No dia 1 de
fevereiro, Viomundo divulgou um texto de Washington Quaquá, presidente do PT do
estado do Rio de Janeiro.
O texto pode
ser lido aqui: http://www.viomundo.com.br/politica/presidente-do-pt-no-rio-estamos-caminhando-para-o-matadouro-como-gado.html
Viomundo deu
ao texto o seguinte título: Presidente
do PT no Rio: “Estamos caminhando para o matadouro como gado”
Originalmente,
o texto fora publicado no facebook do PT do Rio de Janeiro, com outro título: “Permita-me
discordar!”
Inspirado neste direito, farei a seguir algumas críticas
ao ponto de vista do presidente do PT do Rio de Janeiro.
Quaquá afirma ter ficado “quase deprimido”, não com o
resultado do julgamento no TRF4, mas com “nossa reação, nosso rumo errático que se
intensifica dramaticamente. Estamos caminhando para o matadouro como gado. Estamos
usando a inteligência menos que bovina pra atuar na conjuntura”.
Compreendo a reação de Quaquá.
Apenas acrescento dois aspectos: a) nossa reação no dia 24
deveria ter sido muito mais dura, inclusive em Porto Alegre, São Paulo e Rio de
Janeiro; b) nosso “rumo errático” não começou agora e está relacionado ao
famoso debate sobre a estratégia adotada pelo Partido.
Quaquá afirma que “só a mobilização popular crescente terá
potência e força para nos tirar da enrascada da conjuntura”. E lista um
conjunto de iniciativas práticas neste sentido, com as quais no geral estou de
acordo.
Mas registro que não compreendi por quais motivos essa “tarefa”
de que fala Quaquá deve mobilizar todas as nossas energias “nos próximos 5
meses!”
Não vou especular, mas fiquei curioso com esta referência
ao período que começa em janeiro-fevereiro e termina em junho-julho.
Quaquá afirma que “as invés de fazer bravatas e propalar uma
revolução popular sem exército organizado, o que temos que fazer é ir para o
povo”, pois só isso “pode criar a força material e militante que nós hoje não
temos, mas precisamos ter, para vencer o complexo de poder golpista”.
Novamente estou de acordo no geral, embora tenha sentido
falta de qualquer referência às lutas sociais concretas, a começar pela luta em
defesa da aposentadoria.
Querer organizar o povo em defesa de Lula só terá êxito se
esta tarefa for vinculada a auto-organização do povo em defesa de suas demandas
concretas.
Ao invés de falar destas lutas concretas, Quaquá fala que “depois,
e paralelo, é necessário ampliar as alianças!”
Fiel ao seu estilo, de espancar com incomparável valentia um
inimigo imaginário (nos parágrafos anteriormente citados, ele vitupera alguém
que “faz bravatas” e quer fazer “uma revolução popular sem exército organizado”),
Quaquá agora diz o seguinte: “Estamos retrocedendo à infância política
com essa posição estreita de só fazer alianças na esquerda e na centro-esquerda.
O princípio básico, pré-primário das alianças, é que “o inimigo do meu inimigo
principal é meu aliado”.
Quaquá acha que devemos procurar aliados no centro, na
centro-direita e na direita. Pois procurar aliados apenas na esquerda e
centro-esquerda seria “retroceder à infância política”.
Quaquá propõe “rachar o bloco adversário”, “buscando
ampliar as alianças até mesmo entre os que estavam no bloco de poder adversário
a nós”.
Entendi tudo.
Só não consigo entender por quais motivos, e em
torno de quais objetivos, Quaquá acredita que gente do lado de lá, em
quantidade e qualidade politicamente relevantes, vai vir nos apoiar.
Notem que Quaquá não fala de “alianças eleitorais”, mas
sim de “alianças políticas e sociais que podem ou não se expressar na disputa
eleitoral, mas são mais amplas que as disputas eleitorais!”
Minha impressão é que Quaquá raciocina, em 2018, com uma
lógica de 2002. Ou seja, raciocina com base em uma época em que havia relevante
interesse, da parte de setores do centro e da direita, assim como da parte de
setores do capital, em fazer alianças conosco.
Talvez seja por isso, aliás, que ele fala em bloco “adversário”
e não em bloco “inimigo”.
Quero deixar claro que não sou contra mapear aliados no
judiciário, no MP, na PF; não sou contra procurar “as lideranças políticas de
cada Estado”, nem mesmo aquelas que tendo feito parte do golpe, hoje se dizem
oposição; e também não sou contra criar uma “frente democrática” na Câmara e no
Senado.
Mas não acredito que esta operação seja capaz de barrar a
nova etapa do golpe.
Talvez Quaquá acredite nisto, porque ele raciocina como se
estivéssemos lutando contra um “Estado Policial”, uma “ditadura”, contra a qual
podemos mobilizar os setores democráticos, mais ou menos como se fez em
certa época da luta contra a ditadura.
Acontece que para amplos setores da direita e do centro,
assim como do grande capital, romper a legalidade é o preço a se pagar para
liquidar com o PT e com Lula. E, portanto, mesmo setores de centro e direita
que sabem que está sendo praticada uma ilegalidade, não querem correr o risco
de romper agora a frente única contra o PT.
Exceto, é claro, se nós mesmos cortássemos a nossa cabeça.
Algo do tipo: anulem a condenação e, em troca, Lula não
disputará a eleição presidencial de 2018. Neste caso, realmente seria possível que
setores do bloco golpista aceitassem discutir uma “aliança”, na qual eles
entrariam fornecendo os doces e salgados para o velório e a gente fornecendo
nosso próprio corpo para abrilhantar o evento.
Quaquá parece perceber esta dificuldade e acho que é por
isso que, neste exato ponto de seu texto, ele diz o seguinte: “sinceramente,
precisamos discutir muito bem o que é esse negocio de não ter “plano B”.
Concordo: precisamos
discutir muito bem, pois a situação pode evoluir para um cenário que nos
apresentará dilemas parecidos com o do Colégio Eleitoral e/ou com o final do
Congresso Constituinte de 1988.
Ou seja: situações em que adotar uma posição momentaneamente
“isolada” nos capacita a jogar, no momento seguinte, um papel “amplo”.
Independente desta discussão mais geral, sobre o que pode
vir a acontecer, o PT já tem uma decisão: aconteça o que acontecer, vamos
inscrever a candidatura de Lula no dia 15 de agosto de 2018.
Vale dizer que Quaquá concorda com isto, chegando ao ponto
dizer que devemos inscrever Lula mesmo que ele seja/esteja preso.
Entretanto, Quaquá diz que “temos sim que ter um petista
na chapa, como vice, desde já, que sinalize pro Brasil e pro meio político qual
o caminho vamos seguir caso façam uma violência maior e desmedida!”
Ou seja: Quaquá defende um “plano B” camuflado de
candidatura a vice.
Noutras palavras: se o nome de Lula não estiver na urna
eletrônica, Quaquá propõe pedir às pessoas que votem na pessoa que agora será
apresentada como vice de Lula.
E já apresenta o perfil de seu “plano B”: “um
petista amplo e com experiência de governo, sem sectarismo, que seja seu
companheiro de chapa e substituto em caso de violência institucional do TSE!”
Segundo Quaquá, isto seria “uma forma de dissuasão de uma
violência maior, porque tornará esta inócua, pois o resultado eleitoral será
definido pelo próprio Lula”.
Ou seja: o golpismo e todo o seu aparato serão derrotados,
não pela força da mobilização popular, nem mesmo pelas alianças amplas, mas por
nossa astúcia.
Astúcia que permitiria que o resultado eleitoral fosse “definido
pelo próprio Lula”.
Astúcia contra a qual o golpismo não fará nem poderá fazer
nada, claro, pois se pudesse e se fizesse, a história não teria final feliz e
esta proposta de plano B camuflado de vice só aumentaria o número de pessoas “quase
deprimidas”.
Penso que o erro de Quaquá tem origem na “tese”, desenvolvida
por ele no final de seu texto, tese que resumo desta maneira: ou
derrotar o estado policial já, através de um plano B camuflado de vice; ou insistir
que eleição sem Lula é fraude, ser derrotado nesta conjuntura e fazer um processo
de reorganização de médio prazo.
O principal equívoco desta tese consiste em não perceber que
apresentar um plano B (disfarçado ou não de vice) não impede a derrota.
Pelo contrário: aderir à tese do “plano B” provavelmente nos
levaria, não apenas para uma derrota eleitoral, mas também para uma desmoralização
política e ideológica.
Explico: o único candidato de esquerda capaz de vencer as
eleições 2018 é Lula. Os demais podem concorrer, podem até ter boas votações,
mas não conseguirão vencer.
Por isso a direita faz de tudo para tirar Lula da disputa.
Se indicarmos outro nome no lugar de Lula – não importa quem
nem quando – não estaremos apontando o futuro vencedor; estaremos apontando
mais um perdedor.
Com uma diferença fundamental: ao apontar outro nome, na
crença de que seria possível ganhar com outro nome, estaríamos abandonando na prática a posição de que eleição sem Lula é fraude.
E ao final seríamos não apenas derrotados, mas também teríamos legitimado a fraude e, por
tabela, legitimado quem da direita sair vitorioso desse processo.
Seria o sonho de consumo de certa direita: cassar Lula e
derrotar o nome por ele indicado.
A
esquerda só ganhará as eleições presidenciais de 2018 se Lula for o candidato. Qualquer
outra alternativa nos obrigaria a fazer uma “reorganização de médio prazo”. Mas
se abrirmos mão da denúncia do golpe e da fraude, até mesmo esta reorganização de
médio prazo estará em risco.
Ao
nos vender a ilusão de que um plano B camuflado de vice nos permitiria vencer,
Quaquá inadvertidamente me fez lembrar aqueles abatedouros que levam o gado
para o matadouro ouvindo música clássica. O gado morre do mesmo jeito, mas sem
resistir, motivo pelo qual a carne fica mais macia, embora tal fato não altere em nada a inteligência bovina.
Não
estamos condenados à derrota. Em hipótese alguma devemos ajudar os que
pretendem nos derrotar. E a resolução do Diretório Nacional do
PT, aprovada em 16 de dezembro de 2017 e reafirmada em 25 de janeiro de 2018,
segue valendo: nosso plano é Lula candidato a presidente.
Excelente artigo. Está em linha com o que temos defendido no programa Duplo Expresso.
ResponderExcluirRomulus Maya
A consigna da autocrítica não deve ser tratada como algo temporário e transitório. A autocrítica é um método específico, um método Bolchevique, de treinar as forças do Partido e da classe operária em geral no espírito do desenvolvimento revolucionário. O próprio Marx falou de autocrítica como um método de fortalecimento da revolução proletária[1]. No que tange a autocrítica em nosso Partido, seu começo data da primeira aparição de Bolchevismo em nosso país, até seu surgimento como uma corrente revolucionária específica no movimento operário.
ResponderExcluirSabemos que já na primavera de 1904, quando o Bolchevismo ainda não era um partido político independente mas trabalhava junto dos Mencheviques dentro de um único Partido Socialdemocrata - sabemos que Lenin já estava convocando o Partido a realizar “autocrítica e impiedosa exposição de suas próprias deficiências”. Aqui o que Lenin escreveu em seu panfleto Um Passo em Frente Dois Passos Atrás:
Eles [i.e., os oponentes do Marxismo - J. St.] seguem com caretas de alegria maligna as nossas discussões; evidentemente procurarão utilizar para os seus fins algumas passagens isoladas desta brochura dedicada aos defeitos e lacunas do nosso partido. Os sociais-democratas russos estão já suficientemente temperados nas batalhas para não se deixarem perturbar por essas alfinetadas, e para prosseguir, apesar delas, o seu trabalho de autocrítica, continuando a revelar implacavelmente as suas próprias lacunas, que serão corrigidas, necessária e seguramente, pelo crescimento do movimento operário. E que os senhores adversários tendem apresentar-nos da situação verdadeira dos seus próprios "partidos" um quadro que se pareça, mesmo de longe, com o que apresentam as atas do segundo congresso! (Vol. VI, p. 161)
Portanto, esses camaradas que pensam que autocrítica é um fenômeno passageiro, uma moda que estão absolutamente errados, uma moda que tende a deixar de existir rapidamente como acontece normalmente com toda moda, estão absolutamente errados. Na verdade, a autocrítica é uma arma indispensável e permanente no arsenal do Bolchevismo, uma arma intimamente ligada à própria natureza do Bolchevismo, com seu espírito revolucionário.
Algumas vezes se diz que a autocrítica é algo que é bom para um Partido que ainda não chegou no poder e não tem “nada a perder”, mas que é perigoso e prejudicial para um partido que já está no poder, que é cercado por forças hostis, e que a exposição de suas debilidades pode ser explorada pelos seus inimigos.
Isso não é verdade. É bastante falso! Pelo contrário, justamente porque o Bolchevismo chegou ao poder, justamente porque os Bolcheviques podem se tornar presunçosos devido aos sucessos de nosso trabalho de construção, justamente porque os Bolcheviques podem falhar em observar suas debilidades e assim tornar as coisas mais fáceis para seus inimigos - por estas razões a autocrítica é particularmente necessária agora, após a tomada do poder.