Companheiros/as
Nos dias 17 e 18 de agosto de 2006, aconteceu em Montevidéu um seminário internacional sobre “Experiências de governo dos partidos de esquerda e progressistas da América Latina e Caribe”.
A programação do seminário incluiu debates sobre “desenvolvimento econômico e social”, “democratização da política”, “relação governos e forças políticas”, “integração”.
Eu tive a oportunidade de fazer três exposições no Seminário. O texto abaixo é um resumo sintético destas exposições. Não tive a possibilidade de revisar, portanto tomem apenas como um rascunho e por favor não divulguem.
Valter Pomar
* * *
1.Antes de 1980, a esquerda brasileira teve uma pequena experiência de participação em governos: várias prefeituras entre 1945 a 1964, presença em alguns governos estaduais (com destaque para Brizola no Rio Grande do Sul e Arraes em Pernambuco) e participação em alguns escalões dos governos Vargas e Jango.
2.Depois de 1980, a esquerda brasileira ampliou sua presença em governos. Muitas prefeituras, vários governos estaduais, alguns ministros nos governos pós-ditadura e, agora, a eleição de Lula para a presidência da República.
3.Depois de 1980, a presença da esquerda brasileira em governos não se limita ao PT, mas se deu principalmente através do PT (as vezes em governos de coligação).
4.No caso do PT, participamos de prefeituras desde 1982. Nesses 24 anos, já estivemos presentes em cerca de 500 das mais de 5000 prefeituras brasileiras. Participamos de governos estaduais desde 1994. Já elegemos o governador em 6 dos 27 estados brasileiros. E chegamos à presidência da República em 2002.
5.Trata-se, portanto, de uma experiência muito importante, mas ainda limitada: até 2002, chegamos a governar cidades onde moravam 30% da população e se produzia 30% do PIB brasileiro.
6.Qual o balanço que podemos fazer da experiência do PT na direção de governos municipais e estaduais?
7.O PT produziu um número relativamente grande de documentos, fazendo o balanço desta experiência. Os pontos que ressaltaremos a seguir e as ênfases que sugerimos não se pretendem a expressar o ponto de vista global do Partido a respeito.
8.Primeiro, em comparação com os governos de centro e de direita, fazemos um balanço positivo no que toca a inversão de prioridades orçamentárias em prol das necessidades sociais das maiorias, bem como no que toca ao esforço de democratizar as decisões políticas. Noutras palavras: para o povo, faz diferença viver em cidades ou estados governados pelo PT.
9.Segundo, em comparação com o modelo de sociedade que propugnamos, é evidente que nossos governos municipais e estaduais padecem de imensas limitações, conseguindo por isso conter, mas dificilmente reverter os fenômenos de degradação econômica, ambiental, social, política e ideológica impulsionados pelo capitalismo em geral e pelo neoliberalismo em particular. Admitir isto não implica em subestimar nossos êxitos, mas sim em reconhecer que é preciso fazer muito mais para dar conta de nossos objetivos estratégicos.
10.Terceiro e ligado aquelas limitações, em meados dos anos 90 incluímos entre nossas tarefas de governo, no âmbito municipal e estadual, enfrentar os temas do desenvolvimento econômico e social. Ou seja: trouxemos para os âmbitos locais e estaduais uma temática que antes nos parecia em grande medida exclusiva ou prioritária do governo federal. Embora haja êxitos, as políticas econômicas anti-cíclicas que desenvolvemos a partir dos governos municipais e estaduais seguem extremamente limitadas e dependentes das iniciativas das políticas macroeconômicas impulsionadas pelo governo federal.
11.Quinto, nossa chegada ao governo federal nos colocou diante de temas estruturais, tais como: segurança pública, defesa, relações internacionais, pacto federativo (relação União, estados e municípios), reforma do Estado e reforma política, meios de comunicação, modelo de desenvolvimento econômico e social alternativo ao neoliberalismo. A experiência demonstrou que para vários desses assuntos, não dispúnhamos de formulação prévia adequada. Ademais, tivemos problemas de gestão e principalmente divergências estratégicas que ainda não foram equacionadas.
12.Ligado a isto, temos que reconhecer que experiência (nos três níveis: municipal, estadual e federal) vem demonstrando que temos dificuldades em manter a autonomia dos partidos de esquerda e dos movimentos sociais, frente aos governos. Isso nos remete para a discussão sobre a relação governos e “forças políticas”.
13.Neste terreno, temos três grandes desafios:
a) impedir que as limitações intrínsecas aos governos, limitem também as perspectivas ideológicas, programáticas e estratégicas dos partidos políticos;
b) impedir que a nossa presença no aparato estatal neutralize nossa capacidade de organização e mobilização social;
c) impedir que nossa presença em pedaços do aparelho de Estado, nos transforme em porta-vozes da “razão de Estado” e justificadores do status quo ante. Superar o abismo social existente no continente exige persistência, nunca conformismo.
14.É importante lembrar que a relação Estado/governo/partido se coloca de maneira diferente, para os classes populares e para as classes dominantes. Para estas últimas, os partidos não são um instrumento para conquistar o poder; nem são o principal mecanismo de manutenção e direção do Estado. As classes dominantes possuem outros mecanismos, para além dos partidos, para manter e dirigir o Estado, tais como as forças armadas, os meios de comunicação de massa, a alta burocracia governamental e as organizações empresariais.
15.Para as classes populares, ao contrário, os partidos são fundamentais. Em certo sentido, as classes dominantes desenvolvem sua atuação político-partidária, em resposta aos partidos políticos da esquerda. Mas a importância e a legitimidade do papel dos partidos, frente ao governo e ao Estado, não deve nos fazer perder de vista que nosso propósito é a democratização radical da sociedade e do poder, o que supõe no mínimo o mais amplo controle da sociedade sobre o Estado.
16.O tema da relação partido/governo/Estado deve ser tratado como parte do problema mais geral da democratização da sociedade em geral e da política em particular. Até porque, se não acontecerem mudanças econômicas, sociais, políticas e culturais profundas, a democratização da política seguirá dependendo do voluntarismo e das boas intenções dos governantes.
17.Exemplos de problemas estruturais que devem ser resolvidos mediante mudanças estruturais:
a) o poder dos meios de comunicação privados, na formação da opinião da sociedade;
b) a influência das grandes empresas privadas, sobre as decisões dos governos e dos parlamentos;
c) o fosso de informação e poder que existe, entre os governados e os governantes, entre os profissionais da política e do governo, vis a vis os cidadãos e cidadãs em geral;
d) a distância entre os debates parlamentares e as questões que afligem o dia-a-dia da população;
e) o poder pessoal autocrático dos chefes do poder executivo;
f) o poder desmedido das chamadas equipes econômicas, no interior dos governos;
g) o poder desmedido da alta burocracia estatal, frente aos governantes eleitos.
18.Especificamente sobre a relação partido/governo, nossa experiência no Brasil comporta duas características complicadoras:
a) por um lado, trata-se de partidos no plural;
b) por outro lado, trata-se de partidos de esquerda, de centro e as vezes até mesmo de direita.
19.Isso nos coloca diante de um duplo desafio:
a) como evitar que a legítima busca da hegemonia de um partido, se transforme em imposição sobre as outras forças políticas que do governo participam?
b) como um partido de esquerda pode conseguir hegemonizar um governo de centro-esquerda com aliados de direita e, ao mesmo tempo, manter as características e as posições de um partido de esquerda?
20.Outros aspectos que deve ser enfrentados são os efeitos colaterais de nossa presença em governos. É o caso da corrupção e também da burocratização do debate político.
21.A corrupção tem causas sociológicas, agravadas pelo neoliberalismo. Os governos de esquerda têm que ser campeões no combate à corrupção. E os partidos de esquerda devem criar mecanismos para prevenir e punir o surgimento de casos de corrupção. A partir do momento em que a esquerda chega ao governo e passa a tomar decisões que incidem na distribuição de imensos recursos, os mecanismos internos de combate à corrupção devem se tornar mais fortes e sofisticados. Se o PT dispusesse de uma corregedoria interna, alguns dos acontecimentos de 2005 não teriam ocorrido.
22.Quanto a burocratização do debate político, trata-se da tendência de transferir para os governos decisões que são ou deveriam ser tomadas pelo Partido. Esta tendência é reforçada pela natural e até certo ponto desejável ampliação das fileiras partidárias, depois que nos tornamos governo. Os novos militantes não participaram da luta contra a ditadura, não participaram da luta contra os governos neoliberais, não conhecem o partido oposicionista e das lutas sociais. Isto transforma estes novos militantes em presa fácil da concepção segundo a qual, uma vez conquistado o governo, o Partido perde importância estratégica.
23.Pelo contrário, devemos reafirmar a importância do Partido, de seu protagonismo, de sua autonomia estratégica e de sua capacidade de elaboração e direção. É claro que o Partido não deve se imiscuir nos assuntos cotidianos. Isso seria negativo, tanto para a gestão administrativa do governo, quanto para a imprescindível autonomia do Partido frente ao governo/Estado. Entretanto, é preciso estar alerta para duas situações: quando as políticas cotidianas nos afastam dos nossos objetivos estratégicos; e quanto nossos objetivos programáticos foram tão rebaixados, que deixam de cumprir o papel de horizonte e acicate para nossa ação cotidiana.
24.Os partidos devem, por exemplo, estar na vanguarda do debate e da luta por:
a) construir um modelo econômico e social alternativo, que leve em conta não apenas a oposição ao neoliberalismo, mas também nossa crítica democrática e popular ao desenvolvimentismo conservador e nossa crítica socialista ao capitalismo;
b) evoluir das políticas emergenciais para a ampliação das políticas estruturais;
c) um desenvolvimento nacional que esteja combinado com a integração continental e com o objetivo de construir outra ordem mundial.
25.A política externa do governo brasileiro tem esta vocação. Prioridades para as relações sul-sul, África e integração continental. Nesta integração, o Mercosul é visto como parte da construção da CASA.
26.Claro que setores das classes dominantes só concebem uma política de integração com os Estados Unidos. Claro, também, que a lógica comercial e de curto prazo segue turvando a imaginação de muitos setores. Ademais, só agora estamos conseguindo colocar o tema da integração na pauta política nacional.
27.Um dos aspectos da integração é o tratamento das assimetrias. Embora muito tenha sido feito, muito mais precisa ser feito para dar conta deste problema, especialmente importante no caso do Paraguai e do Uruguai. Conflitos como o das “papeleras”, que consideramos como assunto que deve ser tratado no âmbito do Mercosul, jogam um papel negativo.
28.Outro aspecto da integração é como tratar as relações com os Estados Unidos. Diante do fracasso da Alca, os EUA estão buscando firmar acordos bilaterais com diversos países do continente. Estes Tratados de Livre Comércio (TLC) tiveram efeitos profundamente negativos onde já estão em vigor; e sofrem uma imensa oposição da esquerda nos países em que ainda não foram aprovados pelos respectivos Congressos nacionais. Os Estados Unidos buscam firmar um TLC com o Uruguai, para colocar uma cunha no Mercosul. É preciso construir outro caminho.
Nos dias 17 e 18 de agosto de 2006, aconteceu em Montevidéu um seminário internacional sobre “Experiências de governo dos partidos de esquerda e progressistas da América Latina e Caribe”.
A programação do seminário incluiu debates sobre “desenvolvimento econômico e social”, “democratização da política”, “relação governos e forças políticas”, “integração”.
Eu tive a oportunidade de fazer três exposições no Seminário. O texto abaixo é um resumo sintético destas exposições. Não tive a possibilidade de revisar, portanto tomem apenas como um rascunho e por favor não divulguem.
Valter Pomar
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1.Antes de 1980, a esquerda brasileira teve uma pequena experiência de participação em governos: várias prefeituras entre 1945 a 1964, presença em alguns governos estaduais (com destaque para Brizola no Rio Grande do Sul e Arraes em Pernambuco) e participação em alguns escalões dos governos Vargas e Jango.
2.Depois de 1980, a esquerda brasileira ampliou sua presença em governos. Muitas prefeituras, vários governos estaduais, alguns ministros nos governos pós-ditadura e, agora, a eleição de Lula para a presidência da República.
3.Depois de 1980, a presença da esquerda brasileira em governos não se limita ao PT, mas se deu principalmente através do PT (as vezes em governos de coligação).
4.No caso do PT, participamos de prefeituras desde 1982. Nesses 24 anos, já estivemos presentes em cerca de 500 das mais de 5000 prefeituras brasileiras. Participamos de governos estaduais desde 1994. Já elegemos o governador em 6 dos 27 estados brasileiros. E chegamos à presidência da República em 2002.
5.Trata-se, portanto, de uma experiência muito importante, mas ainda limitada: até 2002, chegamos a governar cidades onde moravam 30% da população e se produzia 30% do PIB brasileiro.
6.Qual o balanço que podemos fazer da experiência do PT na direção de governos municipais e estaduais?
7.O PT produziu um número relativamente grande de documentos, fazendo o balanço desta experiência. Os pontos que ressaltaremos a seguir e as ênfases que sugerimos não se pretendem a expressar o ponto de vista global do Partido a respeito.
8.Primeiro, em comparação com os governos de centro e de direita, fazemos um balanço positivo no que toca a inversão de prioridades orçamentárias em prol das necessidades sociais das maiorias, bem como no que toca ao esforço de democratizar as decisões políticas. Noutras palavras: para o povo, faz diferença viver em cidades ou estados governados pelo PT.
9.Segundo, em comparação com o modelo de sociedade que propugnamos, é evidente que nossos governos municipais e estaduais padecem de imensas limitações, conseguindo por isso conter, mas dificilmente reverter os fenômenos de degradação econômica, ambiental, social, política e ideológica impulsionados pelo capitalismo em geral e pelo neoliberalismo em particular. Admitir isto não implica em subestimar nossos êxitos, mas sim em reconhecer que é preciso fazer muito mais para dar conta de nossos objetivos estratégicos.
10.Terceiro e ligado aquelas limitações, em meados dos anos 90 incluímos entre nossas tarefas de governo, no âmbito municipal e estadual, enfrentar os temas do desenvolvimento econômico e social. Ou seja: trouxemos para os âmbitos locais e estaduais uma temática que antes nos parecia em grande medida exclusiva ou prioritária do governo federal. Embora haja êxitos, as políticas econômicas anti-cíclicas que desenvolvemos a partir dos governos municipais e estaduais seguem extremamente limitadas e dependentes das iniciativas das políticas macroeconômicas impulsionadas pelo governo federal.
11.Quinto, nossa chegada ao governo federal nos colocou diante de temas estruturais, tais como: segurança pública, defesa, relações internacionais, pacto federativo (relação União, estados e municípios), reforma do Estado e reforma política, meios de comunicação, modelo de desenvolvimento econômico e social alternativo ao neoliberalismo. A experiência demonstrou que para vários desses assuntos, não dispúnhamos de formulação prévia adequada. Ademais, tivemos problemas de gestão e principalmente divergências estratégicas que ainda não foram equacionadas.
12.Ligado a isto, temos que reconhecer que experiência (nos três níveis: municipal, estadual e federal) vem demonstrando que temos dificuldades em manter a autonomia dos partidos de esquerda e dos movimentos sociais, frente aos governos. Isso nos remete para a discussão sobre a relação governos e “forças políticas”.
13.Neste terreno, temos três grandes desafios:
a) impedir que as limitações intrínsecas aos governos, limitem também as perspectivas ideológicas, programáticas e estratégicas dos partidos políticos;
b) impedir que a nossa presença no aparato estatal neutralize nossa capacidade de organização e mobilização social;
c) impedir que nossa presença em pedaços do aparelho de Estado, nos transforme em porta-vozes da “razão de Estado” e justificadores do status quo ante. Superar o abismo social existente no continente exige persistência, nunca conformismo.
14.É importante lembrar que a relação Estado/governo/partido se coloca de maneira diferente, para os classes populares e para as classes dominantes. Para estas últimas, os partidos não são um instrumento para conquistar o poder; nem são o principal mecanismo de manutenção e direção do Estado. As classes dominantes possuem outros mecanismos, para além dos partidos, para manter e dirigir o Estado, tais como as forças armadas, os meios de comunicação de massa, a alta burocracia governamental e as organizações empresariais.
15.Para as classes populares, ao contrário, os partidos são fundamentais. Em certo sentido, as classes dominantes desenvolvem sua atuação político-partidária, em resposta aos partidos políticos da esquerda. Mas a importância e a legitimidade do papel dos partidos, frente ao governo e ao Estado, não deve nos fazer perder de vista que nosso propósito é a democratização radical da sociedade e do poder, o que supõe no mínimo o mais amplo controle da sociedade sobre o Estado.
16.O tema da relação partido/governo/Estado deve ser tratado como parte do problema mais geral da democratização da sociedade em geral e da política em particular. Até porque, se não acontecerem mudanças econômicas, sociais, políticas e culturais profundas, a democratização da política seguirá dependendo do voluntarismo e das boas intenções dos governantes.
17.Exemplos de problemas estruturais que devem ser resolvidos mediante mudanças estruturais:
a) o poder dos meios de comunicação privados, na formação da opinião da sociedade;
b) a influência das grandes empresas privadas, sobre as decisões dos governos e dos parlamentos;
c) o fosso de informação e poder que existe, entre os governados e os governantes, entre os profissionais da política e do governo, vis a vis os cidadãos e cidadãs em geral;
d) a distância entre os debates parlamentares e as questões que afligem o dia-a-dia da população;
e) o poder pessoal autocrático dos chefes do poder executivo;
f) o poder desmedido das chamadas equipes econômicas, no interior dos governos;
g) o poder desmedido da alta burocracia estatal, frente aos governantes eleitos.
18.Especificamente sobre a relação partido/governo, nossa experiência no Brasil comporta duas características complicadoras:
a) por um lado, trata-se de partidos no plural;
b) por outro lado, trata-se de partidos de esquerda, de centro e as vezes até mesmo de direita.
19.Isso nos coloca diante de um duplo desafio:
a) como evitar que a legítima busca da hegemonia de um partido, se transforme em imposição sobre as outras forças políticas que do governo participam?
b) como um partido de esquerda pode conseguir hegemonizar um governo de centro-esquerda com aliados de direita e, ao mesmo tempo, manter as características e as posições de um partido de esquerda?
20.Outros aspectos que deve ser enfrentados são os efeitos colaterais de nossa presença em governos. É o caso da corrupção e também da burocratização do debate político.
21.A corrupção tem causas sociológicas, agravadas pelo neoliberalismo. Os governos de esquerda têm que ser campeões no combate à corrupção. E os partidos de esquerda devem criar mecanismos para prevenir e punir o surgimento de casos de corrupção. A partir do momento em que a esquerda chega ao governo e passa a tomar decisões que incidem na distribuição de imensos recursos, os mecanismos internos de combate à corrupção devem se tornar mais fortes e sofisticados. Se o PT dispusesse de uma corregedoria interna, alguns dos acontecimentos de 2005 não teriam ocorrido.
22.Quanto a burocratização do debate político, trata-se da tendência de transferir para os governos decisões que são ou deveriam ser tomadas pelo Partido. Esta tendência é reforçada pela natural e até certo ponto desejável ampliação das fileiras partidárias, depois que nos tornamos governo. Os novos militantes não participaram da luta contra a ditadura, não participaram da luta contra os governos neoliberais, não conhecem o partido oposicionista e das lutas sociais. Isto transforma estes novos militantes em presa fácil da concepção segundo a qual, uma vez conquistado o governo, o Partido perde importância estratégica.
23.Pelo contrário, devemos reafirmar a importância do Partido, de seu protagonismo, de sua autonomia estratégica e de sua capacidade de elaboração e direção. É claro que o Partido não deve se imiscuir nos assuntos cotidianos. Isso seria negativo, tanto para a gestão administrativa do governo, quanto para a imprescindível autonomia do Partido frente ao governo/Estado. Entretanto, é preciso estar alerta para duas situações: quando as políticas cotidianas nos afastam dos nossos objetivos estratégicos; e quanto nossos objetivos programáticos foram tão rebaixados, que deixam de cumprir o papel de horizonte e acicate para nossa ação cotidiana.
24.Os partidos devem, por exemplo, estar na vanguarda do debate e da luta por:
a) construir um modelo econômico e social alternativo, que leve em conta não apenas a oposição ao neoliberalismo, mas também nossa crítica democrática e popular ao desenvolvimentismo conservador e nossa crítica socialista ao capitalismo;
b) evoluir das políticas emergenciais para a ampliação das políticas estruturais;
c) um desenvolvimento nacional que esteja combinado com a integração continental e com o objetivo de construir outra ordem mundial.
25.A política externa do governo brasileiro tem esta vocação. Prioridades para as relações sul-sul, África e integração continental. Nesta integração, o Mercosul é visto como parte da construção da CASA.
26.Claro que setores das classes dominantes só concebem uma política de integração com os Estados Unidos. Claro, também, que a lógica comercial e de curto prazo segue turvando a imaginação de muitos setores. Ademais, só agora estamos conseguindo colocar o tema da integração na pauta política nacional.
27.Um dos aspectos da integração é o tratamento das assimetrias. Embora muito tenha sido feito, muito mais precisa ser feito para dar conta deste problema, especialmente importante no caso do Paraguai e do Uruguai. Conflitos como o das “papeleras”, que consideramos como assunto que deve ser tratado no âmbito do Mercosul, jogam um papel negativo.
28.Outro aspecto da integração é como tratar as relações com os Estados Unidos. Diante do fracasso da Alca, os EUA estão buscando firmar acordos bilaterais com diversos países do continente. Estes Tratados de Livre Comércio (TLC) tiveram efeitos profundamente negativos onde já estão em vigor; e sofrem uma imensa oposição da esquerda nos países em que ainda não foram aprovados pelos respectivos Congressos nacionais. Os Estados Unidos buscam firmar um TLC com o Uruguai, para colocar uma cunha no Mercosul. É preciso construir outro caminho.
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