Os fatos são conhecidos: a Câmara dos Deputados aprovou, no dia 25 de junho de 2025, por 383 votos a 98 votos, um Projeto de Decreto Legislativo que revoga todo o decreto do governo que aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras.
Quem pautou a votação foi Hugo Motta, presidente da Câmara dos Deputados. A atitude de Motta surpreendeu muitas pessoas no governo e na bancada do PT, que até então acreditavam nas promessas e juras de amor feitas pelo cidadão.
O PDL foi para o Senado, onde também foi aprovado.
O que devemos fazer diante disso?
Mobilizar a população contra um Congresso que tenta impedir Lula de governar? Demitir os ministros dos partidos que traíram o governo? Recorrer ao Supremo Tribunal Federal contra um PDL inconstitucional? Negociar com a direita, para reduzir danos? Aceitar a decisão e cortar na carne, prejudicando o povo e reduzindo as chances de reeleição de Lula? Deixar de lado o arcabouço fiscal? Tudo junto e misturado?
No mundo ideal, o presidente nacional do PT, companheiro Humberto Costa, já teria convocado uma reunião de emergência da Comissão Executiva Nacional e/ou do Diretório Nacional do PT, para discutir o que fazer.
Mas no mundo real as instâncias ainda não foram convocadas. Entretanto, a discussão sobre o que fazer está rolando solta, dentro e fora do Partido. Um dos que opinou a respeito foi Washington Quaquá.
A opinião de Quaquá pode ser vista, ouvida e lida aqui: https://www.instagram.com/reel/DLX_efuJ1ff/?igsh=MXdpdDdicHJ1ZjMzaQ==
Chamo a atenção, no vídeo acima, para dois detalhes, digamos, estéticos: a camisa branca com a palavra Clássico e uma foto do Che Guevara ao fundo. Sem dúvida, o estilo é quase tudo.
Isto posto, vamos agora ao texto predicado por Quaquá: "Olha eu queria avisar meus queridos colegas de bancada e a nossa direção nacional do PT, a situação com a rejeição no Congresso Nacional das matérias do governo nesta semana, ontem, foi gravíssima e nós não podemos permitir que a gente entre numa escalada contra o Congresso Nacional, o Congresso Nacional a gente queira ou não queira, é uma instituição eleita pelo povo brasileiro, a política é o espaço do diálogo, é o espaço do consenso, o que eu acho é que nós do PT precisamos baixar a fervura, precisamos conversar com os líderes do Congresso, precisamos incorporar as demandas dos deputados e do Congresso, porque judicializar, colocar o Supremo no lugar da política, é um erro que, vamos lá, nós estamos caminhando pelos mesmos erros cometidos pela presidenta Dilma e deu no que deu, eu quero dar um conselho a meus companheiros e minhas companheiras, eu dou a vida pelo Lula, mato e morro pelo Lula se for necessário, agora é hora de baixar a fervura, é hora de negociar, é hora de chamar, presidente Lula, as forças vivas da sociedade brasileira, o grande empresariado, chamar ministro Haddad o empresariado brasileiro, os trabalhadores, os camponeses, o Congresso Nacional, povo brasileiro, para uma política de desenvolvimento, o que vai fazer o Brasil crescer não é nem corte de gastos nem aumento de gastos, é aumento do desenvolvimento, a Margem Equatorial tem que ser explorada, nós precisamos trazer ambientes de investimento que tenham rapidez e não sejam travados pelas travas do custo Brasil, que na verdade não é o custo de infraestrutura, o custo Brasil é o custo dessa burocracia de classe média que impede os investimentos a partir de entraves, sejam ambientais, sejam legais, nós temos que chamar Supremo, Congresso, empresários, sociedade, por um pacto de desenvolvimento, o que vai tirar o Brasil da lona é um pacto de desenvolvimento, só uma pessoa pode liderar isso, o presidente Lula, ele é o líder do Brasil."
Claro que no discurso de Quaquá, que espero ter transcrito corretamente, tem vários lugares comuns absolutamente demagógicos (tipo "matar ou morrer", "forças vivas" etc.).
Mas, tirante esses arroubos, é preciso levar muito a sério as opiniões de Quaquá.
Primeiro, porque ele é muito bem relacionado com forças para lá de vivíssimas. Segundo, porque ele verbaliza aquilo que outros (ainda) não têm coragem de dizer.
As vezes verbaliza até pelo silêncio. Por exemplo: no discurso acima transcrito, Quaquá não fala uma única palavra sobre os juros, sobre a dívida pública, sobre os baixos impostos pagos pelos ricos. sobre os subsídios e as isenções. Nada disto foi citado por Quaquá como "travas" que atrapalham o Brasil.
No lugar disso ele fala dos "entraves ambientais", "legais" e do "custo desse burocracia de classe média", frases que soam celestiais aos ouvidos de certa elite brasileira.
A meus ouvidos, a essência do discurso de Quaquá está no seguinte trecho: "não podemos permitir que a gente entre numa escalada contra o Congresso Nacional". Ou seja: só a direita pode "escalar" contra nós. A gente não pode nem mesmo se defender.
Vale lembrar que o governo passou os últimos dias exercitando o "diálogo", buscando o "consenso". E o que fez Hugo Motta? Traiu os líderes do PT no Congresso, líderes a quem restou confessar pública e candidamente que não estavam entendendo o que aconteceu.
No lugar de "escalar", Quaquá propõe ceder: "incorporar as demandas dos deputados", o que eu entendo como "liberar mais emendas".
O diagnóstico implícito nessa proposta é que bastaria pagar os chantagistas que a coisa se acalma.
Que existe chantagem, não tenho dúvida. Mas não acho que seja só ou principalmente isso: está em curso uma operação de cerco e sufocamento, cujo objetivo é forçar o governo a fazer em 2025 um ajuste fiscal brutal, que torne inviável a reeleição de Lula.
Esta é, aliás, uma semelhança entre o momento atual e um certo momento do governo Dilma. A parte pensante da direita quer nos obrigar a fazer, em 2025, o que lamentavelmente fizemos em 2015.
Quaquá é contra "judicializar, colocar o Supremo no lugar da política".
Ou seja: frente a uma ilegalidade (o Brasil não é parlamentarista e o PDL não se aplica ao caso), não deveríamos recorrer.
Sobre isto, acho que Quaquá tem razão em parte: transformar o Supremo em árbitro não é uma opção estrategicamente adequada.
Mas existem outras possibilidades, que Quaquá simplesmente desconsidera: i/ mobilizar a população, contra aqueles que querem impedir o presidente de governar; ii/contingenciar tudo aquilo que interessa à elite (emendas, subsídios etc.); iii/deixar de perseguir o absurdo déficit zero; iv/tirar imediatamente do governo quem vota contra o governo: melhor um governo de minoria do que um governo com falsa maioria.
Quaquá também tem certa razão, quando diz que precisamos colocar o "desenvolvimento" no centro da pauta.
O problema é que Quaquá parece acreditar em contos da carochinha. Afinal, o tipo de "desenvolvimento" apoiado pelo grande empresariado não tem nada que ver com o que necessitamos para "tirar o Brasil da lona".
Desenvolvimento, aqui no Brasil, implica em derrotar o capital financeiro e os setores dedicados à primário-exportação. Aliás, é bom lembrar que estes setores da classe dominante incluem no "custo Brasil" as políticas sociais, o salário mínimo, as aposentadorias etc.
Por fim: mesmo supondo que Quaquá tivesse 100% de razão no que propõe, há um detalhe tático que precisa ser colocado em debate. A saber: para que Lula lidere o proposto pelo prefeito de Maricá, ou para que ele lidere um cavalo-de-pau como o que eu defendo, ou para que ele lidere outra alternativa, é preciso primeiro retomar o controle da situação. E para fazer isso devemos abandonar o cretinismo parlamentar, que só tem olhos para a correlação de forças nas instituições; é preciso levar a disputa para a sociedade, ou seja, convocando às ruas as verdadeiras "forças vivas" da Nação: as classes trabalhadoras.
O povo votou em Lula. O Congresso quer governar no lugar de Lula. Lula quer melhorar a vida dos pobres. O Congresso quer proteger os ricos. Vamos reagir imediatamente, por exemplo convocando um grande comício com 300 mil pessoas, contra os 300 picaretas que estão querendo inviabilizar o Brasil.
Se a direita está em campanha, respondamos na mesma moeda. Ou é isso ou seremos emparedados vivos, com Congresso, com Supremo, com tudo.
Contra a ditadura da Faria Lima, vamos de Favela do Moinho!
Nenhum comentário:
Postar um comentário