domingo, 2 de novembro de 2025

A pesquisa sobre a chacina não é o que parece

Recomendo fortemente a leitura da pesquisa Genial Quaest acerca da "operação" no Rio de Janeiro.

A pesquisa merece uma crítica técnica, inclusive sobre o uso do termo "operação" e sobre a qualidade das respostas colhidas em situação de medo intenso, mas para facilitar a argumentação vou partir do pressuposto de que os dados e resultados da pesquisa são 100% corretos.

Dentre eles, destaco os seguintes.

Primeiro: 87% acha que o Rio de Janeiro vive uma situação de guerra.

Segundo: 73% da população acha que a polícia deveria fazer "operações como essa" nas comunidades.

Terceiro: 64% da população do estado do Rio de Janeiro apoia a "operação".

Quarto: 58% acha que a "operação" foi um sucesso.

Quinto: 52% acha que depois da "operação policial", o Rio de Janeiro está "menos seguro".

Sexto: quando a pergunta é "qual deveria ser a primeira reação de um policial que está trabalhando e se depara com uma pessoa com um fuzil na mão?", a resposta que obtém 50% é "buscar prender sem atirar".

Há uma óbvia contradição entre os quatro primeiros e os dois últimos resultados.

O que comprova que está em curso uma disputa ideológica polarizada, na qual a direita consegue levar vantagem porque ela domina a "narrativa" geral segundo a qual estaria em curso uma "guerra".

Portanto, é possível à esquerda virar o jogo quando faz predominar o debate em torno dos resultados concretos desta "guerra" e, a partir daí, estabelecer outra "narrativa": a da segurança pública.

(A direita sabe disto, motivo pelo qual, entre outras coisas, evitou a adequada autópsia dos mortos).

A rigor, a própria pesquisa demonstra que bastaria convencer o eleitorado autoproclamado de esquerda a defender posições de esquerda, que o resultado geral da pesquisa seria bem diferente.

Afinal, segundo a pesquisa, 35% do "eleitorado lulista" e 27% da "esquerda não lulista" aprovam a "operação". 

Enquanto o lado de cá está dividido, o lado de lá é quase monolítico: o apoio à "operação" é quase total na direita (92%) e na extrema-direita (93%).

O que também mostra como, em determinados temas, a extrema-direita polariza totalmente a direita gourmet.

Também pelo exposto mais acima, é tão deletéria a posição de Quaquá & assemelhados: ao declarar apoio à "operação" (que qualquer pessoa honesta em relação aos fatos precisa reconhecer que foi uma chacina) e ao reforçar o discurso de que estaria em curso uma "guerra" (onde a lei é matar), os criptofascistas infiltrados entre nós contribuem para reforçar a direita.

Não se combate os fascistas concordando com eles.

Nem se combate o fascismo, tolerando entre nós o criptofascismo.


















sábado, 1 de novembro de 2025

O criptofascismo e o "apoio popular" à chacina

A edição da Folha de S. Paulo na véspera do dia dos mortos afirma que “mais da metade dos moradores do RJ” considera que a “operação” (leia-se: a chacina) foi “um sucesso”. 

Deixemos aos especialistas discutir os problemas técnicos que a pesquisa possa ter, entre o quais o fator “medo”, e admitamos que o retrato esteja correto. Pergunto: qual a surpresa?

Afinal, todos sabemos que as posições da extrema-direita são muito influentes e por vezes majoritárias, no mundo e no Brasil. 

Vide as eleições recentes na Bolívia e na Argentina. Vide as eleições presidenciais, estaduais e parlamentares de 2022, assim como as eleições municipais de 2024. 

Em todos esses e em muitos outros casos, a maioria numérica do eleitorado válido votou em pessoas e partidos cujas políticas prejudicam, objetivamente, a maioria do povo.

Cabe perguntar: por que tantas pessoas que são e serão prejudicadas pela extrema-direita, ainda assim votam nessa gente?

Os motivos são muitos e entre eles não estão correção, eficácia nem eficiência. Noutras palavras, a política de insegurança pública da direita não entrega, nem entregará nunca o que promete. Portanto, a parcela do povo que apoia a política de insegurança pública não o faz por causa dos resultados, pois aquela política não produz paz, nem mesmo a paz dos cemitérios.

No Rio de Janeiro, por exemplo, o governador Castro tem lado na guerra de facções; e o desfecho da recente chacina é que outros “subsenhores da guerra” vão substituir os que tenham sido mortos e presos. Já os verdadeiros chefes e donos da coisa toda seguirão intocados.

Assim, o que explica o apoio popular não é o resultado objetivo, mas sim o convencimento resultante da luta política-ideológica, a saber, a capacidade que a extrema-direita construiu, ao longo de décadas e usando todos os meios (redes e púlpitos inclusive), de convencer a população de que não existiria outro jeito, que este seria o jeito certo.

Isto coloca um desafio ainda maior para a esquerda, especialmente para o PT. Trata-se de simultaneamente combater o crime de outra e verdadeira forma & de combater a política criminosa dos neofascistas

O desafio é tão difícil que alguns setores do PT e alguns setores do mal denominado "progressismo" acham mais fácil “unir-se a eles”, ou seja, adotar discurso e prática parecidas com as da direita.

É o caso, por exemplo, de um certo criptofascista abrigado na cúpula do PT, personagem meio caricato que demonstra um prazer quase sexual quando fala em pau, porrada e bomba

O resultado dessa conduta não foi, não é nem será o fortalecimento da esquerda. Passar o pano nas políticas da extrema-direita contribui para legitimar e fortalecer a extrema-direita. Prova suplementar disto é que, na cidade atualmente governada pelo citado criptofascista, a direita geralmente vence as eleições majoritárias, inclusive presidenciais.

Se a esquerda quer mesmo vencer a extrema-direita no debate sobre segurança pública, não tem caminho fácil: é preciso construir uma política diferente, aplicar uma política diferente e defender uma política diferente. Dá trabalho, mas é o único jeito de impedir que a barbárie prevaleça.

Quem quiser seguir outro caminho, precisa "pedir para sair". Ou precisa ser saído por quem realmente quer "combater o fascismo". Afinal de contas, quinta-coluna inimigo é.