Resolução sobre conjuntura aprovada pela Direção Nacional da AE no dia 18 de agosto de 2014
1.O secretariado nacional da AE,
reunido no dia 13 de agosto de 2014, debateu sobre a conjuntura logo após a
confirmação de que Eduardo Campos, candidato à presidência da República pelo
Partido Socialista Brasileiro, integrantes de sua equipe e dois pilotos
morreram num acidente aéreo na cidade de Santos, São Paulo.
2.A presidenta Dilma Rousseff
declarou luto e interrupção por três dias da campanha presidencial. O Partido
dos Trabalhadores, em nota de pêsames, também informou interromper pelo mesmo
período as atividades de campanha em âmbito nacional, estadual e municipal. As
campanhas de militantes vinculados a AE acataram a orientação da direção
partidária.
3.A morte de Eduardo Campos causou
impacto e consternação entre seus familiares, amigos, correligionários,
eleitores, adversários e na população em geral.
4.As reações foram da estupefação
inevitável frente a desastres deste tipo -- destacando-se a percepção da
fragilidade da vida humana -- a atitudes ou protocolares, ou demagógicas e
oportunistas, passando ainda pelo comportamento tão comum em momentos de luto,
especialmente em países de forte influência religiosa como o brasileiro,
comportamento esse que converte a pessoa falecida em alvo de elogios
superlativos.
5.Deste leque de reações, achamos
necessário destacar três questões, vinculadas entre si. Primeiro, a rapidez e
virulência da extrema-direita nas redes sociais. Segundo, a linha de cobertura
adotada pelos grandes meios de comunicação. Terceiro, a especulação acerca de
qual será o impacto do falecimento de Eduardo Campos na sucessão presidencial.
6.As mensagens da extrema-direita são
antes de mais nada ilógicas. Se tivessem mais neurônios e menos bílis, estes
brutamontes cavernícolas perceberiam que a trágica morte de Eduardo Campos não
favorece em nada as candidaturas que encabeçam a disputa presidencial. Quem alimenta
teorias conspiratórias, deveria perguntar quem se beneficia desta tragédia.
7.A irracionalidade fascistóide, sua
virulência abjeta, confirma que as eleições presidenciais deste ano serão ainda
mais violentas do que as de 2010. Sendo necessário localizar e denunciar os
laços existentes entre esta extrema-direita e outros segmentos da oposição de
direita, a começar por alguns colunistas de veículos de comunicação
"sérios"; bem como os laços entre a extrema-direita, setores das
polícias e das forças armadas (ver a este respeito nota da direção nacional da
AE, enviada ao Diretório nacional do PT, cobrando um debate sobre o tema).
8.Os grandes meios de comunicação
abordaram a tragédia a partir de um objetivo: fazer com que o patrimônio
político e eleitoral acumulado por Eduardo Campos seja potencializado e
direcionado de forma a garantir que a disputa presidencial vá ao segundo turno.
Em muitos casos, a cobertura exaustiva, o fomento da comoção e o lamento pela tragédia
não passam de hipocrisia, pois é nítida a comemoração que determinados setores
da direita e da mídia fazem, sobre a possibilidade de um segundo turno na
eleição presidencial.
9.A maior parte das especulações a respeito aponta
no sentido de converter Marina Silva em candidata à presidência da República.
Embora haja elementos contraditórios com esta expectativa, elementos que não
devem ser desconsiderados, pesquisas divulgadas no dia posterior ao velório e
sepultamento de Eduardo Campos corroboram a competitividade eleitoral desta
alternativa; a maior parte dos analistas considera que com a candidatura Marina
teremos segundo turno; e muitos acham que, neste cenário, Aécio Neves poderia
estar fora deste segundo turno. Ambas possibilidades ajudam a entender certas
reações de próceres (“aecistas” e “serristas”) do PSDB à tragédia.
10.Neste contexto, reforça-se a
tendência tão comum de analisar o quadro político a partir, predominantemente,
do comportamento dos indivíduos e das cúpulas partidárias. O que constitui uma
“versão moderna” da teoria segundo a qual a história é feita pelos príncipes.
Evidente que a análise política exige considerar, com a devida importância, a
análise dos partidos e seus líderes. Mas é preciso atentar e levar em devida consideração
variáveis mais profundas, que constituem marcos dentro dos quais as pessoas e
os partidos atuam, expressando a luta entre os diversos interesses de
classe e frações de classe.
11.Entre tais variáveis, destacamos
três, que já apontávamos na resolução da direção nacional da AE, divulgada em
maio de 2014.
12.A primeira delas é o
aprofundamento da crise internacional e, por decorrência, a maior pressão das
potências imperialistas sobre a América Latina e o Brasil.
13.Os acontecimentos na Palestina, na
Ucrânia e na Argentina, bem como as decisões da mais recente reunião dos Brics,
só confirmam a intensidade da crise.
14.A segunda variável é o acirramento
da disputa entre as duas vias de desenvolvimento do Brasil, com o grande
empresariado e parcela dos “setores médios”, a oposição de direita e o
oligopólio da mídia deixando claro sua aversão radical a toda e qualquer medida
vinculada a soberania nacional, a integração latino-americana e caribenha, a
ampliação das liberdades democráticas, ao bem estar social e a igualdade.
15.Esta segunda variável teve uma de
suas expressões mais caricatas na famosa “análise” divulgada pelo Banco Santander.
Mais relevante, entretanto, é a combinação de três atitudes, por parte do
grande capital: a “greve de investimentos”, a “greve de contribuições” e a
“aposta na inflação”.
16.A terceira variável é a ampliação (relativamente
às eleições de 2010) da parcela da população e do eleitorado oriundo da classe
trabalhadora, que mantém reservas ou até mesmo desconfiança frente ao petismo, frente
ao lulismo e frente à candidatura Dilma presidenta.
17.Destaque-se, neste particular, a
existência de um grande contingente de jovens e mulheres que tende a votar
branco, nulo ou não sabe em quem votar; e o desempenho de nossas candidaturas
estaduais e proporcionais, especialmente na região sudeste do país e nas
grandes cidades.
18.Ao longo dos últimos meses, quando
analisamos estas três variáveis, nós da tendência petista Articulação de
Esquerda sempre dissemos que a
eleição presidencial de 2014 tende a ser resolvida no segundo turno, num ambiente
de forte confrontação política e ideológica.
19.Se as pesquisas não demonstravam
isto ainda, é porque as “candidaturas de oposição realmente existentes” não
estavam conseguindo capturar o voto de setores insatisfeitos com o PT e com o
governo Dilma. Mas que isto tenderia a ocorrer, quanto mais próximos
estivéssemos do dia 5 de outubro.
20.Por quais motivos afirmávamos isto?
Reproduzimos, a seguir, o raciocínio contido na resolução que divulgamos no
início de maio de 2014.
Depois de quase 12 anos de presidência
petista, houve mudanças importantes no país e por isto mesmo parcelas
crescentes da população estão insatisfeitas.
De um lado, o grande
empresariado e os “setores médios tradicionais” (assalariados de alta renda,
assim como setores da pequena burguesia) estão insatisfeitos com as mudanças
ocorridas, querem evitar seu aprofundamento e querem recuperar o espaço
perdido.
De outro lado, amplos setores da
população trabalhadora e parcelas dos “setores médios” estão também
insatisfeitos, não com o sentido das mudanças, mas sim com a timidez das
mudanças realizadas e querem ganhar mais e mais rápido.
A oposição de direita conhece o
desejo popular por mais mudanças e sabe que só ganhará as eleições
presidenciais se conseguir aparecer, para a maioria do eleitorado, como a
portadora de mudanças. Acontece que existe uma contradição antagônica entre a
mudança desejada pelo povo e a mudança desejada pela oposição de direita.
As mudanças desejadas pelo povo, nós
traduzimos em mais Estado, mais desenvolvimento, mais políticas públicas, mais
emprego, mais salário, mais democracia.
Já a mudança desejada pela oposição
de direita implica em desemprego, redução de salários, menos direitos, menos
políticas sociais e democracia: é uma mudança para pior.
Por isto, a oposição de direita não
pode assumir abertamente seu programa, não pode dizer que tipo de mudança
deseja para o país. Dizer que vão gerar desemprego, reduzir salários e
investimentos sociais seria a derrota antecipada.
Sem poder falar do futuro que
pretendem construir e sem poder falar do seu próprio passado - quando
implementaram no Brasil o programa neoliberal - o que resta para a oposição de
direita é criticar “tudo isto que está aí”, combinando a denúncia de problemas
(reais ou não), a manipulação midiática e a sabotagem ativa, para criar um
ambiente de crise, deterioração e caos.
Por isto o oligopólio da mídia anda
tão crítico quanto à realidade brasileira, para reforçar o ambiente negativo do
qual se nutrem as candidaturas da oposição de direita.
21.Até 13 de agosto, entretanto, como
já dissemos, as pesquisas mostravam que as candidaturas presidenciais da
oposição não estavam conseguindo converter em voto válido este sentimento
oposicionista presente em parcelas importantes do eleitorado.
22.Pois
bem: a oposição de direita enxerga na trágica morte de Eduardo Campos uma
oportunidade para tentar resolver esta aparente contradição.
23.Não está dado que consigam isto,
mas devemos reconhecer que as condições objetivas e subjetivas para isto
existem. E está claro que existe uma decisão neste sentido, por parte do estado-maior
da direita, que é o oligopólio da mídia.
24.A verdade é que, para a oposição
de direita, uma possível candidatura Marina combina várias características
positivas. Primeiro, sua conversão ao neoliberalismo e à política externa
subalterna. Segundo, seu ódio visceral ao petismo, ao lulismo e a Dilma.
Terceiro, uma (falsa) imagem de sintonia com as aspirações populares por uma
política diferente. Quarto, uma capacidade de disputar o voto evangélico.
Finalmente, o recall das eleições de
2010.
25.Para alguns, estas características
positivas não a convertem em “presidente ideal”, motivo pelo qual esperam
apenas que ela ajude na ida de Aécio ao segundo turno e o apoie neste momento.
26.Para outros, as debilidades da
candidatura Aécio e as afinidades eletivas entre o pensamento de Marina e o
pensamento neoliberal (vide declarações de Pérsio Arida e Eduardo Gianetti)
justificariam uma aposta total em Marina.
27.Para ambos setores da oposição de
direita, entretanto, a tragédia de Campos e uma possível candidatura Marina é
vista como muito útil na batalha contra o PT e Dilma. Na avaliação destas hienas,
Marina seria capaz de fazer aquilo que Campos não estava conseguindo. É por
isto que muitas declarações de pêsames vindas da direita e da mídia foram
acompanhadas de explícita comemoração.
28.Por tudo isto, espera-se que não
haja frente a Marina as ilusões que muitos setores tinham frente a Campos, ilusões
que transparecem explicitamente em várias mensagens de condolências vindas de
setores da esquerda partidária e social.
29.Caso a oposição de direita consiga
converter Marina em candidata presidencial, crescem as possibilidades de
segundo turno; bem como crescem as possibilidades de Aécio não estar no segundo
turno. Neste cenário, torna-se ainda mais atual algo que já dissemos e
reafirmamos várias vezes, nos últimos anos: o Partido dos Trabalhadores e o
conjunto da esquerda política e social brasileira precisam dar um salto na sua
capacidade organizativa, política, teórica, cultural e estratégica.
30.Os motivos estão desenvolvidos na
resolução já citada da direção nacional da AE, especialmente nos trechos que
resumimos a seguir:
Nunca apoiamos aquela tática, mas
reconhecemos que em 2002 a tática de centro-esquerda era eleitoralmente
“lucrativa”. Hoje é diferente: as alianças com setores da direita, as
expectativas na postura do grande empresariado, a tibieza frente ao oligopólio
da mídia, a moderação programática geram rendimentos eleitorais decrescentes.
Para além do erro estratégico contido
nas atitudes citadas no ponto anterior, há um erro tático: este caminho não é
adequado para vencer as eleições de 2014, nem nacionalmente, nem nos estados.
A radicalização da direita (e não
apenas da oposição de direita) e a ofensiva do grande capital não dão margem
para a reprodução da tática adotada em 2002.
Aliás, já em 2006 nossa tática foi
distinta daquela adotada em 2002, graças ao que obtivemos em 2006 uma vitória
eleitoral, política e ideológica. Já a tentativa de reproduzir, em 2010, a
tática de 2002, resultou numa vitória eleitoral, mas num ambiente de defensiva
política e ideológica.
Se a esquerda quiser continuar
governando o país a partir de 1º de janeiro de 2019, é indispensável que o
segundo governo Dilma seja superior ao primeiro.
O segundo mandato Dilma só terá a
força necessária para fazer mudanças estruturais no país, se conseguir combinar
vitória na eleição presidencial, ampliação da presença institucional da
esquerda (no parlamento nacional, nos parlamentos e governos estaduais),
aliança com os movimentos sociais e partidos de esquerda, com democratização da
comunicação social e uma reforma política ampla, feita através de uma
Constituinte Exclusiva.
31.As eleições de 2014 serão não
apenas as mais duras, mas também as mais caras da história recente: as três
principais candidaturas falam de gastos que, somados, atingem 916 milhões de
reais. Ao mesmo tempo, o grande capital está reduzindo ao máximo suas
contribuições para as campanhas eleitorais, em especial as contribuições para as
candidaturas do PT.
32.A esse respeito, reafirmamos o que
já foi dito noutro momento: O grande capital não é “ingrato” nem
“desinformado”, apenas sabe que certas intenções que manifestamos, certas
opções que fizemos e os êxitos que acumulamos, são incompatíveis com o padrão
de acumulação hegemônico no grande empresariado brasileiro. Dizendo de outra
maneira, o atual padrão de acumulação do grande capital necessita da perversa
combinação de desemprego e salários baixos, com preços e juros altos.
33.Da incompreensão acerca da postura
do grande capital, decorre a incorreta insistência numa política de alianças do
PT com setores da direita política e social. Insistência que, frente a um
quadro adverso, produziu uma política de alianças desencontrada.
Um exemplo disto: temos 17 candidaturas próprias a governador (contra 10 em
2014) e fortes candidaturas ao Senado em 14 estados. Mas em grande número
desses estados, confrontamos o PSD e o PMDB, que em âmbito nacional foram
cortejados, apesar do que são, apesar do que fazem hoje e do que certamente
farão no segundo mandato Dilma.
34.Para ganhar as eleições,
precisamos manter o eleitorado de esquerda e disputar o eleitorado de centro.
Para atingir estes objetivos, mais relevante que fazer alianças institucionais
é demarcar claramente com a oposição de direita, apontar o que eles fizeram
quando foram governo nacional e onde são governo nos estados e municípios, contrapondo
ao que nós fizemos e principalmente deixando claro o que faremos no segundo
mandato Dilma Rousseff.
35.Esta
ênfase no futuro, embora tenha sido oficialmente aceita, não se traduziu nas
diretrizes programáticas, nos materiais de campanha, nem mesmo nos principais
pronunciamentos da presidenta Dilma Rousseff.
36.Exemplo disto: o PT faz duras
críticas ao “racismo à brasileira” e aponta a articulação existente entre as
desigualdades de classe, de gênero,
geracionais, regionais e raciais. Ao mesmo tempo, mostramos que em
nossos governos houve uma elevação das condições de vida dos setores populares.
Mas não apontamos medidas efetivas que tomaremos para fazer cessar o genocídio
praticado contra a juventude negra e pobre das periferias. Medidas que devem
incluir a desmilitarização das polícias; a mudança nas políticas de comunicação,
cultura e educação; o combate à segregação urbana.
37.Vinculado a isto, insistimos:
*é preciso reconhecer e incorporar
nas campanhas o papel positivo e indispensável dos movimentos e das lutas
sociais, para nossas vitórias eleitorais e principalmente para o êxito dos
nossos governos;
*é preciso encampar urgente e
efetivamente a “pauta da classe trabalhadora”, tal como apresentada pela CUT;
*coerente com afirmar a urgência
inadiável da reforma política, a presidenta Dilma Rousseff deve convidar a
população a votar no Plebiscito Popular;
*é preciso tomar medidas imediatas no
sentido da democratização da comunicação e dar destaque a isto no programa de
governo 2015-2018;
*é preciso abandonar o discurso equivocado
que insiste em chamar de "classe média" os setores da classe
trabalhadora que, graças às nossas políticas, ampliaram sua capacidade de consumo;
*é preciso enfatizar a defesa das
reformas estruturais;
*é preciso enfrentar a ditadura do
capital financeiro, ampliando o peso dos bancos públicos, quebrando o
oligopólio dos bancos privados, reestruturando a dívida interna, estabelecendo
controle sobre os fluxos de capital.
38.Para continuar democratizando o
país, ampliando o bem-estar social e trilhar um caminho democrático-popular de
desenvolvimento, será necessário combinar ampliação da democratização política
e políticas públicas universalizantes do bem estar-social, com um padrão de
desenvolvimento ancorado em reformas estruturais: a reforma tributária, a
reforma do setor financeiro, a reforma urbana, a reforma agrária, a
universalização das políticas sociais, a reforma política e a democratização da
comunicação. Reformas que do nosso ponto de vista, articulam-se a uma
estratégia de luta pelo socialismo.
39.Precisamos libertar a economia e a
sociedade brasileira de um padrão de desenvolvimento econômico que prevaleceu
não apenas durante o neoliberalismo, mas ao longo de muitas décadas. Se não
conseguirmos fazer isto, se não conseguirmos mudar o padrão de desenvolvimento,
sofreremos uma derrota estratégica.
40.Por isto, o Partido dos
Trabalhadores tem como objetivo não apenas vencer as eleições presidenciais,
mas vencer criando as condições para um segundo mandato superior, melhor, mais
avançado que o atual. Por isto e para isto, seguiremos dedicando o melhor dos
nossos esforços para a reeleição da presidenta Dilma Rousseff.
Direção Nacional da AE
18 de agosto de 2014
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