sábado, 7 de setembro de 2024

Sobre a demissão de Silvio Almeida

A demissão do agora ex-ministro Silvio Almeida comprova que o concreto é mesmo síntese de múltiplas determinações. 

 No caso, entre outras tão ou mais importantes: 

-a generalizada agressão contra mulheres, não importa quem sejam nem que cargo ocupem;

 -o encaminhamento dado às denúncias, quando estas foram feitas reservadamente; 

-a forma como a denúncia veio a público, em particular a natureza da entidade que serviu de portadora;

-o tratamento dado por Silvio Almeida, quando ainda era ministro, a diversas situações e temas; 

-a diferente importância que se dá às denúncias envolvendo mulheres e homens, brancos e negros, pessoas de esquerda e de direita, ministérios “fortes” e “fracos” (a depender do rigor, ainda que por diferentes razões, uma única demissão não bastaria);

-a relação contraditória entre a presunção de inocência, o direito à privacidade e a condição essencialmente pública do cargo de ministro; 

 -a discussão sobre quem assumirá o ministério de direitos humanos (a depender da pessoa escolhida, certos problemas podem aumentar);

 -o uso que a extrema-direita já está fazendo dos acontecimentos; 

 -o imenso desgaste político para a luta antirracista, para a luta das mulheres, para o PT, a esquerda e o governo; 

 -a dimensão digamos “pessoal” disto tudo, em primeiro lugar o sofrimento das vítimas. Sofrimento que leva, em alguns casos, à demora em denunciar certos crimes. 

São tantas as dimensões envolvidas, que mais algum tempo será necessário para termos uma visão de conjunto; e mais tempo ainda será necessário antes que possamos divulgar uma versão supostamente completa e publicável. 

Versão que precisa levar em devida conta a opinião dos militantes e movimentos envolvidos na luta das mulheres, negros e negras.

Mas, desde já, é possivel dizer, com base no que sabemos, tanto através de fontes públicas quanto privadas, que Lula fez bem em demitir o ministro. 

Assim como fez bem a executiva nacional do Partido dos Trabalhadores em solidarizar-se com a ministra Anielle Franco e com todas as mulheres vítimas de violência.

O problema, contudo, não se encerra com a demissão e substituição do ministro; nem se encerrará com a conclusão das investigações oficiais. Entre outros motivos, devido ao que podemos chamar de “rachadura no cristal”. 

O que isto significa já vimos no passado, quando denúncias de corrupção contribuíram para uma imensa crise num partido e num governo que destacavam seu compromisso com a ética na política. 

No presente, fatos como os que levaram à demissão de Sílvio Almeida podem, de forma similar, contribuir para imensos problemas para uma esquerda que corretamente enfatiza a luta contra o racismo e contra o machismo. 

Neste sentido, devemos evitar vários dos erros cometidos em situações similares.
 
Um deles foi não perceber o imenso efeito corrosivo e multiplicador de acusações que colocam em questão a coerência entre o que dizemos e o que fazemos. 

No quesito “coerência”, da direita não se cobra quase nada.

Já da esquerda se cobra um alto nível de coerência.

E está certo que assim seja. Pois se levamos a sério o que defendemos, temos a obrigação de praticar o que predicamos.

4 comentários:

  1. Lula não teve alternativa; a demissão era o caminho lógico. O estrago foi sério no Governo, mas foi devastador na luta pela causa negra. Lideranças estão catatônicas , e os abutres do ódio sobrevoam os escombros, à procura de carne vermelha.

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  2. 'No quesito “coerência”, da direita não se cobra quase nada.'

    Essa frase só vale se considerarmos "cobrança" somente aquilo que for excessivamente publicado e demonizado pela classe dominante, via mídia.

    Mas a realidade vai além disso!

    De fato, o povo que não tem "voz ativa ou publicada", por isso sem força política organizada para fazer de sua rejeição uma cobrança efetiva, se sente enojado há muito tempo, ao ter que lidar com tantas incoerências, tramóias e impunidade daqueles que são os líderes no país e se refestelam com privilégios e maracutaias.

    A materialidade dessa cobrança se apresenta no grande número de votos "anti tudo que está aí" e como a esquerda virou sentinela do "status quo" deixou de ser o símbolo do "anti sistema".

    Há cobrança, via voto, contra essa realidade toda errada e injusta pra muitos e protetora sempre para aqueles com poder.

    A classe dominante, com seu poder de fogo, define a versão dos fatos que irá preponderar e quem fica ou vai pro paredão, sua cobrança conta porque o sistema é seu.

    A classe trabalhadora, sem uma liderança politica de esquerda que saia do armário da neutralidade, cobra rejeitando tudo que se relaciona com política, ou seja, sua cobrança é, na verdade, a retroalimentação de tudo como está.

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  3. Lemos na imprensa que a denuncia foi formalizada desde ...Janeiro!!!

    E lemos também que a escolha foi da cota de Lula, ou seja sem passar pelo PT e outros partidos. Imaginamos que aduladores tem poder e conspiradores palacianos tem interesses políticos e econômicos.

    MLKJ sabe-se agora, foi chantageado pelo FBI por sua conduta moral e extraconjugal. Decidiu enfrentar e prosseguir. Venceu e também perdeu (pessoalmente).

    Acho precipitada a condenação pública pelo crime que não se comprovou, o que lembra o que Lula fez com ZD. "Concretude" isso?

    e dirigentes do PT se omitem de novo?

    Vós, que não são "santos" sereis medidos também...







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  4. E quanto ao caso do ministro Juscelino Filho?...
    Lembremos:
    https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/ministro-juscelino-filho-indiciado-pela-pf-so-saira-do-governo-por-decisao-pessoal-afirma-padilha/
    (Jucemir Rodrigues da Silva)

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