sexta-feira, 20 de julho de 2012

Rascunho da palestra feita na Universidade do PIE

Bom dia a todos e todas.

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer o convite para o Foro de São Paulo contribuir com a Universidade de Verão do PIE.

Para aqueles que ainda não conhecem o que é o Foro de São Paulo, recomendo ler dois textos: o Documento Base e a Declaração Final do XVIII Encontro do Foro de São Paulo, realizado de 3 a 6 de julho de 2012, em Caracas, Venezuela.

Estes dois textos foram traduzidos para o inglês e enviados para a organização desta Universidade de Verão, para que fossem distribuídos entre os participantes.

Também solicitei que fossem distribuídos dois outros textos, igualmente traduzidos para o inglês: as resoluções do 4º Congresso do Partido dos Trabalhadores do Brasil, de cuja direção nacional eu faço parte; e um texto de minha autoria, intitulado Una ventana abierta, em que apresento de maneira mais detalhada o que aqui vou falar de maneira mais resumida.

O tema desta nossa mesa é The crisis in Europa as a part of the global crisis.

Vou contribuir com este tema falando de três assuntos: como encaramos a crise global; como estamos reagindo a ela; e como estamos vendo a situação na Europa.

Concordamos que se trata de uma crise global, ainda que ela não afete de maneira igual todas as regiões, países, setores sociais e dimensões da vida humana. Vou resumir, a seguir, as principais variáveis que enxergamos nesta crise global.

Consideramos que se trata, em primeiro lugar, de uma crise do capitalismo neoliberal, ou seja, uma crise do padrão de acumulação capitalisa que se tornou hegemônico a partir da crise dos anos 1970.

Esta crise do capitalismo neoliberal se expressa e se traduz em diversas crises articuladas: financeira, comercial, ambiental, política, militar etc. Por razões de tempo, não vou abordar estes diferentes aspectos, mas ressalto que é desta análise concreta que se pode extrair diretrizes políticas para enfrentar a crise.

A crise do capitalismo neoliberal se articula com outra variável: o deslocamento do centro geopolítico do mundo, que parece estar se movimento do Ocidente de volta para o Oriente, depois de pelo menos 500 anos.

Uma terceira variável da crise global é o declínio da hegemonia dos Estados Unidos. Evidentemente, declínio não é fim. Além disso, como estamos vendo, as classes dominantes dos Estados Unidos estão agindo agressivamente para tentar reverter este declinio: dentro do país, operando um giro ainda mais reacionário, do ponto de vista social, político e ideológico; fora do país, lançando mão de seu aparato de mídia, do monopólio do dólar e da força das armas.

A crise global possui uma quarta variável, que é o conflito entre dois modelos de capitalismo: o de tipo neoliberal versus o capitalismo de Estado, conflito que visualizamos, ainda que de maneira imperfeita, no choque entre a aliança Estados Unidos mais União Européia versus os chamados Brics (Brasil, Rússia, India, China e África do Sul).

Ainda a respeito desta variável, quero destacar o seguinte: o principal conflito existente hoje no mundo é intercapitalista, entre modelos distintos de capitalismo. A alternativa socialista ainda encontra-se num momento de defensiva estratégica e compreender isto é algo politicamente fundamental.

Uma quinta variável da crise global é a incerteza acerca de qual será seu desfecho. Na verdade, o desfecho está sendo construído na luta entre Estados e, dentro de cada Estado, entre as diferentes classes sociais.

O pano de fundo desta luta remete para uma idéia clássica do marxismo: a contradição profunda entre o desenvolvimento das forças produtivas capitalistas, entre a capacidade da humanidade criar riquezas, versus o caráter limitado das relações de produção baseadas na propriedade privada e na apropriação privada desta imensa riqueza.

Esta contradição profunda pode ser traduzida assim: os problemas são cada vez mais globais e não serão resolvidos enquanto o poder estiver concentrado nas mãos de um punhado de capitalistas, empresas transnacionais e uns poucos e poderosos Estados nacionais.

A incerteza acerca do desfecho da crise global resultado, exatamente, da inexistência de um poder capaz de construir tal solução.

Evidentemente, isto não será assim para sempre. O que está ocorrendo neste momento nos Estados Unidos, na Europa e no Oriente Médio fazem parte de um plano mais ou menos articulado de superação da crise, do ponto de vista das classes sociais e dos países que dominaram e se beneficiaram do período neoliberal.

A questão é: as classes trabalhadoras e os países explorados conseguirão reunir a força política necessária para vencer esta disputa? Entendendo aqui vencer como 1) derrotar o neoliberalismo, 2) derrotar o capitalismo e 3) iniciar a transição para uma sociedade socialista avançada?

Evidentemente não temos como saber. Mas podemos dizer, com certeza, que o processo que está em curso na América Latina, desde 1998 e 2002, com as eleições dos presidentes Chavez e Lula, é um ponto de apoio para a luta das classes trabalhadoras e para a luta dos países explorados de todo o mundo.

Como podemos resumir o que está ocorrendo na América Latina?

Sendo muito sintético, as forças que se opuseram ao neoliberalismo conseguiram conquistar vários dos principais governos da região; e onde não somos governo, nos convertemos geralmente na principal força oposicionista.

Graças a isto, houve uma mudança na correlação de forças na região que chamamos de América Latina e Caribe. Esta mudança tornou possível ampliar os níveis de democracia política e as condições sociais de nossa população. Ao mesmo tempo, ampliamos os graus de soberania nacional e integração regional.

Evidentemente, tudo isto ocorre em meio a fortes contradições, de todo tipo. Não estamos falando de processos perfeitos, destes que só existem nos laboratórios dos chamados cientistas políticos. Estamos falando de processos reais, feitos por pessoas reais, nos marcos de uma correlação de forças mundial ainda profundamente difícil para quem é de esquerda.

É preciso destacar, ainda, que desde a eleição de Obama, estamos sofrendo um forte contraataque por parte dos Estados Unidos e dos setores conservadores de nossa região. Exemplo disto são as vitórias eleitorais da direita na Guatemala, no Panamá, na Costa Rica e no Chile; assim como os golpes em Honduras e Paraguai; ou ainda a recriação da IV Frota naval dos Estados Unidos, decisão que vinculamos a tentativa de controlar as reservas de petróleo da Venezuela e do Brasil.

Seja como for, a experiência da América Latina e do Caribe demonstram que é possível, mesmo nos marcos de uma situação global ainda muito difícil para a esquerda, avançar, vencer, construir alternativas e projetar esperanças.

Por fim, estamos convencidos de que não venceremos sozinhos. Se não houver mudanças na correlação de forças em outras regiões do mundo, mais cedo ou mais tarde sofreremos um retrocesso na América Latina e Caribe.

É por isso que o Foro de São Paulo está investindo na organização dos migrantes latinoamericanos nos Estados Unidos e na Europa.

É por isto, também, que temos a expectativa de que a esquerda européia seja capaz de defender o estado de bem-estar, seja capaz de defender as liberdades democráticas, seja capaz de derrotar a integração conservadora controlada principalmente pelo capital financeiro alemão e francês, seja capaz de enfraquecer o imperialismo e o colonialismo europeu e seja capaz, principalmente, de fazer a classe trabalhadora se tornar novamente protagonista.

Por fim, gostaria de destacar que o tema central, do nosso ponto de vista, está na política, na capacidade de reunir as forças sociais e políticas de esquerda em torno de um projeto político que ganhe o apoio da maioria da população.

É isto que estamos fazendo na América Latina e, pelo menos até agora, temos conseguido progressos importantes.

Muito obrigado.


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