006 e 2010.

Este viver melhor significa mais empregos, mais salários, mais capacidade de consumo. Significou, também, avanços muito relevantes em algumas áreas, como o acesso a energia elétrica, as cotas para afrodescendentes etc.

Mas não houve, ao longo destes dez anos, mudanças estruturais na oferta de serviços públicos, nem nos padrões de propriedade e riqueza. Embora o povo viva melhor, a desigualdade ainda é brutal no Brasil.

Tampouco houve mudanças estruturais no funcionamento do Estado, da política e da comunicação social no Brasil.

O Estado brasileiro é o desenhado pela Constituição de 1987-1988, que preservou muito do estado ditatorial. Posteriormente, no período neoliberal, este Estado foi alterado parcialmente, para pior.

O sistema político brasileiro é baseado no financiamento privado empresarial das campanhas eleitorais, no voto nominal (e não no voto em listas partidárias), além de outras distorções importantes que agridem o conceito básico da democracia: a igualdade entre todos.

E a comunicação social é oligopolizada, controlada por um grupo de empresas familiares, todas vinculadas aos interesses da direita e do grande capital.

Ou seja: entre 2003 e 2013 a vida do povo brasileiro melhorou, mas ficaram pendentes importantes mudanças estruturais. E, a partir de 2011, estas mudanças estruturais tornaram-se mais difíceis de fazer, devido aos impactos da crise internacional sobre a sociedade brasileira.

Entre os muitos impactos e efeitos colaterais da crise, está uma mudança na atitude de setores importantes do grande capital frente ao nosso governo. No ambiente de crise, o grande capital pressiona nosso governo para que adote medidas que reduzam o “custo da força de trabalho”.

Evidentemente, nos negamos a isto. Como disse a presidenta Dilma, ela não foi eleita para reduzir o emprego, os salários e os serviços sociais à disposição do povo brasileiro.

Em decorrência, apesar dos subsídios e das concessões feitas pelo governo, o grande capital não aposta na ampliação dos investimentos e do crescimento econômico.

É esta a queda de braço que estava em curso no Brasil, até maio de 2013: por um lado, o grande capital pressionando o governo a cortar, por outro lado o governo pressionando o grande capital a investir.

Era este o contexto, quando explodiram as manifestações de junho de 2013.

Aqui vale a pena recapitular, de maneira esquemática, os quatro momentos da onda de manifestações:

1-as primeiras manifestações, encabeçadas por um Movimento  Passe Livre. Vale explicar que este Movimento existe há muitos anos, que seus dirigentes em geral são próximos ao PT, especialmente na cidade de São Paulo. As manifestações mais expressivas, realizadas em SP, foram brutalmente reprimidas pela polícia, que no Brasil são vinculadas ao governo estadual. No caso, ao governo Alckmin, que é do PSDB.

2- a segunda onda de manifestações, de solidariedade aos que foram reprimidos e de denúncia da brutalidade policial. Novamente, nestas manifestações predominou a esquerda. O crescimento das manifestações levou as prefeituras e governos estaduais a, um atrás do outro, cancelar os aumentos das tarifas de transporte coletivo.


3-a terceira onda de manifestações, para comemorar o resultado. Nestas manifestações, há dois componentes novos.  Ao lado dos jovens trabalhadores e filhos de trabalhadores, começam a participar setores que aqui no Brasil chamamos de classe média alta. E a grande mídia, que originalmente se opusera aos movimentos, começa a apoiar a mobilização, ao mesmo tempo que busca direcioná-la contra o governo Dilma e contra o PT.

4-finalmente, há uma quarta onda de manifestações, com dimensões mais reduzidas e com diferentes propósitos. Os sindicalistas, os médicos etc.

Qual foi a atitude das esquerdas?

A esquerda que faz oposição ao governo Dilma (refiro-me ao PSOL, ao PSTU e a outros grupos) tinha a expectativa de que estes movimentos fossem colocar o governo contra a parede e que a esquerda seria a maior beneficiada disto. Ledo engano.

A esquerda que apoia o governo Dilma (especialmente PT e PCdoB) adotaram outra postura. No caso do PT, de Lula e de Dilma:

1-reconhecer a legitimidade
2-reconhecer a importância
3-mostrar a coincidência de propósitos
4-salientar a diferença com o quadro de outras regiões do mundo
5-apontar medidas concretas (saúde, educação)
6-propor um plebiscito, constituinte, reforma política

A direita reagiu mal. Nega-se a fazer reformas.

Ensinamentos:
1-há uma nova geração
2-há uma nova classe trabalhadora
3-há um envelhecimento e uma burocratização e uma institucionalização
4-a direita aproveita e disputa as ruas
5-sem democratizar comunicação, riscos crescentes
6-abriu-se um novo momento da luta de classes no país
7-disputa de 2014 será duríssima

Espero que este resumo ajude no debate que voces estão fazendo na Escola de Verão do PCF.

Bom debate e obrigado por vosso convite e por vossa atenção.



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