sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Edinho ataca novamente

Pergunta: na guerra contra o crime, Edinho proporia uma "trégua"?

Imagino que não.

Mas na guerra contra a especulação criminosa, Edinho propõe uma "trégua".

É o que está dito na entrevista (reproduzida ao final) que o companheiro concedeu ao Globo.

A palavra "trégua" dissimula o que efetivamente está ocorrendo. Afinal de contas, na guerra em curso, só um dos lados está atacando, chantageando, desestabilizando. 

Edinho não percebe esta assimetria, talvez devido a uma concepção equivocada que ele sabiamente atribui a alguém mais importante: "a dinâmica do capitalismo no século XXI é dada pelo capital financeiro — é também com ele que temos de construir um projeto de Brasil forte".

A primeira frase é parcialmente verdadeira: a dinâmica do capitalismo no século XXI é parcialmente dada pelo capital financeiro. 

Já a segunda frase é enganosa: afinal, se quisermos construir "um projeto de Brasil forte", teremos que subordinar o capital financeiro. 

A palavra subordinação talvez soe forte demais para alguém que diz não gostar de polarização. 

E, claro, legal seria se o capital financeiro se dispusesse a construir "um projeto de Brasil forte".

Mas a vida é como ela é, cheia de antagonismos e polarizações. 

No caso em tela, a entrevista de Edinho polariza contra a recente resolução do Diretório Nacional do PT e, também, contra seguidas declarações públicas da presidenta Gleisi Hoffmann acerca da taxa de juros e do Banco Central.

Depois da visita à Embaixada dos EUA e dessa entrevista ao Globo, temo pelo que ainda está por vir. 

Desse ponto de vista, Edinho bem que podia dar uma trégua. Ao PT.


SEGUE A ENTREVISTA

O mercado financeiro está indicando claramente nas últimas semanas que perdeu
a confiança sobre o governo fazer um ajuste fiscal que consiga conter o rombo
crescente das contas públicas nos próximos anos e que, portanto, consiga
minimamente cumprir as metas fiscais. Como reverter essa situação?

Edinho Silva — Acho que é hora de pensarmos no Brasil. Essa guerra estabelecida na
economia vai derrotar o país. É hora de uma trégua e de fortalecermos o caminho
proposto pelo ministro Haddad. Ele propõe um caminho, isso tem de ficar claro. É um
caminho. E isso tem de unir quem aposta no Brasil. A hora é de união e total respaldo ao
ministro Fernando Haddad. Nenhum analista bem informado, e bem-intencionado,
colocaria como uma tarefa simples reduzir o rombo das contas públicas no curto prazo.
Só o governo Bolsonaro deixou mais de R$ 700 bilhões de estouro. É importante não
perdermos esse referencial, caso contrário o peso sobre o governo Lula seria muito
injusto. Não é nem um pouco razoável considerar que o governo Lula apresentaria um
pacote para produzir um superávit primário capaz de estabilizar a relação dívida/PIB no
curto prazo.

E o que seria razoável, então?
Edinho Silva — O que está sendo proposto é um caminho. Temos de construir unidade
na construção desse caminho. O Brasil é um país como muitas injustiças e
desigualdades, impor o impossível significa caminharmos para uma escalada de
aprofundamento da miséria, da violência. Por isso que o caminho sinaliza os objetivos, e
eles precisam ser alcançados, mas com racionalidade, tranquilidade e estabilidade. É
urgente e necessária uma trégua nessa polarização. Na construção desse caminho
temos de garantir que quem aposta no Brasil tenha seus ganhos garantidos. Quem
apostar contra o país, tem de ser perdedor.

Mas dada a deterioração das expectativas, o governo não teria de dar mais
garantias em relação ao equilíbrio fiscal?
Edinho Silva — Sem a busca do equilíbrio fiscal não tem perspectiva de futuro. Não há
segurança de inflação baixa e nem de redução da taxa de juros. O presidente Lula é um
defensor do poder de compra dos salários, portanto, inimigo da inflação, e é um
desenvolvimentista, o que é antagônico com juros altos. Só temos de construir o
caminho da busca do equilíbrio, sem atalhos, buscar a construção de um equilíbrio que
seja perene. Ninguém nega que temos problemas nas contas públicas que vêm de longa
data, como eu já disse. Eu sempre digo que a economia é como na saúde: se errar no
diagnóstico, vai errar no medicamento, no tratamento. O receituário está pronto, o que
está sendo construído é a dosagem. Todos temos de ajudar nessa construção. Tem de
ser uma construção coletiva, governo, Congresso e “os atores do bem”, aqueles que
apostam no Brasil. As medidas que estão sendo votadas no Congresso são o início da
construção de um caminho, não o fim. São passos importantes na busca do equilíbrio, da
justiça fiscal, e da estabilidade. Em um governo que preza pela democracia, o debate
para o ritmo da busca dos objetivos está sendo feito pelo Congresso, com ampla
participação dos atores. O importante é sabermos que a construção do caminho que
levará ao equilíbrio fiscal perene e estável não pode ser ter atalhos. O mais importante
agora é a aprovação das medidas para que possamos caminhar na busca dos objetivos.
A construção do equilíbrio das contas públicas tem de ser permanente. Agora o foco é
aprovar as medidas enviadas pelo presidente Lula. Aprovadas, segue o esforço na
direção do equilíbrio das contas públicas. Não há bala de prata, essa é uma concepção que não deveria existir, temos de acreditar nos processos. O governo tem o diagnóstico
e se move na direção correta, na velocidade que a democracia e a realidade brasileira
permitem. É hora de unirmos o Brasil. Chega de apostar contra o país. Está na hora de
sairmos dessa polarização do “perde perde”. Temos de dar garantias para quem aposta
no Brasil. No mercado tem quem ganha e tem quem perde. Os ganhadores têm de ser
sempre quem aposta no país. O presidente Lula é um homem pragmático. Ele sabe que
a dinâmica do capitalismo no século XXI é dada pelo capital financeiro — é também com
ele que temos de construir um projeto de Brasil forte. Só não podemos aceitar que sejam
exigidas medidas irreais.


quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

CQD, Edinho…

Ontem um amigo me enviou a imagem que reproduzo ao final desta mensagem.

Reenviei para minhas listas, acompanhada da expressão CQD.

Algumas pessoas me escreveram perguntando o que a “sigla” queria dizer.

Uma resposta está aqui:

https://pt.m.wikipedia.org/wiki/Quod_erat_demonstrandum

CQD, no caso, faz menção ao que disse no texto cujo endereço segue abaixo, mais precisamente ao que está no trecho reproduzido logo a seguir:

http://valterpomar.blogspot.com/2024/12/edinho-candidato-presidencia-nacional.html?m=1

“O que se pode dizer, a julgar pelas entrevistas concedidas por Edinho, é que se ele virasse presidente do PT, seu mandato seria um retrocesso político em relação ao de Gleisi Hoffmann.”

Acrescento o seguinte: é óbvio que os gringos tem interesse no que pensamos e queiram contatos no PT.

Assim como é óbvio que a recíproca pode ser verdadeira.

Mas é patético comemorar publicamente o fato de ter sido recebido e tratado como fonte pelo sub do sub da quase ex.

Como diria um amigo, a má política geralmente vem acompanhada da falta de compostura.



terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Edinho candidato à presidência nacional do PT

Candidato oficializado à presidência nacional do Partido dos Trabalhadores, por enquanto só o Romenio Pereira, da tendência Movimento PT.

Candidatura prometida, por enquanto só a da tendência petista Articulação de Esquerda, que informou publicamente que informará seu nome até março de 2025.

Candidatura mais comentada, entretanto, é a de Edinho Silva.

Edinho, para quem não sabe, é da tendência Construindo um Novo Brasil (CNB) que possui metade menos uns do atual Diretório Nacional do Partido, eleito em 2019.

CNB era, originalmente, o nome de uma chapa lançada para disputar o processo de eleição direta da direção partidária (PED) realizada em 2005. Esta chapa teve como candidato a presidente nacional o companheiro Ricardo Berzoini.

Detalhe curioso: em 2001, quando aconteceu o primeiro PED, Berzoini também foi candidato a presidente nacional. Substituiu um candidato que havia saído do Partido, o José Fortunati. Berzoini teve uma pequena votação. Em primeiro lugar no PED, com pouco mais de 50% dos votos, ficou José Dirceu, candidato do autodenominado "campo majoritário".

O segundo PED deveria ocorrer em 2003. Mas o então Diretório Nacional do PT decidiu adiar o processo, por motivos que lembram os argumentos utilizados para adiar o PED de 2023. Eleito em 2001, em 2002 José Dirceu se licenciou da presidência para virar ministro de Lula. E, cumprindo o estatuto, o Diretório Nacional do PT reuniu-se para eleger um substituto temporário. Para a função, foi escolhido José Genoíno.

Em 2005, em meio a chamada "crise do mensalão", Genoíno renunciou à presidência do PT. Para ocupar o seu lugar, o "campo majoritário" indicou Tarso Genro. Tarso era cotado para ser candidato a presidente nacional do Partido, mas desistiu da tarefa, no que teve a ajuda inestimável de uma entrevista desastrosa que ele concedeu à Folha de S. Paulo, na qual ele não soube dizer por quais motivos defender o PT.

Para substituir Tarso, o "campo majoritário" acabou escolhendo Ricardo Berzoini. Berzoini foi eleito no PED de 2005 e reeleito em 2007, sem nunca ter sido um nome in pectore nem do "campo majoritário", nem da recém-criada CNB, que de nome de chapa virou nome de tendência.

No PED de 2009, a CNB lançou José Eduardo Dutra, que fora da velha Articulação, depois do "campo majoritário" e em seguida da CNB. Dutra ganhou o PED com uma votação superior a que Dirceu havia obtido em 2001. Tragicamente, teve que renunciar por razões de saúde. Coube ao Diretório Nacional do PT eleger um substituto e o nome escolhido foi Rui Falcão.

No PED de 2013, Rui foi candidato a presidência do Partido e se elegeu. Como Berzoini, Rui não tinha sido do "campo majoritário", nem era da CNB.

Nas duas eleições seguintes, a presidência do Partido foi eleita num sistema misturado, com PED na base mas eleição da direção no congresso nacional. 

No processo de 2017, a CNB tinha a expectativa de eleger um de seus nomes à presidência nacional do Partido. No páreo estavam, entre outros, Padilha e Márcio Macedo. Mas, diante do risco do Partido eleger o então senador Lindbergh, Lula aceitou uma sugestão dada por Rui Falcão e deu seu apoio à candidatura da então também senadora Gleisi Hoffman.

Gleisi venceu Lindbergh e foi eleita presidenta nacional do PT no congresso do Partido realizado em 2017. Gleisi era da CNB, fora do "campo majoritário", mas dizem os especialistas que ela dificilmente teria sido escolhida candidata da CNB se não fosse o apoio de Lula.

Gleisi foi reeleita no congresso do PT realizado em 2019. Em 2023 teria que ter ocorrido novo PED, mas este foi adiado e só ocorrerá em 6 de julho de 2025.

No PED de 2025, quem será o nome apoiado pela CNB para disputar a presidência nacional do PT?

Até agora, não saiu a fumaça branca. Há setores da CNB que não estão de acordo com o nome preferido pelo presidente Lula, a saber, o Edinho Silva. Há quem ache que esta resistência está fadada ao fracasso. Mas há, também, quem ache que podem acontecer surpresas. E a imprensa, que adora especulações e fofocas, volta e meia lembra dos nomes de José Guimarães, José Dirceu e até Paulo Okamoto.

Em qualquer caso, como ficou demonstrado na reunião do Diretório Nacional do PT dia 7 de dezembro de 2024, a CNB não tem garantida a maioria absoluta de votos. E, portanto, o resultado do PED não está pré-definido. Motivo pelo qual muita coisa dependerá do que eles decidam, do quando decidam e do como decidam.

O que se pode dizer, a julgar pelas entrevistas concedidas por Edinho, é que se ele virasse presidente do PT, seu mandato seria um retrocesso político em relação ao de Gleisi Hoffmann. Para resumir o problema, suas declarações demonstram que em nenhum caso Edinho será presidente do PT. No máximo, ele seria um ministro sem pasta.

Que Lula ache isto positivo, eu consigo compreender, mesmo sem concordar. Mas tendo em vista a situação política da classe trabalhadora, do governo, do país e do mundo, o PT merece e necessita muito mais.


 







 

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

"Irresponsável, insana e desastrosa"

Foi com estas palavras que a presidenta nacional do PT, companheira Gleisi Hoffmann, definiu a decisão do Banco Central, de elevar a táxa básica de juros para 12,5%.

Detalhe: estão previstos mais dois aumentos. Se vierem, a taxa de juros poderia chegar a 14,25%.

Uma pergunta que não quer calar: por qual motivo a decisão foi unânime?

Aliás, de que adianta nomearmos diretores e indicarmos um novo presidente para o Banco Central, se na hora do vamos ver não existe nem mesmo um teatro que diferencie os "good cop" e os "bad cop"?

Repete-se, no Banco Central, algo parecido com o que já vimos, no passado recente, com as nomeações feitas para o Supremo Tribunal Federal. 

Finalmente: fica mais uma vez comprovado que foi errada a tática de contemporizar com Bob Fields Neto.

Também estamos pagando muito caro pela definição, apoiada por Haddad e Tebet, da meta de inflação.

Sem falar no principal: está desmoralizada a crença de que uma política fiscal austera produziria uma política monetária decente.

Quanto mais a Fazenda dá, mais a banca exige, sem limites.

Tudo isto junto e misturado deveria levar o governo a mudar sua política econômica.

Ou, pelo menos, deveria levar todo o Partido dos Trabalhadores a comprar a briga. Por exemplo, não aceitando que se corte, inutilmente, na nossa própria carne, com medidas que afetam negativamente o salário mínimo, o BPC e outras políticas sociais.  




segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

Romênio Pereira é candidato a presidente nacional do PT

Um dos discursos marcantes da reunião do Diretório Nacional do PT, realizada no sábado dia 7 de dezembro de 2024, foi de Romênio Pereira, atual secretário de relações internacionais do Partido.

Segundo Romênio, “ou o governo muda, ou o povo vai mudar o governo”.

Na véspera da reunião do DN, Romênio Pereira foi oficializado como candidato à presidência nacional do Partido. 

A oficialização - “por unanimidade” - da candidatura foi feita em uma reunião da tendência Movimento PT, da qual Romênio faz parte.

Portanto, haverá pelo menos três candidaturas à presidência nacional do Partido: a lançada pelo Movimento PT e as que serão lançadas pela CNB e pela Articulação de Esquerda.

A votação será no dia 6 de julho de 2025 ou no dia 3 de agosto de 2025, a depender do método que ainda será definido na próxima reunião do Diretório Nacional do PT.

sábado, 7 de dezembro de 2024

Transcrição da intervenção no Diretório Nacional do PT

Segue a transcrição feita por um conhecido, da apresentação do projeto de resolução apresentado pela tendência petista Articulação de Esquerda, na reunião do Diretório Nacional do PT realizada dia 7 de dezembro de 2024. O texto abaixo recebeu uma revisão parcial.


Bom, pessoal, queria começar pela situação mundial.

Tem uma boa notícia na situação mundial, que é a crise do capitalismo e a decadência dos Estados Unidos.

A má notícia é que a reação deles é brutal contra nós, criando uma situação perigosíssima.

É isso que vários aqui destacaram.

Tem um avanço da violência imperialista, e por conta disso não dá para ter um documento nosso que não fale de Palestina e não fale de Cuba, e tem um avanço da extrema-direita.

E esse avanço da extrema-direita não vai ser detido pela "união de todos os democratas".

Por exemplo, não vai ser detido com uma aliança com Biden.

Ele só vai ser detido se a esquerda conseguir fazer uma defesa ativa da soberania, dos direitos, do bem-estar, do desenvolvimento; e recolocar em pauta no debate da sociedade a defesa do socialismo.

Não basta, na nossa opinião, olhando para o Brasil, que a gente lembre do nosso passado glorioso, até porque a gente não quer ser um partido que tem um grande passado pela frente.

E não basta também o conjunto de ações parlamentares e governamentais.

Tem que ter uma ação ativa do PT, no âmbito da educação, da organização e da mobilização do povo brasileiro.

E, neste sentido, o dia 10 de dezembro é um grande teste.

E a CUT tem razão quando debateu a necessidade de vincular a luta contra o golpe com a defesa da tributação dos ricos, com a recusa à PEC do estupro e com a luta contra a escala do 6x1.

Então, todo o conjunto das pautas do povo brasileiro tem que estar presente, senão a luta pela democracia não ganha materialidade, não ganha carne.

E, nesse sentido, eu queria dialogar, a partir do nosso texto, com o que outros aqui falaram.

Em relação ao golpe, claro que, finalmente, o partido tem que apoiar enfaticamente a medida proposta pelo Zaratini sobre o artigo 142 da Constituição, mas nós temos que incluir outras questões.

Primeiro, nenhuma ilusão com os "legalistas" que, sabendo do golpe, disseram que não iam participar dele.

Não dá para aceitar que continue a formação dos oficiais, desde 1964, com base na ideia de que a intervenção militar é a defesa da democracia.

Aliás, recomendo as pessoas ouvirem o discurso feito pelo presidente da Coreia do Sul, abre aspas, segundo o qual para defender a democracia liberal se decreta o estado marcial.

E é preciso lembrar do ministro da defesa, pessoal. O Múcio é cúmplice do golpismo. Ele queria GLO no dia 8 de janeiro. Ele quer salvar os seus amigos, familiares e parentes.

E o Lula tem que falar, como já foi dito aqui.

Sobre o tema da inflação, que está pouco presente nos documentos, no texto da CNB chega-se a dizer que a causa é climática.

A causa da inflação é, em primeiro lugar, o predomínio do agronegócio, a ausência de reforma agrária no país, o controle da distribuição de alimentos para um oligopólio.

E se não tiver medidas concretas nesse sentido, rápido, o tema da inflação vai ser corrosivo.

E, por fim, mas mais importante, o tema do pacote.

Veja, nós fazemos uma crítica duríssima ao pacote.

Primeiro, porque é um sacrifício inútil.

O capital financeiro não vai parar de nos pressionar.

Em segundo lugar, porque é um sacrifício auto-imposto.

Nós estamos fazendo esse pacote para cumprir o novo marco fiscal que nós mesmos inventamos, que prevê o déficit zero, apesar dos alertas feitos por muita gente dessa direção, de que isso provocaria cortes.

Em terceiro lugar, é um sacrifício inócuo, porque não toca nos juros.

Alguém pode dizer que os juros são um problema do Banco Central.

Sim, mas a taxa de inflação é definida por um conselho onde o governo tem incidência. E o Ministério da Fazenda e do Planejamento aceitaram uma meta que causa isso.

E, no Banco Central, até quando nós vamos colocar a culpa no Bob Fields Neto?

Até que assuma o Galípolo, que tem dito que vai manter a taxa de juros e que não vai intervir no mercado de câmbio?

Nós temos um problema nessa área muito grande.

Em quarto lugar, o pacote é completamente desequilibrado.

O pacote apresenta bondades, algumas das quais são tímidas, como no caso dos militares; não fala nada dos subsídios, 600 bilhões de reais.

Ademais, essas medidas dependem da aprovação, da concordância do lado de lá.

Não foram nem ao menos apresentadas até agora.

As medidas que foram apresentadas para debate no Parlamento são as contra nós.

E as medidas em si contêm crueldades tecnocráticas.

Eu vou citar aqui duas.

A gente incluiu nos textos a comemoração do crescimento do PIB.

Só que a partir de agora, se for aprovado o pacote, isso não vai ser incorporado no salário mínimo.

Como é que você ganha o povo para a ideia de que o desenvolvimento é bom para o país e diz para o povo que não vale o que nós aprovamos em 2023, que era a incorporação do PIB; e que agora vai só incorporar uma parte?

Como é que você conquista as pessoas para a ideia de que o nosso crescimento é diferente do crescimento que a direita e a classe dominante sempre defendeu?

E o BPC, pessoal, sinceramente, eu fico enojado com os tecnocratas de merda que inventaram as medidas que são propostas.

Essas pessoas não têm ideia do que elas estão causando na vida de muita gente.

Não têm ideia.

E, ademais, e principalmente, porque nós somos um partido político, não uma confederação de economistas, os efeitos políticos do pacote são gravíssimos. 

Vão nos levar a perder apoio no núcleo duro nosso, que são os que ganham até dois salários mínimos; o pacote nos faz correr risco na eleição de 2026.

Olha o que aconteceu com o Biden e com a Kamala Harris dos Estados Unidos.

E, mesmo que a gente ganhe num cenário desses, ganharemos em piores condições, sob um cerco ainda maior.

Por isso, a nossa opinião é que o pacote tem que ser profundamente revisto.

E que a direção do partido deve dizer isso para o governo.

Agora, desculpa, Fontana, embargo auricular não é o melhor remédio nesse momento.

O melhor remédio é o posicionamento político.

Porque é de política que se trata.

E, por fim, eu queria comentar sobre o espírito geral da coisa, que é o da celebração.

O texto da CNB começa com essa palavra - "celebramos" - e mantém esse espírito do começo até o fim.

Eu queria lembrar, e eu lembrei ontem disso, tive um déjà vu, ou déjà vi, sei lá como fala em francês, da celebração feita em 2013, sobre os 10 anos da nossa chegada ao governo.

E, logo depois, o mundo caiu sobre nossas cabeças.

Eu lembrei da celebração de 2014, a nossa grande vitória sobre a direita.

E, depois, veio Levy, o ajuste ortodoxo, e o mundo caiu sobre nossas cabeças.

Nós acabamos de ter 2024 e, eu não sei como, tem um espírito de celebração.

Pessoal, nós fomos derrotados. Nós fomos derrotados.

Eu sou daqueles que acham que o problema envolve um pouco de tudo. 

Envolve a federação, que, na nossa opinião, deve acabar.

Envolve o PT, evidentemente, erros que nós cometemos.

Mas o principal é que eles cresceram.

Eles cresceram. E não foram quaisquer eles, como já foi lembrado aqui, foram partidos da extrema-direita, como o PL.

Baita crescimento.

Mesmo onde nós os derrotamos, como em Fortaleza, nós tivemos uma vitória eleitoral, mas eles saíram muito fortalecidos.

Então, eu acho que a gente deve dosar a celebração que algumas pessoas acham necessária pelo espírito natalino, ou pela ideia de que nós só podemos dar boa notícia para o povo, ou pela ideia... a gente tem que dosar isso com um pouco de preocupação sensata.

Aqui nesse Diretório Nacional, na boa, em todas as tendências, eu não conheço uma pessoa que não esteja profundamente preocupada com a situação.

Profundamente preocupada.

Isso não transparece nas resoluções?

A quem que nós estamos querendo enganar?

A nós mesmos?

A direita?

A quem?

Nós temos que dosar celebração, que alguns acham indispensável, com preocupação e com medidas práticas.

E com isso eu queria terminar.

Aqui, por exemplo, o companheiro Jilmar incluiu na sua fala a defesa do acordo Mercosul-União Europeia. 

Eu peço sinceramente às pessoas, vamos debater isso aqui nesse diretório.

Lembrem do Celso Amorim dizendo: "é um acordo neocolonial".

O que mudou?

Alguém aqui leu o acordo?

Alguém que leu os termos?

Estão celebrando o que exatamente?

Eu não sei.

Porque, na verdade, só o agronegócio tem a celebrar nesse acordo.

Então, enfim, eu espero que desse debate resulte uma resolução mais equilibrada, que corresponda ao ambiente real do país e ao pensamento médio desse diretório.

Obrigado.

Muito obrigado.

Breve informe sobre a reunião do Diretório Nacional do PT

(sem revisão)

No dia 7 de dezembro de 2024, aconteceu uma reunião do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores.

A reunião foi precedida por um seminário organizado pela Fundação Perseu Abramo.

Informações e opiniões sobre este seminário serão dadas noutra oportunidade.

A reunião do Diretório iniciou as 10h e terminou as 17h, aproximadamente.

A reunião começou com a aprovação da pauta.

Neste momento foram feitas inclusões de pontos de pauta, entre os quais um recurso ao DN, referente a duas comissões de ética contra Washington Quaquá.


A primeira dessas comissões foi solicitada em 2021. A segunda foi solicitada em 2023. O estatuto prevê que cabe à Comissão Executiva Nacional que aprove a admissibilidade de ambas. A inclusão deste ponto na pauta da CEN depende do secretário-geral. O secretário-geral anterior, companheiro Paulo Teixeira, e o atual, companheiro Henrique Fontana, não pautaram a questão na CEN. Foi solicitado ao DN que determinasse que ambas comissões fossem pautadas na próxima reunião da CEN, o que foi aprovado.

Em seguida foi feito o debate sobre conjuntura nacional. Foram apresentados 10 projetos de resolução. Mais detalhes aqui: Valter Pomar: Crítica ao texto da CNB]

Após a apresentação dos projetos de resolução, mais 12 pessoas falaram. 

A maioria dos oradores fez críticas ao "pacote" apresentado pela Fazenda, especialmente quanto as propostas relativas ao salário mínimo e ao BPC.

Na hora da votação do texto-base, as tendências da chamada esquerda petista se unificaram em favor de um único projeto de resolução.

Este projeto de resolução teve 38 votos.

Uma das tendências da chamada esquerda petista, tendência intitulada "Resistência Socialista", decidiu não retirar o seu texto.

O texto da Resistência Socialista teve 7 votos.

A tendência Resistência Socialista é integrada, entre outros, por Lindbergh, Paulo Teixeira e Henrique Fontana. No congresso do PT realizado em 2019, esta tendência apoiou Gleisi Hoffman à presidência nacional do PT, graças ao que pode indicar o titular da secretaria-geral nacional.

Devido a posição da Resistência, prevaleceu o texto da CNB, com 42 votos.

Se a “Resistência” tivesse feito a coisa certa, o resultado seria 45 a 42, com a derrota do texto da CNB.

Depois dessa votação, a reunião interrompeu para o almoço.

Na volta, foram a voto emendas ao texto-base, ou seja, ao texto apresentado pela CNB.

Foram várias emendas, entre as quais destacamos duas: 

-as que incluíram referências a defesa de Cuba e a defesa da Palestina, ambas aprovadas por unanimidade;

-a que tratou da necessidade de alterar a proposta do governo acerca do BPC, aprovada por maioria de votos.

Na votação da emenda sobre o BPC, ficou evidente que a maior parte da direção não está de acordo com as propostas do governo sobre o BPC.

Mas ficou evidente, também, que há posições diferentes quanto ao salário mínimo.


Em seguida, entrou em debate o tema do PED.

A relatora do tema argumentou que, devido ao grande número de emendas apresentadas ao regulamento/regimento do PED, o assunto deveria ser remetido para a próxima reunião do Diretório Nacional do PT, prevista para janeiro.

Efetivamete, ficou para a próxima reunião do DN decidir se a eleição da direção será feita diretamente em urna ou será feita em votação congressual.

Por enquanto foi decidido o seguinte:

-a votação (das direções + delegações OU apenas das delegações) acontecerá dia 6 de julho de 2025, através de urnas eletrônicas;

-a eleição acontecerá naquelas cidades onde os Diretórios Municipais tenham sido registrados na Justiça Eleitoral até 30 de abril de 2024;

-nestas cidades, poderão votar e ser votados os/as filiados/as que tenham seu pedido de filiação registrado no Sisfil até o dia 28 de fevereiro de 2025, desde que não tenham sido 
impugnados de acordo com as normas estatutárias;

-na reunião de janeiro de 2025, será decidido se no dia 6 de julho serão eleitas as delegações  OU se serão eleitas as direções + delegações;

-seja qual for a decisão, haverá Encontros Estaduais entre os dias 19 e 27 de julho de 2025 e haverá Encontro Nacional nos dias 1º, 2 e 3 de agosto de 2025;

-a depender da decisão tomada em janeiro, estes encontros debaterão a política OU debaterão a política e elegerão as direções.

O Diretório Nacional também decidiu que em fevereiro de 2025 acontecerá um festival para comemorar os 45 anos do Partido dos Trabalhadores.

Noutro momento, apresentaremos um balanço político dos fatos resumidos anteriormente.





Sobre pedidos de comissão de ética

Foram retirados, do texto abaixo, os prints citados.


Prezado Henrique Fontana
Secretário-geral nacional do PT
Na reunião do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores, ocorrida no dia 18 de julho, solicitei a inclusão na pauta de um ponto relativo à vice-presidência nacional do PT.
A mesma solicitação fora feita, antes, nos dias 2 e 17 de julho, através do grupo de zap do Diretório Nacional do Partido.
No dia 17, minha solicitação foi objeto de uma postagem do vice-presidente do Partido, postagem feita no grupo de zap do DN. Insiro a referida postagem abaixo.
 
No mesmo dia 17, igualmente no grupo de zap, eu respondi o seguinte: 
“Este tipo de mensagem é muito didática. Me lembra alguns colegas que tinha no primeiro grau. E uma certa fixação fálica que deixo ao pessoal da psi comentar. Mas que este tipo de mensagem seja enviada no grupo de zap do DN, confirma que algumas pessoas não tem noção do que seja a urbanidade no debate político. Mas o principal é que isto desvia o foco do central: Quaquá tem defendido bandidos. Não sei se estes bandidos são ou não culpados do assassinato de Marielle. Mas são bandidos. E Quaquá foi arrolado como testemunha de defesa destes bandidos. Não concordo que o Partido deva ser exposto a mais esse constrangimento: um vice-presidente nacional defendendo publicamente bandidos. Este é o ponto”.
A postagem feita pelo vice-presidente no dia 17 de julho não é um fato isolado. Vejam abaixo outros exemplos de postagens feitas por ele no grupo de zap do DN.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Como já disse, todas as mensagens acima foram enviadas no grupo de zap do Diretório Nacional do PT. Há outras, que não printei.
Compreendo que o vice-presidente não goste da minha pessoa, tampouco do que eu escrevo a respeito dele. Mas há maneiras e maneiras de travar o debate político. Há, inclusive, formas de ofender politicamente alguém, sem ultrapassar os limites da urbanidade. Que ele lance mão de certo tipo de ofensa só confirma que – como diria o João Bosco – cada um faz o que gosta. Fossem outras as condições, isso seria um problema pessoal, a ser resolvido entre adultos. Mas, à medida que o vice-presidente vem lançando, recorrentemente, este tipo de mensagem ofensiva no grupo de zap do Diretório Nacional, isto se torna um problema coletivo, uma vez que contribui para naturalizar entre nós um “estilo” de debate que considero incompatível com a nossa tradição como Partido. 
Não preciso lembrar você, secretário geral, como a história tratou pessoas e partidos que deixaram este tipo de “estilo” dominar o ambiente. 
Não vou pedir que a conduta do vice-presidente seja analisada pela comissão de ética, não porque não mereça, mas sim porque estão pendentes, na “fila”, dois pedidos anteriores de comissão de ética, pedidos que versam sobre casos bem mais graves, pedidos que até agora não foram devidamente encaminhados. 
Caso você não lembre, estou me referindo aos que cito a seguir.
Caso 1
No dia 11 de novembro de 2021, o Núcleo Construção, núcleo de base no âmbito da 1ª Zonal do DM na cidade do Rio de Janeiro, promoveu um debate entre o vice-presidente nacional do PT e o secretário estadual de Formação Política do PT-RJ, Olavo Carneiro. O debate foi realizado e gravado pela plataforma zoom reunindo cem pessoas. Neste debate, o vice-presidente descambou da postura enérgica na defesa de opiniões, para a ofensa e o xingamento ao debatedor divergente. Os impropérios dirigidos ao Olavo Carneiro foram os seguintes:
“Seu pivete, safado, vagabundo”.
“Bolsonarista de merda”.
“Vai tomar no cu”.
“Vai se foder”.
Olavo Carneiro solicitou imediata análise do ocorrido, pela comissão de ética. Não temos notícia do que ocorreu com esta solicitação.
Caso 2
No dia 16 de fevereiro de 2023, um conjunto de tendências petistas (Articulação de Esquerda, Avante PT, Democracia Socialista, Diálogo e Ação Petista, Esquerda Popular Socialista, Militância Socialista, Resistência Socialista e Socialismo em Construção) assinou uma representação para que o vice-presidente respondesse, na comissão de ética do Diretório nacional, por extrapolar “todos os limites ao expressar publicamente posições antagônicas às deliberadas democraticamente pelas instâncias do partido”.
Na oportunidade, o vice-presidente havia postado em suas redes sociais uma foto sorridente e abraçado ao bolsonarista, e ex-ministro da Saúde do governo da extrema-direita, Eduardo Pazzuelo, acompanhado de uma mensagem cheia de elogios. Depois, postou outra mensagem em que chamava toda a militância petista que o criticou pela postagem de “jumentos”.
A representação das tendências destacava que o deputado petista insultava “a todo brasileiro e brasileira que votou no presidente Lula contra a extrema direita fascista”. A representação foi apoiada por um abaixo-assinado que, segundo me informaram hoje, chegou a 2 mil signatários.
Segundo o artigo 233 do estatuto do nosso Partido, a “comissão executiva do nível correspondente decidirá sobre a admissibilidade ou remessa da representação à Comissão de Ética e Disciplina para instauração do respectivo processo, no prazo máximo de 30 (trinta dias)”. 
Apesar do que diz o nosso estatuto, a representação está pendente até hoje, prazo muito superior ao estipulado pelo estatuto e mais do que suficiente para que o assunto tivesse sido pautado. 
Tendo em vista este histórico, prefiro instar o secretário-geral a cumprir o estatuto e submeter os dois pedidos à apreciação das instâncias. 
Sou militante do PT há tempo o suficiente para saber que é muito comum que relevem determinadas atitudes, em nome de acordos políticos e coisas do gênero. Sei, igualmente, que o ambiente político externo afeta e degrada nosso ambiente interno, contribuindo para certas pessoas acharem tudo isto motivo de gracejo. 
Mas, como disse nossa presidenta nacional no já citado caso da fotografia com Pazuello, tudo tem limite. Naturalizar a violência, mesmo que verbal, produz mais violência. O vice-presidente vem escalando nas ofensas. Até onde ele vai chegar? Até quando aqueles que podem e devem fazer algo, vão agir como se o que está acontecendo fosse algo normal e aceitável? 
Sei que todos nós temos coisas mais urgentes para fazer. Foi algo parecido que pensei quando, noutras gestões deste Diretório Nacional, me pediram para lidar com dois casos espinhosos, um no Rio de Janeiro e outro no Mato Grosso do Sul. Eu cumpri minha tarefa. Espero que você, prezado secretário-geral Henrique Fontana, também cumpra a sua, mesmo que todos sempre tenhamos coisas mais importantes que fazer.
Atenciosamente
Valter Pomar 
20/7/2024



Crítica ao texto da CNB

(sem revisão)

Hoje, dia 7 de dezembro de 2024, acontecerá uma reunião do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores.

A secretaria-geral do Partido, ocupada atualmente pelo companheiro Henrique Fontana, apresentou a seguinte proposta de pauta para a reunião: 

1) PED/2025;

2) Conjuntura;

3) Aniversário do PT;

4) Substituição no DN.

Na abertura da reunião, devem ser propostos outros pontos de pauta, entre os quais o julgamento de admissibilidade de duas comissões de ética apresentadas contra o atual vice-presidente nacional do PT, Washington Quaquá. 

As comissões foram propostas em 2021 e 2023, respectivamente, mas até agora a secretaria-geral não pautou seu debate na CEN, donde o recurso ao Diretório Nacional do PT.

Acerca do tema PED, a secretaria nacional de organização fez uma proposta de regulamento, sobre a qual há inúmeras controvérsias. Não se descarta que prevaleça no Diretório a ideia, que já vem sendo ventilada, de deixar para depois a aprovação do regulamento.

Sobre o tema conjuntura, foram apresentados dez projetos de resolução e/ou contribuições para o debate. Lembramos que o atual Diretório Nacional é composto por representação proporcional de 8 chapas, que disputaram o congresso do PT realizado em 2019. Estas 8 chapas, por sua vez, eram compostas por 14 tendências ou similares, algumas das quais não existem mais. Destas 14, dez apresentaram projetos de resolução, a saber:

 Articulação de Esquerda

Avante

Construindo um Novo Brasil

Democracia Socialista

Diálogo e Ação Petista.

Esquerda Popular e Socialista

Movimento PT

Nas Ruas e Redes

Resistência Socialista

Socialismo em Construção

Das outras 4 tendências que compuseram o Diretório Nacional original, duas não existem mais e duas não apresentaram textos: Unidade na Luta, um grupo existente basicamente no Distrito Federal; e Novo Rumo, que existe basicamente em São Paulo. Registre-se que o deputado federal Rui Falcão, um dos integrantes do Novo Rumo, é um dos signatários da tese subscrita pela Articulação de Esquerda.

Esta tese, da AE, pode ser lida aqui: https://pagina13.org.br/resolucao-proposta-ao-diretorio-nacional-do-pt-de-7-12-2024/

No Diretório, cada uma destas tendências apresentará o seu projeto de resolução. Em seguida, deve haver votação. O texto mais votado se converterá em “texto-base”, que receberá emendas e depois será divulgado como texto do Diretório Nacional. Isto supondo uma reunião normal. Mas como a reunião de 7 de dezembro será curta, não se descarta que o texto aprovado por maioria relativa (menos de 50% dos votos do DN) acabe se convertendo em resolução.

Se não houver nenhuma surpresa, o texto que deve obter maioria relativa dos votos na reunião do Diretório Nacional será o apresentado pela tendência Construindo um Novo Brasil. Por este motivo, fazemos a seguir uma análise deste texto, cuja íntegra reproduzimos ao final. 

O texto da CNB começa com a palavra “celebramos”. Podemos dizer que esta é a ideia-força atravessa todo o texto: celebração.

Um exemplo disto é o seguinte trecho do texto da CNB: “os acertos do governo Lula são mais do que palpáveis e surpreendem pela rapidez com que tantos avanços foram alcançados”.

Outro exemplo: “no campo da disputa eleitoral, o PT segue recuperando seu prestígio e a sua presença efetiva no território”.

Celebra-se o que foi feito, celebra-se o que foi prometido, celebra-se o que é desejado.

Celebra-se inclusive projetos parlamentares, cujos autores são citados nominalmente.

Quanto àquilo eventualmente impossível de celebrar – como é o caso dos cortes propostos na política de valorização do salário mínimo ou no BPC – simplesmente não é citado pelo texto.

(Outro tema impossível de celebrar, mas que não comparece em nenhum dos textos apresentados a debate no Diretório Nacional é o acordo Mercosul-União Europeia, aquele que Celso Amorim um dia já chamou de “neocolonial”.)

O resultado de tanta celebração é um texto que não expressa adequadamente o clima realmente existente em grande parte do Diretório Nacional do Partido, inclusive em grande parte da tendência Construindo um Novo Brasil.

Este clima pode ser resumido numa palavra: preocupação.

Mas como a realidade é dura, mesmo em meio a tanta celebração, aparecem alguns problemas. 

Por exemplo, o reconhecimento de que “a remuneração dos trabalhadores permanece inferior quando se compara com países desenvolvidos”; de que é “preciso combater a alta dos preços dos alimentos”, atribuída à crise climática; de que “o cenário só não é mais promissor devido à sabotagem deliberada do Banco Central”; de que “especuladores promoveram a maior alta do dólar na história”; de que “os grandes grupos beneficiados por isenções fiscais que chegam a R$ 546 bilhões em 2024”: de que “a desoneração da folha salarial de 17 setores custou R$ 19,8 bilhões ao governo”; de que “ainda há, no entanto, um caminho a ser percorrido para concluir a reforma da renda, alcançando também os bilionários”.

Outro exemplo do reconhecimento de problemas está no trecho em que o texto tenta explicar porque nosso desempenho nas eleições municipais não foi melhor: “a conjuntura “excessivamente desfavorável”, a “capilaridade da extrema direita nas redes, sempre abastecidas por fundos de milhões de reais e dólares em infraestrutura”, a “violência política” recorde, o “crime organizado”, o “orçamento secreto”, o “crescimento desproporcional  para R$ 50 bilhões em emendas parlamentares”; “a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos”, que “acende um preocupante alerta para as forças progressistas e o campo democrático global”.

Só Tico & Teco saberão explicar como estes fatos – resumidos na expressão “conjuntura excessivamente desfavorável” – dialogam com a descrição idílica e celebratória que marca o texto da CNB.

Tico & Teco devem dar especial atenção ao seguinte parágrafo do texto da CNB:

“Internamente, é nítida a percepção e o reconhecimento de que a gestão Lula tem garantido muitas conquistas populares e apresenta excelentes resultados em inúmeras áreas. Ainda mais se considerarmos o estado de destruição nacional deixado por Bolsonaro. Lula faz um ótimo governo que precisa apenas ajustar o modo de comunicar e formar o seu povo. Não apenas com fatos que evidenciem que a vida está melhorando, mas com a adequada conscientização das massas sobre as razões pelas quais o povo merece ser soberano e artífice do seu próprio destino. As entregas não estão se traduzindo em aumento de popularidade de Lula e de sua gestão”.

Ou seja: o problema não estaria na conduta geral do partido e/ou do governo, mas sim na comunicação do que vem sendo feito.

Neste espírito, o texto faz algumas críticas ao governo Lula. 

Não críticas ao pacote de ajustes, nem ao fato de nossos indicados ao Banco Central estarem sendo cúmplices da política de Campos Neto, tampouco críticas à postura também cúmplice - com o golpismo - do ministro da Defesa, mas sim à atitude de “porta vozes” não nominados que expressariam “timidez” em  “travar abertamente o debate e a disputa política contra as forças conservadoras e reacionárias”.

O texto, sem referir-se a Lula ou a nenhum ministro específico, diz também que o governo “careceu de certa capacidade de diálogo com o partido, tanto para ouvir demandas internas quanto para orientar lideranças na luta política, em uma eleição dominada por máquinas municipais de aliados da base, não petistas, e abastecidas com emendas”.

O texto da CNB faz algumas propostas importantes: a “taxação do patrimônio dos super-ricos (...) deve ser central nas articulações do governo em 2025”, “bem como por outras pautas caras ao povo brasileiro, como a tarifa zero e o fim da escala 6x1”; a “meta defendida pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) de assentar 60 mil famílias em 2025”; a “prisão dos golpistas e o fim do projeto de anistia”; a “emenda constitucional que altera o artigo 142 sobre o funcionamento das Forças Armadas”.

O texto da CNB defende que, em 2025, o “governo deve se organizar olhando para quem estará ao lado da base em votações cruciais para nosso projeto de país, assim como no âmbito da disputa eleitoral de 2026”, afirmando que “não há governabilidade sem força social e no Congresso”.

Diz que o “o presidente também não deve abrir mão dos instrumentos de comunicação de que dispõe”; que é “urgente, inadiável, engajar-se no embate político contra a extrema direita”; que “brasileiros e brasileiras estão assustados com a escalada da violência urbana, patrocinada pelo crime organizado”; que “o PT deve ainda embrenhar-se na nova realidade do mundo do trabalho”; que seria preciso “compreender essa nova era de incertezas e dialogar com a nossa base, seja ela católica ou evangélica e, ao mesmo tempo, combater a falta de projeto da extrema direita”.

Na contramão da celebração, o texto chega a citar que  "povo não come PIB”, sendo hora de “imbuir nossa gente, outra vez, de esperança e ânimo para vislumbrar um futuro possível. O tempo é escasso e premente, porém”.

Cá entre nós: se o tempo é escasso e premente, então é porque nem tudo vai tão bem. 

Nesse espírito, o texto chega a reconhecer que “a pressão por cortes em gastos sociais emerge como uma ameaça constante ao bem-estar social”. 

Mas ao invés de reconhecer que o apoio ao austericídio envolve setores do próprio governo, o texto da CNB prefere relacionar a “pressão por cortes em gastos sociais” com a “a iminente e necessária troca de comando no Banco Central, um movimento que deve garantir que as políticas monetárias futuras estejam alinhadas com os objetivos de crescimento inclusivo e sustentável do governo Lula”.

Realmente, assim deveria ser. Mas as declarações de Galipolo, assim como os votos dos diretores do Banco Central, até agora não apontam neste sentido. Isso sem falar no apoio que o Planejamento e a Fazenda dão para a equivocada meta de inflação. Atitudes que de conjunto tornam inviável realizar um “processo radical de industrialização”, fundamental “para evitar que o país se limite a ser uma sociedade agrária, predominantemente exportadora de commodities — uma grande fazenda no cenário global”.

A dificuldade em reconhecer e combater a influência, inclusive dentro de nosso próprio governo, da direita neoliberal tradicional está relacionada a “prioridade inegociável” proposta pela CNB, a saber, “o enfrentamento resoluto contra o radicalismo violento da extrema direita bolsonarista”.

O problema, como demonstrou a eleição de São Paulo capital, é que a realidade é um pouco mais complexa. A extrema direita não se resume ao bolsonarismo; vastos setores da extrema direita estão aliadas com também vastos setores da direita tradicional; e sem combater o neoliberalismo, a extrema-direita continuará encontrando espaço para crescer.

É principalmente isso que torna muito difícil construir as “alianças que garantam a continuidade” de nosso projeto. Por isto, o fato do texto da CNB terminar dizendo que a vitória de Lula em 2026 depende das “articulações certas”, mostra que continuamos prisioneiros de um jeito de pensar a grande política que já demonstrou todas as suas limitações.


Segue o texto criticado, a saber, o projeto de Resolução da tendência Construindo um Novo Brasil apresentado à reunião do Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores 

Celebramos dois anos do resultado eleitoral que alçou o presidente Lula a um inédito terceiro mandato na história democrática brasileira e o Partido dos Trabalhadores à sua quinta vitória presidencial. Desde 1989, quando disputamos a primeira eleição presidencial com Lula, nosso partido garantiu que os trabalhadores brasileiros tivessem voz e viabilidade eleitoral ganhando cinco dos nove pleitos ocorridos após a democratização. Nosso governo foi eleito para representar estes interesses.

Por um lado, o povo trabalhador colhe os frutos de públicas voltadas ao crescimento soberano do país, com ênfase na reindustrialização e na transição ecológica, gerando aumento do emprego e da renda. Por outro, o Brasil acompanha, estupefato, os resultados das investigações da Polícia Federal sobre a tentativa de Golpe de Estado após as eleições presidenciais. O inquérito revelou, com um farto conjunto de provas, um plano macabro para assassinar o presidente Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, chocando a nação ao mostrar como o país esteve na iminência de mergulhar novamente nas trevas de uma ditadura militar.  

Nas últimas semanas, o noticiário oscilou entre as importantes conquistas econômicas do país e da população, os gols de placa da presidência brasileira do G20 – e o estarrecedor relatório da PF, com o indiciamento dos principais comandantes do golpe.

Os acertos do governo Lula são mais do que palpáveis e surpreendem pela rapidez com que tantos avanços foram alcançados. O país enfrentava um quadro de empresas quebrando ou pedindo concordata e de profunda penúria social, com 33 milhões de pessoas passando fome. O desemprego, herança dos quatro anos de Bolsonaro e Paulo Guedes, criou um cenário de angústia e desalento, com um legado de desastres, desde o meio ambiente até a segurança pública. 

Entre 2016 e 2022, sob Temer e Bolsonaro, o mercado de trabalho brasileiro foi devastado por políticas que desmantelaram garantias e direitos básicos e intensificaram as desigualdades. A reforma trabalhista de 2017, apresentada por Temer como uma solução para a criação de empregos, fracassou, resultando em um aumento do desemprego para 11,7% ao final de seu governo. Durante o governo Bolsonaro, a situação tornou-se ainda pior, com o desemprego disparando para 14,2%, revelando a ineficácia da administração em lidar com as necessidades urgentes dos trabalhadores e da juventude, cuja taxa de desocupação atingiu alarmantes 22,8%. 

Quase dois anos após a saída de Bolsonaro e Guedes, a situação é radicalmente oposta, com recordes no número de empregos gerados (o país ultrapassou a marca de 100 milhões de trabalhadores em meados do ano) e o desemprego está em queda constante. No terceiro trimestre deste ano, a taxa de desocupação recuou 0,5 ponto percentual, atingindo 6,4%, o menor nível desde o início da série histórica, em 2012, indicando que o país caminha para uma situação de pleno emprego. 


Mais do que isso: os empregos têm sido impulsionados pelo setor industrial, especialmente entre os jovens. Quase 35% das novas oportunidades de trabalho foram geradas pelo setor no terceiro trimestre, com a contratação de 418 mil trabalhadores. O resultado é fruto dos esforços do governo em implementar uma política industrial vigorosa e sustentável, materializada pela Nova Indústria Brasil (NIB), lançada no início do ano depois de um rigoroso diagnóstico dos efeitos da desindustrialização que varreu o país.  


Os tipos de empregos gerados pelo setor industrial, que frequentemente demandam habilidades técnicas especializadas, amplia o número de postos de trabalho de maior valor agregado. São empregos que não apenas oferecem salários mais elevados, mas também promovem inovação e eficiência, fatores essenciais para o desenvolvimento sustentável e a competitividade internacional da indústria brasileira.


O setor da construção civil vive um verdadeiro boom, impulsionado pelas obras do Minha Casa, Minha Vida. O mercado imobiliário cresceu 17,4% até o terceiro trimestre deste ano em comparação com o mesmo período de 2023. Simultaneamente, a construção registrou em outubro a maior utilização da capacidade operacional (UCO) para o mês nos últimos 11 anos, segundo a CNI. Mesmo com os avanços, a remuneração dos trabalhadores permanece inferior quando se compara com países desenvolvidos. 


O maior acesso ao crédito e o aumento do consumo indicam um cenário de aquecimento da economia, com o comércio projetando recorde de vendas neste final de ano. Não à toa, a confiança do consumidor em novembro chegou ao maior nível em uma década, segundo o FGV Ibre. 


A massa salarial cresceu R$ 21,952 bilhões em 12 meses, atingindo um recorde de R$ 327,743 bilhões no trimestre encerrado em setembro de 2024. Um incremento de 7,2% em comparação com o mesmo período do ano anterior, refletindo o fortalecimento do poder de compra das famílias.  


Ao mesmo tempo, em menos de dois anos, o governo Lula conseguiu libertar da fome mais de 24 milhões de brasileiras e brasileiros e tudo leva a crer que até o fim do mandato atual o país conseguirá de novo erradicar completamente a fome, como já havia ocorrido em 2014. Para que essa meta seja concluída, no entanto, é preciso combater a alta dos preços dos alimentos, que refletem os efeitos da crise climática sobre a cadeia produtiva.


O cenário só não é mais promissor devido à sabotagem deliberada do Banco Central de Roberto Campos Neto, que comanda a autarquia com viés político-partidário. É uma espécie de serviçal do sistema financeiro que atua inventando todo tipo de falsos pretextos para que o Comitê de Política Monetária (Copom) eleve os juros, em benefício dos banqueiros, e iniba a atividade econômica. Com a taxa Selic em 11,25%, e agentes do mercado pressionando por um aumento de 0,75%, toda a cadeia produtiva corre o risco de retroceder em relação aos seus excelentes resultados dos últimos 10 meses.  


A sociedade civil precisa manter-se vigilante e enfrentar as artimanhas da Faria Lima que visam minar conquistas econômicas e sociais por meio da especulação. No dia 27 de novembro, por exemplo, horas antes de o ministro Fernando Haddad anunciar o conjunto de medidas para melhorar o ambiente econômico e fiscal do país, especuladores promoveram a maior alta do dólar na história, que chegou a R$5,91. A especulação continuou elevando o dólar a patamares acima de R$ 6 nos dias seguintes. O método é claro: os especuladores agiram após ficarem sabendo que as medidas ficais do governo incluíam a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais. Trata-se de uma manobra claramente política para debilitar o governo e impedi-lo de continuar avançando no caminho do desenvolvimento e da justiça social.


Decisão, aliás, histórica. Ao propor a isenção para quem ganha até R$ 5 mil por mês e a taxação de quem ganha mais de R$ 50 mil, o governo Lula alívio significativo da classe média e das classes historicamente penalizadas pelo sistema tributário regressivo e injusto vigente no país. Inicia-se assim a maior reforma da renda já vista, corrigindo distorções estruturais para promover justiça tributária. A campanha contra os supersalários e as readequações nas aposentadorias e pensões de militares também representam uma contribuição necessária para isso.


Todos devem contribuir para um sistema mais equitativo e que garanta equilíbrio fiscal, inclusive os grandes grupos beneficiados por isenções fiscais que chegam a R$ 546 bilhões em 2024. As empresas aparecem em uma lista divulgada pelo Ministério da Fazenda, deixando evidente que, invariavelmente, os mesmos que exigem cortes de investimentos sociais são os que usufruem do não pagamento de impostos, notadamente grupos ligados ao agronegócio, entre outros setores beneficiados pelo Estado. Nunca é demais lembrar que, de janeiro a outubro, a desoneração da folha salarial de 17 setores custou R$ 19,8 bilhões ao governo. 


Lula e Haddad acertam ao expor a hipocrisia dos grandes grupos econômicos e ao propor a taxação dos mais ricos. A tributação de fundos em paraísos fiscais e offshores, conforme explicou o ministro Haddad, já permitiu ao governo aumentar expressivamente a arrecadação federal. Entre janeiro e outubro, a arrecadação atingiu R$ 2,218 trilhões, o maior valor da história. Além do estímulo à atividade econômica, a decisão de promover justiça tributária foi fundamental para esse resultado. 


Esses esforços soma-se à já histórica reforma tributária aprovada no governo Lula, após mais de 40 anos de espera da sociedade brasileira. Uma reforma que irá simplificar o sistema tributário com a unificação de tributos, eliminado o efeito cascata na cobrança, além de isentar de imposto a cesta básica e devolver parte dos impostos para população de baixa renda (cashback).


Ainda há, no entanto, um caminho a ser percorrido para concluir a reforma da renda, alcançando também os bilionários. A taxação do patrimônio dos super-ricos, que existe nas maiores economias do mundo, deve ser central nas articulações do governo em 2025. É um anseio antigo da sociedade brasileira, que está cansada de ver os herdeiros dos donos do poder sugarem as riquezas do país sem pagar sua justa contribuição. 


O PT segue atento a estes anseios, travando no Congresso a luta pela taxação dos super-ricos, bem como por outras pautas caras ao povo brasileiro, como a tarifa zero e o fim da escala 6x1. A tarifa zero, iniciativa do deputado federal Jilmar Tatto (PT-SP), foi uma das grandes bandeiras do PT nas últimas eleições municipais. Trata-se de um sistema único de mobilidade universal e gratuito, aos moldes do SUS, e que atua como um instrumento de dinamização e incremento das economias tanto nas pequenas quanto nas grandes cidades, sempre beneficiando a população.


O fim da escala 6x1, uma proposta que ganhou força graças a um debate amadurecido nas redes sociais, também recebeu amplo apoio do partido, historicamente defensor de condições dignas para os nossos trabalhadores. Prova disso é que o deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG) propôs, em 2019, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 221/2019) para reduzir a jornada de trabalho a 36 horas semanais. 


Os trabalhadores no campo também não devem ser esquecidos e, por isso, apoiamos a meta defendida pelo Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) de assentar 60 mil famílias em 2025. O governo precisa articular uma resposta à altura dessa justa e histórica reivindicação dos nossos irmãos e irmãs rurais.


O debate sobre a regulamentação das apostas online também precisa avançar rapidamente no Brasil, que se vê refém de um tentáculo do capitalismo que prospera às custas da boa-fé de milhões de famílias. Observamos uma devastadora erosão dos orçamentos domésticos de inúmeros lares brasileiros, especialmente aqueles de baixa renda, resultando em um impacto incalculável na saúde física e mental da população, vítima do crescente endividamento. 


Diante da gravidade da crise, a presidenta do PT, Gleisi Hoffmann, apresentou um projeto de lei para proibir a veiculação de propagandas de loterias de apostas. É imperativo que a sociedade não permita que o tema das bets passe despercebido. Essas apostas representam uma ameaça séria ao bem-estar do nosso povo, exigindo uma resposta firme e consciente para proteger as famílias brasileiras dessas armadilhas.


Em meio aos debates necessários sobre políticas para melhorar a vida do povo brasileiro no campo e nas cidades, um tema tornou-se central nas discussões das últimas semanas: o PL da Anistia. Diante das revelações estarrecedoras sobre um plano grotesco, elaborado por militares de alta patente para assassinar Lula, Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, é mais do que urgente, é dever de todo cidadão democrata, ajudar a sepultar a proposta para anistiar aqueles que tentaram ressuscitar os horrores dos anos de chumbo. Não admitiremos anistia a golpistas defensores da tortura. Bolsonaro e todos os que tramaram contra a democracia brasileira devem responder pelos crimes cometidos. 


Diante disso, a resposta democrática da sociedade deve ser uníssona: Sem anistia! Convocamos a sociedade a aderir em massa à mobilização nacional do próximo dia 10 pela prisão dos golpistas e o fim do projeto de anistia. 


Na atual conjuntura, o PT decidiu retomar a articulação para uma emenda constitucional que altera o artigo 142 sobre o funcionamento das Forças Armadas, como pretendem, acertadamente, os deputados Carlos Zarattini e Alencar Santana. A emenda, que já conta com 126 das 171 assinaturas necessárias para ser protocolada, estabelece que as Forças Armadas não possuem poder moderador sobre a democracia, umas das muitas fake news disseminadas pelo bolsonarismo. Além disso, militares da ativa devem ser impedidos de disputar eleições e ocupar cargos públicos. É preciso delimitar de uma vez por todas as funções civis e militares no Estado democrático. Política não é e nunca foi lugar para as Forças Armadas.


No campo da disputa eleitoral, o PT segue recuperando seu prestígio e a sua presença efetiva no território, que foi duramente afetada pela tentativa de destruição do partido promovido pela farsa da Lava Jato, com a prisão absurda de Lula, e pela sistemática campanha de desmoralização produzida pela mídia conservadora. Nas eleições municipais, mesmo abrindo mão de candidaturas próprias em muitos munícipios, para apoiar candidaturas dos partidos da base do Presidente Lula no Congresso Nacional, o PT passou de 183 para 252 prefeitos, vencendo inclusive numa capital importante como Fortaleza, e elegendo 3.118 vereadores e vereadoras em todo o país, 550 a mais que no pleito anterior. Entre eles, ganharam assentos nas câmaras municipais inúmeras mulheres periféricas, lideranças negras e da juventude, e representantes da comunidade LGBTQIA+, em um processo notável de renovação. O fato é que ampliamos o número de eleitores que votaram no PT em âmbito municipal, chegando a mais de 8,8 milhões de brasileiros. 


Poderíamos ter avançado bem mais? Sem dúvida. A conjuntura mostrou-se, entretanto, excessivamente desfavorável, não apenas pela capilaridade da extrema direita nas redes, sempre abastecidas por fundos de milhões de reais e dólares em infraestrutura. A violência política bateu recorde nas eleições e o PT nunca deixou de ser o alvo da vez. O crime organizado expandiu seus tentáculos a ponto de, nestas eleições, ter colocado candidatos competitivos em cidades vitais como São Paulo.


Inúmeras realizações da administração Lula foram eclipsadas pelo orçamento secreto, que levou o pacto federativo ao limite do absurdo e segue desafiando o modelo de presidencialismo vigente. Soma-se a isto as distorções no orçamento público herdadas do governo Bolsonaro, com destaque para o crescimento desproporcional  para R$ 50 bilhões em emendas parlamentares, com parte delas sendo impositivas, criando uma enforcamento na parte discricionária do orçamento.


As realizações do governo são extraordinárias, mas nem sempre isso é percebido adequadamente pela sociedade, devido à timidez de vários dos nossos porta vozes em travar abertamente o debate e a disputa política contra as forças conservadoras e reacionárias.


O governo careceu de certa capacidade de diálogo com o partido, tanto para ouvir demandas internas quanto para orientar lideranças na luta política, em uma eleição dominada por máquinas municipais de aliados da base, não petistas, e abastecidas com emendas.


Em 2025, o PT defende que o governo deve se organizar olhando para quem estará ao lado da base em votações cruciais para nosso projeto de país, assim como no âmbito da disputa eleitoral de 2026. Considerando a atual correlação de forças no Congresso, ampliar nossa bancada na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, considerando ainda a eleição de aliados. Não há governabilidade sem força social e no Congresso. 


Na esfera internacional, a vitória de Donald Trump nos Estados Unidos acende um preocupante alerta para as forças progressistas e o campo democrático global. Suas intenções proclamadas colocam em xeque direitos fundamentais da classe trabalhadora, dos negros, das mulheres, de milhões de migrantes nos EUA e em todo o mundo. Colocam em xeque, igualmente, a própria sobrevivência dos organismos multilaterais e de muitos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. 


Por outro lado, as eleições de Claudia Sheinbaum no México e, mais recentemente, de Yamandú Orsi no Uruguai trazem bons ventos para o campo progressista e as perspectivas de integração latino-americana.


Ressaltamos a consolidação das relações entre Brasil e China, através das  especiais  sinergias  estabelecidas entre as estratégias brasileiras de desenvolvimento , como o PAC, a Nova Indústria Brasil, o Plano de Transformação Ecológica e as Rotas Sul Americanas de Integração   com a estratégia chinesa de desenvolvimento e construção de um futuro compartilhado para a humanidade com a  Iniciativa da Nova Rota da Seda 


A liderança do presidente Lula reafirmou, mais uma vez, o protagonismo internacional do Brasil na cúpula do G20. Dentre os três temas propostas pela diplomacia brasileira, o combate as desigualdades, a transição energética, e a reforma da governança global, Lula acertou em cheio ao criar a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que recebeu a adesão de nada menos que 82 países, extrapolando os limites do bloco.


A Aliança merece visibilidade mundial porque é um chamado aos países ricos a saírem da inércia e da burocracia que caracterizam instituições multilaterais nas últimas décadas e partirem para a ação. Enquanto a ciranda financeira global arruina economias inteiras para tornar grupos minoritários bilionários, a exploração capitalista deixa um rastro de pobreza e endividamento sobre os países em desenvolvimento, em especial no continente africano. A fome é o mais abominável dos sintomas da doença capitalista e deve ser combatida com rigor, como mostrou ao mundo o presidente Lula.


Lula também fortaleceu sua imagem como um dos líderes mais sensíveis às mazelas sociais ao dar enorme visibilidade ao G20 Social. Pela primeira vez, a economia popular e solidária apareceu em uma Declaração Final do G20 Social, reforçando a importância da formalização do mercado de trabalho e das economias inclusivas, cooperativas e contra-hegemônicas, incluindo cozinhas solidárias e o reconhecimento da economia do cuidado.


Em 2025, na presidência dos BRICS e sediando a COP 30 no país, o governo Lula deverá seguir no caminho da construção do multilateralismo, da soberania, da paz e da justiça social, econômica e ambiental.


Internamente, é nítida a percepção e o reconhecimento de que a gestão Lula tem garantido muitas conquistas populares e apresenta excelentes resultados em inúmeras áreas. Ainda mais se considerarmos o estado de destruição nacional deixado por Bolsonaro. Lula faz um ótimo governo que precisa apenas ajustar o modo de comunicar e formar o seu povo. Não apenas com fatos que evidenciem que a vida está melhorando, mas com a adequada conscientização das massas sobre as razões pelas quais o povo merece ser soberano e artífice do seu próprio destino. As entregas não estão se traduzindo em aumento de popularidade de Lula e de sua gestão.


O presidente também não deve abrir mão dos instrumentos de comunicação de que dispõe. A utilização de transmissões em cadeia nacional de rádio e TV deveria ser uma constante nas atividades da Presidência e dos ministros e ministras que integram pastas cruciais, e não uma estratégia limitada a datas como o 7 de setembro.


Para isso, é urgente, inadiável, engajar-se no embate político contra a extrema direita. Corações e mentes jovens das favelas e subúrbios de médias e grandes cidades, que nunca souberam que o PIB cresceu 7,5% com Lula em 2010, anseiam por uma vida melhor. Seja na riqueza impossível prometida pelas apostas ou no empreendedorismo fajuto das novas pirâmides digitais, em esquemas patrocinados por usurpadores, embusteiros sociais e charlatães da política.


Brasileiros e brasileiras estão assustados com a escalada da violência urbana, patrocinada pelo crime organizado. O PT enaltece, portanto, os esforços de Lula ao apresentar, no mês passado, a PEC da Segurança Pública, abrindo caminho para o Sistema Único de Segurança Pública (Susp). 


O PT deve ainda embrenhar-se na nova realidade do mundo do trabalho, onde a linha fina entre empreender e ser explorado por empresas de aplicativos trouxe um véu de dúvidas sobre a cabeça de jovens trabalhadores. 


É preciso compreender essa nova era de incertezas e dialogar com a nossa base, seja ela católica ou evangélica e, ao mesmo tempo, combater a falta de projeto da extrema direita. Como nos ensina a saudosa Conceição Tavares, "povo não come PIB”. É hora de fincar nossa bandeira em cada uma dessas casas e reconduzir esse povo ao campo de quem sempre o defendeu: Lula e o PT. Urge imbuir nossa gente, outra vez, de esperança e ânimo para vislumbrar um futuro possível. O tempo é escasso e premente, porém. 


Como candidato à reeleição, Lula, nossa maior expressão, deve recalibrar toda sua sabedoria e liderança para o mundo digital, sintonizando-as novamente para absorver anseios, frustrações e mudanças pelos quais atravessa nossa juventude. O PT está empenhado nessa causa. A sincronia entre a experiência política e as novas dinâmicas sociais será crucial para reacender a chama do engajamento popular e fortalecer os laços entre o partido e as novas gerações.


Em um cenário em que as elites econômicas mantêm uma postura especulativa e frequentemente adversa aos interesses populares, a pressão por cortes em gastos sociais emerge como uma ameaça constante ao bem-estar social. Essa tensão se intensificou com a iminente e necessária troca de comando no Banco Central, um movimento que deve garantir que as políticas monetárias futuras estejam alinhadas com os objetivos de crescimento inclusivo e sustentável do governo Lula. 


Ao mesmo tempo, o enfrentamento resoluto contra o radicalismo violento da extrema direita bolsonarista permanece uma prioridade inegociável. Facções criminosas que buscam desestabilizar os alicerces democráticos do país devem ser contidas por meio de um esforço conjunto que envolva não apenas mobilização política e social, mas também a promoção de um discurso inclusivo de reafirmação de valores democráticos e dos direitos humanos.


A história das nações desenvolvidas mostrou que um processo radical de industrialização é fundamental para evitar que o país se limite a ser uma sociedade agrária, predominantemente exportadora de commodities — uma grande fazenda no cenário global. A industrialização não só potencializa a capacidade produtiva do país, mas também diversifica a economia, criando empregos com maior valor agregado e promovendo inovação tecnológica.


A compreensão profunda dos desafios políticos atuais e a articulação de estratégias eficazes para enfrentá-los são essenciais à medida que o Brasil se prepara para as eleições de 2026. Será um período decisivo não apenas para o PT, mas para a consolidação de um projeto de desenvolvimento soberano que priorize a justiça social, a equidade econômica e a sustentabilidade ambiental. O PT se encontra em uma posição privilegiada para redefinir o rumo do país, promovendo políticas que combatam a desigualdade e fortaleçam a participação democrática. É preciso construir as alianças que garantam a continuidade desse projeto.


É uma tarefa árdua, que envolve resistir às pressões de grupos que buscam minar as conquistas sociais e inovar na forma de engajar a sociedade civil, especialmente as novas gerações, em um projeto de desenvolvimento soberano. O caminho para um Brasil mais justo e próspero exige liderança audaciosa, disposição para o diálogo e um compromisso inabalável com os princípios democráticos. Somente assim, o Brasil poderá afirmar-se como um modelo de democracia vibrante e inclusiva, capaz de enfrentar os desafios do século XXI com ousadia e determinação, garantindo seu lugar como uma nação desenvolvida e respeitada no cenário mundial. Com as articulações certas, Lula será, outra vez, a liderança capaz de aglutinar o campo progressista e democrático em torno de um projeto soberano de nação.


quarta-feira, 4 de dezembro de 2024

Rosário e o pacote

Recomendo ler o texto de Miguel do Rosário, intitulado “O caos no debate econômico e a falta de trens no Brasil”;

O texto está aqui: 

https://www.ocafezinho.com/2024/12/04/o-caos-no-debate-economico-e-a-falta-de-trens-no-brasil/

Segundo Rosário, seria “saudável que tantos intelectuais e influencers queiram dar mostras de coragem e independência política, através de um posicionamento duro contra o que consideram erros do governo. Mas acho simplesmente inútil gastar energia com algumas coisas. Em minha humilde opinião, toda essa coragem e independência deveriam ser direcionadas para críticas a falta de investimento em infra-estrutura, especialmente na área de mobilidade urbana. (…) o problema brasileiro mais estratégico, e que mais corresponde à crítica de que falta ao governo um projeto nacional, é a falta de transporte sobre trilhos!”

Embora não concorde com o detalhe, concordo com o espírito: o principal problema do governo Lula está na seara do desenvolvimento.

Palavrinha, convém lembrar, que brilhou pela ausência no pronunciamento feito pelo ministro Haddad no dia 27 de novembro.

Temos algum crescimento, temos redução do desemprego, temos inúmeras outras coisas. 

Mas seguimos absolutamente distantes de ter uma política de desenvolvimento que mereça este nome.

Se depender do que vem sendo feito, continuaremos sendo uma subpotência primário-exportadora e paraíso da especulação financeira. 

O que Rosário não percebe é a relação direta que existe entre, por um lado, a ausência de desenvolvimento e, por outro lado, o chamado “arcabouço fiscal”.

O “arcabouço fiscal”, como o próprio Rosário reconhece, resulta de um “acordo” estabelecido “com os agentes econômicos (que financiam a dívida, dominam a opinião pública e exercem forte controle político sobre o congresso nacional), de praticar uma política fiscal responsável e sustentável”.

O resultado prático deste “acordo” é o seguinte: a dinâmica econômica do país continua governada pelo grande capital. 

E como as duas frações dominantes do grande capital são a financeira e a primário-exportadora, no que depender deste “acordo” o país seguirá sem desenvolvimento e sem bem-estar social.

Alguém pode perguntar: como alguém de esquerda pode firmar um acordo deste tipo? 

Na minha opinião, a resposta é: firmaram este “acordo” por acreditar que, em contrapartida, o lado de lá iria reduzir os juros, as grandes empresas privadas iriam ampliar os investimentos, os empregos gerados seriam de qualidade crescente e, no final das contas, ainda que devagar, iríamos ao longe.

Tudo isto com uma ajudinha dos Democratas USA.

Não foi bem isto o que aconteceu. Os juros não caíram, o setor privado é bem mais avaro do que se imaginava que seria, os empregos cresceram mas com remuneração muito baixa e exploração muito alta. 

Mesmo assim, como sabemos, o PIB cresceu e o desemprego caiu. Isto é motivo de comemoração para nós, mas é motivo de preocupação para a turma da especulação. E aí vem a sequência inflação, alta do dólar e alta dos juros, tudo posto na conta do suposto desequilíbrio fiscal.

Tem desequilíbrio fiscal? Não, não tem. 

Acontece que no tal “acordo” (leia-se, Novo Marco Fiscal ou, mais simplesmente, Arcabouço) foram estabelecidas metas demasiado ambiciosas. E, embora não tenha desequilíbrio fiscal, o governo  - para cumprir o tal “acordo” – é levado a fazer cortes.

Para a turma da especulação, estes cortes não seriam os verdadeiros cortes. Em parte por acreditar nisso, em parte simplesmente para ganhar dinheiro, a turma da Faria Lima mete a boca no trombone e aposta contra o Brasil, via câmbio e juros. Para eles, o “cara” seria Milei.

Já para uma parte da esquerda, os cortes são cortes. E recaem em grande medida sobre os setores populares. O que, além de ser injusto em si mesmo, não resolve nenhum problema, mas cria vários: não agrada a turma da especulação (vide pesquisa), não afeta os juros (que são a principal causa isolada de problemas fiscais), nem atinge como se deve e pode atingir os muito ricos. 

E Rosário?

Por um lado, Rosário desanca Milei e os que acreditam nele. No geral, nisso concordo com Rosário, tirante por exemplo o fato dele tratar o presidente argentino como “cachorro morto” (no sentido político da palavra, óbvio): infelizmente, não é assim.

Por outro lado, Rosário elogia a “política econômica responsável” do governo brasileiro, que segundo Rosário não levaria adiante “nenhum corte violento e cruel nas despesas com educação, saúde e assistência social”. Rosário reitera que o “esforço fiscal do governo não implicou em nenhum corte de despesas sociais”. 

Nesta questão discordo totalmente de Rosário. 

Aliás, ele precisa escolher: ou não teve “nenhum corte”; ou não teve “nenhum corte violento e cruel”.

Brincadeiras a parte, vamos ao nó da questão. Segundo Rosário, haveria um “caos cognitivo no debate. A direita acusa o governo de populismo econômico, enquanto uma parte da esquerda tenta pintar Haddad como um drácula neoliberal”. 

Como a esquerda é muito ampla, não sei exatamente de quem Rosário está falando; talvez seja do PSTU. 

Mas se queremos afastar o caos cognitivo, é preciso começar reconhecendo a realidade como ela é. 

Primeiro: o Brasil não tem e nunca teve algo que possa ser chamado de “Estado de bem-estar social”. Nosso salário mínimo, por exemplo, não dá conta de adquirir aquilo que a lei determina. Simplesmente não é verdade que o BPC e a Bolsa família “vão muito bem, obrigado”. Nosso problema segue sendo ampliar os investimentos sociais. 

Neste sentido, é contraditório – para quem é de esquerda - comemorar a avanço de 4% no PIB do terceiro trimestre e, ao mesmo tempo, determinar que o salário mínimo não poderá crescer 4%. Assim como é contraditório comemorar a queda do desemprego e, ao mesmo tempo, reduzir a taxa de crescimento do salário-mínimo, que é parâmetro de remuneração para boa parte dos novos empregos gerados.

Segundo: a melhoria dos indicadores econômicos e sociais, ocorrida desde 2003, tem várias causas. O Novo Marco Fiscal é uma delas? Ou é, assim como a taxa de juros, um freio de mão puxado? Podemos e devemos debater isto. Mas, ao menos no debate travado no PT, não me lembro de ninguém dizendo que “o novo arcabouço levaria a uma catástrofe social, com redução drástica das despesas”. 

O que foi dito é que o arcabouço funcionaria como uma trava e nos levaria a fazer cortes, exatamente porque algumas “despesas” cresceriam e ultrapassariam os limites previstos no Novo Marco Fiscal. E foi exatamente isto o que aconteceu.

Rosário, curiosamente, diz que “não houve corte social nenhum. Ao contrário, despesas com educação e saúde, que estavam acorrentadas ao teto de gastos, foram emancipadas pelo novo marco fiscal e aumentaram dramaticamente”. 

Tirante o “dramaticamente” - quem dera fosse verdade! -  o fato é que as despesas cresceram quando se tirou o Velho Teto, mas esbarraram nos limites autoimpostos pelo Novo Marco. Aconteceu exatamente o que vários disseram que iria ocorrer.

Se houve alguma “negação”, foi de quem – na época em que esse debate foi feito, em 2023 – garantiu que isso não ocorreria, pois supostamente as receitas cresceriam mais rápido.

Aproveito para registrar que Rosário utiliza alguns termos (“caos cognitivo”, “negação”, “neurastênico”) que me lembram certos debates travados em 2018, na época em que Rosário tinha uma ideia mais positiva acerca do Ciro Gomes. 

Vejamos o que diz Rosário: “Quem acompanhar distraidamente o debate neurastênico em certas bolhas da esquerda, pode acreditar que o governo fez cortes drásticos em programas como BPC, quando se deu exatamente o contrário. As despesas do governo com BPC, no acumulado dos últimos 12 meses até outubro, totalizaram R$ 111 bilhões, um aumento impressionante de 17% sobre igual período de 2023. E a evolução mensal das despesas com BPC vem crescendo muito este ano”. 

De fato, quem acompanhar distraidamente qualquer debate, tende a não entender nada. No caso do BPC, por exemplo, o que está em discussão não é o que ocorreu, mas sim o que pode vir a ocorrer se a proposta do governo for aprovada. 

Acontece que Rosário acha que “do ponto-de-vista estritamente fiscal, isso não é necessariamente bom, sobretudo se os filtros para a concessão do benefício não estiverem oferecendo a higidez necessária, ou seja, caso esteja havendo desvio desse recurso para pessoas que não precisam dele”. 

A linguagem utilizada por Rosário é curiosa: “não necessariamente”, “se não estiverem”, “caso esteja havendo”. Cá entre nós: como se sentir confortável em cortar benefícios de quem ganha tão pouco, com base em tantos senões condicionais?? 

Terceiro: Rosário fala da magnitude do orçamento federal, para concluir que o corte “não deve produzir nenhum efeito dramático nos serviços públicos”, “se devidamente diluído em diversos órgãos e despesas, com foco em corte de privilégios”. 

Do ponto de vista dos mercados (e de Rosário), pode ser pouco. Do ponto de vista dos que serão atingidos, que não serão os privilegiados, pode ser relevante. Mas e do ponto de vista político? Quais os efeitos do fato do governo e de parte da esquerda estarem sendo pautados pelo tema do ajuste, não pelo tema do desenvolvimento?

A esse respeito, Rosário afirma que “não me parece razoável, nem estratégico, que uma parte da esquerda transmita à opinião pública a impressão de que a questão fiscal não deva ser tratada com absoluta seriedade e rigor. Ademais a quem interessa vender a fantasia de que o governo Lula poderia estourar os gastos públicos sem nenhuma consequência em termos de ataque especulativo contra o valor da nossa moeda, contra os títulos da dívida, e sem que isso se transformasse numa crise política paralisante e destrutiva no congresso?”

Novamente, não sei quem da esquerda fala em tese contra "seriedade e rigor". Mas sei que o ataque especulativo já está ocorrendo, sem que os gastos públicos tenham estourado. Portanto, se o objetivo de ter “seriedade e rigor” é acalmar os mercados, só há duas alternativas: ou o ajuste fiscal permanente, na linha do que Haddad deu a entender nos últimos dias; ou mudar as regras do jogo, por exemplo lançando uma campanha pública por um imposto sobre grandes fortunas, mudando as metas de inflação e alterando os temos do arcabouço fiscal.

Se entendi direito, Rosário acha que isso seria lutar "contra moinhos de vento". Se for verdade, seus trilhos também serão vento.


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O caos no debate econômico e a falta de trens no Brasil

O debate nacional sobre a nossa economia política vem produzindo uma atmosfera de caos cognitivo que, definitivamente, não é saudável. 


De um lado, temos a mídia comercial e seus colunistas de economia acusando o governo Lula de praticar um populismo irresponsável. Este setor da sociedade recebeu a proposta de ajuste fiscal do governo com absoluto desprezo, por considerá-la mera perfumaria.

Nos últimos dias, pipocaram editoriais elogiosos ao governo Milei, por ter obtido superávit fiscal recentemente, mesmo que ao custo de derrubar a economia, elevar a pobreza e cortar drasticamente despesas sociais. O Banco Mundial estima que o PIB argentino deve desabar 3,5% em 2024. Bom lembrar que os indicadores macroeconômicos mais objetivos são aqueles que associam os números ao PIB. Não é racional, portanto, entender que uma política econômica está indo bem se o PIB está em queda livre. Poderíamos acrescentar que não é também humano pensar assim, porque isso equivaleria a comemorarmos uma perda de peso após a amputação de nossas pernas. 

A comparação das políticas econômicas de Brasil e Argentina, a propósito, atingiu um aspecto incrivelmente demencial, ainda mais depois que os dados fiscais do governo brasileiro, de outubro, registraram um forte superávit de R$ 40,8 bilhões.

Ou seja, o governo brasileiro está praticando uma política econômica responsável. O fato, porém, de não levar adiante nenhum corte violento e cruel nas despesas com educação, saúde e assistência social, parece despertar um ódio bestial nos colunistas neoliberais, talvez por não poderem satisfazer seu instinto sádico de assistir ao sofrimento da camada mais vulnerável da população.

O governo brasileiro, reitere-se, obteve um sólido superávit em outubro, e com isso, o déficit primário no acumulado de 12 meses registrou uma forte queda, de maneira que o ministro da Fazenda está cumprindo o acordo que estabeleceu com os agentes econômicos (que financiam a dívida, dominam a opinião pública e exercem forte controle político sobre o congresso nacional), de praticar uma política fiscal responsável e sustentável.




Entretanto, reitere-se, o esforço fiscal do governo não implicou em nenhum corte de despesas sociais. Mais importante: a economia está crescendo de maneira vigorosa. Os dados do PIB divulgados ontem pelo IBGE mostram um avanço de 4% no terceiro trimestre, sobre igual período de 2023, sendo que, desta vez, não é sequer o agronegócio que está contribuindo, e sim a indústria de transformação, o consumo das famílias e o investimento produtivo. O desemprego caiu para 6%, um dos menores níveis da nossa história. 

A preferência da mídia por Milei não apenas é puramente ideológica, como também não parece sequer fundamentada em dados objetivos. Nem deveríamos chamar de ideológica. É uma preferência antes mística, como se a mídia estivesse ouvindo conselhos de um cachorro morto. 

Por outro lado, temos uma boa parte da esquerda lutando contra moinhos de vento, presa a uma briga contra o arcaboSegue o texto comentado


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uço fiscal como se houvesse a mais remota possibilidade para derrubá-lo no congresso. Pior, ela parece em negação. Muitos preconizaram que o novo arcabouço levaria a uma catástrofe social, com redução drástica das despesas. Alguns até hoje estão presos nessa crítica, como se os dados não importassem. O fato, porém, é que não houve corte social nenhum. Ao contrário, despesas com educação e saúde, que estavam acorrentadas ao teto de gastos, foram emancipadas pelo novo marco fiscal e aumentaram dramaticamente. 

Há alguns ruídos curiosos. Quem acompanhar distraidamente o debate neurastênico em certas bolhas da esquerda, pode acreditar que o governo fez cortes drásticos em programas como BPC, quando se deu exatamente o contrário. As despesas do governo com BPC, no acumulado dos últimos 12 meses até outubro, totalizaram R$ 111 bilhões, um aumento impressionante de 17% sobre igual período de 2023. E a evolução mensal das despesas com BPC vem crescendo muito este ano. Do ponto-de-vista estritamente fiscal, isso não é necessariamente bom, sobretudo se os filtros para a concessão do benefício não estiverem oferecendo a higidez necessária, ou seja, caso esteja havendo desvio desse recurso para pessoas que não precisam dele. 

Concretamente, a política econômica de Fernando Haddad não é de austeridade. Tanto é que vem sendo atacado pelos setores mais liberais da opinião pública, incluindo aí uma forte onda de ataque especulativo vindo do mercado. A acusação da Faria Lima é a oposta: de que o governo Lula teria optado pelo “populismo econômico”. 

Daí a minha observação sobre o caos cognitivo no debate. A direita acusa o governo de populismo econômico, enquanto uma parte da esquerda tenta pintar Haddad como um drácula neoliberal. 

Acho importante também que as pessoas tenham uma noção melhor sobre a magnitude do orçamento federal. 

Nos últimos 12 meses, até outubro, o governo obteve uma receita líquida de R$ 2,12 trilhões, ou seja, de 2 trilhões e 120 bilhões de reais. As despesas, no mesmo período, corresponderam a R$ 2,47 trilhões. O cálculo do resultado primário é feito substraindo as despesas da receita líquida, chegando aos já mencionados R$ 225 bilhões de déficit.

Um corte de R$ 70 bilhões em dois anos, conforme proposto por Haddad, ou R$ 35 bilhões por ano (menos de 1,5% das despesas federais em 2024), se devidamente diluído em diversos órgãos e despesas, com foco em corte de privilégios, não deve produzir nenhum efeito dramático nos serviços públicos. 

Não me parece razoável, nem estratégico, que uma parte da esquerda transmita à opinião pública a impressão de que a questão fiscal não deva ser tratada com absoluta seriedade e rigor. Ademais a quem interessa vender a fantasia de que o governo Lula poderia estourar os gastos públicos sem nenhuma consequência em termos de ataque especulativo contra o valor da nossa moeda, contra os títulos da dívida, e sem que isso se transformasse numa crise política paralisante e destrutiva no congresso?

O exercício da crítica, por outro lado, é fundamental.  É saudável que tantos intelectuais e influencers queiram dar mostras de coragem e independência política, através de um posicionamento duro contra o que consideram erros do governo. 

Mas acho simplesmente inútil gastar energia com algumas coisas. Em minha humilde opinião, toda essa coragem e independência deveriam ser direcionadas para críticas a falta de investimento em infra-estrutura, especialmente na área de mobilidade urbana. Com a economia aquecida, os brasileiros estão precisando viajar mais, por razões de trabalho, e estão se deparando com o custo crescente das passagens aéreas. Conforme cresce a demanda, aumentam os preços. Eu realmente não consigo entender porque o Brasil não tem um grande projeto ferroviário! Esse é o gargalo principal do governo. Não é BPC, não é Bolsa família, que vão muito bem, obrigado. O problema do governo Lula é sua obsessão bizarra por automóveis, o que me parece um reflexo muito triste de um pensamento elitista que contaminou toda a burocracia partidária e governamental. Os quadros do governo federal tem suas passagens aéreas pagas pelo Estado. Não é o caso de nós, reles mortais do setor privado, ou dos setores mais humildes do serviço público, que representamos 99% da sociedade. 

Esse sim me parece o principal risco político vivido pelo governo Lula, o de ser visto como uma “casta” pela população. Temos milhões de pequenos empresários – inclusive eu, da área da comunicação -, e dezenas de milhões de trabalhadores,  que estamos perdendo muitas oportunidades porque estamos acorrentados a um modelo nacional de transporte baseado unicamente em carro, ônibus e avião. 

Não considero isso um problema trivial. Sem mobilidade urbana adequada, não se conseguirá completar o processo de modernização do país, aí incluindo a correção dos problemas de segurança pública, limpeza urbana e acesso mais ágil a serviços de saúde.

O problema brasileiro mais estratégico, e que mais corresponde à crítica de que falta ao governo um projeto nacional, é a falta de transporte sobre trilhos!