O texto abaixo é a primeira parte de um roteiro para o
debate que será feito na reunião da direção nacional da tendência petista
Articulação de Esquerda, no domingo 15 de setembro de 2019. A segunda parte do roteiro (que não segue abaixo) trata do desempenho da chapa Em tempos de guerra, a esperança é vermelha, dos congressos estaduais e nacional do PT, da análise da conjuntura e de resoluções organizativas e políticas decorrentes do PED 2019. Algumas das conclusões
apresentadas na primeira parte do roteiro são provisórias e baseadas em informações também provisórias. E
todas as opiniões ainda são de responsabilidade pessoal dos redatores do
roteiro. Portanto, pede-se leitura e crítica, mas com a devida piedade.
No dia 8 de setembro de 2019, centenas de milhares de pessoas filiadas
ao Partido dos Trabalhadores votaram em direções zonais e/ou municipais e
respectivas presidências, bem como votaram nas delegações aos respectivos congressos
estaduais e ao congresso nacional do PT.
A secretaria nacional de organização do PT divulgou, na tarde do dia 11
de setembro de 2019, um boletim intitulado “Eleições Internas 2019/Totalização
de Votos das Chapas de Delegados Nacionais/Resultado Parcial”.
Este boletim é “parcial”, por dois motivos: contém números cuja exclusão
é solicitada por diversos recursos; e não contém números cuja inclusão é
solicitada por outros recursos. Estima-se que tanto num, quanto noutro caso,
estamos falando de cerca de 30 mil votos.
O prazo para recursos encerrou no dia 13 de setembro; ainda não foi
divulgado um balanço do número total de votos afetados. O prazo limite para
votação dos recursos é o dia 5 de outubro. Portanto, até este dia 5/10/2019,
qualquer análise deve ser feita com os dados fornecidos pelo boletim divulgado
na tarde de 11 de setembro.
O referido boletim (que está disponível para acesso na página www.pagina13.org.br) informa o total de
votos e o número obtido por cada uma das nove chapas nacionais que disputaram o
PED, distribuídos por estados. A análise a seguir baseia-se, exceto quando
expressamente indicado, nos números deste boletim.
Comparecimento
A primeira análise que deve ser feita diz respeito ao número de petistas
que compareceram às urnas. O boletim informa que foram 310.909 (incluindo votos
válidos, brancos e nulos).
Este número pode ser comparado com dois outros: com o número total de
filiados aptos a votar e com a série histórica de comparecimento, nas eleições (PED)
anteriores.
O boletim informa que o número de filiados aptos a votar era de
2.040.882. Portanto, teriam comparecido 15,2%.
O boletim informa, também, o número de filiados aptos a votar nos
municípios onde a votação efetivamente ocorreu. Neste caso, o número de aptos
cai para 1.786.900. E, também neste caso, o comparecimento teria sido de 17,3%.
Agora vejamos a série histórica. Infelizmente, a secretaria nacional de
organização do PT não disponibiliza uma tabela oficial, consolidando os dados
de todos os PED realizados pelo PT, nos anos de 2001, 2005, 2007, 2009, 2013,
2017 e 2019. Na falta de uma consolidação oficial, compilamos os dados e
chegamos ao seguinte:
2001, 867 mil filiados, compareceram
221.516, 26%.
2005, 825 mil filiados, compareceram
315 mil, 38%
2007, 849 mil filiados, compareceram
330 mil, 38%
2009, 1.322 mil filiados,
compareceram 516.093, 39%
2013, 1.619 mil filiados,
compareceram 421.507, 26%
2017, 1.691 mil filiados,
compareceram 308.687, 18%
Os dados acima foram obtidos em tabelas fornecidas pela própria Secretaria
nacional de organização. Suspeito que há incongruências, mas só a Sorg dispõe
dos dados que permitiriam tirar a dúvida. Assim, trabalharemos com o que temos.
Se exatos os dados, o comparecimento de 2019 foi o menor da série
histórica: algo entre 15,2% (considerando o total de filiados) e 17,3%
(considerando o total de filiados aptos nos municípios que realizaram o PED).
Claro que, a depender dos recursos, pode haver uma oscilação para baixo ou para
cima.
Entretanto, em números absolutos e relativos, há uma semelhança entre os
números nacionais do PED de 2019 e o PED de 2017: 308 mil e 310 mil votantes,
17,2% e 18%.
Mas quando olhamos a participação dos estados, verificamos que em alguns
houve uma oscilação expressiva na votação de 2019 em relação a 2017, Vejamos
abaixo, por enquanto sem citar os números, o comportamento da votação em cada
estado, em 2019 comparando com 2017:
Acre caiu
Alagoas subiu
Amapá caiu
Amazonas subiu
Bahia é um mistério, por razões que explicaremos adiante
Ceará subiu
Distrito Federal subiu
Espírito Santo caiu
Goiás caiu
Maranhão subiu
Minas Gerais caiu
Mato Grosso do Sul caiu
Mato Grosso subiu
Pará subiu
Paraíba caiu
Pernambuco subiu
Piauí subiu
Paraná caiu
Rio de Janeiro caiu
Rio Grande do Norte subiu
Rondônia caiu
Roraima caiu
Rio Grande do Sul subiu
Santa Catarina subiu
Sergipe subiu
São Paulo caiu
Tocantins subiu
Em doze estados a votação caiu. Em catorze a votação cresceu. São do
nordeste 7 dos 14 estados em que a votação subiu. A exceção é a Paraíba, onde por
acaso havia chapa única na disputa da direção estadual do Partido. No caso da
Bahia, não há como fazer a comparação, pois devido às fraudes cometidas no PED
de 2017, foi feito um acordo para compor direção e delegações, mas não existe
um número oficial de comparecimento com o qual se possa fazer a comparação.
Mas atenção: os números nacionais de 2017 e 2019 são similares. Assim,
poder-se-ia imaginar que a oscilação para cima ou para baixo foi pequena. Mas isto
não é verdade. Há alguns estados onde o crescimento no número de votantes foi
imenso. Vejamos os números absolutos:
Alagoas subiu de 2.039 para
4.095 (+100%)
Amazonas subiu de 8.070 para 9.767 (+21%)
Ceará subiu de 22.780 para
33.949 (+49%)
Distrito Federal subiu 4.603 para 5.651 (+22%)
Maranhão subiu de 9.254 para
14.236 (+53%)
Mato Grosso subiu de 3.608 para 4.428 (+22%)
Pará subiu de 10.255 para 18.527 (+80%)
Pernambuco subiu de 9.981 para
19.493 (+95%)
Piauí subiu de 10.543 para
16.143 (+53%)
Rio Grande do Norte subiu de 2.774 para 3.148 (+13%)
Rio Grande do Sul subiu de 18.859 para 22.102 (+17%)
Santa Catarina subiu de 8.316 para 8.591(+3%)
Sergipe subiu de 4.740 para
6.359 (+34%)
Tocantins subiu de 3.137 para 3.934 (+25%)
Os dados são claros: o PED de 2019 manteve um número absoluto de
votantes parecido com o de 2017, apesar da queda expressiva do comparecimento
em alguns estados, porque em 14 estados cresceu expressivamente o
comparecimento. Metade dos estados em que houve crescimento está no nordeste e,
nestes estados, o crescimento oscilou entre 35% e 100%! O Pará também exibiu um
imenso crescimento: 80%!
Detalhe importante: exatamente nos oito estados onde o crescimento da
participação foi mais expressivo, o PT participa dos governos estaduais, seja
como partido do governador, seja como aliado.
Para alguns isto é boa notícia: onde somos mais fortes eleitoralmente, o
PT é mais forte. Para outros, a “boa nova” vem acompanhada de um preocupante
senão: a influência (não apenas política) destes governos nos respectivos
processos eleitorais do Partido, revelando uma crescente “estatização” e
“estadualização” do Partido. O que, na ausência de um “projeto nacional” claro
e forte, pode levar a uma crescente influência dos interesses de governantes estaduais na
definição da nossa política nacional.
Isso nos remete para uma discussão complexa, mas
necessária: a qualidade da participação.
Para um partido como o PT, ter 2 milhões de
filiados é ótimo. Mas temos um problema se destes 2 milhões de filiados, apenas
300 mil estão dispostos a participar, mesmo que minimamente, da vida
partidária.
E temos outro grave problema, se uma parte destes 300 mil votou sem
compreender o que estava fazendo, sem ter conhecimento das diferentes
alternativas; ou, em alguns casos, “votou” sem existir, como é o caso dos
eleitores criados por fábricas de atas e por apurações fraudulentas.
Não temos como estimar quantos votantes estavam minimamente informados
acerca das alternativas. O que sabemos é que o número de pessoas que participou
dos debates presenciais (nos três níveis) foi bem menor do que o número de
eleitores. E que o número de pessoas que acessou os debates entre as chapas
nacionais também foi menor do que o número de votantes. Além disso, ao menos
nacionalmente o Partido não fez chegar, a todos os filiados e filiadas, nenhum
material informando quais eram as chapas que estavam disputando as eleições.
A verdade é que o Partido organiza uma eleição de grande porte, porém com métodos e com
meios extremamente precários. Basta
dizer que já registramos vários casos de erros materiais na transcrição dos
votos para as planilhas e boletins oficiais.
Mas, para piorar, alguns setores do Partido adotam meios que corrompem a
qualidade do processo:
abuso de poder econômico, interferência de outros partidos, transporte de
filiados, fabricação de atas, ingerências ilegais, alteração das regras no meio
do processo, monopolização dos dados oficiais do processo por parte de uma
única tendência etc.
Infelizmente,
a reiteração dos problemas acima citados revela que eles já se tornaram parte
integrante do modus operandi de um setor do Partido. Portanto, se faz
necessário denunciar e combater publicamente estas práticas.
Quando escrevemos este texto, ainda não foram consolidados todos os
recursos sobre o processo. Mas os dados preliminares reafirmam a tese que temos
defendido, desde 2001: o PED não é um bom método para eleger direções e definir política. Ele não é a causa da degeneração de
alguns setores do Partido, mas o PED facilita e estimula a degeneração, à
medida que impõe uma dinâmica que traz junto todos os problemas dos processos
eleitorais tradicionais, agravados por práticas que mesmo no terreno eleitoral
conseguimos coibir e evitar com certo êxito.
Chapas nacionais: a CNB
O boletim divulgado pela Sorg no dia
11 de setembro informa que a chapa Lula Livre para Mudar o Brasil obteve 154.263
votos ou 52,9%. Esta chapa foi apresentada pela tendência petista Construindo
um Novo Brasil (CNB).
Esta maioria absoluta foi possível graças ao
resultado obtido em alguns estados. Vejamos aqui o número total de votos de
cada estado e o respectivo número de votos obtido pela chapa Lula Livre para
Mudar o Brasil. Indicamos aqueles casos em que o número de votos foi maior que
50% do total de votos válidos no respectivo estado.
Acre 1.613, 1.428
88%
Alagoas 4.095,
2.975 72%
Amapá 3.237, 907
Amazonas 9.767, 2.137
Bahia 8.062, 1.438
Ceará 33.949,
22.682 66,8%
Distrito Federal 5.651, 1.260
Espírito Santo 5.104, 2.480
Goiás 7.042,
4.186 59,4%
Maranhão 14.236, 5.086
Minas Gerais
34.961, 20.313 58%
Mato Grosso
do Sul 5.466, 2.905 53%
Mato Grosso
4.428, 2.957 66,7%
Pará 18.527,
13.957 75,3%
Paraíba 4.224, 1.722
Pernambuco
19.493, 10.466 53,6%
Piauí 16.143, 7.936
Paraná 7.626,5.304 69,5%
Rio de
Janeiro 17.115, 9.113 53,2%
Rio Grande do Norte 3.148, 1.024
Rondônia 1.693,751
Roraima 233,
209 89,6%
Rio Grande do Sul 22.101, 1.652
Santa Catarina 8.591, 3.956
Sergipe 6.359, 1.988
São Paulo 44.098,
24.380 55%
Tocantins 3.934, 1.048
Portanto, em 13 estados a chapa da CNB obteve mais
do que 50% dos votos. Em alguns destes estados, o número absoluto de votantes é
muito baixo (Roraima, Acre). Em outros estados,
o percentual obtido pela CNB é próximo ao percentual nacional.
Mas há alguns pontos fora da curva, ou seja,
estados que contribuem com parcela expressiva da votação nacional e onde a CNB obteve
uma vantagem expressiva: Ceará (11,6% do
total de votos válidos nacionais e 66% dos votos da CNB),
Minas Gerais (12% dos votos válidos nacionais e 58% dos votos da CNB), Pará (6%
dos votos válidos nacionais e 75% dos votos na CNB), São Paulo (15% dos votos válidos
nacionais e 55% dos votos na CNB).
Sem o desempenho obtido nestes quatro estados, é
possível que a CNB não alcançasse maioria absoluta. Também por este motivo,
vale analisar como foi o desempenho estadual da CNB em
eleições passadas, especialmente nestes estados. Por enquanto, entretanto, queremos
destacar a série histórica.
Novamente vamos nos basear em dados compilados a
partir de informações não consolidadas pela Sorg, portanto dados que apresentam
incongruências (incluindo aí o fato de que em 2017 não se votou diretamente nas
chapas nacionais). Lembramos, ademais, que a atual configuração da CNB não é a
mesma da Articulação Unidade na Luta ou do Campo Majoritário. Lembramos,
finalmente, que em alguns PED a CNB apresentou chapas nacionais em aliança com
outros setores. Com as ressalvas indicadas, vejamos o desempenho “da” CNB em
cada PED:
2001: 105
mil votos, 51,7%
2005: 116
mil votos, 41,9%
2007:
126 mil votos, 42,6%
2009:
252 mil votos, 55,1%
2013:
200 mil votos, 53,6%
2017:
141 mil votos, 46%
2019:
154 mil votos, 52,9%
A partir destes números, podemos desenhar duas
curvas.
A curva de números absolutos cresce suavemente
entre 2001 e 2007 (ganho de 20 mil eleitores), depois cresce muito entre 2007 e
2009 (ganho de 125 mil eleitores), depois decresce entre 2009 e 2017 (perde 110
mil eleitores), depois cresce modestamente entre 2017 e 2019 (ganha 13 mil
eleitores).
Ao que tudo indica, esta curva de números absolutos
acompanha, com algumas discrepâncias, o comparecimento geral dos petistas.
Já a curva de números relativos é diferente: cai
muito entre 2001 e 2005, se mantém estável entre 2005
e 2007, cresce muito entre 2007 e 2009, se mantém estável entre 2009 e 2013,
cai bastante entre 2013 e 2017, cresce entre 2017 e 2019.
Esta curva de números relativos, ao que tudo
indica, é no essencial comandada pela política. A CNB é sempre maioria, mas
esta maioria é absoluta ou relativa a depender de razões políticas.
Foi por razões essencialmente políticas que a CNB obteve
a maioria absoluta em 2001: marchávamos para conquistar a presidência da
República, orientados por uma linha política respaldada pela maioria do
Partido.
Foi por razões essencialmente políticas que a CNB perdeu
a maioria absoluta em 2005 e não a reconquistou em 2007: a chamada “crise do
mensalão” desorganizou o grupo dirigente e, ao mesmo tempo, provocou uma reação
muito crítica na base partidária.
Foi por razões essencialmente políticas que a CNB
recuperou a maioria absoluta em 2009: a mudança na política do governo, os
impactos positivos sobre o país, a atitude frente a crise de 2008 e, inclusive,
a ilusão de que os desgastes causados pelo chamado “mensalão” haviam sido
superados.
Foi por razões essencialmente políticas que a CNB
perdeu a maioria absoluta em 2017: o impeachment, a radicalização da base
partidária e o repúdio aos que queriam “virar a página do golpe”.
Se isto é verdade, se é verdade que a curva de
votos relativos da CNB é comandada pela política, como explicar a maioria
absoluta conquistada (ao menos segundo a “última parcial”) em 2019???
A questão é: em 2019, a maioria absoluta do
eleitorado petista votou na chapa apresentada pela CNB porque considerou que
ali está uma política adequada (como aconteceu em 2001 e em 2013)? Ou será que em
2019 a maioria absoluta foi obtida graças a outros fatores? Ou estamos diante
de uma combinação de variáveis?
Pensamos que podemos nos aproximar da resposta para
esta questão, fazendo uma análise do desempenho obtido pela CNB nos estados. Como
demonstramos, a maioria absoluta não foi
obtida em todo o país, mas em 13 estados. A saber:
Acre 1.613, 1.428
88%
Alagoas
4.095, 2.975 72%
Ceará
33.949, 22.682 66,8%
Goiás 7.042,
4.186 59,4%
Minas Gerais
34.961, 20.313 58%
Mato Grosso
do Sul 5.466, 2.905 53%
Mato Grosso
4.428, 2.957 66,7%
Pará 18.527,
13.957 75,3%
Pernambuco
19.493, 10.466 53,6%
Paraná
7.626,5.304 69,5%
Rio de
Janeiro 17.115, 9.113 53,2%
Roraima 233,
209 89,6%
São Paulo
44.098, 24.380 55%
Em todos eles, a CNB é maioria nas respectivas
direções estaduais. Em quatro deles (Alagoas, Ceará, Pernambuco, Pará) pode-se
argumentar que o PT foi “vitorioso” nas eleições de 2018, mesmo que esta
“vitória” tenha sido apoiar no primeiro ou no segundo turno candidaturas de
outros partidos. Nos demais casos, fomos derrotados, as vezes de maneira
aplastradora.
E aí vale perguntar: em estados como Minas Gerais,
São Paulo, Rio de Janeiro, Acre, Paraná, quais seriam os motivos essencialmente
políticos capazes de explicar que a CNB tenha conseguido maioria absoluta dos
votos?
Dizendo de outra forma: caso a CNB tivesse obtido
maioria relativa, a explicação poderia ser apenas política. Mas uma maioria
absoluta, garantida pelo desempenho da chapa nacional da CNB nesses estados,
não pode ser explicada apenas ou essencialmente pela política.
E quando se olha o cenário nacional, parece óbvio
que o cenário de 2019 não pode ser comparado a 2001, 2009 e 2013. Diferente desses
três anos, em 2019 a política nacional da CNB está muito longe de ser clara e
atrativa.
Entretanto, pode-se argumentar que: a) a prisão de
Lula e a vitória de Bolsonaro empurraram o Partido para uma posição mais
cautelosa; b) que a postura da atual presidenta do PT, pelo menos a postura que
adotava antes de virar candidata oficial da CNB, parecia o máximo do
radicalismo possível e garantiu muitos votos para a CNB, embora a cúpula desta
tendência e a presidenta se choquem com frequência; c) que o apoio de Lula
conta muito; d) que os setores da CNB defensores de “virar a página do golpe” foram
muito cautelosos, até terminar a eleição (logo depois veio a entrevista de Rui
Costa nas páginas da revista Veja).
Mas algumas destas razões também estavam presentes
em 2005, em 2007 e em 2017, anos em que a CNB obteve maioria relativa.
Portanto, para explicar a maioria absoluta obtida em 2019, consideramos
necessário levar em conta outros fatores: a incapacidade de forjar uma
alternativa política e eleitoral, o peso da inércia no “eleitorado” petista, a
influência das máquinas parlamentares e governamentais, além das fraudes.
Destes outros fatores, nos parecem essenciais a influência
das máquinas (que jogaram um papel decisivo exatamente nos estados onde a CNB
obteve um resultado fora da curva) e das fraudes (que incluem desde transporte
ilegal, intimidação a fiscais, engravidamento de urnas, falsificação de atas,
alteração das regras no meio do processo etc.).
Quais serão os efeitos da maioria absoluta obtida
pela CNB? Em nossa opinião, serão desastrosos.
Na prática, a CNB poderá decidir sozinha quais serão
os rumos do Partido. E como a CNB está dividida, mas aderiu a uma versão
franciscana do centralismo democrático, isto quer dizer que quem for maioria na
CNB poderá decidir os rumos do Partido. Ou seja: em tese, 26,5% do PT poderão
impor sua vontade sobre 100% do PT.
Isto já seria ruim em qualquer situação. Mas na
situação atual pode ser
desastroso. Pois hoje estamos enfrentando uma “operação em pinça” contra o PT:
de um lado a extrema-direita, que nos quer aniquilar; de outro lado, a
centro-direita-com-aliados-na-esquerda, que nos quer anular. Frente a esta
operação em pinça, qual será a política da maioria? Melhor dizendo, qual será a
política da “maioria da maioria”?
Tudo indica que será uma repetição canhestra da
política de alianças adotada entre 1995 e 2016. Acontece que, naquele momento,
o PT liderava aquela política de alianças. Querer que o mesmo ocorra agora, é
querer o impossível. Construir uma política alternativa, nesta situação, será
difícil em quaisquer condições. Construir uma política alternativa, com o
Partido dirigido por uma maioria absoluta conquistada nas bases que foram
conquistadas, é praticamente impossível. Especialmente levando em consideração
o peso assumido pelos governadores, que possuem agenda própria, como se vê na
reforma da previdência e, também, nas recentes declarações do governador da
Bahia.
Noutras palavras, a maioria absoluta da CNB não
garante que o Partido tenha “estabilidade” para enfrentar o que já está acontecendo,
muito menos o que virá. Esta maioria absoluta indica que novas crises e novas
derrotas virão. Haverá uma alternativa?
O desempenho nacional
das chapas minoritárias
Além da chapa Lula Livre para mudar o Brasil, da
CNB, havia outras 8 chapas. Somadas, elas obtêm
47% dos votos. Mas estas chapas minoritárias não se coligaram, nem se
coligarão. Duas fazem parte do campo ampliado da CNB. Outras duas fazem parte
do campo de alianças construído pela CNB na gestão 2017-2019. E cada uma das 8
chapas obteve, isoladamente, votações muito inferiores a obtida pela CNB.
Aliás, uma das constantes em todos os PED
realizados desde 2001 até 2019 é que a segunda chapa (seja qual for) nunca
chegou perto de ter a metade dos votos da chapa da CNB.
Mesmo quando a CNB teve seu pior desempenho, em
2005 (42% dos votos), a segunda chapa obteve
12,2%. Ou seja, nenhuma das chapas minoritárias nunca recebeu,
isoladamente, uma votação que fosse eleitoralmente competitiva. Quem se jacta
de estar em “segundo lugar” deveria refletir a esse respeito.
Como, por variados motivos, as chapas minoritárias
nunca se uniram, nunca a CNB enfrentou uma disputa contra uma oposição que
fosse eleitoralmente competitiva. Outra questão, tão importante quanto, é
verificar se o “discurso” apresentado pelas chapas minoritárias foi
efetivamente uma alternativa global ao “discurso” da maioria, ou se em alguns
casos tratava-se de uma variante frente a qual o original podia ser até mais
convincente e atrativo.
Outros elementos a considerar, ao analisar o
desempenho das chapas minoritárias, é sua composição e seu histórico. No caso
do PED 2019, temos duas chapas novatas em termos de PED (Repensar o PT e Nas
lutas, ruas e redes) e 6 chapas veteranas (ou seja, que já disputaram outros PED,
com esta ou com conformações parecidas).
Das chapas veteranas, duas se organizam em torno de
uma única tendência (Articulação de Esquerda, no caso da chapa Em tempos de
guerra, a esperança é vermelha; O Trabalho, no caso da chapa Diálogo e Ação Petista).
Outras 4 chapas foram organizadas a partir de coalizões de tendências
(Movimento PT e Tribo; DS, Avante e MS; Novo Rumo e EPS) ou de parlamentares
(Resistência).
A maioria destas chapas e de seus integrantes fez
alianças cruzadas nos estados e municípios, inclusive com a CNB. Em alguns
casos, há sinais de que estas alianças locais incluíram a transferência de
votos para chapas nacionais. Isto torna ainda mais difícil saber, com certeza,
qual a força isolada de cada uma das chapas e de cada um de seus componentes.
Um número aproximado poderá ser deduzido das indicações que serão feitas ao DN,
em novembro de 2019.
De toda forma, o ranking no PED 2019, conforme o
boletim da Sorg de 11 de setembro, é o seguinte:
290 13,3%
200 10,7%
250 9,1%
220 5,2%
270 3,7%
210 2,1%
260 1,7%
230 1,3%
Quanto a análise da série histórica: como já
dissemos, o PED de 2017 foi feito com base em regras diferentes do PED 2019. Em
2017 os filiados não votaram em chapas nacionais. Este fato altera pouco a
análise do desempenho da chapa da CNB, devido ao seu volume; mas pode afetar
muito o desempenho relativo de cada uma das chapas minoritárias. Assim, para
uma análise da evolução histórica, o ideal seria comparar os resultados do PED
de 2013, de 2017 e de 2019. Um problema é que em 2013 e 2017, a
composição de algumas chapas minoritárias era muito distinta da atual.
Independente da análise do desempenho eleitoral de
cada uma e do conjunto das chapas minoritárias, é óbvio que não foi atingido,
no dia 8 de setembro, o objetivo de eleger uma maioria comprometida com uma
“nova maioria”, uma “nova estratégia” e um “novo padrão de funcionamento”.
Esses números são horríveis, a participação é baixíssima, principalmente se levarmos em consideração que o crescimento de militantes é muito menor do que de simpatizantes/eleitores do Partido. Parece que as lideranças — todas, de todas as tendências — ainda não se deram conta que o partido como instituição, instrumento de luta política e transformação social é muito maior e mais importante historicamente que suas dispustas paroquiais. É preciso utilizar métodos mais abertos e mais modernos de participação se não queremos passar o que vem passando com os partidos de esquerda nas democracias avançadas.
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