No dia 25 de junho, milhões de pessoas acompanharam à distância o julgamento, pelo STF, de dois habeas corpus impetrados pela defesa de Lula.
Nas redes sociais, muitas lideranças experientes manifestaram, de público e privadamente, grandes expectativas em uma vitória. Gilmar Mendes, anteontem tratado como canalha, chegou a ser citado como um grande aliado. E muita gente boa se surpreendeu com o voto contrário de Celso de Melo.
O que dizer desse comportamento, senão reconhecer que existe, na esquerda brasileira, uma corrente que simplesmente não consegue se libertar das ilusões?
Não se trata de uma pessoa, nem de um partido específico: é toda uma corrente ideológica, que aderiu ao “pensamento positivo”, segundo o qual gentileza gera gentileza, moderação gera moderação; conciliação gera conciliação.
São os que achavam que se a esquerda desistisse da revolução e da “ditadura do proletariado”, a direita desistiria dos golpes e das ditaduras militares.
Se a esquerda parasse de defender a expropriação dos capitalistas, estes aceitariam a distribuição de renda e poder.
Se a esquerda deixasse de lado o anti-imperialismo, os EUA e seus amigos europeus aceitariam a integração regional e respeitariam a soberania nacional.
Se a esquerda acreditasse no “estado de direito”, o outro lado abriria mão do “estado da direita”.
O que aconteceu, todos sabemos: o golpe de 2016, Lula preso, um cavernícola na presidência, o Brasil e a América Latina regredindo.
Apesar disso, a turma do pensamento positivo não desiste!!!
Nem pensar em autocrítica das ilusões!!!
Passaram a dizer que o golpe foi causado porque Dilma não soube “dialogar”; que as forças armadas apoiaram o golpe porque foram “provocadas” por certas atitudes inadequadas da esquerda; que a condenação e prisão de Lula foram obra de Moro e Dallagnol, não do partido do judiciário.
Que Lula “com certeza seria candidato”; que Haddad seria eleito se atraísse o centro; que Bolsonaro é fruto de um acidente imprevisto, não de um movimento organizado; que o governo é frágil e a liberdade de Lula está por um triz.
Que as revelações do Intercept vão virar o mundo de ponta-cabeça, que com certeza venceremos as eleições de 2022 e — crème de la crème — que o grande empresariado já se deu conta de que era feliz e não sabia.
Os “positivistas”, quando questionados, lembram com ares inteligentes, típicos de quem leu sem entender, daquela famosa boutade do Barão de Itararé: “tudo pode acontecer, inclusive nada”.
Os “positivistas” reclamam que não podemos ser cegos às contradições existentes no “campo adversário”. E, por fim, atacam o “negativismo” dos que supostamente acham que tudo sempre vai dar errado.
Onde estará a verdade?
Na prática.
E “a prática”, no caso, significa a luta de classes. E na luta de classes vale a máxima: se vis pacem para bellum. Se queres a paz, prepara-te para a guerra.
Lula pode ser libertado, Bolsonaro pode ser derrotado, nossos inimigos podem ser divididos, podemos voltar a governar o país.
Mas para isso, só há um caminho: lutar, lutar e lutar. E os que vivem no mundo das ilusões, não conseguem lutar adequadamente.
Não compreendem, por exemplo, que para derrotar o inimigo, é preciso conhecê-lo. Não subestimar sua força, não minimizar suas más intenções, não desconsiderar sua vontade de vencer.
Os que criticam as ilusões dos “positivistas” não são “negativistas”. São realistas. Não confundem seu desejo com os fatos. Guardam a vontade para organizar a luta. Luta que será mais ou menos longa, a depender do que ocorra no mundo, a depender das divisões na coalizão golpista e, principalmente, a depender de nossa capacidade de conscientizar, organizar e mobilizar a classe trabalhadora.
O sétimo congresso do PT será palco de muitas batalhas: da democracia contra a fraude; dos que desejam debate, contra os que querem uma mera votação; dos que defendem um partido de luta, contra os que defendem uma legenda eleitoral; dos que defendem um partido antissistêmico, contra os defensores de uma politicagem tradicional e fisiológica; dos que defendem uma oposição radical, contra os que defendem uma oposição frouxa; dos que defendem as reformas estruturais e o socialismo, contra os que defendem a social-democracia e o social-liberalismo.
Mas, além disso tudo, o congresso do PT será uma batalha entre “positivismo” e marxismo. Entre os cultivadores de ilusões e os semeadores de esperança.
Em tempos de guerra, a esperança é vermelha.
Que texto!!!!! Parabéns pela lucidez!
ResponderExcluirBom texto, um excelente ponto de partida para o debate e para a reorganização do PT, da esquerda, da oposição, da luta popular.
ResponderExcluirComentário lúcido e realista
ResponderExcluirComentário recheado de lucidez e animador.
ResponderExcluirQuando fiz mestrado na PUC/SP, Final da dec. 70 e início de 80, O bisturi literário de Demerval Saviani foi minha primeira paixão. Hoje fico feliz de sentir o mesmo quando leio o que Valter Pomar escreve. Quanta lucidez, realidade, luz para o caminho. Obrigada, Valter Pomar!
ResponderExcluirSenti muita esperança ao ler este texto. Agradeço ao Pomar a partilha do seu saber...
ResponderExcluirLímpido e lúcido.
ResponderExcluirExcelente texto, que sirva de ponto de partida para um grande debate no sétimo Congresso PT.
ResponderExcluirexcelente reflexão lúcida e bastante ferina. o positvismo e o marxismo são pólos contrários de uma leitura do real. há os positvistas realistas e há os marxistas negativistas. o fato é que se não construirmos uma unidade ampla das fôrças sociais de esquerdaq ( movimentos sociais e partidos politicos) que seja com um programa mínimo, de defesa intransigentes dos direitos sociais conquistados e a preserver, de denuncias e de resistencia a todo e a qualquer ataque aos direitos de expressão, de opinião, de defesa dos direitos sociais trabalhistas da defesa contra os preconceitos de raça. cor., gênero e de orientação sexual, da defesa radical da democracia, da defesa da soberania nacional e das riquezas nacionais, contra o desmatamento da amazonia, da defesa das terras e direitos dos povos indigenas, da prservação do meio ambiente e das reservas ecologias naturais e aréas protegidas ambientalmento e unidade politica contra os golpistas, fascistas bolsonaristas. Sem este esforço continuo e permanente das lideramças politicas e sociais, a esperança deixará de ser vermelha. pois a guera política contra a extrema direita está posta. não podemos nos envergonhar de sermos de esquerda e de lutarmos por um Brasil DEemocrático Justo Soberano e Socialista.
ResponderExcluirAs palavras bem colocadas, faz com que a expressão do que se propõe, seja vista de forma clara e coesa. No país das desigualdades sociais, onde uma forte ditadura se instalou sem que as pessoas percebessem, mas, que seus reflexos é público e notório, ante os comentários e imposições inpostas por gestos e ações pelas autoridades constituídas em nosso país.
ResponderExcluirMaravilhoso texto,grande contribuição para os debates
ResponderExcluirMais pra mais do que pra menos...Temos um problema (não gosto dessa palavra), sério no PT: Capacidade dirigente!....
ResponderExcluirO que seria então levar a luta por Lula Livre do ponto de vista prático e realista, sem ilusões? Quem estaria disposto a apostar por essa opção, que meios e recursos contam? E em que distinguiria essa estratégia do "pensamento positivo"? Lula, de fato a única liderança política, está de acordo com essa mudança de atitude e estratégia que consiste basicamente em sair do "paz e amor" para uma atitude e uma estratégia em linha com a velho citação maquiavélica?
ResponderExcluir