sexta-feira, 29 de maio de 2020

As origens e desafios atuais do Programa Democrático e Popular

Roteiro da aula "As origens e desafios atuais do Programa Democrático e Popular"
29 de maio, 19h00

Me foi solicitado que falasse com vocês sobre as origens e desafios ATUAIS do programa democrático e popular.
A questão que me proponho a discutir é: porque alguns falam de “programa socialista”, de “estratégia socialista”, de “governo socialista” e outros falam de “programa democrático-popular”,  de “estratégia democrático-popular”, de “governo democrático popular”.
E ainda: porque para alguns estes termos querem dizer coisas completamente diferentes, enquanto outros consideram que se trata de duas maneiras diferentes de dizer praticamente a mesma coisa?
Para responder esta questão, vamos voltar a 1905, a um livro publicado por Lenin, intitulado “Duas táticas da social-democracia na revolução democrática”.
Não vou falar do conteúdo do livro, vou falar do título.
Lenin fala de duas táticas. Na linguagem moderna, a gente falaria de duas ESTRATÉGICAS. Na época, 1905, o termo estratégia ainda não havia se generalizado como parte do vocabulário utilizado na política. As pessoas usavam o termo tática no sentido de estratégia (como fazer para ganhar uma guerra); e também usavam o termo tática no sentido de tática mesmo (como fazer para ganhar uma batalha).
Lenin também fala de revolução democrática. Revolução democrática queria dizer revolução BURGUESA. E quando ele falava de duas táticas, ele estava se referindo a duas políticas, que conduziam a dois tipos diferentes de revolução democrática. Ambas seriam burguesas. Uma seria protagonizada pela grande burguesia. Outra seria protagonizada pelo campesinato.
Lenin defendia que a revolução democrática protagonizada pelo campesinato deveria ser apoiada pelo proletariado. E admitia inclusive que pudesse existir, por um certo tempo, um governo revolucionário conjunto, do proletariado e do campesinato. Lenin dava a esta hipotético governo (que não ocorreu em 1905, mas ocorreu em 1917) um nome que ele mesmo dizia ser horroroso, uma fórmula algébrica: DITADURA DEMOCRÁTICO REVOLUCIONÁRIA DO PROLETARIADO E DO CAMPESINATO.
Lenin defendia, para horror dos mencheviques, que o proletariado poderia cumprir um papel hiper ativo numa revolução DEMOCRÁTICA, ou seja, NUMA REVOLUÇÃO DEMOCRÁTICO BURGUESA. Por que? Porque ele achava que, fazendo isto, o proletariado estaria radicalizando e acelerando o processo, tornando mais fácil a etapa seguinte, a luta pelo socialismo.
Neste exemplo que eu dei já fica claro de que problemática surgiu o termo democrático popular: revolução democrática... revolução democrático-popular... revolução socialista.
Lenin poderia ter dito: duas táticas, uma conduz a uma revolução democrático burguesa, outra conduz a uma revolução democrático popular.
Mas atenção: nesse momento, Lenin imagina o seguinte cenário: os operários vão apoiar o campesinato, farão uma revolução democrática hiper radical, mas em algum momento a aliança vai se romper, os antigos camponeses continuarão defendendo o capitalismo e os operários defenderão o socialismo.
Neste caso, portanto, a revolução democrático-popular é uma coisa e a revolução socialista é outra coisa.
Agora vamos dar um salto de 12 anos, vamos para 1917.
Nas Teses de Abril e em outros textos, Lenin vai defender algo FORMALMENTE parecido com o que ele defendeu em 1905, mas há uma mudança fundamental.
Em 1905 ele defende que o proletariado apoie o campesinato para radicalizar a revolução burguesa, para tornar mais rápida a passagem para uma segunda etapa, onde se dará a realização das demandas socialistas do proletariado.
Em 1917 ele defende que o proletariado SE apoie no campesinato para realizar uma revolução socialista, que vai atender as demandas democráticas do campesinato.
Não nos importa aqui discutir os detalhes do problema, mas apenas atentar para que nesse momento ressurge a noção do democrático-popular, agora como duas coisas simultâneas:
-continua sendo uma modalidade de revolução democrático-burguesa
-mas agora é uma revolução democrático-burguesa que se dá como PARTE de uma revolução socialista
Neste caso, portanto, a revolução democrático-popular e a revolução socialista fazem parte do mesmo processo. Não são a mesma coisa, mas também não são coisas distintas no tempo e no espaço.
Agora vamos dar mais um salto no tempo e vamos até 1920, no II Congresso da Internacional Comunista.
Neste Congresso houve uma comissão que debateu a Questão Colonial e coube a Lenin apresentar o relatório da comissão para o plenária do Congresso.
Vejamos um pedaço do que ele disse, no dia 26 de julho: “gostaria de sublinhar particularmente a questão do movimento democrático-burguês nos países atrasados. Esta foi precisamente a questão que suscitou algumas divergências. Discutimos sobre se, do ponto de vista dos princípios e da teoria, era ou não correcto declarar que a Internacional Comunista e os partidos comunistas devem apoiar o movimento democrático-burguês nos países atrasados; em resultado desta discussão chegámos à decisão unânime de que deve falar-se de movimento revolucionário nacional em vez de movimento «democrático-burguês». Não resta a menor dúvida de que qualquer movimento nacional só pode ser democrático-burguês, pois a massa principal da população nos países atrasados é constituída pelo campesinato, que representa as relações capitalistas burguesas. Seria utópico pensar que os partidos proletários, se é que eles podem surgir em geral em tais países, são capazes de aplicar nestes países atrasados uma táctica comunista sem manter determinadas relações com o movimento camponês e sem o apoiar na prática. Mas aqui foram feitas objecções de que se falássemos de movimento democrático-burguês se apagaria qualquer diferença entre os movimentos reformista e revolucionário. Entretanto, nos últimos tempos esta diferença manifestou-se nos países coloniais e atrasados com inteira clareza, porque a burguesia imperialista procura com todas as forças implantar o movimento reformista também entre os povos oprimidos. Entre a burguesia dos países exploradores e a dos coloniais verificou-se uma certa aproximação, pelo que, muito frequentemente - e talvez mesmo na maioria dos casos - a burguesia dos países oprimidos, apesar de apoiar os movimentos nacionais, luta ao mesmo tempo de acordo com a burguesia imperialista, isto é, juntamente com ela, contra todos os movimentos revolucionários e as classes revolucionárias. Na comissão isto foi demonstrado de forma irrefutável, e nós considerámos que a única coisa correcta era ter em atenção esta diferença e substituir em quase toda a parte a expressão «democrático-burguês» pela expressão «revolucionário-nacional». O sentido desta mudança consiste em que nós, como comunistas, só devemos apoiar e só apoiaremos os movimentos libertadores burgueses nos países coloniais nos casos em que esses movimentos sejam verdadeiramente revolucionários, em que os seus representantes não nos impeçam de educar e organizar num espírito revolucionário o campesinato e as amplas massas de explorados. Mas se não existirem essas condições, os comunistas devem lutar nestes países contra a burguesia reformista, à qual também pertencem os heróis da II Internacional. Nos países coloniais existem já partidos reformistas, e os seus representantes dizem-se por vezes sociais-democratas e socialistas. A distinção mencionada foi aplicada a todas as teses, e penso que graças a isto o nosso ponto de vista está agora formulado de um modo mais preciso”.
Notem que aqui aparece um outro conceito, para abordar uma outra situação.
Em 1905 Lenin falava de revolução democrática camponesa com apoio do proletariado, em 1917 ele falará de revolução socialista com apoio do campesinato, mas nos dois casos ele está falando da Rússia, uma das grandes potências do mundo e um país imperialista.
Em 1920, no texto que acabo de ler, ele está falando dos países coloniais. E nesses países ele introduz uma diferença entre a movimento democrático-burgues e movimento revolucionário nacional.
Notem que a base do raciocínio é o mesmo: nos dois casos, onde está a grande burguesia, está a alternativa menos radical; e onde está o camponês, está a alternativa mais radical, que deve ser apoiada pelos proletários e comunistas.
Qual a diferença então? Por qual motivo ele não usa os termos de 1905? Por qual motivo ele não sua os termos de 1917? Um motivo é óbvio: a Rússia não era um país colonial. Nos países colonizados, a questão NACIONAL (a independência) era a divisora de águas.
Mas e a questão, digamos, econômico-social?
No mesmo relatório, um pouco mais adiante, Lenin dirá o seguinte: “O trabalho prático dos comunistas russos nas colónias anteriormente pertencentes ao tsarismo, em países tão atrasados como o Turquestão e outros, colocou perante nós a questão de como devem ser aplicadas a táctica e a política comunistas em condições pré-capitalistas, pois o traço característico mais importante destes países é o facto de neles dominarem ainda as relações pré-capitalistas, e por isso não se pode sequer falar ali de um movimento puramente proletário. Nestes países quase não há proletariado industrial. Apesar disto, também ali temos assumido e devemos assumir o papel de dirigentes. O nosso trabalho mostrou-nos que nestes países é preciso vencer dificuldades colossais, mas os resultados práticos do nosso trabalho mostraram também que, apesar destas dificuldades, se pode despertar nas massas a aspiração a um pensamento político independente e a uma actividade política independente também lá onde quase não há proletariado. (...) Compreende-se perfeitamente que os camponeses, que se encontram numa dependência semifeudal, possam assimilar muito bem a ideia da organização soviética e realizá-la na prática. É igualmente claro que as massas oprimidas, exploradas não só pelo capital mercantil mas também pelos feudais e por um Estado que assente sobre bases feudais, podem também aplicar esta arma, este tipo de organização nas condições em que se encontram. A ideia da organização soviética é simples e pode ser aplicada não só às relações proletárias mas também às relações camponesas feudais e semifeudais”.
Notem: ele está defendendo que a organização SOVIÉTICA, ou seja, através de CONSELHOS, organismos de democracia direta, não é unicamente aplicável em países capitalistas que estão vivendo situações de revolução socialista. Mas também em situações pré-capitalistas.
Lenin fala também o seguinte: “os Sovietes camponeses, os Sovietes dos explorados são um instrumento útil não só para os países capitalistas, mas também para os países com relações pré-capitalistas, e que a propaganda da ideia dos Sovietes camponeses, dos Sovietes de trabalhadores, em toda a parte, tanto nos países atrasados como nas colónias, é um dever incondicional dos partidos comunistas e dos elementos que estão dispostos a criar partidos comunistas; e lá onde as condições o permitam devem tentar imediatamente a organização de Sovietes do povo trabalhador. (...) “o proletariado dos países avançados pode e deve ajudar as massas trabalhadoras atrasadas e que o desenvolvimento dos países atrasados poderá sair da sua etapa actual quando o proletariado vencedor das repúblicas soviéticas estender a mão a essas massas e puder prestar-lhes apoio. (...)
Note que estamos diante de um novo problema: quando voce tem países pré-capitalistas ajudados por países socialistas, como voce chama o tipo de sociedade que existe nesses países? Como voce chama o processo revolucionário que cria este tipo de situação?
Não dá para chamar APENAS de “capitalistas”, mas também não dá para chamar AINDA de socialistas.
Sabendo isto, Lenin fala o seguinte: "A questão foi colocada do seguinte modo: poderemos considerar correcta a afirmação de que o estágio capitalista de desenvolvimento da economia nacional é inevitável para os povos atrasados que estão agora a libertar-se e entre os quais se observa agora, depois da guerra, um movimento na via do progresso? Respondemos negativamente a esta questão. Se o proletariado revolucionário vitorioso realizar entre eles uma propaganda sistemática e os governos soviéticos forem em sua ajuda com todos os meios de que dispõem, é errado supor que o estágio capitalista de desenvolvimento é inevitável para os povos atrasados. Em todas as colónias e países atrasados devemos não só formar quadros independentes de combatentes, organizações partidárias, não só realizar uma propaganda imediata pela organização de Sovietes camponeses e procurar adaptá-los às condições pré-capitalistas, mas a Internacional Comunista deve estabelecer e fundamentar teoricamente a tese de que os países atrasados, com a ajuda do proletariado dos países avançados, podem passar ao regime soviético e, através de determinadas etapas de desenvolvimento, ao comunismo, evitando o estádio capitalista de desenvolvimento”.
Viram a frase: “os países atrasados, com a ajuda do proletariado dos países avançados, podem passar ao regime soviético e, através de determinadas etapas de desenvolvimento, ao comunismo, evitando o estádio capitalista de desenvolvimento”.
Ou seja: ele está agora falando da possibilidade de um CAMINHO ao COMUNISMO, que não seria o mesmo da Rússia, nem o mesmo caminho dos demais capitalistas avançados.
Porque ele não chama de SOCIALISMO, simplesmente?
Ele vai falar de “regime soviético”, entendendo por isto um regime de “sovietes camponeses”, que ele mesmo falou antes que a “massa principal da população nos países atrasados é constituída pelo campesinato, que representa as relações capitalistas burguesas”.
As vezes parece uma salada de conceitos, de categorias, mas existe uma certa ordem nesta confusão, o que nós podemos chamar de “estacas no pântano”.
Estaca 1: países pré-capitalistas, onde o campesinato é maioria explorada, a tarefa é libertar os camponeses da exploração, torna-los proprietários livres;
Estaca 2: onde o pré-capitalismo for combinado com a exploração colonial, é preciso fazer um movimento nacional para acabar com a condição colonial, mas novamente quem pode fazer um movimento verdadeiramente radical nesse sentido são os camponeses;
Estaca 3: nos dois casos, mesmo que os camponeses protagonizem, se ficar só nisso, o desfecho poderá ser o desenvolvimento capitalista;
Estaca 4: mas se os camponeses se organizarem em sovietes, se os camponeses contarem com o apoio dos comunistas, se os camponeses contarem com o apoio do Estado socialista (no caso, a URSS), então será possível chegar “através de determinadas etapas de desenvolvimento, ao comunismo, evitando o estádio capitalista de desenvolvimento”.
Portanto, notem que estamos diante de algo parecido, mas diferente, do que foi dito em 1905 e do que foi dito em 1917.
Em 1905 ele defende que o proletariado RUSSO apoie o campesinato para radicalizar a revolução burguesa, para tornar mais rápida a passagem para uma segunda etapa, onde se dará a realização das demandas socialistas do proletariado, em transição ao comunismo.
Em 1917 ele defende que o proletariado RUSSO SE apoie no campesinato para realizar uma revolução socialista, que vai atender as demandas democráticas do campesinato, em transição ao comunismo.
Em 1920 ele defende que o proletariado RUSSO e mundial apoie o campesinato dos países atrasados e colonizados, para realizar um caminho alternativo de transição ao comunismo.
Alguns anos depois, quando Lenin já tinha morrido, outro congresso da Internacional Comunista tenta por ordem nesta taxonomia e aprovam a seguinte resolução:

Como vocês podem ver, a ideia de uma estrada reta capitalismo/socialismo/comunismo já está virando um caminho de rato, com vários caminhos paralelos, com vias elevadas e com vias subterrâneas, caminhos mais longos e outros mais curtos, com estradas de mão única, duas mãos, várias pistas e por aí vai.
A próxima parada nessa nossa arqueologia do termo democrático-popular é a China, um texto escrito por Mao Zedong e publicado, segundo consta, no dia 15 de janeiro de 1940 na revista Cultura Chinesa, sob o título POLITICA E CULTURA DA NOVA DEMOCRACIA.
Vejam esse trecho do texto: “Desde as dinastias de Chow e Chin, a China tem sido uma sociedade feudal. Sua política e sua economia têm tido esse caráter. Assim também tem sido sua cultura — reflexo de sua política e de sua economia.
Contudo, desde a agressão do capitalismo estrangeiro e desde que alguns elementos capitalistas começaram gradualmente a crescer na sociedade chinesa, isto é, nos cem anos decorridos desde a Guerra do Ópio até a atual guerra anti-japonesa, a China tornou-se, passo a passo, uma sociedade colonial, semi-colonial e semi-feudal. Atualmente, nos territórios ocupados, nossa sociedade é de caráter colonial; nas áreas não-ocupadas. é semi-colonial; enquanto em ambos os lados predomina ainda o sistema feudal. Esta é a fisionomia da sociedade chinesa de nossos dias; por outras palavras, sua «condição nacional». A política e a economia dominantes são portanto de caráter colonial, semi-colonial semi-feudal; e assim também é a cultura.
Essa política, essa economia e essa cultura dominantes são os objetivos visados por nossa revolução. São a velha política, a velha economia e a velha cultura coloniais, semi-coloniais e semi-feudais que nós visamos eliminar, para em seu lugar estabelecermos algo de precisamente oposto: nova política, nova economia e nova cultura.
Qual seria, então, o conteúdo da nova politiea e da nova economia da nação chinesa? E qual o conteúdo da nova cultura?
O processo histórico da revolução chinesa deve ser dividido em dois estágios: primeiro, a revolução democrática, e depois a revolução socialista — dois processos revolucionários de caráter inteiramente diferente. A democracia aqui mencionada não é a velha democracia, a democracia do velho tipo, mas a Nova Democracia, a democracia de novo tipo.
Pode-se concluir, portanto, que a nova política, a nova economia a nova cultura da nação chinesa nada mais são do que a política, a economia e a cultura da Nova Democracia.
Esta é a característica histórica da atual revolução chinesa. Todo aquele que, estando empenhado no trabalho revolucionário na China, não compreender esta característica histórica, não será capaz de dirigir a revolução ou de conduzí-la à vitória. Pelo contrário, será desprezado pelo povo e acabará inevitavelmente num lamentável fracasso.
Qual a novidade? O que virá em seguida:
IV - A Revolução Chinesa é Parte de Revolução Mundial
A característica histórica da revolução chinesa é que ela se divide em duas etapas: a revolução democrática e a revolução socialista. A democracia da primeira etapa não é uma democracia no sentido geral, mas um tipo novo, especial, de estilo chinês, a Nova Democracia. Como foi então formada esta característica histórica? Ela existiu primitivamente durante os últimos cem anos ou só apareceu depois?
Um estudo superficial do desenvolvimento histórico da China e do mundo revelará que tal característica histórica não existia nos dias da Guerra do Ópio ou no período que a seguiu imediatamente, e só tomou forma depois da primeira guerra imperialista mundial e da Revolução Russa de Outubro. Detenhamo-nos agora no estudo do processo de sua formação.
É evidente que se a atual sociedade da China é de caráter colonial, semi-colonial e semi-feudal, o processo da revolução chinesa deve ser dividido em duas etapas: a primeira etapa é a que visa transformar a sociedade colonial, semi-colonial e semi-feudal numa sociedade independente e democrática, enquanto que a segunda etapa visa impulsionar a revolução para diante a fim de construir uma sociedade socialista, o que estamos realizando agora é a primeira etapa da revolução chinesa.
Pode-se dizer que a primeira etapa começou nos dias da Guerra do Ópio em 1840, isto é, no tempo em que a sociedade chinesa principiava a modificar-se, de sua forma feudal original, para a forma semi-colonial e semi-feudal. Durante este período, tivemos a Revolução de Tai-Ping, a Guerra Sino-Francesa, a Guerra Sino-Japonesa, o Movimento Reformador de 1898, a Revolução de 1911, o Movimento de 4 de maio, o Movimento de 30 de maio, a Expedição do Norte, a Revolução Agrária, o Movimento de 9 de dezembro e a atual Guerra Anti-Japonesa. Todos esses movimentos, de um certo ponto de vista, visaram a realização da primeira etapa da revolução chinesa. Foram movimentos do povo chinês, em períodos diferentes e com diferentes graduações, tendendo para este objetivo — combater o imperialismo e o feudalismo e lutar pelo estabelecimento de uma sociedade democrática independente. A Revolução de 1911 foi apenas a sua realização num sentido mais concreto. Esta revolução, pelo seu caráter social, era democrático-burguesa e não social-proletária. Ela ainda não foi concluída e exige, assim, nosso continuado esforço, porque os inimigos desta revolução ainda estão extremamente fortes na atualidade. Ao aludir à revolução, dizia o dr. Sun Yat-Sen: «A revolução ainda não está terminada e a ela nossos camaradas devem continuar dando seus esforços». Referia-se êle a esta revolução democrático-burguesa .
Ocorreu uma transformação na revolução democrático burguesa da China, depois da irrupção da primeira guerra imperialista mundial e da construção do Estado socialista na sexta parte do mundo, com a vitória da Revolução Russa de Outubro de 1917.
Antes disso, a revolução democrático-burguesa chinesa pertencia à categoria da velha revolução democrático-burguesa mundial e dela fazia parte. A partir daquela época, a revolução democrático-burguesa chinesa tem modificado o seu caráter e pertence agora à categoria da nova revolução democrático-burguesa. No que diz respeito à frente revolucionária, ela é uma parte da revolução socialista-proletária mundial.
Por que? Porque a primeira guerra imperialista mundial e a vitoriosa Revolução Socialista de Outubro modificaram a trajetória do mundo, traçando uma nítida linha divisória entre as duas etapas históricas.
Na época em que o capitalismo mundial entra em colapso numa sesta parte do globo, enquanto em outras partes tem revelado claramente sintomas de decadência; quando a parte restante do mundo capitalista não pode continuar sem depender, mais do que nunca, das colônias e semi-colônias; quando o Estado Socialista está consolidado e proclama sua decisão de ajudar a luta dos movimentos de libertação de todas as colônias e semi-colônías; e quando o proletariado dos países capitalistas está se libertando dia a dia da influência dos partidos social-democratas imperialistas e também se declara desejoso de ajudar esse movimento de libertação; numa tal época, qualquer revolução das colônias e semi-colônias contra o imperialismo ou o capitalismo internacional, não pode mais pertencer à categoria da velha revolução mundial democrático-burguesa, mas sím a uma nova categoria. Não é mais parte da velha revolução mundial burguesa ou capitalista, mas da nova revolução mundial — a revolução socialista-proletária. Esta espécie de colônias semi-colônias revolucionárias não devem ser consideradas aliadas da frente contra-revolucionária do capitalismo mundial, mas sim aliadas da frente da revolução socialista mundial.
Ainda que, de acordo com o seu caráter social, a primeira fase da primeira etapa desta revolução colonial e semi-colonial seja fundamentalmente democrático-burguesa, e seus objetivos concretos sejam afastar os obstáculos que impedem o desenvolvimento do capitalismo, esta espécie de revolução não é mais do velho tipo, dirigido somente pela classe burguesa e visando simplesmente o estabelecimento de uma sociedade capitalista ou de um país sob a ditadura da classe burguesa, mas sim de um novo tipo dirigido inteira ou parcialmente pelo proletariado e objetivando o estabelecimento de uma nova sociedade democrática ou de um país governado, em sua primeira etapa, pela aliança de diversas classes revolucionárias. Este tipo de revolução, devido às variações da situação do inimigo e nas condições desta aliança, pode ser dividido num certo número de fases durante o seu processo, mas nenhuma mudança ocorrerá em seu caráter fundamental, que será o mesmo até o advento da revolução socialista.
Este tipo de revolução é um grande golpe no imperialismo, e por isso não é admitido e sim combatido pelos imperialistas. Em contraposição, é admitido pelo socialismo apoiado pelo Estado Socialista e pelo proletariado socialista internacional. Assim, este tipo de revolução tornou-se parte integrante da revolução mundial sociafista-proletária.
«A revolução da China faz parte da revolução mundial». Esta acertada tese foi proposta desde 1924-1927, durante o período da Grande Revolução da China. Ela foi apresentada pelos comunistas e aprovada por todos que participavam na luta anti-ímperiaíista e anti-feudal naquela épóca. Sucedia apenas que o significado da teoria não estava muito desenvolvido ainda, e o que nós possuíamos era somente uma compreensão nebulosa da questão. Lembro-me de que quando o sr. Chiang Kaí-Shek falou em Swatow, em 1925, durante a sua expedição contra Chen Chiung-Ming, êle também disse: «A revolução da China faz parte da revolução mundial».
Esta «revolução mundial» não é a velha revolução mundial burguesa, que há muito já ficou para trás, mas sim a nova revolução mundial, a revolução socialista. Do mesmo modo, essa «parte» não signifíca uma parte da velha revolução burguesa, porém uma parte da nova revolução socialista. Isto constitui uma modificação extraordinàriamente grande, uma modificação sem precedentes na história do mundo, em geral, e na história da China, em particular.
Baseando-se na acertada teoria de Stálin foi que os comunistas chineses apresentaram esta justa tese. Já em 1918 dizia Stálin, em artigo comemorativo do primeiro aniversário da Revolução de Outubro:
«São os seguintes os três aspectos mais importantes da grande significação mundial da Revolução de Outubro. Em primeiro lugar, ela amplia o alcance do problema nacional, começando pelo problema particular da luta contra a opressão nacional e indo até o problema geral da libertação dos povos oprimidos, colônias e semi-colônias, do jugo do imperialismo. Em segundo lugar, amplia a possibilidade e abre o verdadeiro caminho para esta libertação, favorece em grande parte o trabalho de libertação dos povos oprimidos ocidentais e orientais, atraindo-os para a frente comum da luta vitoriosa contra o imperialismo. Em terceiro lugar, lança uma ponte entre o Ocidente socialista e o Oriente escravizado, isto é, estabele uma nova frente revolucionária anti-imperialista, ligando o proletariado ocidental e os povos oprimidos orientais através da Revolução Russa» (1).
Desde a publicação desse artigo, Stálin tem desenvolvido continuamente a teoria a respeito da revolução colonial e semi-colonial, procurando diferenciá-la do velho tipo de revoluções e da sua transformação numa parte da revolução socialista-proletária. Esta teoria foi expljcada mais clara e corretamente num artigo publicado em 30 de junho de 1925, quando Stálin sustentava uma polêmica com os nacionalistas iugoslavos daquela época. O artigo, intitulado «Mais Uma Vez o Problema Nacional», dizia em certa parte:
«O camarada Semich refere-se a uma passagem do folheto de Stálin «O Marxismo e o Problema Nacional», escrito no fim de 1912. Ali está dito que «a luta nacional é uma luta das classes burguesas entre si». Com isto, êle parece insinuar a correçào de sua própria fórmula para definir a significação social do movimento nacional nas presentes condições históricas. Mas o folheto de Stálin foi escrito antes da guerra imperialista, numa época em que a questão nacional não tinha assumido ainda uma significação de amplitude mundial aos olhos dos marxistas, e quando a exigência básica dos marxistas a respeito do direito de auto-determinação era considerada, não uma parte da revolução proletára, mas uma parte da revolução democrático-burguesa. Seria ridículo ignorar o fato de que, desde então, uma modificação fundamental teve lugar na situação internacional, que a guerra, por um lado, e a Revolução de Outubro na Rússia, por outro lado converteram a questão nacional de parte integrante da revoluçâo democrático-burguesa em parte integrante da revolução socialista-proletária. Já em Outubro de 1916, em seu artigo «Resumo da Discussão sobre a Auto-Determinação», dizia Lênin que o ponto básico da questão nacional, referente ao direito de auto-determinação tinha deixado de ser parte do movimento democrático geral, tornando-se parte integrante da revolução proletária socialista geral. Não mencionarei os trabalhos sub­sequentes sobre a questão nacional feitos por Lênin e outros representantes do comunismo russo. Em vista de tudo isto, que significação pode agora ser atribuída à referência do camarada Semich a uma certa passagem do folheto de Stálin, escrito no período da revolução democrático-burguesa na Rússia, desde que, como resultado da nova situação histórica, entramos numa nova época, na época da revolução proletária mundial? A única significação que lhe pode ser atribuída é que o camarada Semich discute sem levar em consideração o espaço e o tempo, sem levar em consideração as atuais condições históricas. Por isso êle viola os mais elementares princípios da dialética e deixa de levar em conta o fato de que aquilo que é certo em determinada situação histórica pode vir a ser errado em outra situação histórica» (2).
Disto podemos depreender que há duas categorias de revoluções. A primeira, pertencente à categoria burguesa ou capitalista, tornou-se assunto do passado desde a irrupção da primeira guerra imperialista mundial em 1914, e especialmente desde a Revolução de Outubro de 1917. Daí em diante, começou a segunda categoria de revolução mundial, a revolução mundial proletária ou socialista, tendo o proletariado dos países capitalistas como a sua força principal, e os povos oprimidos das colônias e semi-colônias como seus aliados. Não importa a que classe ou partido pertençam os elementos oprimidos que participam na revolução, nem se êles, na prática ou ideologicamente, compreendem ou não o seu significado. Na medida em que são anti-imperialistas, sua revolução faz parte da revolução mundial proletária-socialista, e êles se tornam seus aliados.
A significação da revolução chinesa está hoje grandemente ampliada, porque ela veio se processando numa época em que a crise política e econômica do capitalismo conduz o mundo, passo a passo, para a segunda guerra imperialista, quando a União Soviética alcançou o período de transição do Socialismo para o Comunismo e tem a possibilidade de orientar e ajudar o proletariado, os povos oprimidos e todas as massas revolucionárias do mundo; quando as forças proletárias dos vários países capitalistas estão crescendo mais e mais; e quando o Partido Comunista, o proletariado, os camponeses, a intelectualidade e a pequenb-burguesia tornam-se uma poderosa e independente força política. Numa época como essa, não devemos concluir que foi grandemente a significação mundial da revolução chinesa? Claro que sim. A revolução chinesa é uma grandiosa parcela da revolução mundial!
Esta primeira etapa da revolução chinesa (que, por sua vez é dividida em muitas sub-etapas), de acordo com o seu caráter social, é uma nova revolução democrático-burguesa e não a revolução socialista-proletária, embora de há muito ela se tivesse tornado parte desta última e uma considerável parte, uma importante aliada no presente. A primeira fase ou etapa desta revolução não visa certamente, e de fato não pode visar, estabelecer uma sociedade capitalista dirigida pela burguesia, mas sim estabelecer uma Nova Democracia governada pela aliança de diversas classes revolucionárias. Depois do cumprimento desta primeira etapa, ela se desenvolverá para a segunda etapa, a fim de estabelecer-se a sociedade socialista na China.
Portanto, notem que estamos diante de diferentes tipos de resposta, em parte porque são problemas diferentes, em parte porque as pessoas estão tateando a busca de uma fórmula que dê conta de ALGO TRANSITÓRIO QUE PODE VIR A ACONTECER. OU NÃO.
Na China vai acontecer em 1949. E se vocês forem a busca do “Programa Comum da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês” promulgado na véspera da fundação da República Popular da China, verão que os chineses falam que se trata do ”programa da frente única da democracia popular da China, além de desempenhar o papel como a constituição provisória. O Programa Comum foi aprovado pela primeira Sessão Plenária da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês e promulgado no dia 29 de setembro de 1949. Antes da promulgação da Constituição da República Popular da China em 1954, o programa desempenhava o papel como a constituição provisória”.

E na Constituição aprovada em 1954 será dito o seguinte:

Preâmbulo

Como resultado de mais de um século de luta heróica, o povo chinês — sob a direção do Partido Comunista da China — alcançou finalmente, em 1949, uma grande vitória na revolução popular contra o imperialismo, o feudalismo e o capital burocrático; liquidou, assim um longo período de opressão e escravidão, e criou a República Popular da China, ditadura democrática do povo. O regime de democracia-popular na República Popular da China — isto é: o regime da nova democracia — assegura a nosso país a possibilidade de liquidar por via pacífica a exploração e a miséria, e de construir uma sociedade socialista, próspera e feliz.
O período que vai da criação da República Popular da China até à construção da sociedade socialista é um período de transição. Constituem tarefas fundamentais do Estado no período de transição a realização gradual da industrialização socialista do país e a execução gradual das transformações socialistas na agricultura, na indústria artesanal e na indústria e comércio capitalistas. Durante os últimos anos o povo de nosso país travou com êxito uma luta de grandiosas proporções visando à transformação do sistema agrário, à resistência à agressão norte-americana, à ajuda ao povo coreano, ao esmagamento dos elementos contra-revolucionários e à restauração da economia nacional. Assim foram preparadas as condições necessárias para o desenvolvimento econômico planificado e para a passagem gradual à sociedade socialista.

Notem que o termo democrático popular já comparece aí. E vai se naturalizando uma nova equação. Junto da equação CAPITALISMO-SOCIALISMO-COMUNISMO, passa a existir a equação PRÉ-CAPITALISMO (feudal, semicolonial ou semelhante)-REGIME DEMOCRÁTICO-POPULAR-SOCIALISMO- CAPITALISMO.
Processo similar ocorreu, pouco antes, no Leste Europeu.
Isso fica claro no seguinte texto:

As Democracias Populares da Europa Oriental

Eugene Reale, 1947, do PCI

Poderemos admitir que uma nova constituição dos povos, um novo regime social, seja um dos resultados da última guerra? Estaremos, hoje, ante uma nova concepção de Estado, ante uma forma nova de democracia? No conflito entre o regime capitalista e o regime socialista do mundo contemporâneo pode, até certo ponto, apresentar-se uma terceira forma, que não tenha o caráter peculiar nem de um nem de outro, mas represente historicamente uma expressão própria, uma solução particular, um fato bem diferenciado e individualizado?
A essas perguntas, que muitos escritores e figuras políticas tem apresentado e que interessa a camadas cada vez mais amplas de estudiosos, devemos responder que uma tal eventualidade não é apenas possível, mas diremos quase natural, desde que se tenha a consciência da inelutabilidade do desenvolvimento histórico; não apenas possível mas lógico, desde que se tenha a compreensão do conceito de progresso, para o qual nada se pode fossilizar em fórmulas fixas e imutáveis.
Depois da primeira guerra mundial, a revolução dos operários e camponeses na Rússia representou a rutura violenta com o velho mundo capitalista, e o regime comunista significou exatamente o contrário do regime burgues. Dada a tese, colocava-se a sua antítese: desenvolvida até o último grau a crise da sociedade capitalista, concretizava-se o fim de seu superamento — o bolchevismo.
A revolução bolchevique foi a grande conquista dos tempos modernos, no sentido em que significou a libertação definitiva do trabalho em relação ao capital e a sua organização por si mesmo e de modo autônomo. Assim como a revolução francesa tinha realizada a liquidação do mundo feudal, a revolução bolchevique realizava a liquidação da sociedade capitalista.
O grande processo histórico que teve início em 1917, com a Revolução soviética, está longe de ter-se encerrado e o seu desenvolvimento foge, por isso, a uma análise definitiva.
Ao contrário, aquele processo histórico que teve início em 1789, com a Revolução Francesa concluiu seu ciclo e oferece suficiente perspectiva para uma análise completa.
Também ali foi aberta uma voragem no seio da velha sociedade europeia, uma nova, radical e temerária afirmação ideológica, que libertou o homem das peias dos privilégios feudais e ofereceu um novo conceito do cidadão, em contraposição às velhas fórmulas de uma sociedade erguida sobre a desigualdade e os privilégios.
Também ali, se desenvolveu num processo ininterrupto de guerras para a afirmação desses princípios, numa série alternada de progressos e retrocessos, de revoluções e reações internas, de aventuras ditatoriais e de empresas contrarrevolucionárias por parte da Europa coligada.
Como a União Soviética de hoje, a França exportava, então, com as bandeiras do Diretório e com as águias napoleônicas, um princípio novo que seria o germe de toda a história futura.
Quando aqueles capítulos se encerraram, quando o déspota corso terminou a sua parte, o quadro que se apresentou — vencido ou vencedor que ele tinha sido — foi de todo novo: a estrutura social da Europa estava completamente transformada.
Realizou-se, através do grande contraste entre o princípio do absolutismo e o princípio revolucionário, uma terceira forma de regime dos povos que não tem o caráter peculiar de um ou de outros desses extremos, mas é e quer ser uma expressão histórica própria.
A França havia afirmado os princípios imortais dos direitos do homem e a Europa embora os tendo combatido, e combatendo-os, acabou por assimilá-los. "A Grécia mesmo derrotada triunfou sobre seus ferozes vencedores".
Era natural que esse processo fosse mais evidente, sobretudo nas zonas de maior atrito e desgaste, naqueles países onde mais violenta se desenvolveu a luta, onde mais viva se manifestou a contenda.
Nos países colocados nos limites da nação iniciadora e irradiadora, na Itália e na Alemanha, o processo de reação-assimilação foi mais imediato e veloz, abrindo caminho a novas combinações políticas e a novas formas ideológicas que, revividas nas grandes revoluções de 1848, tornaram-se irresistíveis afirmações populares.
Hoje, graças ao impulso que havia animado aquela primeira orientação, o princípio democrático triunfante é uma conquista definitiva, reconhecida em todo o mundo. O processo se renova atualmente nos países colocados nas proximidades da nova grande nação iniciadora e irradiadora — a URSS.
A nova Europa, que nasce das ruínas da segunda guerra mundial mostra, nos países onde foi maior o atrito entre as duas formas opostas de organização social, os sinais já visíveis e individualizados de uma profunda transformação de estrutura política e econômica.
Nasce uma nova forma constitucional, uma nova organização do Estado, que já superou as velhas formas de organização capitalista, mas que não é, pelo menos na acepção estrita da palavra, uma verdadeira e exata organização socialista ou comunista da sociedade.
Na Polônia, Checoslováquia, Iugoslávia, Bulgária e em geral em toda a Europa centro e sul-oriental está se processando uma experiencia nova: estes países assumem agora a sua grande função mediadora entre a civilização de tipo nitidamente capitalista e a civilização de tipo soviético.
Esses países se erguiam sobre uma estrutura semi-feudal e, por vezes, realmente semibárbara, incapazes de resistir às pressões externas, porque estavam internamente desunidos, arruinados, carcomidos, apodrecidos.
Às fronteiras da nação socialmente mais evoluída do mundo se extendia ainda, antes da última guerra uma grande faixa de países atrasados, fundados sobre uma economia anacrônica e mantidos nessas condições para constituir um cinturão de segurança, uma barreira contra a União Soviética.
Sociedades como essas, nas quais dominava a grande propriedade latifundiária de origem feudal, rebeldes a todo o progresso, surdas a qualquer voz de renovação, não podiam ser senão sociedades em dissolução.
Em cada um desses países, com efeito, uma cadeia de interes- ses oprimia o povo e toda a nação estava subjugada por essa cadeia.
Daí o equilíbrio instável sobre o qual se erguiam os próprios agrupamentos nacionais; uma vez arrebentada aquela cadeia, todas as relações sociais estariam convulsionadas.

O Exemplo da Polônia e seus Vizinhos

Pensemos, por exemplo, na Polônia de antes de 1939.
O latifundiário polaco, tipo social bem próximo do junker prussiano, era o verdadeiro senhor do Estado e toda a organização política do país só existia em função da defesa de seus privilégios. Nesses setores, onde não penetrava a influencia direta do grande proprietário polaco, intervinham dois de seus naturais aliados, o clero católico atrasado, ávido e reacionário, e o grande capital financeiro estrangeiro.
O regime de Pilsudski, inicialmente, e o de seus sucessores, depois, não foi senão a expressão dessa coalizão.
A odiosa política de opressão das minorias, o antissemitismo, o fanatismo nacionalista e, naturalmente, o caráter antissoviético de todas as iniciativas diplomáticas do governo, estavam a serviço dessa mesma coalizão.
Pensemos na Albânia do rei Zogú, completamente submetida a Mussolini, mesmo antes da ocupação armada fascista; pensemos na Iugoslávia de Stojadinovich, de Alexandre e do Príncipe Paulo. Ali os antagonismos étnicos eram artificiosamente exasperados até o fanatismo em benefício de uma restrita classe dirigente da monarquia de grandes proprietários sérvios, que apoiavam a monarquia e, por sua vez, obtinham a força e a autoridade.
Também ali, a monarquia era completamente dependente, no plano internacional, das grandes potencias ocidentais (França, Grã-Bretanha e por alguns momentos, Itália e Alemanha), que, através da organização monárquica, controlavam a vida econômica e política da nação.
Faltava, em suma, em cada um desses países, uma verdadeira unidade popular e um governo que fosse a expressão da vontade do povo.
Eram regimes camuflados com os ouropéis da falsa democracia, por vezes abertamente ditatoriais, fascistas, ou filo-fascistas.
A igreja católica na Polônia, a igreja ortodoxa na Iugoslávia, participavam desse sistema de interesses, e, especialmente sobre as camadas rurais e as camadas mais atrasadas do proletariado urbano, desenvolviam sua ação narcotizante da vontade e das aspirações das grandes massas populares.
A natural aliança entre operários e camponeses, base fundamental da unidade popular, era assim dificultada e mesmo virtualmente impedida.
As consequências desse sistema são bem conhecidas. Ao primeiro choque dos grandes interesses em oposição a velha estrutura se esboroou. Habituados a enganar o próprio povo com fórmulas vazias, com vãs declarações nacionalistas, com a ostentação de uma força insubsistente, os governos fascistas e filo-fascistas da Europa centro e sul-oriental foram varridos em poucos dias por um inimigo aguerrido, que conhecia bem a falta de preparação política e militar daquelas nações.
Após inútil derramamento de sangue (quem não se recorda da carga de cavalaria polaca contra as divisões couraçadas alemãs nas planícies abertas do Vístula?) os povos tiveram que sofrer todos os horrores da ocupação nazista, todas as consequências extremas da criminosa política de suas velhas classes dirigentes.

Dois Fatos Novos

Mas através da guerra dois fatos novos se concretizaram:
1.          — Foi afinal destruída aquela rede de interesses e de cumplicidades que envilecia aqueles povos.
2.          — Apresentou-se afinal a oportunidade de realizar, através da resistência à opressão hitlerista e da luta contra os colaboracionistas, aquela guerra verdadeiramente nacional, na qual as grandes massas populares conquistaram consciência de sua própria força e de seus interesses próprios.
Sobre esses dois fatos históricos, de fundamental importância, se firmaram as bases dessa nova forma de regime político que se chama democracia popular.
E, de fato, um novo mundo nasce das ruínas da segunda guerra mundial.
Ali, onde se quebraram as ondas mais terríveis da tempestade; ali, onde se combateu a guerra mais sanguinolenta; ali, onde o exército hitlerista se encontrou com os exércitos soviéticos e se despedaçou; ali se realiza hoje aquela nova forma política que provavelmente está destinada a ter, durante muito tempo, uma profunda repercussão sobre a história europeia.
Um problema fundamental se apresentou a esses povos após a libertação: seria possível voltar aos regimes de falsa democracia parlamentar com os quais essas nações se tinham governado, com os insucessos que eram de todos conhecidos e sentidos antes do segundo conflito mundial?
Os regimes que haviam surgido após a primeira guerra mundial e que representavam o verdadeiro cordão sanitário com o qual as potencias ocidentais pretendiam assediar a União Soviética, não podiam ser restaurados, nem correspondiam de nenhuma maneira aos interesses daquelas populações.
De outro lado, a própria guerra, com seus longos anos de luta contra o invasor nazista, em vez de refrear tinha despertado o sentimento nacional, a consciência da individualidade dos povos.
Todo o povo tem necessidade de uma forma constitucional própria, que corresponde às suas exigências específicas, que se adapte às suas condições particulares e, dessa maneira, não era possível adotar uma organização social nascida em diferente clima histórico, imposta em meio àquela comoção social que foi a Revolução de Outubro, amadurecida e elaborada através de um longo e profundo processo revolucionário.
A democracia popular, como nova concepção do Estado, como novo sistema político de nosso tempo, nasce da falencia das velhas castas dirigentes e da velha estrutura reacionária, do espírito das guerrilhas, da experiencia da luta contra o opressor hitleriano e o colaboracionismo interno, do reforçamento da consciência nacional das populações.
E, como vemos, uma solução que nasce concretamente da própria natureza dos acontecimentos, das novas exigências provocadas pelas transformações sociais que a guerra operou.

Duas Definições sobre as Novas Democracias

Na sua ordem do dia, aos exércitos soviéticos, a 1.° de Maio de 1946, Stalin declarava:
"O enfraquecimento e a liquidação das principais forças do fascismo e da opressão mundial, conduziram a profundas transformações na vida política dos povos do mundo, a um notável desenvolvimento do movimento democrático dos povos. Amadurecidas pela experiencia da guerra, as massas populares compreenderam que não se pode confiar o destino do Estado a dirigentes reacionários, que apenas procuram atingir objetivos estreitos de egoismo de classe, em contraste com os interesses do povo. Precisamente por isso, os povos que não querem viver nas condições que tinham vivido até então, tomam os destinos de seus Estados nas próprias mãos, edificam uma ordem democrática- e dirigem uma luta ativa contra as forças da reação, contra os incendiários de uma nova guerra."
E Molotov, em seu discurso pronunciado por ocasião da celebração do 28.° aniversário da Revolução de Outubro, declarou:
"Em uma série de países europeus realizaram-se reformas sociais de grande vulto, com a liquidação dos restos do poderio territorial e feudal e a transferência da posse da terra aos camponeses não proprietários, o que liquidou a capacidade de resistência de que dispunham anteriormente as forças reacionárias fascistas e estimulou o renascimento do movimento democrático e socialista nesses mesmos países."
A "Democracia Popular" é uma forma de regime político no qual o povo exerce, não apenas em aparência, mas na realidade e numa ampla medida, o poder governamental e administrativo. A eliminação da instituição monárquica é uma das primeiras realizações dessa nova democracia. Eliminado esse centro, em torno do qual se aglomeravam todos os restos de um sistema baseado na desigualdade econômica, as novas repúblicas populares puderam romper a unidade das forças reacionárias. Completado o confisco ou expropriação das grandes propriedades territoriais, divididos os latifúndios entre os camponeses necessitados de terra, liquidadas as uniões monopolistas do capital, nacionalizadas as grandes indústrias e os bancos, postos sob a direção estatal os transportes ainda sob o controle das grandes empresas privadas, as novas repúblicas populares puderam deixar intacta, sem perigo, a propriedade privada, média e pequena, puderam fazer subsistir todas as outras formas de economia capitalista.
Não se pode, assim, falar de economia socialista ou sovietizada, mas sim de uma economia de fundamentos sociais, de uma economia profundamente democrática, de um programa de saneamento e de renovação nacional, como é compreendida em muitos países capitalistas e, também, por partidos não socialistas, programa tanto mais indispensável e urgente naquela zona europeia, quanto mais ela tinha ficado para trás no caminho do progresso, devido aos obstáculos opostos pelos velhos regimes reacionários.

Liberdade dos Indivíduos e dos Grupos

Originada na luta pela libertação, a democracia popular tutela a liberdade dos indivíduos e dos grupos, como o maior dos bens, como conquista própria de sua formação histórica e à qual não seria possível renunciar sem desnaturar-se, como premissa indispensável a todo o progresso ulterior. A liberdade de consciência é o principio regulador das relações entre o Estado e as várias confissões nacionais. Na Polônia e em muitos outros países, as propriedades pertencentes às comunidades religiosas, embora muito grandes, ficaram isentas de confisco ou expropriação. Segundo as regras de toda a sã e viril concepção de liberdade, a liberdade da Igreja tem seus justos limites no livre exercício da religião.
O estado leigo, zeloso de suas atribuições, intervém contra toda tentativa de intromissão da Igreja no campo estritamente político.
Da mesma forma que durante a guerra de guerrilhas, aqueles padres que foram encontrados de armas na mão contra o povo, haviam sido tratados, da mesma maneira que todos os outros colaboracionistas, segundo as leis de guerra, assim hoje aquela parte do clero que colaborou com o opressor nazista e pretendia continuar a servir-se de seus meios espirituais para sabotar a obra do governo, foi colocada em condições de não causar dano. Mas, felizmente, a maior parte do clero colocou-se ao lado do povo na luta contra o invasor e, hoje, completamente livre no exercício de sua atividade religiosa, observa lealmente seus deveres para com o Estado.
São estes critérios, reguladores das relações entre o Estado e a Igreja, critérios de legislação Socialista?
Não é necessária uma longa argumentação para demonstrar que estas normas não cabem no âmbito das reformas especificamente socialista, mas são antes conquistas de direito constitucional moderno, comuns a todos os Estados democratas e, por isso, pertencem tanto à democracia socialista como à clássica democracia liberal, tendo sido por esta última codificadas, não só na conhecida fórmula cavouriana, como naquele livro valioso de Montalembert, "A Igreja livre no Estado livre".
A política religiosa que hoje vem se desenvolvendo nas novas repúblicas populares da Europa centro e sul-oriental é, antes, sob certos aspectos, ainda menos avançada e radical do que a política religiosa desenvolvida em relação à Igreja Nacional do Estado Frances, durante a grande Revolução e logo após.
Na Polônia, por exemplo, um milhão de hectares de bens eclesiásticos ficaram isentos do confisco ou expropriação, enquanto que na França, durante a Revolução de 89, junto aos bens dos emigrados foram confiscados as propriedades religiosas. Na Itália, sob o governo da Direita, foi promulgada a lei sobre o eixo Eclesiástico: e no entanto o Estado de Saboia não era na verdade nenhum Estado Socialista...
Na nova forma constitucional das democracias populares, o poder executivo é emanação direta do povo.
Isto quer dizer que os novos Estados surgidos desta guerra na Europa centro e sul-oriental, não são organizações políticas no velho sentido burgues, isto é, uma democracia formal e parlamentar na qual o povo elege as câmaras e estas se limitam a discutir e a promulgar as leis, enquanto o poder executivo, dependente na realidade unicamente da camarilha das forças reacionárias no poder, as aplica a seu talante e conveniência.

Nenhuma Separação de Poderes

Nas Repúblicas Populares não há nenhuma separação entre poder legislativo e poder executivo; o povo participa diretamente da administração do Estado e da cousa pública, através dos representantes por ele eleitos e ante ele diretamente responsáveis. A burocracia parasitária, dependente unicamente do poder constituído, surda às necessidades e aspiração do povo, foi eliminada.
Toda a vida econômica, a vida artística, a vida cultural, existem em função e a serviço do povo.
Os comites populares na Iugoslávia, os Comites nacionais na Checoslováquia, os comitês da frente patriótica da Bulgária, os comitês de Libertação Nacional na Albânia, representam todas as categorias de trabalhadores, operários e camponeses artesãos, técnicos e intelectuais, exercem o controle direto e garantem a execução da vontade popular. Um novo despertar político e econômico é o grande fato novo que se realiza nesta radical transformação do conceito de Estado e das relações sociais.
O governo não é mais, para as massas populares, qualquer cousa de estranho e de outros interesses, mas o seu próprio governo, o governo da maioria, a expressão do próprio povo. As velhas classes dominantes desaparecem, os obstáculos são removidos, a vida política é aberta à participação dos melhores, na livre ascensão dos valores humanos. Um marco no caminho dos povos foi atingido.
Parece evidente, mesmo ao mais superficial observador, que esta profunda transformação que se realizou e continua a realizar-se, não é somente uma pura e simples restauração dos princípios democráticos nos países onde a influencia fascista, ou a macaqueação filo-fascista, os haviam desnaturado.
Os princípios democráticos, tomados na habitual acepção burguesa da palavra, não seriam suficientes para explicar a profunda renovação que esta guerra, tão nitidamente influenciada por motivos ideológicos novos, havia operado naquela zona europeia.
A transformação verificada no países colocados nas proximidades das fronteiras do grande Estado Socialista e libertados pelo exército vermelho, leva em si o germe da maior das revoluções dos tempos modernos, compreendida como nova concepção das relações sociais, e daí surgirem formas que também podem ser transitórias como liquidação teórica das concepções burguesas e como a defesa permanente de algumas determinadas conquistas da humanidade.
Trata-se agora de um tipo especial que já superou a era da burguesia como concepção e como modo de viver. Trata-se de uma forma especial de democracia, que se desenvolve das premissas gerais do socialismo.

O Socialismo na Etapa Atual

O Socialismo é, na atual etapa, o positivo do processo histórico.
Através da crítica socialista do sistema burgues, dissolveu-se aquele aglomerado de formas sociais do capitalismo, que a Revolução Francesa havia deixado.
Não se trata, pois, de restauração de princípios democráticos burgueses, mas de afirmação de princípios democráticos socialistas.
A nova corrente, que irrompe na história contemporânea, não é mais a Revolução de 89, é a Revolução de nosso século, a Revolução socialista.
Indubitavelmente, esta guerra operou uma transformação geral, a que não se subtraiu nenhuma das nações que dela tenha participado.
O Estado Socialista, que num processo de ordenação revolucionária tinha durante três decenios elaborado e superado algumas das suas manifestações originárias, pôde ulteriormente aperfeiçoar a sua forma política. A União Soviética, que deu ao Ocidente a contribuição de suas energias frescas e novas, e que com essa contribuição pôde salvá-lo do retorno à barbárie medieval, abriu-se nesse mesmo tempo, cada vez mais, ao Ocidente, assimilando aquilo que a civilização do ocidente havia independentemente conquistado nesses anos, no campo da ciência e do progresso humanos.
Por sua parte, mesmo as grandes nações capitalistas não podem subtrair-se à atração das grandes conquistas sociais da União Soviética.
A História, de resto, é toda baseada sobre essa troca de força e de valores, sobre essa perpétua relação do deve e haver, somente no qual e através do qual a humanidade pode avançar.
Um mundo em decomposição, uma artificiosa barreira criada pela reação desapareceu para sempre no fluxo desta guerra.
As novas democracias populares representam como que uma ponte lançada entre duas épocas: a época capitalista e a época socialista.
É portanto uma grande experiencia de renovação social, destinada a ter uma repercussão profundíssima na história do mundo.
Uma experiencia fundada sobre a libertação, sobre o trabalho, sobre a justiça social: eis o que se está realizando por trás daquilo que Mister Churchill, chamou de "cortina de ferro".
Qual a etapa mais recente deste processo todo?
Em 1978, no mesmo PC da China, se adotou um programa de Reformas e Abertura.
E qual a conclusão que se chegou?
Fallad-. Las cuatro modernizaciones implicarán la introducción de capitales extranjeros en China, y esto dará lugar inevitablemente a las inversiones privadas. ¿No conducirá esto a un capitalismo miniaturizado?
Deng. Al fin y al cabo, la política que seguimos en nuestra construcción sigue siendo la de apoyarnos en nuestros propios esfuerzos como recurso principal y procurar ayuda exterior como recurso auxiliar, política elaborada en su tiempo por el Presidente Mao. Por más amplia que sea la apertura al exterior y por elevada que sea la suma de capitales extranjeros que entren en China, éstos ocuparán un porcentaje insignificante y no afectarán a nuestro sistema socialista de propiedad social. La absorción de fondos y tecnologías del exterior e incluso la construcción de fábricas en China por parte de países extranjeros podrán servirnos como factor complementario para desarrollar nuestras fuerzas productivas socialistas. Por supuesto, es posible que con esto se introduzcan en el país ciertas cosas decadentes propias del capitalismo, y de esto tenemos clara conciencia, pero no es nada temible.

OU seja, se chegou a conclusão de que o SOCIALISMO em si mesmo é um processo de transição, com características diferentes a depender da época histórica em que ocorre & a depender do tipo de sociedade onde ocorre; e que nesse processo de transição vão COINCIDIR, se COMBINAR e LUTAR entre si diferentes MODOS DE PRODUÇÃO.
Portanto, quanto os governos dirigidos por partidos comunistas no Leste Europeu e na China diziam que eram regimes democrático-populares, o que no fundo eles estavam dizendo é que estavam na FASE INICIAL DE CONSTRUÇÃO DO SOCIALISMO.

Pois bem, chegamos agora no Brasil de 1987, no V Encontro Nacional do PT, quando o Partido tenta dar uma formulação mais detalhada para sua estratégia e seu programa de transformação.
Como vocês poderão perceber, todas as confusões e todas as conclusões que expliquei antes, incidem na resolução do congresso petista, consciente ou inconscientemente.
Naquele momento, em que o socialismo parecia ser uma perspectiva muito próxima, o programa democrático e popular era visto como claramente articulado com o socialismo.
Depois de 1991, quando o socialismo parecia ser uma perspectiva cada vez mais distante, o programa democrático e popular era visto como algo “EM SI MESMO”, como se fosse uma modalidade do capitalismo e não como a “fase inicial do socialismo”.
Lembro, mais uma vez, que ele pode ser qualquer uma destas coisas; ou nenhuma delas. Pois estamos discutindo não sobre o nome de algo que existe, mas sim sobre o nome que devemos dar para algo que queremos que venha a existir.
Eu pessoalmente acho correto falar de programa democrático e popular, para deixar claro que se trata de contemplar interesses democráticos e populares que não necessariamente são os interesses socialistas estrito senso.
Mas, por outro lado, acho necessário deixar claro que se trata de um programa democrático e popular ARTICULADO ao socialismo ou, de preferencia, um programa democrático-popular E socialista, para deixar claro em que perspectiva estratégica nos situamos.
Pois a nossa perspectiva estratégica é: não é possível implementar um programa democrático e popular sem atacar as bases do capitalismo.
Se tentamos fazer isso, o capitalismo virá contra nós e não teremos nem socialismo, nem programa democrático popular.
Portanto, é melhor deixar clara a articulação, a conexão entre reforma agrária, democracia política, soberania  nacional e PROPRIEDADE SOCIAL DOS GRANDES MEIOS DE PRODUÇÃO, mais PODER DA CLASSE TRABALHADORA.
Terminei.